• Nenhum resultado encontrado

Essa pesquisa revelou que os gestores da empresa AB no Brasil possuíam alternativas de ação ao longo do processo de formação das estratégias de RS associadas a BPG. A não-ação em relação à obesidade ocorreu devido ao poder relativo dos gestores locais e de outras ações empreendidas no Norte que mudaram o foco de atenção no Sul, limitaram o escopo de ação ao tema, reforçaram um viés organizacional estabelecido no Norte e mobilizado em diferentes níveis de análise por diferentes atores (dentro e fora da organização).

Pág

in

a

59

Essa pesquisa mostrou que a análise de situações de não-ação, por meio de uma perspectiva crítico-pluralista, é de particularmente relevante para o desenvolvimento de pesquisas em estratégias de RS no Sul e também para a rearticulação da agência de pesquisadores e gestores locais e também a recuperação dos debates que vêm sendo suprimidos nos EUA pela abordagem estratégica. Mais especificamente, análise permitiu reconhecer dimensões que são desconsideradas pela literatura dominante, tais como (a) a economia política dos bens públicos no Sul providos ‘voluntariamente’ por estratégias de RS de grandes corporações do Norte; (b) dinâmicas de rearticulação de agendas regulatórias por meio de estratégias de RS vinculadas a BPG no Sul; (c) mecanismos de inclusão seletiva promovidos por membros da CCT em dinâmicas de interação e institucionalização com demais atores locais; (d) dinâmicas de apropriação e contenção da agência de gestores locais em nível micro-individual por meio de interações nos níveis meso-organizacional e macroestrutural.

Essa pesquisa evidencia a importância para a esfera pública em geral de uma perspectiva crítico-pluralista em estratégia que permita a geração de conhecimento em RS focado nas interações assimétricas entre atores Norte-Sul em diferentes níveis de governança, bem como em processos de rearticulação de mecanismos regulatórios vinculados à institucionalização da agenda de RS focada

Pág

in

a

60

em BPG pela indústria global de alimentos por grandes corporações e membros da CCT.

Em termos específicos, essa investigação mostra que estratégias de RS vinculadas à agenda de S&B são também de interesse de instituições relacionadas ao âmbito ampliado da saúde pública. A apropriação da economia política dos bens públicos por grandes corporações e outras instituições de governança global comandados pelos EUA tem assumido um foco problemático no âmbito da saúde pública em anos recentes. Análise mostra que mecanismos supostamente privados de gestão estratégica tais como: auto-regulamentação, códigos de conduta, planejamento formal e guias de ação em RS devem ser considerados como formas de “soft law”17 ou “soft regulation” também pelo âmbito da saúde global do Brasil e outros países do Sul. A agenda globalista de S&B está vinculada a processos globalizantes que transformam grandes corporações em instituições governamentais no Sul e ajudam a promover as sucessivas crises do capitalismo neoliberal global.

17 “Soft law” (ou lei branda) é expressão utilizada para se referir a acordos voluntariamente

adotados que não implicam em obrigação legal de serem cumpridos. Assim, “soft regulation” (regulação branda) são preferíveis às regulações estabelecidas em lei por atores governamentais que possuem capacidade de “enforcement”, ou seja, mecanismos de Estado que forçam o cumprimento das leis.

Pág

in

a

61

Essa pesquisa sugere que a agenda de RS estratégica deve ser problematizada por múltiplas instituições, não apenas no Brasil e não apenas pela academia de administração, uma vez que: (a) a perspectiva estratégica de RS vinculada a BPG apropria e contém múltiplos interesses e agendas locais tanto no Sul quanto no Norte; (b) o tipo de desenvolvimento gerado por essas estratégias de RS orientadas por agendas de BPG carece de evidências empíricas tanto no Sul quanto no Norte; (c) a atuação voluntarista de corporações no provimento de bens públicos gera problemas de governança tanto no Sul quanto no Norte.

Finalmente, a perspectiva crítico-pluralista delineada neste artigo mostra que diversos atores de países em desenvolvimento e emergentes não podem ser tratados apenas como objeto (ou stakeholders) das estratégias ‘globais’ de RS e conhecimento correspondente. Eles devem ser vistos como atores sociais que possuem autoridade e poder relativo na formação de estratégias e conhecimentos voltadas ao bem público. As diferenças entre “teoria” e “prática” descritas e analisadas nesse artigo rearticulam uma “linha divisória norte-sul” que deve ser reconhecida por uma perspectiva ampliada e engajada com tais atores a partir do Sul que problematize questões de economia política e o crescente poder de grandes corporações, agências internacionais e membros da

Pág

in

a

62

CCT no provimento de BPG e conhecimento acadêmico em nome de “responsabilidade social global”.

