• Nenhum resultado encontrado

Conforme os objetivos apresentados neste estudo, percebeu-se a importância dos documentos oficiais brasileiros para o ensino da língua portuguesa, que entre as práticas de linguagens, foi dado destaque para o eixo leitura, assim como o gênero discursivo é de fundamental importância para o ensino da leitura, pois proporciona o contato com o uso social da língua e as crônicas, como objeto literário para desenvolver a criticidade do leitor, a qual colabora para se alcançar o letramento.

Sendo assim, esta pesquisa mostrou que o objetivo principal de analisar a competência leitora dos alunos da EJA pode ser atingida, ao se colocar em prática as teorias que embasam este trabalho, de acordo com o capítulo 2, nomeado Fundamentação Teórica.

Mediante o fracasso escolar e a falta de interesse dos alunos em leituras para fruição, faz-se necessário a aplicação de métodos que supram esta necessidade. O método recepcional, alicerce para a construção da proposta didática apresentada neste trabalho, apoiado no gênero discursivo crônica, foi destaque para o desenvolvimento de diferentes atividades com ênfase em leituras, considerando o contexto em que o professor atua.

Dessa maneira, se responde a questão de pesquisa, a qual indaga se as práticas de leitura na EJA colaboram para que os alunos dominem a prática social da língua portuguesa e consequentemente alcancem o letramento crítico, pois aplicação do método recepcional se torna um instrumento valioso. Ao se considerar que as etapas vão avançando, maiores exigências vão surgindo, “seja por discutir a realidade desautorizando as versões socialmente vigentes, seja por utilizar técnicas compositivas mais complexas” (AGUIAR; BORDINI, 1988, p. 89).

O aprimoramento da leitura permite que os alunos atuem nas diversas esferas sociais e dessa forma, tornam-se aptos a serem protagonistas do processo de ensino-aprendizagem, além de colaborarem na transformação do meio em que vivem. Mediante o exposto, a justificativa para esta pesquisa pode concluir que o componente curricular de língua portuguesa tem subsídios para proporcionar a aprendizagem significativa para o aluno, uma vez que os estudos desenvolvidos neste trabalho apontam a proposta didática centrada no aluno, considerando seus interesses, emoções e motivações.

Ao finalizar este estudo, posso dizer que uma das considerações mais relevantes diz respeito a aplicação do método recepcional, que consolida a proposta inicial de que é possível trabalhar as práticas de leitura com os alunos da EJA.

É importante apontar que não foi possível aplicar a proposta didática desenvolvida nesta pesquisa, porém há o interesse em colocá-la em prática e por meio dos resultados obtidos, iniciar um novo trabalho acadêmico.

Por todas as considerações aqui feitas, avalio que este estudo possa trazer mais contribuições para a área de pesquisa em desenvolvimento e aplicação de outros métodos de ensino que sejam eficazes para que os alunos se interessem pelo componente de língua portuguesa e tenham autonomia para buscar outras fontes de informação, que os auxiliem no exercício pleno da cidadania.

REFERÊNCIAS

AGUIAR, V. T; BORDINI, M. G. Literatura: a formação do leitor: alternativas metodológicas. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1988. 176 p. – (Série Novas Perspectivas; 27).

ÂNGELO, I. Sobre a crônica. Veja São Paulo, São Paulo, 25 abr. 2007.

ANTUNES, I. Aula de português – encontro & interação. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.

ASSIS, M. Um caso de burro. In: NOGUEIRA, A. Os melhores da crônica brasileira. Rio de Janeiro: José Olympio, 1977.

BARBOSA, J. P.; ROVAI, C. F. Gêneros do discurso na escola: rediscutindo princípios e práticas. 1. ed. São Paulo: FTD, 2012.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998. 106 p.

______. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Versão aprovada em 15/12/2017. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/index.php?option=com_docman&view=download&alias=79611- anexo-texto-bncc-aprovado-em-15-12-17-pdf&category_slug=dezembro-2017-

pdf&Itemid=30192>. Acesso em: abr. 2018.

CAFARDO, R. País só deve dominar Leitura em 260 anos. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 28 fev. 2018.

______. Pisa, um ilustre desconhecido dentro da escola. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 20 maio 2018. Caderno Metrópole, p. A18.

DÁ licença de contar. Direção: Pedro Serrano. São Paulo, 2015. (16 min). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=P5DV2I3CbIg&t=928s>.Acesso em: abr. 2018.

DEMO, P. Introdução à metodologia da ciência. 2. ed. 21. reimpr. São Paulo: Atlas, 2013.

