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2.4 PARTICIPANTE DIEGO

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa possibilitou conhecer os significados construídos para a lesão medular traumática sofrida, pelos indivíduos participantes, e, com isso, compreender o processo pelo qual passaram para a retomada de seu projeto de vida após a instalação da deficiência física, a partir da revisão de seu mundo presumido.

Considera-se que o método utilizado na pesquisa foi adequado e propiciou conhecer e compreender o universo dos significados, considerando não só o fenômeno investigado, mas também todo o contexto envolvido. Foi permitido flexibilidade na entrevista, de forma que os participantes puderam discorrer como quiseram sobre o assunto.

Os resultados apontaram para a construção de um significado positivo por parte dos entrevistados, ou seja, a pesquisa mostrou que a experiência de sofrer a lesão medular traumática e passar a ser um deficiente físico, na condição de paraplégico, ainda que muito mobilizadora e difícil, justamente por instituir a perda de referência da vida que se tinha, não necessariamente oferece um sentido ruim à vida da pessoa. Sem dúvida, essa construção positiva requer que o sujeito tenha disponibilidade de olhar para o todo que o envolve.

Pautando-se na fundamentação teórica, com informações de complexidade da situação de sofrer a lesão medular, considera-se que esses resultados apresentaram um novo panorama, o qual apontou para a existência de situações positivas, que fizeram a diferença em suas vidas posteriormente, mesmo em meio a tanta adversidade enfrentada, podendo por assim dizer que situações favoráveis chegaram a ter maior peso no significado construído do que as situações negativas vividas pelos lesados medulares participantes desta pesquisa.

Reconheceu-se a existência de um luto a ser elaborado, visto que a deficiência física implica mudanças e um processo de crescimento. As análises indicaram que tais mudanças geram sofrimento, e o indivíduo se vê como alguém desconhecido, pois as múltiplas perdas impactam a sua identidade, no entanto, o significado de crescimento construído por cada participante permitiu que acrescentassem outros conteúdos a seu mundo e assumissem a nova identidade de forma positiva.

Os participantes precisaram se apropriar da nova condição e elaborar o luto para conseguir reinvestir na vida e poder escolher que direcionamento dar a partir da nova visão de mundo. Percebe-se o quanto é importante que cada indivíduo se torne agente desse desenvolvimento, isto é, resgate sua autonomia, o que é também um dos objetivos, no trabalho com deficientes físicos, do profissional que atua na área da reabilitação física.

A análise das entrevistas permitiu verificar o caráter único e individual do processo de luto e construção de significado, pois cada participante viveu à sua maneira essa experiência, elaborando em tempo diferente, com fatores de influência diferentes e quando semelhantes mais intensos para um que para outro e com variadas reações.

Observou-se ainda que a deficiência física não é algo esperado na vida de um indivíduo, tendendo mais a configurar-se em uma ruptura, no entanto, os resultados mostraram que isso não se faz uma regra, a depender do conteúdo prévio em seu mundo presumido.

Os resultados mostraram também a importância dos profissionais em reabilitação física trabalhar o resgate dos potenciais das pessoas com deficiência, pois se observou que o indivíduo identificar suas potencialidades contribui para uma retomada mais positiva dos planos futuros, propiciando um direcionamento da vida satisfatório ao reconhecerem em si aspectos bons, que lhe ajudam a acreditar que são capazes de dar conta da situação.

Assim, a criação do projeto de vida futuro se consolida também olhando para o passado e presente, quando então se identifica o que é possível manter e o que implica alterações. Dessa forma, após a lesão medular traumática sofrida, houve a necessidade de rever tal projeto e revelou-se diferenças nos planos traçados.

A pesquisa também permitiu identificar a importância do lesado medular compartilhar o sofrimento com outras pessoas com deficiência física, e se perceber fazendo parte de um grupo que o reconhece, não se vendo só, podendo realizar trocas, sentir-se entendido, e conhecer diversas estratégias de enfrentamento, sendo que esse grupo, tal como na reabilitação, tende a valorizá-lo e assim facilita também a autovalorização, o que ajuda na apropriação da condição e consequentemente no reinvestimento da vida dentro das possibilidades permitidas na conjuntura atual. Cabe aos centros de reabilitação também contribuir proporcionando vivências de atendimento de grupo, colaborando para que as pessoas com deficiência física se sintam pertencentes a um grupo que compreende suas perdas.

Assim, o significado construído pelos participantes contribuiu no direcionamento do novo projeto de vida, de maneira que os planos futuros estivessem em conformidade à realidade atual, adequando as expectativas, e vindo se consolidar as perspectivas satisfatórias a eles. Ressalta-se que a vivência desse novo projeto de vida também permitirá que novos significados venham a ser construídos aos acontecimentos em suas vidas na condição atual, pois o sentido se dá ao longo da vivência das situações.

Entende-se que se faz necessária a realização de mais estudos, pesquisas e discussões sobre o tema aqui tratado, sendo que essa pesquisa não pretendeu se tornar conclusiva e não permite generalizações, mas o intuito de gerar reflexões e contribuir com conhecimentos foi alcançado.

A pesquisa suscitou ainda o interesse na investigação com indivíduos em outra faixa etária, ou com tempo de lesão inferior a dois anos, ou ainda acima de cinco anos, e observar que diferenças poderiam ocorrer nesse significado construído e no processo vivenciado.

Por fim, ressalta-se o quão é necessário se atentar à validação de todo o contexto que envolve cada indivíduo acometido, bem como a influência que pode ter o seu mundo presumido na construção do significado.

VII. REFERÊNCIAS

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