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Depois que decidimos quais seriam as turmas que iriam participar da pesquisa, procuramos deixar a professora bastante à vontade quanto à nossa presença, pois, apesar de sabermos de

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Documentos necessários para obter a autorização do Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Ufes, sob nº 270/11 (ANEXO A).

sua preocupação em nos dar atenção, não queríamos que nossa presença se tornasse empecilho ou dificuldade para ela lidar com as crianças.

Nos primeiros encontros, despertamos a atenção das crianças e provocamos a curiosidade, mas preferimos ficar reservado, isto é, ficamos mais observando e, à medida que as crianças vinham ao nosso encontro, interagíamos, respondíamos às suas indagações e dúvidas. Esse foi o momento de aproximação com a escola, com o trabalho da professora e com as crianças.

Esses primeiros encontros serviram para compreendermos a dinâmica da Educação Física, os locais disponíveis e os horários das atividades. Observamos como a Educação Física se encaixava na rotina de cada turma e da professora, a média de crianças por sala, os materiais utilizados e os que estavam disponíveis para a aula.

Chegávamos antes do início das aulas e saíamos somente após seu término, para acompanhar realmente o cotidiano da professora nessas suas turmas e não apenas a atividade de jogo em si. Anotamos em diário de campo todos esses momentos e começamos a registrar, em fotos e vídeos, as aulas compondo, assim, mais recursos para a correlação dos dados produzidos.

As crianças dos grupos que participaram desta pesquisa têm três aulas de Educação Física por semana, assim distribuídas:

Quadro Quadro de horário das aulas de Educação Física

HORÁRIO DE AULA GRUPO 5 GRUPO 6

7h às 7h50min Segunda-feira ---

7h50min às 8h40min Terça-feira Segunda-feira e quinta-feira

10h50min às 11h30min Quinta-feira Terça-feira

Esses horários dizem muito a respeito das aulas de Educação Física, a saber:

a) Nas primeiras aulas, no horário de sete horas, é a entrada das crianças na escola. Elas chegam acompanhadas de seus familiares, pais ou responsáveis. Essa entrada, ou melhor, esse horário da entrada, como é chamado, dura, pelo menos, 15 minutos, ou seja, até às 7h15min as crianças estão chegando à escola, o que diminui o horário de aula e ainda há o lanche que, em algumas ocasiões, é servido durante essa primeira aula, reduzindo ainda mais o tempo da Educação Física.

b) O último horário de aula do dia, das 10h40min às 11h30min, é ainda mais preenchido pela rotina das crianças na escola. Nessa aula, a professora de Educação Física se dirige ao refeitório para acompanhar as crianças no almoço, servido para os Grupos 5 e 6, entre 10h40min e 11h30min. Além disso, às 11h, abre-se o portão para que os alunos que utilizam transporte escolar (particular) possam sair mais cedo e, às 11h15min, abre-se o portão, definitivamente, para que a comunidade possa entrar para pegar as crianças. Entretanto, nem todos os alunos saem juntos e, até às 11h30min, a professora fica responsável por entregar as crianças aos seus respectivos responsáveis.28 Esse último horário de aula de Educação Física do dia, chamado horário de saída, também é praticamente tomado pela rotina do almoço e da saída das crianças, restando pouquíssimo ou, como vimos algumas vezes, nenhum tempo para as atividades pedagógicas direcionadas pela professora.

c) Entretanto, o segundo horário de aula, entre as 7h50min e às 8h40min, é inteiramente disponível para a Educação Física. Nesse horário não ocorre nenhum tipo de atividade de rotina tornando a aula bastante aproveitada e, por que não dizer, produtiva.

Percebemos o quanto o horário influencia o desenvolvimento das aulas, na sua preparação, pois observamos que a professora preparava as aulas conforme o tempo disponível para o desenvolvimento das atividades. Além do tempo, o local também é um fator determinante do tipo de atividade a ser desenvolvida, haja vista que, nem sempre, a professora dispunha do mesmo local, já que eram duas professoras de Educação Física trabalhando ao mesmo tempo na escola com turmas diferentes e também uma professora de Música, que, às vezes, ocupava locais fora da sala de aula.