DOLZ, J. A olímpiada de língua portuguesa. Escrevendo o futuro: uma contribuição para o desenvolvimento da aprendizagem da escrita. In: LAGINESTRA, M. A; PEREIRA, M. I

(equipe produção). A ocasião faz o escritor: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010. (Coleção da Olimpíada).

GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2002.

LAGINESTRA, M. A; PEREIRA, M. I (equipe produção). A ocasião faz o escritor: caderno do professor: orientação para produção de textos. São Paulo: Cenpec, 2010. (Coleção da Olimpíada).

ORENSZTEJN, M; MOREIRA, S. M; CAVALLARI, S. Muitos modos de ler. In: AIDAR, F. S; ALVES, J. C (direção). Abrelê. São Paulo: Ática, 2011.

PAIVA, M. R. Peppa Pig e o estado de bem-estar social. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 19 maio 2018. Caderno 2, p. C8.

PNAD CONTÍNUA 2016. 51% da população com 25 anos ou mais do Brasil possuíam apenas o ensino fundamental completo. IBGE, 2017. Disponível em: < https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2013-agencia-de-

noticias/releases/18992-pnad-continua-2016-51-da-populacao-com-25-anos-ou-mais-do- brasil-possuiam-apenas-o-ensino-fundamental-completo.html>. Acesso em: abr. 2018.

ROJO, R.; CORDEIRO, G. S. Apresentação: gêneros orais e escritos como objetos de ensino: modos de pensar, modos de fazer. In: SCHNEUWLY, B.; DOLZ, J. (Colaboradores). Gêneros orais e escritos na escola. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004. – (Coleção As faces da Linguística Aplicada).

SÃO PAULO (SP) Secretaria Municipal de Educação. Coordenadoria Pedagógica. Divisão de Educação de Jovens e Adultos. Educação de jovens e adultos: princípios e práticas pedagógicas – volume 2 / Secretaria Municipal de Educação. – São Paulo: SME / COPED, 2016. 96 p.

______. Currículo da Cidade: Ensino Fundamental: Língua Portuguesa. São Paulo: SME/COPED, 2017.

SILVEIRA, D. T.; CÓRDOVA, F. P. A pesquisa científica. In: GERHARDT, T. E.; SILVEIRA, D. T. (Orgs.). Métodos de pesquisa. Porto Alegre: Editora da UFRGS, 2009. VERISSIMO, L. F. Capacetada. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 05 abr. 2018. Caderno 2, p. C8.

VILLA-LOBOS, D.; RUSSO, R.; BONFÁ, M. Perfeição. Intérprete: Legião Urbana. In: LEGIÃO URBANA. O descobrimento do Brasil. Emi-Odeon Brasil, p1993, 1 CD. Faixa 4.

ANEXO A- Crônica de Luis Fernando Verissimo

CAPACETADA

Luis Fernando Verissimo, O Estado de S. Paulo 05 Abril 2018 | 02h00

A cidade de Nova Hartz fica no interior do Rio Grande do Sul, não muito longe de Porto Alegre. Todos os anos, na Páscoa, a cidade faz uma encenação da Paixão de Cristo que termina com sua crucificação no Monte Gólgota. A parte final é a mais impressionante do espetáculo, com a música, a iluminação e os efeitos de cena contribuindo para a dramaticidade do seu desenlace. Que inclui o detalhe mais cruel do drama: o do centurião romano que espeta o lado do agonizante Jesus com sua lança.

Este ano, a cena final teve uma participação inesperada. Um espectador não aguentou tanta maldade, pulou no palco e atacou o centurião com um capacete de motoqueiro, interrompendo o martírio de Cristo e o espetáculo e espalhando confusão e perplexidade no Monte Gólgota que não estavam no script. Até o momento em que escrevo, a invasão do palco já tinha saído na imprensa de todo o mundo, mas aqui não se sabia muita coisa sobre o homem que atacou o centurião, se estava bêbado ou apenas indignado, ou as duas coisas.

Pensando bem, sabia-se tão pouco sobre o invasor quanto sobre o ator que fazia o centurião em Nova Hartz e menos ainda sobre o próprio centurião romano da Bíblia, um daqueles ajudantes que têm seus cinco minutos na História e desaparecem para sempre. Os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e João não se contradizem muito no relato do martírio e da crucificação de Jesus, mas só São João menciona o centurião com sua lança covarde, que ficou como protótipo de sadismo gratuito, além do dever militar. Se há algum personagem histórico, fictício ou não, que merece uma capacetada retroativa, é esse centurião. Né não?

