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A Filtração em Margem (FM) é uma técnica utilizada em muitos países há mais de 100 anos para produzir água potável. Apesar dos países desenvolvidos já terem um bom domínio da técnica, continuam ainda com intensas pesquisas para aprofundamento do conhecimento do nível de detalhes dos compostos químicos e dos microorganismos do solo, o que pode ser evidenciado pelas dezenas de artigos internacionais em revistas científicas que são publicados todo ano. Tem-se aumentado o interesse no uso deste método como uma alternativa de baixo-custo para sistemas de tratamento na remoção de patogênicos. Vários estudos têm mostrado que a FM remove consideráveis percentagens de componentes orgânicos e inorgânicos encontrados nas águas superficiais.

A linha de estudo deste trabalho propôs estudar essa forma de captação utilizando poços próximos à margem de rios para obtenção de água com um grau de qualidade melhor do que originalmente no rio de forma a reduzir custos com tratamento. No Brasil, além dos testes experimentais na bacia do Beberibe, também há estudos sobre o tema e aplicação experimental nas margens do lago do Peri, em Florianópolis. Ambos os experimentos apresentam bons resultados com uso promissor dessa técnica.

Esta pesquisa foi desenvolvida através de um projeto piloto implantado na Estação Elevatória de Caixa d’Água, na divisa de Olinda e Recife, pertencente a COMPESA (Companhia Pernambucana de Saneamento). Contou-se com o apoio da Secretaria de Recursos Hídricos de Pernambuco, assim como da própria COMPESA. Uma observação interessante para a escolha do local foi o fato que havia uma captação de água no rio Beberibe a fio d’água nas margens desta estação até o final da década passada. Porém, com a crescente poluição apresentada na água do rio Beberibe neste trecho, a mesma foi desativada; e atualmente a estação elevatória recebe água do rio Beberibe captada em um trecho bem mais a montante.

O trabalho de campo durou um pouco mais de dois anos, incluindo o levantamento de campo para escolha da área, as sondagens geológicas do local escolhido, o projeto e a construção do poço de produção, a instalação da bomba e o monitoramento. A última fase do experimento com poço de produção realizou-se bombeando ininterruptamente uma vazão de cerca de 12.500 L/hora ao longo de

dezessete semanas (17/03/09 a 10/07/09), os níveis estabilizaram o que indica uma boa recarga induzida no aquífero.

6.1 Conclusões

As margens do rio Beberibe são formadas por sedimentos estratificados sendo que uma primeira camada de sedimentos mais finos atua como camada filtração. Na profundidade de 7,0 a 13,0 metros existe uma camada de areia grossa a cascalho que conduz uma boa vazão até o poço, abaixo dela há uma camada de areia fina a média antes de uma nova camada confinante abaixo.

Para caracterização das propriedades do escoamento no solo foram realizados os testes Slug e Bail-Down em todos os poços de observação encontrando-se o valor médio de 1,5x10-05 m/s. Foi realizado um teste de aquífero com acompanhamento em cinco poços de observação, e foi obtido um valor aproximado de 3,0x10-04 m/s para a condutividade hidráulica. O teste de aquífero realizado indicou que a partir de certo instante, aproximadamente 80 minutos, surge um novo aporte de água demonstrando que o cone de rebaixamento atingiu uma nova fonte hídrica.

Foram traçados dois mapas de curvas potenciométricas na área da estação elevatória, um primeiro demonstrando o regime de fluxo normal do escoamento subterrâneo com dados anteriores ao início de operação do poço de produção e um segundo mapa ilustrando o novo regime de fluxo com o bombeamento. Neste segundo mapa fica evidenciado o cone de depressão gerado e a mudança na direção do fluxo na zona de interface do aquífero com o rio, onde a cota do rio encontra-se elevada devido a uma pequena barragem de nível existente no local. O monitoramento da cota potenciométrica nos poços de observação e a medição da lâmina d’água apresentaram correlação, indicando que quando há elevação na cota do rio Beberibe há maior recarga para o aquífero.

Os valores observados para os parâmetros analisados da água do poço de produção estiveram todos dentro dos padrões de potabilidade. Os dados de coliformes totais e Escherichia Coli do monitoramento da qualidade mostram que a contaminação não alcançou a região do poço de produção. Com relação a turbidez, obteve-se valores praticamente zero na água bombeada, isto se deve ao efeito de

filtração que ocorre no meio poroso, também demonstrado para os sólidos totais dissolvidos. Os valores de amônia para o rio, indicativo de contaminação fecal ou oriundo da agropecuária, apresentaram-se acima do permitido no rio. No entanto, esta contaminação não alcançou o horizonte do poço de produção.

Para os metais, os valores observados de ferro, manganês, zinco, níquel, cobre, cromo apresentaram-se maiores para o rio Beberibe e foram sendo amortizados ao percolar a água pelo meio poroso, de modo que a água extraída do poço apresenta teor de metais abaixo dos limites permitidos de potabilidade pelas normas brasileiras. O efeito de redução já não ocorre com a salinidade, observado nos valores de condutividade elétrica, pois os sais não são removidos no meio poroso.

Como a água bombeada atendeu os padrões de potabilidade, poderia ser utilizada diretamente para abastecimento, talvez com uma simples cloração. No entanto, como o método é novo no Brasil, pode no mínimo funcionar como um pré- tratamento das águas do rio Beberibe, que se encontra bastante poluído conforme as observações realizadas tanto no monitoramento da CPRH quanto no monitoramento do projeto piloto.

6.2 Recomendações

Apesar do tema ser amplamente discutido em outros países, observa-se a evolução de novas pesquisas para um melhor entendimento dos processos da interação entre as águas superficiais e subterrâneas, assim como um melhor esclarecimento dos processos envolvidos na atenuação de vários compostos orgânicos e inorgânicos. Estudos recentes têm buscado analisar a contaminação de produtos fármacos nos corpos hídricos superficiais, e sua atenuação no meio poroso.

No âmbito do projeto piloto implantado, sugere-se que seja dada continuidade aos estudos pelo Grupo de Recursos Hídricos (GRH) da UFPE, contando com o apoio dos órgãos estaduais (SRH/PE, COMPESA e CPRH). Nesse sentido podem ser enumeradas as seguintes recomendações:

- analisar a possibilidade de executar uma bateria de poços ao longo do rio Beberibe, aproveitando as áreas livres nas margens do rio;

- realizar medições de vazões no rio Beberibe no trecho da Estação Elevatória de Caixa d’Água;

- delimitar áreas de proteção no entorno do rio Beberibe;

- continuar com o monitoramento físico-químico e bacteriológico, para observar as possíveis variações sazonais e corroborar com as observações realizadas na presente pesquisa;

- realizar outras análises investigativas para garantir a contribuição das águas do rio Beberibe, como análises de isótopos;

- investigar a remoção de matéria orgânica na área deste projeto piloto, através de carbono orgânico total (COT) e carbono orgânico dissolvido (COD);

- realizar análises de microorganismos do meio ambiente subterrâneo;

- continuar com o monitoramento dos níveis potenciométricos, observando-se as variações sazonais e os efeitos de recarga;

- após um monitoramento mais amplo, realizar modelagem computacional de fluxo e transporte de solutos, a fim de melhorar o entendimento das condições envolvendo a interação entre águas superficiais e subterrâneas no local em estudo.

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