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A referida pesquisa chegou às considerações, que se apresentam não como argumento finalizador da discussão, mas como dispositivo de debate dentro do quais provocações podem ser reveladoras de novas formas de perceber o campo e os sujeitos da pesquisa.

Deflagraram-se os atores e relações responsáveis pelas formas de apreensão da cidade e da natureza urbana, procurando entender como se pensou a cidade e como se desenvolveu a economia nesta.

Analisou-se a produção urbana da capital cearense, os sujeitos envolvidos nesse processo e as relações de poder e formas de apreensão social do urbano existente nesse contexto, analisando a relação entre homem e meio ambiente como uma construção social dentro da qual se estabeleceu mecanismos e formas de apreensão da cidade que são fundamentais para o entendimento da produção da urbe e dispersão dos sujeitos nesta.

Apreendeu-se que as formas de relação entre homem e meio ambiente urbano na cidade de Fortaleza trazem consigo relações de poder e percepção social que influem na forma de desenvolvimento urbano da cidade.

Desse modo, o Parque Ecológico do Cocó se insere como resultado de um processo histórico que interliga especulação imobiliária a diferenciados fatores, tais como: a) desenvolvimento urbano da cidade, que inseriu aquele espaço dentro de uma lógica de investimento de recursos variados; b) junção de investimentos públicos e privados, tendo em vista desenvolver aquela região para o consumo; c) inserção do meio ambiente como mercadoria urbana a ser vendida, onde a mudança de percepção da sociedade em relação ao meio ambiente fez surgir dentro do sistema econômico capitalista um novo produto: o verde, mercadoria de ressignificação da relação cidade-natureza e estabelecedora de novas relações sociais dentro de um espaço urbano.

Uma cidade planejada e elaborada de acordo com interesses específicos e que revelava um sistema de hierarquização social dentro de sua estrutura, que dispunha os sujeitos de acordo com relações de poder historicamente estabelecidas e que fazia do espaço urbano um campo de domínio e aplicação de uma imposição normativa das formas de uso e apropriação da cidade se refletia e nascia dentro do processo de pesquisa. Entretanto, os sujeitos objetos dessas intervenções e normatizações não se mostravam passivos e inquietos nesse contexto, pois se constatou, na pesquisa de campo, que diariamente existiam e

reproduziam-se formas de resistência cotidiana às tentativas de homogeneização daquele campo.

Buscando entender como esse contexto de produção da cidade se relacionava com o processo de ocupação cotidiana daquele espaço, e como se construíam as formas de insurgência e ressignificação do espaço urbano do Parque do Cocó, elaborou-se a segunda parte desta pesquisa.

Caracterizaram-se as formas cotidianas de produção do campo de estudo. Percebeu-se que as formas de conflito pelo uso do Parque são complexos históricos dentro do qual seus agentes estão envolvidos, bem como conflitos inseridos nas relações históricas de produção da cidade, mas que elaboram cotidianamente novas formas de embates e demarcações de fronteiras de tensão dentro desse espaço.

Analisaram-se as várias formas de conflito e resistência existentes cotidianamente dentro do Parque do Cocó. Uma categorização dos variados usos existentes naquele campo foi elaborada, pois estes são diferenciados e trazem consigo relações sociais e históricas que variam de acordo com a classificação social dos usos e dos usuários que os praticam.

Percebeu-se que o conflito assume diferentes formas quando das relações entre sujeitos dentro do Cocó. Usos diferenciados, de sujeitos diversos e com relações de poder específicas se estabelecem de modo a criar um complexo jogo de relações sociais de aceitação e proibição dentro do espaço referido.

Categorias foram elaboradas a partir das pesquisas de campo, onde os usos foram categorizados e assumiram formas de classificação específicas, como: a) usos permanentes, que são praticados por moradores do entorno do Parque, caminhantes e moradores das margens do rio; b) Usos esporádicos, elaborados por pescadores e lavadeiras; c) Usos imediatos, que são estabelecidos por grupos de contestação, tais como movimentos sociais e partidos políticos.

Conflitos e negociações são estabelecidos no processo diário de apropriação e atribuição de sentido aquele espaço pelos usos acima descritos. Entretanto, percebeu-se que formas variadas de conflito que existem naquela região. Conflitos que se revelam na esfera pública da mídia e das grandes preocupações urbanas, tais como a construção do viaduto no entorno do Parque do Cocó, por exemplo, encobrem formas microscópicas de conflitos cotidianos estabelecidos nas relações diárias dos sujeitos que utilizam aquele espaço. E, ainda, conflitos reguladores das formas de relação e apropriação do campo, incrustado nas práticas sociais do Parque e nas formas de apreensão deste pelos sujeitos ali inseridos.

A análise desses processos de interação revelaram ferramentas de entendimento da realidade do Parque, que permitem inseri-lo num contexto de disputa pela cidade e seus espaços públicos. Uma realidade objetiva ancorada num longo processo de produção da cidade e, por consequência do Parque, processo que configura e resulta na criação de usos específicos e normatizados para determinadas áreas, mas que não impedem formas de ressignificação dos sujeitos ali inseridos e modelos de insurgência a uma realidade posta de maneira legalizada, mas não legitimada nas formas de sociação cotidianamente estabelecidas.

O Parque do Cocó, desse modo, se revelou na pesquisa como espaço metonímico, que reflete a disputa pela cidade. Um conflito que coloca em questão as formas de produção e apropriação do espaço urbano. Assim, o Parque reflete uma luta coletiva e histórica por direitos e faz nascer uma questão à sociedade: que cidade desejamos e a quem é reservado o direito de dela se apropriar?