Resta comentar a força do teatro, que consegue impelir um homem para cima de um palco e enfrentar uma guarnição de soldados romanos armados com lanças para vingar Jesus Cristo. E há no ato do nosso herói uma reprimenda implícita. Onde estávamos que não pulamos no palco para enfrentar todas as injustiças que nos revoltam, desde Gólgota?

ANEXO B- Música da Legião Urbana

PERFEIÇÃO

Música: Dado Villa-Lobos Renato Russo

Marcelo Bonfá Letra: Renato Russo

1

Vamos celebrar a estupidez humana A estupidez de todas as nações O meu país de sua corja de assassinos Covardes, estupradores e ladrões Vamos celebrar a estupidez do povo Nossa polícia e televisão

Vamos celebrar nosso governo E nosso estado, que não é nação Celebrar a juventude sem escola As crianças mortas

Celebrar nossa desunião

Vamos celebrar Eros e Thanatos Persephone e Hades

Vamos celebrar nossa tristeza Vamos celebrar nossa vaidade. 2

Vamos comemorar como idiotas A cada fevereiro e feriado Todos os mortos nas estradas Os mortos por falta de hospitais Vamos celebrar nossa justiça A ganância e a difamação Vamos celebrar os preconceitos O voto dos analfabetos

Comemorar a água podre E todos os impostos

Queimadas, mentiras e sequestros Nosso castelo de cartas marcadas O trabalho escravo

Nosso pequeno universo Toda hipocrisia e toda afetação

Todo roubo e toda a indiferença Vamos celebrar epidemias: É a festa da torcida campeã. 3

Vamos celebrar a fome Não ter a quem ouvir Não se ter a quem amar

Vamos alimentar o que é maldade Vamos machucar um coração Vamos celebrar nossa bandeira Nosso passado de absurdos gloriosos Tudo que é gratuito e feio

Tudo que é normal

Vamos cantar juntos o hino nacional (A lágrima é verdadeira)

Vamos celebrar nossa saudade E comemorar a nossa solidão. 4

Vamos festejar a inveja

A intolerância e a incompreensão Vamos festejar a violência E esquecer a nossa gente

Que trabalhou honestamente a vida inteira E agora não tem mais direito a nada Vamos celebrar a aberração

De toda a nossa falta de bom senso Nosso descaso por educação Vamos celebrar o horror

De tudo isso – com festa, velório e caixão Está tudo morto e enterrado agora

Já que também podemos celebrar

A estupidez de quem cantou esta canção. 5

Venha, meu coração está com pressa Quando a esperança está dispersa Só a verdade me liberta

Chega de maldade e ilusão.

Venha, o amor tem sempre a porta aberta E vem chegando a primavera -

Nosso futuro recomeça:

ANEXO C- Crônica de Machado De Assis

UM CASO DE BURRO

Machado de Assis

Quinta-feira à tarde, pouco mais de três horas, vi uma coisa tão interessante,

que determinei logo de começar por ela esta crônica. Agora, porém, no momento de pegar na pena, receio achar no leitor menor gosto que eu para um espetáculo, que lhe parecerá vulgar, e porventura torpe. Releve a importância; os gostos não são iguais. Entre a grade do jardim da Praça Quinze de Novembro e o lugar onde era o antigo passadiço, ao pé dos trilhos de bondes, estava um burro deitado. O lugar não era próprio para remanso de burros, donde concluí que não estaria deitado, mas caído. Instantes depois, vimos (eu ia com um amigo), vimos o burro levantar a cabeça e meio corpo. Os ossos furavam-lhe a pele, os olhos meio mortos fechavam-se de quando em quando. O infeliz cabeceava, mais tão frouxamente que parecia estar próximo do fim.

Diante do animal havia algum capim espalhado e uma lata com água. Logo, não foi abandonado inteiramente; alguma piedade houve no dono ou quem quer que é que o deixou na praça, com essa última refeição à vista. Não foi pequena ação. Se o autor dela é homem que leia crônicas, e acaso ler esta, receba daqui um aperto de mão. O burro não comeu do capim, nem bebeu da água; estava já para outros capins e outras águas, em campos mais largos e eternos.

