As tecnologias são um recurso que, indiscutivelmente, chegou para ficar, tornando-se uma ferramenta de apoio muito importante para a educação no século XXI, que pode ser utilizada em diversos contextos, como por exemplo, aulas a distância, gravação e registro de aulas, apoio para pessoas com alguma deficiência, entre outros. Para Kruger “as novas Tecnologias de Informação e Comunicação —TIC — desafiam-nos a transformar nossos conceitos educacionais, nossas perspectivas didáticas, nos constrangem a rever e complementar nossa formação” (2014, p.75).
No estudo empreendido na pesquisa foi possível perceber que as tecnologias digitais mudaram amplamente a maneira como a música pode ser ensinada e aprendida. Os múltiplos avanços tecnológicos que têm sido feitos desde o final do século passado deixaram uma forte marca na cultura em geral. Tais avanços podem trazer uma transformação digital muito significativa para a educação musical, mudando as nossas concepções tradicionais do que pode ou não pode ser ensinado em música. Para tanto, pensa-se ser necessário adotar tecnologias digitais nas aulas de música para poder acompanhar os novos desenvolvimentos tecnológicos. O que irá requerer do educador, em alguns casos, sair de sua zona de conforto e poderá, também, fazer com que a experiência de ensino não seja unilateral.
Este trabalho intentou desenvolver uma ferramenta de apoio para o ensino musical com foco no desenvolvimento criativo da música. Para tanto foi concebido um jogo digital musical a partir do estudo de aplicativos e jogos diversos, não necessariamente musicais. Neles foram observadas peculiaridades que ajudam a criar um envolvimento emocional do jogador, como são: uma história coerente e personagens interessantes, momentos inesperados, velocidade e ritmos que levem os jogadores a estar atentos a maior parte do tempo, e um sistema de avaliação que forneça um retorno ou feedback rápido.
Como já foi mencionado anteriormente, os experimentos de Chrome Music Lab permitiram o entendimento de algumas formas que, no contexto digital,
podem ser utilizadas para o desenvolvimento criativo e ensino musical. Por outro lado, foi importante a comparação com jogos digitais populares como o jogo Super Mario Party, da companhia Nintendo, que possui instâncias e velocidades que são interessantes para criar imersão, motivação e maior interesse no jogo.
O jogo proposto foi inicialmente pensado para ser utilizado tocando num instrumento real (piano). Porém, alguns problemas surgiram para concretizá-lo desta forma, pois os resultados sobre reconhecimento de células rítmicas, mesmo por recursos de inteligência artificial ainda não são muito eficientes. É possível reconhecer alturas de sons (notas musicais), como pudemos observar no aplicativo Yousician, mas o reconhecimento de ritmos não é muito preciso. Isto é um problema, pois não permite o uso do piano como ferramenta principal no jogo. Assim, foi necessário restringir as possibilidades criativas do jogo proposto neste trabalho a certas figuras rítmicas. Tentar solucionar este problema em estudos futuros é essencial para favorecer novas perspectivas e versões do jogo criado neste trabalho.
Além do mais, analisando as possibilidades do aplicativo Yousician, que permite analisar as notas que estão sendo tocadas em um instrumento musical físico, pensamos que o jogo criado para este trabalho poderia não ser restrito somente ao piano, e que também poderia ser utilizado como ferramenta para o estudo e desenvolvimento da criatividade em outros instrumentos musicais.
Para futuros estudos, seria interessante, também, realizar e testar o jogo, fazendo observações detalhadas sobre seu uso por alunos, testando a variedade de minijogos e o tipo de avaliação de cada fase, com o intuito de melhorar esta ferramenta.
Para o uso do jogo em sala de aula será necessário que os professores planejem suas aulas testando o jogo previamente, para saber todos os detalhes de seu funcionamento na hora quando for utilizá-lo.
É importante dizer que seria interessante criar um grupo interdisciplinar que incluísse programadores de jogos digitais, artistas visuais, músicos/compositores e professores de música para executar o jogo, e com isto ter
diversas perspectivas e olhares que possam enriquecer a proposta, ampliando os enfoques aqui propostos e dando continuidade a esta pesquisa.
Finalmente, ao estudar o conceito de criatividade, foi possível perceber que a aprendizagem musical em uma perspectiva criativa pode ser desenvolvida e estimulada não só através de composições, mas também através de experiências musicais variadas. Sendo assim, seria interessante criar mais minijogos que trabalhassem outras características musicais, com a intenção de complementar a ferramenta aqui proposta.
É importante ressaltar que este jogo foi pensado para ser um apoio para a educação musical, nunca para substituir o professor de música. Apesar dos questionamentos sobre o ensino tradicional de música, os professores de música sempre serão um elemento fundamental ao ensino, como orientadores do aprendizado musical, que não podem ser substituídos mas assessorados pelas tecnologias.
Com o jogo digital musical criado nesta pesquisa pretendeu-se responder à problemática nela apontada em conformidade com os fundamentos teóricos que a embasaram. Por se tratar de um estudo inicial, ainda será preciso avaliar a efetividade do jogo proposto. De antemão é possível supor que serão necessárias alterações para aperfeiçoá-lo. Este é um desafio a ser enfrentado pelos educadores musicais em estudos futuros.
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