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Neste capítulo, a fim de responder a questão norteadora desta pesquisa: “Como

futuros professores (alunos do 1º ano de Pedagogia) dos anos iniciais do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) concebem a profissão docente e quais as suas expectativas profissionais?” apresento caminhos percorridos para a realização deste estudo, resgatando aspectos históricos da educação no Brasil e da formação do professor do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano). Em seguida, analiso como e quando a questão da formação do professor e dos saberes docentes passa a ter destaque na literatura educacional brasileira e apresento algumas concepções de autores sobre os saberes da docência.

Além disso, fiz um estudo exploratório com 65 sujeitos dos 1° anos do curso de Pedagogia de um instituto superior de educação, localizado na região de Campo Limpo, São Paulo, para entender como o saber docente deve ser construído e investigar como futuros professores já têm implícitos esses saberes. Os dados coletados nesse estudo puderam ser comparados com a literatura da área de formação docente, oferecendo algumas pistas de que os saberes são permeados pelas experiências da vida cotidiana, extrapolando o universo da academia na formação inicial.

Por serem alunos do primeiro ano do curso de Pedagogia, os participantes são portadores de saberes constituídos pela prática, conforme mostram os dados coletados no eixo temático “processo de escolarização”, em que a trajetória escolar marca as respostas para projeções profissionais futuras. Dessa forma, é de se esperar que por meio das teorias a instituição amplie e reorganize esses saberes sem, contudo, deixar ocultadas as crenças, hipóteses e concepções que Tardif (2002) define como saberes experienciais formando

[...] um conjunto de representações a partir das quais os professores interpretam, compreendem e orientam sua profissão e sua prática cotidiana em todas as suas dimensões. Eles constituem, por assim dizer, a cultura docente em ação (TARDIF, 2002, p. 49).

As reminiscências dos participantes são compatíveis a uma nova postura para a formação dos professores que vão atuar nos primeiros anos (1º ao 5º) do Ensino Fundamental. Haja vista que o alunado que eles vão encontrar está inserido em um contexto social muito diverso do que foi o deles, cabendo à instituição formadora desses sujeitos subsidiá-los para agirem nesse novo contexto.

A sociedade e a educação são muito complexas e mudam com uma velocidade extraordinária. As instituições formadoras de professores precisam seguir a esteira dessas mudanças, atualizando seus currículos, investindo na pesquisa educacional, apresentando soluções coletivas e não perder de vista que a atividade do professor é composta de contatos, de afetividade, de conhecimento, ilustrados aqui pelas falas dos participantes, respectivamente:

“O mundo fora das escolas e dentro dela está caótico. Se eu conseguir amenizar isto, se conseguir dar carinho, se puder ser lembrada como eu me lembro dos meus professores, principalmente dos anos iniciais, já ficarei satisfeita.” (s. 19)

“... pretendo conseguir transformar muita coisa na formação dos alunos que infelizmente não têm muitas condições familiares, mas com certeza com uma boa formação, irá contribuir positivamente para um futuro melhor.” (s. 03)

Os dados revelaram que as soluções coletivas não fazem parte do cotidiano dos futuros professores, mas mostram seus anseios em colocar em prática as teorias aprendidas no curso de Pedagogia, conforme tabela 23.

Entretanto, Tardif (2002) é “contra a idéia tradicional da relação teoria e prática: o saber está somente do lado teoria, ao passo que a prática ou é desprovida de saber ou

portadora de um falso saber baseado, por exemplo, em crenças, ideologias, idéias preconcebidas”.

Para Tardif, Lessard e Lahaye (1991) “o saber docente compõe-se na verdade de vários saberes provenientes de diferentes fontes”. Por isso faz-se necessário considerar que os saberes construídos por esses sujeitos devem ser reconhecidos e valorizados, uma vez que (os saberes) têm peso na forma como pensam e decidem esses futuros professores, haja vista serem eles oriundos de suas vivências pessoais.

Nos dados coletados, os participantes manifestaram por mais de uma vez que sua escolha profissional foi influenciada pela família, professores, religião etc., e justificaram, quando justificaram, que a escolha teve como motivo: um sonho de criança, porque é uma realização profissional, porque estão convictos etc., nunca uma resposta embasada em alguma teoria, o que leva a entender que suas projeções e entendimento do saber docente até aqui perpassaram apenas pelas experiências de caráter pessoal, imprimindo a prática por eles exercida e/ou sofrida. De acordo com os dados, os participantes ofereceram respostas que demonstraram que seu saber docente é um “saber social e temporal pelo fato de grande parte ser proveniente da história de vida, da trajetória escolar”. Este saber, segundo Tardif (2002) se bem aproveitado pelo curso de formação, atenderá o que propõe Zeichner (1993) ao dizer que “o papel do professor é mais ajudar os seus alunos a construir saber [...] do que limitar-se a transmitir-lhes saber”.

A ausência de respostas que justificassem a satisfação com a escolha do curso dá indício para que os cursos de formação inicial invistam urgentemente na base de conhecimentos desses futuros professores.

Pelas respostas impregnadas de senso comum, clichês e messianismo, percebe-se que esses futuros professores ainda não têmos conteúdos da base de conhecimento que lhes darão sustentação teórica, daí a contradição entre uma afirmação e uma justificativa. Os

alunos até afirmam que vão fazer a diferença, mas não sabem explicar como fazê-la, o que pode ser justificado por estarem no primeiro ano do curso de Pedagogia.

Com raras exceções, os alunos repetem o que já leram ou ouviram de acordo com sua crença, vontade, idiossincrasia, aspectos que não refletem o que a instituição propõe no seu currículo, de acordo com suas políticas presentes no documento (vide Apêndice III) por ela fornecido.

A título de encerramento, espero que este trabalho venha a contribuir para a reflexão sobre os saberes da docência, alertando, contudo, que as pesquisas acerca do tema devem prosseguir, pois a formação de professores constitui um continuum na vida desses que abraçam a docência como profissão.

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