• Nenhum resultado encontrado

Mediante o que expomos no decorrer deste trabalho, nos foi possível observar que, a antropofagia é um aspecto constitucional da nossa formação cultural e se faz presente em muitos aspectos de nossas vidas. O comportamento do povo brasileiro não poderia deixar de lado uma marca tão forte, que parte de um mito tão profundo e com um significado tão marcante. Um mito que leva os índios ao combate para que possam, através da vingança ritual, refazer os seus caminhos ancestrais para reencontrar a terra- sem-mal.

Assim como todos os símbolos que são uma forma de conforto para o ser humano, em função da sua incessante insatisfação mediante o mundo, a antropofagia indígena também simboliza essa busca insatisfeita por preencher os vazios existenciais.

Para os Tupinambá, é o ritual antropofágico que os levará a terra-sem-mal, onde não existe dor, sofrimento, trabalho e morte; um lugar de harmonia e de paz. Ingerindo o seu inimigo, eles, além de se aproximarem do mito, também estarão absorvendo daquele guerreiro prisioneiro, seus valores e virtudes; fazendo com que provem e sintam a diminuição da distância da terra-sem-mal.

Demonstramos os impactos da modernização da sociedade. A invasão cultural que adentrou o Brasil. Novas formas de enxergar o mundo e o sagrado foram introduzidas. O cristianismo católico chega ao Brasil faminto por novos devotos, para repor o que fora devorado pelo protestantismo reformado na Europa, aqui encontram um enorme banquete, mas, infelizmente para os cristãos, os índios falam uma língua diferente da deles, o que atrasou um pouco a comilança; foi como se diante deles estivesse um imenso banquete, faltando os talheres. Esses talheres, de pronto, foram sendo providenciados, e os Jesuítas trataram de aprender a língua nativa, para que assim pudessem catequisar os indígenas, o que não foi um problema para os cristãos, que logo providenciaram formas de “devorar” aquelas pessoas e a sua cultura.

Quando se depararam com a antropofagia, os colonizadores logo acreditaram estarem diante de algo efetivamente demoníaco que precisava ser rapidamente combatido, para que aquelas criaturas, que inicialmente nem eram considerados como gente, tivessem uma chance de não sucumbirem na total danação. Era necessário que fossem rapidamente catequizados e que a antropofagia fosse definitivamente banida das

tribos.

Apressaram-se em catequisar e empurrar o cristianismo “goela a baixo” nos índios alegando que as práticas antropofágicas eram animalescas e demoníacas assim como afirmou Colombo, entretanto como foi possível verificar nesse trabalho a antropofagia indígena não se trata de animalidade ou de pecado, os rituais antropofágicos, foram retratados pelos cronistas de história como uma pratica predatória e sem sentido, nesse trabalho comprovamos exatamente o oposto. Mostramos que a falta de sentido encontrada pelos Europeus residia em uma motivação que não incluía submissão de outro povo, acumulo de terras e bens, falando em poucas palavras não era compreensível aos europeus que uma guerra não tivesse o ganho financeiro como pano de fundo.

A antropofagia como concretização de uma guerra que tinha como finalidade ultima honrar os seus parentes, e reviver um mito cosmogônico não era compreensível à civilização branca, rica e letrada da Europa. E a maneira mais prática que eles encontraram para tentar coagir os índios foi à introdução de práticas religiosas que anulasse e até mesmo punisse as práticas antropofágicas. Essa coação foi tão danosa à cultura indígena e consequentemente a cultura brasileira que transformou a antropofagia que era um orgulho para nação Tupinambá em um Tabu, praticamente “imencionável”em nossa sociedade.

Nesse trabalho, analisando as obras de grandes autores nos foi possível fazer submergir da historia contada pelos próprios europeus, fatos que nos mostram que a antropofagia realmente ocorria, mas que não era exatamente uma festa de horrores, como eles quiseram nos evidenciar. Fazendo uma leitura mais atenta, é possível perceber que mesmo tratada como pecado, o sagrado indígena escapa pelas entrelinhas chegando até nós como mostramos do decorrer desse trabalho e que ficou evidente quando demonstramos matematicamente no primeiro capítulo baseados nas obras dos próprios cronistas europeus.

Com base nessa sacralidade comprovada pelo simbolismo do ato antropofágico que se traduz na quantidade de carne ingerida, por cada membro durante o festim antropofágico e também nos rituais de festa ocorridos antes e depois da morte do prisioneiro, é que partimos para a análise da antropofagia subjetiva. Pois, hoje o ritual antropofágico prático foi extinto em nosso país estando presente apenas nas narrativas históricas.

Tupinambás, até o canibalismo nutricional do caso da Cruz da menina de Pombal- PB, que resignificada pelo povo, volta para o meio sagrado através da “santificação” da menina, tornando-se Maria um orgulho para a religiosidade da cidade, assim como os guerreiros Tupinambás mortos em tribos inimigas também se tornava motivo de orgulho para a sua tribo de origem. Tivemos também as demonstrações de antropofagia moderna, apontamos onde é possível encontrar hoje a antropofagia ressignificada em nossa sociedade. Nos casos modernos temos maiores recorrências na área da medicina, que disfarçada e completamente dissociada da ideia de antropofagia, que é coisa de selvagem, essa antropofagia velada enche de orgulho a sociedade que é capaz de salvar vidas usando de técnicas e tecnologias avançadas de uma sociedade que se considera a mais evoluídas de todos os tempos, mas que no fim, é tão antropofágica quanto os indígenas Tupinambás, apenas com um diferencial, são antropófagos sem se dar conta, transformando literalmente o Tabu em totem.

Multifacetada, mais uma vez encontramos a antropofagia se relacionando ao catolicismo na Paraíba, dessa vez ela aparece como ato frustrado, tornando-se o mito cosmogônico de Bananeiras cidade do brejo Paraibano, mais uma vez percebemos que mesmo não tendo acontecido, ela foi o canal para que o sagrado se manifestasse, tornando-se dessa forma literalmente o terreno onde seria erguida a igreja católica de Nossa Senhora do Livramento e se relacionando diretamente com a construção da cidade e da identidade de um povo.

Por ultimo tratamos da antropofagia subjetiva, demonstrando como é possível encontrar os mitemas do mito antropofágico, na história de pessoas como Frei Damião e o seu combate fervoroso a religiosidade popular e as tradições do povo. Essa subjetividade e essa análise foi feita com base no mito cosmogônico Tupinambá e com base nos ideais de antropofagia de Oswald de Andrade. Observamos ainda as manifestações subjetivas da antropofagia na arte e na cultura, quando partimos para a antropofagia subjetiva e no meio artístico, complica-se a possibilidade de algum ser humano poder escapar da máxima de Strauss de que “somos todos canibais”, principalmente quando nessa perspectiva é bastante pertinente corroborarmos como o que afirmou Mário Araújo em seu texto Dois Meninos, quando ele diz que:” Quando as pessoas entendem o que falamos, afinal, é sempre uma indecência julgar que já não as temos de alguma forma dentro de nós.”. Partindo desse princípio amplia-se as possibilidades antropofágicas e diminuem-se os espaços para os preconceitos.

pesquisa conseguiu alcançar os objetivos aos quais nos propusemos apontando a sacralidade do ritual antropofágico, e as influências da antropofagia em nossa sociedade. Desejando que esse trabalho possa vir a contribuir efetivamente para um novo olhar da ciência em relação ao ritual antropofágico indígena, e que possamos dar a nossa contribuição social na tentativa de quebrar as barreiras do preconceito em relação a essa temática tão cara a formação da nossa sociedade.