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Compreender a relação entre uma determinada organização espacial com um dos elementos que a compõe, exige a inquirição dos processos de constituição que estruturam essas duas escalas de análise, permitindo alinhavar os pressupostos que explicam a realidade encontrada nessa relação. Nessa perspectiva, para alcançar o objetivo proposto nesta pesquisa, a historicidade enquanto meio investigativo possibilitou a compreensão das diferentes formações socioespaciais que constituíram o município de Palmitos/SC, identificando nessas as características das formas de exploração/produção de erva-mate.

Presente em todas as formações socioespaciais do município em estudo, a atividade da erva-mate assumiu importâncias distintas de acordo com as características das organizações sociais de cada momento, cujo entendimento de ambas demonstra a imbricação e interrelações estabelecidas. O aperfeiçoamento técnico foi facilitado pela fixação da ocupação humana, rompendo com a mobilidade e alterações efêmeras advindas das explorações desenvolvidas em espaços diferentes, vinculados com a sazonalidade de colheita dos ervais.

Na formação sócioespacial da ocupação, intrinsecamente vinculada com a exploração de ervais nativos, essa atividade correspondia ao principal determinante das formas de organização espacial e relações sociais estabelecidas. Os processos de obtenção detinham técnicas rudimentares e suas implicações espaciais eram passageiras, determinadas tanto pela rusticidade quanto pela sazonalidade da colheita.

A colonização, alicerçada na privatização da terra rompeu com a sazonalidade da exploração, ao fixar a ocupação em um único local, possibilitando também o aprimoramento técnico. A consolidação das colônias de povoamento condicionou essa característica à praticamente toda região que correspondia ao antigo Campo de Erê, contribuindo para que o aperfeiçoamento tecnológico tornou- se uma constante. Esse advento implicou na concentração dos processos de obtenção da erva-mate em um único local (em virtude do barbaquá automático), desativando barbaquás tradicionais que secavam a erva antes de revendê-la as indústrias. É válido ressaltar que a formação de colônias de povoamento no Oeste

catarinense, não correspondeu à um processo espontâneo, mas fruto de políticas territoriais imigratórias vinculadas com interesses geopolíticos e geoeconômicos. Esse último corresponde à produção de gêneros alimentícios para abastecimento da economia doméstica, num contexto nacional de industrialização e urbanização. Deste modo, os produtos que conseguiam se inserir no circuito mercantil correspondiam aos cereais e carnes, possibilitando uma contínua troca de fluxos, que materializam também a consolidação da ordem social competitiva necessária para disseminação do sistema capitalista de produção aos diferentes espaços brasileiros. Essa condição contribuiu para desvalorização da erva-mate como alternativa de renda, que já vivenciava um momento de crise, em virtude da produção argentina.

Esse contexto contribuiu para a erradicação de ervais nativos e implantação da lavoura temporárias e pecuária, que se caracterizam como as principais atividades do município de Palmitos. A partir desse momento, a erva-mate assume um papel secundário nas propriedades rurais, utilizada como complementação de renda.

Como durante a colonização grande parte dos ervais nativos foram erradicados, após a reestruturação produtiva da agroindústria ervateira, que amplia a demanda de matéria-prima, elevando o preço pago ao produto, ocorreram incentivos tanto de instituições governamentais como de pessoas envolvidas diretamente com a atividade para a adoção desenvolvimento desse cultivo, a partir da década de 1980.

Essa inserção foi facilitada pelo contexto de crise vivenciada pela agricultura, marcada pela seletividade e marginalização dos estabelecimentos de produção e desvalorização dos produtos rurais. Com o objetivo de encontrar alternativas de complementação da renda, produtores rurais desenvolveram cultivos de erva-mate, que registrou um momento de auge no ano de 1996, com 284 estabelecimentos rurais declarando o desenvolvimento desse cultivo.

É possível intuir que essa territorialidade da erva-mate se inseriu naquele espaço após uma ruptura de um regime de produção das unidades produtivas rurais, compreendido aqui, pelas condições satisfatórias de reprodução social obtidas mediante o desenvolvimento das tradicionais atividades produzidas desde os primeiros anos de referida formação socioespacial. Essa ruptura, ulterior a reestruturação produtiva no parque industrial da erva-mate, possibilitou a inserção

desse cultivo como uma alternativa de renda ante as condições adversas que se construíam gradativamente nas demais atividades, sobretudo no desenvolvimento desigual das unidades produtivas do município.

Na disseminação da planta como alternativa de renda para as propriedades rurais, estão presentes a atuação do Estado e pessoas vinculadas a atividade (ervateiros), que em determinadas circunstancias sobrevalorizaram o cultivo visando sua disseminação, sem, contudo existir contexto mercadológico favorável ao produtor rural, o que favoreceu para um processo de erradicação dos ervais ou parte desses, a partir do final da década de 1990.

Em dado momento da totalidade social pode ocorrer uma redutibilidade e intercambialidade de um elemento ao outro (Santos 1985), pois entre eles existe interação, na qual a ação deve desempenhar e concretizar uma dada função. Isso é perceptível, sobretudo nas motivações que conduziram os produtores rurais a implantar ou erradicar plantações de ervais, ou mesmo na prática de um indivíduo que representa instituições governamentais (Epagri).

Contemporaneamente, a baixa expressividade da erva-mate junto às propriedades rurais caracteriza o contexto atual. Com 284 estabelecimentos declarados em 1996, após 10 anos apenas 43 declaram a produção de erva-mate na unidade de produção. Nessa dinâmica, é notável a influência que o preço pago ao produto exerceu tanto para dinamizar as plantações, quanto para incentivar um processo de erradicação. Ressaltando a imbricação que função e ação possuem na constituição dos arranjos espaciais.

As análises realizadas nesse trabalho objetivaram identificar as relações entre elementos caracterizadores de determinado espaço, que após o desenvolvimento da investigação permite ressaltar a capacidade do sistema de produção capitalista possui na conformação dos espaços, reorganizando-os constantemente. Isso se demonstra seja através da implantação das colônias de povoamento que rompem com uma formação sócioespacial, por não ser totalmente compatível com o sistema de produção capitalista, bem como na capacidade que a obtenção de rendas possui em determinar a função de um espaço, produzindo novas articulações entre os agentes envolvidos nas diferentes territorialidades econômicas.

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