Meia dúzia de curiosos tinham parado ao pé do animal. Um deles, menino de dez anos, empunhava uma vara, e se não sentia o desejo de dar com ela na anca do burro para esperta- lo, então eu não sei conhecer meninos, porque ele não estava do lado do pescoço, mas justamente do lado da anca. Diga-se a verdade; não o fez - ao menos enquanto ali estive, que foram poucos minutos. Esses poucos minutos, porém, valeram por uma hora ou duas. Se há justiça na Terra valerão por um século, tal foi a descoberta que me pareceu fazer, e aqui deixo recomendada aos estudiosos.

O que me pareceu, é que o burro fazia exame de consciência. Indiferente aos curiosos, como ao capim e à água, tinha no olhar a expressão dos meditativos. Era um trabalho interior e profundo. Este remoque popular: por pensar morreu um burro mostra que o fenômeno foi mal-entendido dos que a princípio o viram; o pensamento não é a causa da morte, a morte é que o torna necessário. Quanto à matéria do pensamento, não há dúvidas que é o exame da consciência. Agora, qual foi o exame da consciência daquele burro, é o que presumo ter lido no escasso tempo que ali gastei. Sou outro Champollion, porventura maior; não decifrei

palavras escritas, mas ideias íntimas de criatura que não podia exprimi-las verbalmente. E diria o burro consigo:

“Por mais que vasculhe a consciência, não acho pecado que mereça remorso.

Não furtei, não menti, não matei, não caluniei, não ofendi nenhuma pessoa. Em toda a minha vida, se dei três coices, foi o mais, isso mesmo antes haver aprendido maneiras de cidade e de saber o destino do verdadeiro burro, que é apanhar e calar. Quando ao zurro, usei dele como linguagem. Ultimamente é que percebi que me não entendiam, e continuei a zurrar por ser costume velho, não com ideia de agravar ninguém. Nunca dei com homem no chão. Quando passei do tílburi ao bonde, houve algumas vezes homem morto ou pisado na rua, mas a prova de que a culpa não era minha, é que nunca segui o cocheiro na fuga; deixava-me estar aguardando autoridade.”

“Passando à ordem mais elevada de ações, não acho em mim a menor lembrança de haver pensado sequer na perturbação da paz pública. Além de ser a minha índole contrária a arruaças, a própria reflexão me diz que, não havendo nenhuma revolução declarado os direitos do burro, tais direito não existem. Nenhum golpe de estado foi dado em favor dele; nenhuma coroa os obrigou. Monarquia democracia, oligarquia, nenhuma forma de governo, teve em conta os interesses da minha espécie. Qualquer que seja o regíme, ronca o pau. O pau é a minha instituição um pouco temperada pela teima que é, em resumo, o meu único defeito. Quando não teimava, mordia o freio dando assim um bonito exemplo de submissão e conformidade. Nunca perguntei por sóis nem chuvas; bastava sentir o freguês no tílburi ou o apito do bonde, para sair logo. Até aqui os males que não fiz; vejamos os bens que pratiquei”. “A mais de uma aventura amorosa terei servido, levando depressa o tílburi e o namorado à casa da namorada - ou simplesmente empacando em lugar onde o moço que ia no bonde podia mirar a moça que estava na janela. Não poucos devedores terei conduzido para longe de um credor importuno. Ensinei filosofia a muita gente, esta filosofia que consiste na gravidade do porte e na quietação dos sentidos. Quando algum homem, desses que chamam patuscos, queria fazer rir os amigos, fui sempre em auxílio deles, deixando que me dessem tapas e punhadas na cara. Em fim...”. Não percebi o resto, e fui andando, não menos alvoroçado que pesaroso.

Contente da descoberta, não podia furtar-me à tristeza de ver que um burro tão bom pensador ia morrer. A consideração, porém, de que todos os burros devem ter os mesmos dotes principais, fez-me ver que os que ficavam, não seriam menos exemplares do que esse. Por que se não investigará mais profundamente o moral do burro? Da abelha já se escreveu que é superior ao homem, e da formiga também, coletivamente falando, isto é, que as suas instituições políticas são superiores às nossas, mais racionais. Por que não sucederá o mesmo ao burro, que é maior?

Sexta-feira, passando pela Praça Quinze de Novembro, achei o animal já morto. Dois meninos, parados, contemplavam o cadáver, espetáculo repugnante; mas a infância, como a ciência, é curiosa sem asco. De tarde já não havia cadáver nem nada. Assim passam os trabalhos deste mundo. Sem exagerar o mérito do finado, força é dizer que, se ele não inventou a pólvora, também não inventou a dinamite. Já é alguma coisa neste final de século. Requiescat in pace.

