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A presente pesquisa apresentou resultados significativos quando analisados sob a perspectiva da compreensão do fenômeno da evasão e baixo rendimento estudantil nas universidades públicas. Nesse sentido, os dados reforçaram o que a literatura vem apresentando quanto à relação entre vivências acadêmicas, adaptação e permanência no Ensino Superior.

Conforme já apontado na revisão literária constante nesse trabalho, o contexto universitário culmina com um período extremamente complexo em termos de transição e integração de jovens em idade regular para o Ensino Superior, como é o caso da maioria dos participantes dessa amostra (52% dos participantes entre 17 e20 anos).

Os dados revelaram que os alunos-participantes apresentaram menores índices de adaptação e integração nas dimensões estudo e pessoal. Essa realidade reflete que os alunos encontram maiores dificuldades em se ajustar às variáveis que exigem organização pessoal, disposição, autonomia e outros fatores próprios de cada sujeito. Conforme apontaram outras pesquisas, os estudantes com melhores índices de adaptação na dimensão pessoal e estudo foram os que apresentaram melhores índices de rendimento acadêmico (CUNHA; CARRILHO, 2005; FREITAS; RAPOSO; ALMEIDA, 2007).

Já nas dimensões carreira, interpessoal e institucional, os alunos se mostraram melhor adaptados (médias de 3,77; 3,77; 3,72 respectivamente). Esse dado está diretamente relacionado com o índice de satisfação e integração do estudante ao curso e à carreira pretendidos, bem como à integração social (com colegas e docentes), assim como à instituição de modo geral.

Constatou-se, ainda, certa correlação entre adaptação e escolha profissional, principalmente no que diz respeito às dimensões carreira (F=16,525; p≤0,01) e

institucional (F=6,910; p≤0,01). Esse fato concorda com a informação da maioria

dos participantes, ao afirmarem que o curso frequentado é correspondente à sua 1ª opção e à sua intenção em continuar a frequentá-lo até o fim. Segundo uma pesquisa feita por Mendonça e Rocha (2005), a concepção que o aluno tem acerca da universidade, do curso escolhido, das expectativas trazidas para esse novo contexto, fará toda a diferença em seu processo de transição, a ponto de gerar

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a identificação com esse ambiente, com o curso e a consequente identificação profissional – que a literatura portuguesa denomina vocacional.

Ao avaliar se a variável nível socioeconômico dos participantes foi determinante para o processo de adaptação à universidade, constatou-se significância somente na dimensão interpessoal (F=3,914; p≤0,01). Esse é um fator bastante relevante, não apenas por seu caráter pedagógico e social, mas também, político, já que alguns dos alunos de classes sociais C, D e E, obtiveram acesso à universidade por conta das políticas de cotas e ações afirmativas. Há que se fazer um estudo mais aprofundado acerca dessa questão, entretanto, pode-se inferir que tais alunos apresentam desempenho ao nível dos demais das classes B e A.

Tomando como referência pesquisas bases nessa temática (SOARES; ALMEIDA; FERREIRA, 2006; GRANADO et al., 2005), como responsáveis pelos estudos de criação e validação do QVA-r em Portugal e no Brasil, o presente estudo confirmou a precisão do instrumento nas diferentes dimensões que abarca, destacando que os valores alcançados foram próximos aos de Soares, Almeida e Ferreira (2006) e Granado et al. (2005).

Ao término dessa pesquisa, fica o desafio às instituições públicas de Ensino Superior no que concerne à importância de identificar e compreender as vivências acadêmicas do estudante e as relações destas com a adaptação, a permanência e o rendimento escolar.

A falta de perspectiva profissional, a heterogeneidade dos alunos, a falta de preparo dos discentes e de alguns docentes, a falta de estrutura universitária, são exemplos de fatores que podem apresentar forte relação com a adaptação do estudante. Não conhecer e não querer buscar compreender as causas de tais problemas é não se abrirpara a realidade, para o novo, para os desafios.

Ressalta-se, por fim, que a presente pesquisa esteve circunscrita ao entendimento de certas variáveis na adaptação de estudantes universitários de cursos de Engenharia. Não obstante, temos ciência de suas limitações, considerando-se, sobretudo, a complexidade do fenômeno estudado, o qual está sujeito a uma multiplicidade de fatores intervenientes, desde questões como a mobilidade do ingressante e as políticas de acesso ao Ensino Superior, as perspectivas com relação à profissão de escolha, as condições do mercado de trabalho, a valorização e concepções relativas às diferentes profissões, dentre outros fatores de natureza psicológica, social e econômica. Esses são aspectos que, por sua vez, não se apresentam de modo estável, mas em mudança, conforme se dão as relações intra e interpessoais, sociais e ideológicas. Desse modo, para que se alcance em profundidade o significado dos dados que envolvem a adaptação, permanência e êxito do graduando no Ensino Superior, estudos e instrumentos que se voltem para essas questões são necessários e urgentes.

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