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Podemos afirmar que as duas primeiras questões de pesquisa, formuladas no início da investigação para atingir os objetivos propostos, foram devidamente respondidas: 1) O PT realmente não adotou, em sua campanha presidencial de

1989, o modelo de campanha modernizada? e 2) O PT efetivamente adotou, em 2002, o modelo de campanha modernizada?

Não restam dúvidas de que a campanha eleitoral que levou Lula à Presidência foi radicalmente concordante com o arquétipo construído por Mancini e Swanson (1996). O uso de pesquisas de opinião como ferramentas de marketing eleitoral, a profissionalização da estrutura de campanha, a centralidade conferida aos meios de comunicação de massa, a personalização em torno da imagem pessoal do candidato e o uso de apelo sedutor-emotivo na propaganda configuraram-se como características diáfanas desta campanha.

Porém, não se pode classificar a campanha de 1989 simplesmente como

não-modernizada, em uma atribuição dicotômica de valores. Se as pesquisas e o marketing ainda eram vistos com muitas reservas dentro do partido; se a

profissionalização ainda dava seus primeiros passos, em uma estrutura assentada sobre o trabalho da militância e do voluntariado; se a televisão ainda desempenhava um papel de reforço ao que se passava nas ruas; e se o discurso de campanha priorizava a publicidade crítica habermasiana, fortes doses de personalização já eram sentidas na estratégia daquela campanha.

Assim, é preciso seguir a orientação de Sartori (1982, pp. 318-320) a respeito dos casos mistos, evitando classificar aquela campanha como não- modernizada, já que parece-nos mais apropriado categorizá-la como um caso próximo a este tipo puro, e que não se aproximou ainda mais pelas especificidades de Lula – sua liderança carismática e sua origem – e do próprio PT – um partido de massas.

Com as respostas a estas duas questões, pode-se testar a hipótese que norteou a investigação: o PT não adotou, em 1989, o tipo ideal de campanha modernizada desenvolvido por Mancini e Swanson (1996); em 2002, teria

passado a adotá-lo. Esta hipótese foi corroborada, com a ressalva de que a

personalização já existia em 1989.

Em relação à terceira questão formulada, que dizia respeito às razões da modernização da campanha presidencial petista – modernização hipotética, no início da investigação, e confirmada ulteriormente, – nossas reflexões apontaram para dois eixos explicativos.

De um lado, a variável de competitividade, segundo a qual o PT e sua cúpula, especialmente Lula e José Dirceu, então presidente nacional da sigla, desenvolveram a percepção de que somente a utilização das ferramentas de uma campanha modernizada, largamente utilizadas pelos adversários desde 1989, impediria a quarta derrota de Lula em 2002. Bernardo Kucinski deixa isso claro, afirmando que Lula dizia que, sem a profissionalização, o marketing e uma maior atenção à televisão, os 40% do eleitorado que decidiriam o pleito dificilmente seriam conquistados.

Esta variável é dependente de outra, que alcunhamos de variável política: aqui se encontra o principal fator explicativo, no sentido de que, somente com uma revisão de posturas políticas, substituindo as metas organizativas oficiais, o PT poderia vencer certas barreiras contrárias ao uso de ferramentas modernizantes. Dificilmente o PT poderia usar os resultados de pesquisas de opinião na construção do discurso de campanha e na orientação de sua estratégia se não tivesse procedido a uma guinada em direção ao centro do espectro político- partidário nacional.

Da mesma forma, a contratação de um publicitário intimamente ligado ao malufismo seria impensável sem este deslocamento, que fez com que o partido passasse a adotar posições deveras mais pragmáticas no que diz respeito à atuação em nível eleitoral nacional – já que, nos níveis sub-nacionais, tal pragmatismo já era evidente há tempos.

Se tal migração do partido rumo ao centro do espectro político nacional foi largamente percebida pelos analistas, principalmente após a aliança com o PL, não muitos atentaram para as alterações mais profundas e estruturais que antecederam este deslocamento. Alguns autores – como Barreira (2002), Mendes (2002), Reis

(2000) e Sader (2003), por exemplo – especularam sobre tais mudanças, falando em institucionalização, pragmatização, eleitoralização, revisão ideológica,

social-democratização do PT. Porém, nenhum deles procurou demonstrar,

apresentando evidências e amparando-se em sólidos referenciais teórico- analíticos, como se processou tal mutação: quais eram os interesses dos atores envolvidos, quais foram suas estratégias, qual foi a evolução dos acontecimentos etc.

Foi isto que procuramos fazer, a partir da bibliografia pertinente, de documentos partidários e de material de imprensa da época, e amparados por arcabouço teórico que girou em torno de dois eixos: o conceito de partido anti- sistema de Sartori (1982), e a teoria de mudança institucional de Panebianco (1995). Pareceu-nos extremamente apropriada a noção de partido anti-sistema para caracterizar o PT, em sua atuação em nível nacional, da fundação até 19951, devido a suas atitudes deslegitimadoras do sistema político nacional.

Por outro lado, Panebianco (1995) nos forneceu o ferramental teórico necessário à apreensão das etapas e mecanismos envolvidos nesta transformação, que fez com que o PT abandonasse a posição de partido anti-sistema.

Assim, a mutação petista em direção a processos re-legitimadores do sistema político nacional foi a mudança decisiva e fundamental que tornaria possível sua migração rumo ao centro da arena partidária brasileira. Esta migração, chamada de variável política, combinou-se com a variável de

competitividade, impelindo o partido a promover alterações substanciais em sua

campanha presidencial de 2002.

Com esta dissertação, esperamos ter contribuído para explicar, ao menos parcialmente, as alterações ocorridas no maior partido de esquerda do país, que assumiu o governo federal em 2002; outrossim, esperamos ter elucidado, ao menos no que diz respeito às explicações intrapartidárias e àquelas relacionadas à

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Aliás, os anos de 1994 e/ou 1995 são colocados, pela maioria dos autores que tratam de explicar a transformação do PT – qualquer que seja o nome emprestado a ela, – como pontos de inflexão, devido à derrota de Lula em 1994 e à eleição de José Dirceu em 1995, com a retomada do controle da sigla pela Articulação.

construção de campanhas eleitorais, como o PT e Lula chegaram a esta importante vitória.