REFERÊNCIAS

Adams, R. (2005). Fast food, obesity, and tort reform: an examination of industry responsibility for public health. Business and Society Review, 110(3), 297-320.

Aguinis, H.; Glavas, A. (2012). Corporate social responsibility: a review and research agenda. Journal of Management, 38(4), 932-968.

Allen, R. (1994). A fórmula secreta. Rio de Janeiro: Objetiva.

Alvesson, M., & Sköldberg, K. (2000). Reflexive methodology: new vistas for qualitative

research. Sage: London.

Arrighi, G., Silver, B., & Brewer, B. (2003). Industrial convergence, globalization, and the north-south divide. Studies in Comparative International Development, 38(1), 3-31.

Bachrach, P., & Baratz, M. (1962). Two faces of power. American Political Science

Pág

in

a

63

Banerjee, S. B. (2008). CSR: the good, the bad and the ugly. Northampton: Edward Elgar.

Barley, S. R. (2007). Corporations, democracy, and the public good. Journal of

Management Inquiry, 16(3), 201-215.

Baron, D. P. (2008). Managerial contracting and corporate social responsibility.

Journal of Public Economics, 92(1-2), 268-288.

Bartley, T. (2011). Transnational governance as the layering of rules: intersections of public and private standards. Theoretical Inquiries in Law, 12(2), 25-51.

Bertilsson, M. (1984). The theory of structuration: prospects and problems. Acta

Sociologica, 27(4), 339-353.

Besley, T., & Ghatak, M. (2007). Retailing public goods: the economics of corporate social responsibility. Journal of Public Economics, 91(9), 1645-1663.

Borges, J. F., Miranda, R., & Valadão Jr., V. M. (2007). O discurso das fundações corporativas. Revista de Administração de Empresas, 47(4), 101-115.

Pág

in

a

64

Brown, D., Roemer-Mahler, A., & Vetterein, A. (2010). Theorizing transnational corporations as social actors. Business and Politics, 12(1), 1-39.

Brugmann, J., & Prahalad, C. (2007). Cocreating business’s new social compact.

Harvard Business Review, 85(2), 80-90.

Bryman, A. (1989). Research methods and organization studies. London: Unwin Hyman.

Cabral, L. (2010). Brazil’s development cooperation with the South: a global model in waiting. London: Overseas Development Institute.

Cappelin, P., & Giffoni, R. (2007). As empresas em sociedades contemporâneas: a responsabilidade social no Norte e no Sul. Caderno CRH, 20(51), 419-434.

Child, J. (1997). Strategic choice in the analysis of action: structure organizations and environment. Organization Studies, 18(1), 43-76.

Choi, C. J., Kim, S. W., & Kim, J. B. (2010). Globalizing business ethics research and the ethical need to include the bottom-of-the-pyramid. Journal of Business Ethics, 94(2), 299-306.

Pág

in

a

65

Clegg, S. (2002). Lives in balance: a comment on Hinings and Greenwood’s disconnects and consequences in organizational theory? Administrative Science

Quarterly, 47(3), 428-441.

Clegg, S., Courparsson, D., & Phillips, N. (2006). Power and organizations. London: Sage.

Cooke, B. (2004). O gerenciamento do (terceiro) mundo. Revista de Administração de

Empresas, 44(3), 62-75.

Desai, M. (2003). Public goods: a historical perspective. In I. Kaul, P. Conceição, K. Le Goulven, & R. U. Mendoza. Providing global public goods: managing globalization (pp. 63- 77). New York: Oxford University Press.

Emirbayer, M., & Mische, A. (1998). What is agency? American Journal of Sociology,

103(4), 962-1023.

Faria, A. (2013). Border thinking in action: should critical management studies get anything done? In V. Malin, J. Murphy, & M. Siltaoja. (Eds.). Getting things done (pp.

Pág

in

a

66

Faria, A., Imasato, T., & Guedes, A. L. (2014).O que gestão estratégica tem a ver com capitalismo(s)? Revista de Administração Contemporânea, 18(ed. esp.), 2-21.

Faria, A., & Sauerbronn, F. F. (2008). A responsabilidade social é uma questão de estratégia? Uma abordagem crítica. Revista de Administração Pública, 42(1), 7-34.

Flick, U. (2004). Triangulation in qualitative research.In: U. Flick, E. von Kardoff, & I. Steinke (Eds.). A companion to qualitative research (pp. 178-183). London: Sage.

Foster, R. J. (2008). Following soft drinks from New York to New Guinea. New York:

Palgrave Macmillan.

Frynas, J. G. (2008). Corporate social responsibility and international development: critical assessment. Corporate Governance, 16(4), 274-281.

Giddens, A. (2003). A constituição da sociedade (2a ed). São Paulo: Martins Fontes.