ANEXO D – Crônica de Marcelo Rubens Paiva

PEPPA PIG E O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL

Marcelo Rubens Paiva, O Estado de S.Paulo 19 Maio 2018 | 02h00

Uma das injustiças cometidas no aniversário de 200 anos de nascimento de Marx veio da revista The Economist: a de que filósofo errou, pois não previra o Estado de Bem-Estar Social, que poderíamos qualificar como uma resposta capitalista à utopia socialista.

Reino Unido, países nórdicos e do “commonwealth”, como Canadá, Nova Zelândia e Austrália, estabeleceram um regime que coloca o Estado como organizador da economia, democratizando os direitos sociais: saúde e educação gratuitas, renda mínima, pleno emprego com auxílio-desemprego. Programas habitacionais e aposentadoria digna.

A ação bem-sucedida nasceu depois de o continente europeu viver o horror de estados totalitários (fascismo, nazismo, stalinismo) e do fracasso da economia sem controle (crash de 1929).

Fruto do pensamento keynesiano, o Estado regularia toda a atividade econômica e social, para defender a população do inimigo externo, graças a um pacto social com sindicatos e organizações trabalhistas.

Estados democráticos e reinos se transformaram em oásis com qualidade de vida invejada por outros países. Era o que Leonel Brizola queria implantar no Brasil: O “socialismo moreno”.

Porém, é uma injustiça desqualificar o marxismo. Primeiro, porque o pacto seguiu em frente graças aos trabalhadores anarquistas, socialistas e comunistas. Segundo, porque, ali vizinho, mordendo as canelas, estava o bloco comunista, vendendo a ideia de revolução, com tanques encostados na Cortina de Ferro.

No pós-guerra, nações capitalistas fronteiras com a URSS, Polônia, Alemanha Oriental, Hungria, Checoslováquia, Iugoslávia, Bulgária e Romênia, tiveram que maneirar a exploração do trabalhador e ampliar os direitos sociais. Para mostrar ao mundo que políticas sociais produtivas são possíveis em regimes não comunistas. E para impedir que o ideal leninista atravessasse as cancelas fronteiriças.

Sejamos justos: se não fossem os comunistas, e a pressão que exerciam sobre os Estados, não existiria o bem-estar social. E o que Peppa Pig tem a ver com isso?

Peppa era para mim, como para a maioria, uma desproporcional porquinha cor-de-rosa nariguda que ambulantes vendiam em faróis. Virou febre e preocupou os pais: será mais uma tentativa de lavagem cerebral e jogada de marketing sobre nossas crianças indefesas?

Estranha e anacrônica, pois o mundo do desenho animado estava animado com as experiências 3D introduzidas em 1995 pela Pixar (Toy Story) e Dreamworks, Peppa Pig é em 2D, e os personagens estão sempre de lado, como figuras egípcias.

Se você tem filho ou neto, e deu uma olhada no que assistem, percebeu que Peppa

Pig é muito mais do que um desenho de sucesso mundial. Criado exatamente em 2004 no

Mark Baker, é exibido em 180 países, inclusive no Brasil (começou a ser exibido pelo canal fechado Discovery Kids e atualmente está também na TV Cultura).

O que fascina em Peppa? É uma porquinha de uns 5 anos, que tem um irmão menor, George, de quem cuida, e a quem ensina e protege. Seus pais, como todos os pais da história, têm uma paciência de cão para ensinar e brincar com os filhos. Diferentemente de muitos de nós, que cedemos tablet e celulares, para não ter que ensinar nem brincar.

Em Peppa Pig, todos trabalham. Não existe patrão. Não existe relação de poder. Ninguém é subalterno. Todas as profissões são dignas, da motorista de van ao lixeiro. E os filhos de todos estudam na mesma escola. Mulheres podem trabalhar no que quiserem. Todos se ajudam, numa comunidade unida pela solidariedade.

Mamãe Coelha é motorista de ônibus, sorveteira junto com o marido, bibliotecária e também bombeira. Trabalha num desmanche, pilota guindastes e helicópteros, e gosta do que faz. Madame Gazela, a professora com sotaque francês de todas as crianças, é uma roqueira que já tocou numa banda. É sempre auxiliada por algum pai ou mãe.

As crianças aprendem francês, a reciclar lixo, a guardar resíduo orgânico para compostagem, a cuidar da natureza, a respeitar os mais velhos. Não existem inimigos, vilões. Nenhum gato sai caçando um rato. Não existe avareza: todos moram em casas parecidas e têm carro próprio.

Documentos relacionados