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A palavra método (do grego méthodos

,

ligada à expressão metérchomai: em meio a), traz a idéia de esforço para atingir um fim, investigação, estudo (LALANDE,

1993). Na literatura filosófica, Lalande sugere dois sentidos para expressão: o cami- nho pelo qual se chegou a determinado resultado, mesmo quando esse caminho não foi previamente fixado de uma maneira premeditada e refletida; o segundo sentido traz a idéia de um programa que regula antecipadamente uma seqüência de operações a executar e que assinala certos erros a evitar, com vista a atingir um resultado deter- minado.

A palavra méthodos indica a noção de procedimentos que devem ser seguidos quando se deseja obter algum resultado investigativo. Trata-se de efetivar algo seguindo deter-

minados passos. Vejamos se esta compreensão se confirma em outros textos clássicos. No Sofista de Platão, Teeteto conversa com um estrangeiro, que lhe faz a seguinte

observação:

Todavia, em qualquer análise, é sempre indispensável, antes de tudo, estar de acordo sobre o seu próprio objeto, servindo-nos de razões que o definam, e não apenas sobre o seu nome, sem preocupar-nos com a sua definição: Não é nada fácil saber o que são as pessoas, objeto de nossa análise, e dizer o que é o sofista. Mas, o método aceito por todos, e em todo lugar, para levar a bom termo as grandes obras é o de que se deve procurar, primeiramente, ensaiar em exemplos pequenos e mais fáceis antes de chegar propriamente aos temas grandiosos. No caso presente, Teeteto, também me parece ser esse o método que aconselho a nós: antes desta procura difícil e penosa a que, bem sabemos, nos obrigará o gênero sofístico, deve-se, primeiramente, ensaiar em algum as- sunto mais fácil o método aplicável a esta pesquisa; a menos que tenhas outro caminho mais fácil a propor-nos. (PLATÃO, 1993, p. 218c-218d.).

Apesar da coincidência do vocabulário platônico com o moderno, não devemos tomar alguns termos de forma anacrônica. O que está em questão, nesse diálogo, é a tese de que o não-ser é um modo de ser. O protagonista do diálogo é denominado como Estrangeiro de Eléia, filósofo do círculo de Parmênides e Zenão. Ao Estrangei- ro é feita a questão sobre como distinguem o sofista, o político e o filósofo. Para efe- tuar a análise dos nomes, o Estrangeiro parte de uma premissa: o acordo entre o que se está falando por meio de razões que definem. Quando se usa a expressão “próprio objeto”, está se falando de “coisas” não de objeto que se usa nas formulações metodo-

lógicas modernas4. A proposta do Estrangeiro é de que o método escolhido deve ser testado, inicialmente, em assunto de maior domínio, com o intuito de verificar sua utilidade, para, então, transpô-lo para níveis de maior complexidade.

4 Devemos nos lembrar que a palavra objeto foi introduzida na filosofia no século XIII pelos Escolásticos. Adiante, veremos o

sentido usado por Tomás de Aquino e Duns Scot, mostrando a gênese da constituição da palavra objeto e o sentido que era dado

Fédon, livro que trata da imortalidade da alma, tem como ambiente a prisão ate-

niense, no dia em que Sócrates tomaria a cicuta, concretizando sua sentença dada pela polis grega. Platão, por estar doente, não estava presente. Fédon narra o acontecido a Equécrates, que faz chegar a Platão. O diálogo é uma forma de reafirmação das convic- ções de Sócrates sobre o destino da alma dos mortais. Em diálogo com Cebes, Sócrates afirma que o pensamento é a capacidade de examinar as coisas por si mesmo, que tende ao que sempre existe, e que conserva sempre sua identidade e seu modo de ser. Dito isso, Sócrates pergunta a Cebes com o quê a alma se mostra aparentada: com as coisas transitórias ou com o seu contrário, ao que o interlocutor responde:

Penso não haver ninguém, Sócrates, por mais dura que tenha a cabeça, que seja capaz de não concordar, seguindo este método, em que, em tudo e por tudo, a alma tem mais semelhança com o que se comporta sempre do mesmo modo, do que com as coisas que não o fazem. (PLATÃO, 1993, p. 79e.).

Nesses dois exemplos apresentados dos livros de Platão, coloca-se a questão do método socrático, e, no fim das contas, platônico. Comentando sobre isso, Watanabe afirma:

Caminho é método (em grego, meta + hodós, “por essa via”). Qual seria, então, o

método de Platão? Para qual via, ou quais vias, aponta sua obra? Platão não é um metodologista à nossa maneira, preocupados que somos em não cometer desvios nem erros pelo caminho, ou em economizar nossos instrumentos de conheci- mento, reduzindo-os ao mínimo necessário, seja este qual for. Sua dialética é um método de divisão da definição procurada em duas partes, isto é, um procedi- mento de dicotomia; uma vez conseguida a divisão, toma-se em seguida uma das

duas partes obtidas como nova definição, que deverá ser dividida novamente, e assim por diante. Na dialética, sabemos de onde saímos, mas nem sempre sabe- mos aonde chegaremos. (WATANABE, 1995, p. 53-54.

Sócrates afirma sua convicção deste seu método, ao menos quando lemos na Repú-

blica:

Em todo caso, há algo que ninguém jamais contestará: não há outro método de pesquisa senão a dialética que intente alcançar a essência de cada coisa, pois as outras técnicas em geral não se ocupam, senão das opiniões e dos desejos dos ho- mens ou são cultivadas em função da produção de seres naturais ou da fabricação de objetos artificiais, ou, ainda, da conservação do que se produz ou fabrica. [...] O método dialético é o único que, refutando hipóteses aceitas, encaminha-se até o princípio para encontrar um fundamento firme (Platão, 1993, p. 533b-533c). Para Platão, portanto, vemos a estruturação de um método discursivo que pretende construir afirmações sólidas, do ponto de vista formal, mas que, acima de tudo, garan- te o acesso às coisas em seu fundamento, estabelecendo o princípio ideal de todas as coisas. Método é, portanto, para ele, caminho de acesso às coisas em si mesmas. Esse método se chama dialético.

Com essas conotações apresentadas, mantém-se a idéia de que método se refere a procedimentos a serem seguidos na investigação. Deste modo, podemos falar em um método socrático ou platônico5.

Contudo, o uso do termo na literatura filosófica reconfigurou o sentido. Para isso, devemos examinar o modo corrente nos filósofos e inferirmos seu sentido críti- co para o uso contemporâneo. Como auxílio, sugerimos uma anotação de Nietzsche sobre grandes metodólogos: Os grandes metodólogos: Aristóteles, Bacon, Descartes e Augusto Comte6.

Vamos ao exame deles.