Pág

in

a

67

GIFE. (2008). Investimento social privado dos EUA no Brasil – uma análise de empresas do

Grupo +Unidos. São Paulo: GIFE.

Green, P. (1996). The two faces of political apathy. American Political Science Review,

90(4), 890-891.

Guedes, A., & Faria, A. (2010). International management and international relations: a

critical perspective from Latin America. London: Routledge.

Gugler, P., & Shi, J. (2009). Corporate social responsibility for developing country multinational corporations. Journal of Business Ethics, 87(suppl. 1), 3-24.

Held, D., & McGrew, A. (2007). Globalization/Antiglobalization. Cambridge: Polity Press.

Hinings, C., & Greenwood, R. (2002). Disconnects and consequences in organization theory? Administrative Science Quarterly, 47(3), 411-421.

Holstein, J. A., & Gubrium, J. F. (2005). Interpretive practice and social action. In N. K. Denzin, & Y. S. Lincoln. The Sage Handbook of Qualitative Research (3rd ed.) (pp. 483-506). Thousand Oaks: Sage.

Pág

in

a

68

IFPRI – International Food Policy Research Institute. (2011). What influenced food

policy in 2011? Washington: IFPRI.

IPEA. (2006). A evolução da ação social das empresas privadas no Brasil. Brasília, IPEA.

Jaime, P. (2005). O empresariado e a questão social: apontamentos para a interpretação de um novo associativismo empresarial. Revista de Administração

Pública, 39(4), 939-978.

Jovchelovitch, S., & Bauer, M. W. (2007). Narrative interviewing.London: LSE Research Online.

Kaul, I., Grunberg, I., & Stern, M. (1999). Defining global public goods. New York: Oxford Univesity Press.

Kaul, I., & Mendoza, R. Advancing the concept of public goods. In I. Kaul, P. Conceição, K. Le Goulven, & R. U. Mendoza. Providing global public goods: managing

Pág

in

a

69

Kazmi, B. A., Leca, B., & Naccache, P. (2015). Is corporate social responsibility a new spirit of capitalism? Organization, 23(5), 742-762.

Kingdon, W. (1984). Agendas, alternatives and public policies. Boston: Litle Brown.

Kobrin, S. J. (2009). Private political authority and public responsibility: transnational politics, transnational firms, and human rights. Business Ethics

Quarterly, 19(3), 349-374.

Langley, A. (1999). Strategies for theorizing from process data research. Academy

of Management Review, 24(4), 691-710.

Langley, A., & Truax, J. (1994). A process study of new technology adoption in smaller manufacturing firms. Journal of Management Studies, 31(5), 619-652.

Levy, D., Brown, H. S., & Jong, M. (2010). The contested politics of corporate governance: the case of Global Reporting Initiative. Business & Society, 49(1), 88-115.

Ludwig, D. S., & Nestle, M. (2008). Can the food industry play a constructive role in the obesity epidemic? Jama, 300(15), 1808-1811.

Pág

in

a

70

Mahoney, J. T. (1993). Strategic management and determinism: sustaining the conversation. Journal of Management Studies, 30(1), 173-191.

Marens, R. (2013). What comes around: the early 20th Century American roots of legitimating corporate social responsibility. Organization, 20(3), 454-476.

Marens, R. (2004). Wobbling on a one-legged stool: the decline of american pluralism and the academic treatment of corporate social responsibility. Journal of

Academic Ethics, 2(1), 63-87.

Matten, D., & Moon, J. (2008). “Implicit” and “explicit” CSR. Academy of Management

Review, 33(2), 404-424.

Miller, D., & Harkins, C. (2010). Corporate strategy, corporate capture: food and alcohol industry lobbying and public health. Critical Social Policy, 30(4), 564-589. Mir, R., & Marens, R. (2008). The corporation and its fragments: corporate citizenship and

the legacies of imperialism. New York: Edward Elgar.

Moriceau, J. L., & Guerrillot, G. (2012). Gifted: the monolingualism of corporate social responsibility. Revista de Administração de Empresas, 52(2), 153-164.

Pág

in

a

71

Muller, A. (2006). Global versus local CSR strategies. European Management Journal,

24(2-3), 189-198.

Mutch, A., Delbridge, R., & Ventresca, M. (2006). Situating organizational action: the relational sociology of organizations. Organization, 13(5), 607-625.

Pendergast, M. (1993). A história não autorizada do maior dos refrigerantes e da

companhia que o produz. Rio de Janeiro: Ediouro.

Persinotto, R. (2009). As elites políticas: questões de teoria e método. São Paulo: Ibpex.

Pettigrew, A. (2012). Context and action in the transformation of the firm: a reprise. Journal of Management Studies, 49(7), 1304-1328.