Também há na escola um horário de pátio, que é uma das atividades curriculares das crianças na Educação Infantil e corresponde ao momento em que as crianças são conduzidas ao pátio para atividades livres, nas quais as professoras, as estagiárias e/ou as AEIs não desenvolvem atividades pedagógicas direcionadas e é permitido às crianças brincar autonomamente, livres, sem a intervenção de adultos, que permanecem no pátio para cuidar delas e protegê-las das

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Percebemos que o horário de saída é bastante conturbado, pois, na maioria das vezes, a professora estava no pátio e tinha que dividir a atenção entre entregar as crianças ao seu responsável e cuidar das que ainda estavam na escola. Na maioria das vezes, ajudávamos acompanhando as crianças no pátio, enquanto a professora verificava o material, a mochila e o calçado e, quando necessário, realizava uma breve conversa com os responsáveis.

situações de perigo de acidentes, socorrendo-as de eventuais acidentes, além de mediar seus conflitos.

Passamos algum tempo, desde as primeiras aproximações com a escola, para compreender como se dava a organização da professora no desenvolvimento das suas aulas e, ela mesma, às vezes, era surpreendida com as mudanças ocasionadas pela rotina, na entrada das crianças, no lanche, no almoço, no horário de saída, no horário de pátio, na ocupação dos locais previamente pensados para as atividades do dia. Ela precisava se reorganizar quanto à atividade e o local para o desenvolvimento da aula. Em muitas ocasiões, a professora mudava totalmente o seu planejamento e as suas atividades, porque foi surpreendida por essa “roda viva que é o CMEI” (como disse uma das pedagogas, em uma oportunidade de diálogo informal na escola).

Vejamos o que a professora de Educação Física do CMEI diz sobre os locais para a realização das aulas:

Apesar deste CMEI possuir um amplo espaço físico, é comum nos vermos (professor e alunos) sem lugar para ficar, isso devido ao horário de pátio, chuvas, reuniões, reformas, limpeza etc. As turmas começam a fazer o horário de pátio a partir das 8:20h, com o Grupo 4 ocupando o pátio das árvores. Quando chove, os alunos que estão em horário de pátio ficam no hall assistindo a filmes, pois todos os pátios ficam inutilizáveis (relato escrito da professora).

Essas reorganizações que acontecem na utilização dos locais disponíveis para as aulas de Educação Física nos fazem pensar, a partir de Certeau (1994), sobre a diferenciação que esse autor faz de lugar e espaço. Para Certeau, o lugar é físico, isto é, é dado a priori ao praticante e este, ao agir sobre esse lugar, transforma-o em espaço. É o que vimos acontecer muitas vezes nas aulas da professora Ana Rosa. Vários lugares da escola se transformaram em espaços de aula de Educação Física, porque a dinâmica da escola obrigou a professora a “fazer uso” desses lugares com as crianças, a praticá-los, como foi o caso da rampa de acesso aos banheiros, do palco, do hall, do corredor e da sala multiúso, todos lugares de pertencimento comum, que não dizem respeito apenas à Educação Física (se é que essa disciplina realmente tem um lugar na escola, porque os pátios também são de uso comum), que não são reservados a ela, mas que foram transformados em espaço de Educação Física pelos praticantes dessa escola.

Toda essa dinâmica de ações e relações foi alvo de nossa percepção. É fato que não captamos tudo o tempo todo, mas fizemos um esforço para isso e, assim, já assumimos a crítica. O processo de pesquisa, os dados produzidos e a análise empreendida foram o resultado de 38 dias de atuação na escola, com a professora e com as crianças, num total de 15 semanas do segundo semestre de 2011. O Capítulo VI discute esse processo.

CAPÍTULO VI

6 USOS E APROPRIAÇÕES DO JOGO NA EDUCAÇÃO FÍSICA DO CMEI

Para compreender os usos e as apropriações do jogo nas aulas de Educação Física no CMEI compartilhado, analisamos os dados sistematizados no diário de campo, relacionando-os com o material produzido nos registros iconográficos (filmagens e fotografias), nas entrevistas semiestruturadas, nos relatos da professora (textos elaborados por ela sobre as aulas) e também nos registros das conversas informais com a professora e das falas das crianças captadas, particularmente, na ocasião das aulas.