Pettigrew, A. (1992). The character and significance of strategy process research.

Strategic Management Journal, 13(S2), 5-16.

Pettigrew, A. (1990). Longitudinal field research on change: theory and practice.

Pág

in

a

72

Porter, M., & Kramer, M. (2011). The big idea: creating shared value. Harvard

Business Review, 89(1-2), 62-77.

Porter, M., & Kramer, M. (2006). The link between competitive advantage and corporate social responsibility. Harvard Business Review, 84(12), 78-92.

Pozzebon, M. (2004). The influence of a structurationist view on strategic management research. Journal of Management Studies, 41(2), 247-272.

Prahalad, C., & Hammond, . (2002). Serving the world’s poor, profitably. Harvard

Business Review, 80(9), 48-57.

Oliveira, J. P. (2008). Empresas na sociedade: sustentabilidade e responsabilidade social. Rio de Janeiro: Elsevier-Campus.

Reed, D. (2002). Employing normative stakeholder theory in developing countries: a critical theory perspective. Business & Society, 41(2), 166-207.

Pág

in

a

73

Reed, M. (2003). The agency/structure dilemma in organization theory. Open doors and brick walls. In H. Tsoukas, & C. Knudsen (Eds.). The Oxford Handbook of

Organization Theory (pp. 289-309). Oxford: Oxford University Press.

Rooney, E. (1986). Who's left out? A rose by any other name is still red; or, the politics of pluralism. Critical Inquiry, 12(3), 550-563.

Sauerbronn, F. F., & Sauerbronn, J. F. (2011).Estratégias de responsabilidade social e esfera. Revista de Administração Pública, 45(2), 435-58.

Sauerbronn, F. F., & Faria, A. (2011). Agency in strategy: linking social practice and co-determination. Revista de Administração Mackenzie, 12(6), 49-75.

Sklair, L. (2002). Democracy and transnational capitalist class. The Annals of the

American Academy of Political and Social Science, 581(1), 144-157.

Pág

in

a

74

Swinnen, J. F. M., & Vandemoortele, T. (2009). Are food safety standards different from other food standards? A political economy perspective. European Review of

Agricultural Economics, 36(4), 507-523.

Teixeira, J. C., Nascimento, M. C. R., & Carrieri, . P. (2012). Triangulação entre métodos na administração: gerando conversações paradigmáticas ou meras validações “convergentes” Revista de Administração Pública, 46(1), 191-220.

Tsoukas, H., & Knudsen, C. (2002). The conduct of strategy research. In A. Pettigrew, H. Thomas, & R. Whittington. (Eds.). Handbook of strategy and management. London: Sage.

Thompson, P., & Harley, B. (2012). Beneath the radar? A critical realist analysis of ‘the knowledge economy’ and ‘shareholder value’ as competing discourses.

Organization Studies, 33(10), 1363-1381.

Vallentin, S., & Murillo, D. (2012). Governmentality and the politics of CSR.

Pág

in

a

75

Vogel, D. (2010). The private regulation of global corporate conduct. Business &

Society, 49(1), 68-87.

Waddock, S. (2008). Building a new institutional infrastructure for corporate responsibility. Academy of Management Perspectives, 22(3), 87-108.

Wallerstein, I. (2005). After developmentalism and globalization, what? Social

Forces, 83(3), 1263-1278.

Whittington, R. (1992). Putting Giddens into action: social systems and managerial agency. Journal of Management Studies, 29(6), 693-712.

Whittington, R. (1988). Environmental structure and theories of strategic choice.

Journal of Management Studies, 25(6), 521-536.

Windsor, D. (2006). Corporate social responsibility: three key approaches. Journal of

Pág

in

a

76

Resumo

Muitos estudos sobre estratégia de responsabilidade social (ERS) no Brasil atribuem uma perspectiva voluntarista de ação às grandes corporações do Norte na solução de problemas no Sul. Esses estudos desconsideram que o argumento

‘borderless world’ em ERS reforça e reproduz interesses associados a uma agenda

de bens públicos globais (BPG), em detrimento de importantes atores do Sul. O presente artigo apresenta uma perspectiva crítico-pluralista para desafiar esse argumento centrando-se no conceito de agência. O estudo da agência de uma grande corporação estadunidense na formação da ERS problematiza a interação de seus gestores locais e ‘globais’ junto a atores no Brasil. Métodos processuais e históricos foram utilizados pelos pesquisadores para: (a) revelar a codeterminação da agência pelos níveis microindividual, mesorganizacional e macroestrutural; e (b) problematizar um determinado viés de ação em ERS. Por fim, são discutidos os reflexos da formação de ERS para governança e destacadas questões de economia política de BPG que impactam sistemas globais de saúde e alimentação.

Documentos relacionados