• Nenhum resultado encontrado

PARTE I DA FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM ENFERMAGEM À CONCEPÇÃO

2.5 CONSIDERAÇÕES SOBRE CONCEPÇÕES DE SAÚDE

Apresento algumas considerações sobre concepções de saúde que encontrei nas bases de dados da Biblioteca Virtual em Saúde – LILACS e MEDLINE, na Scientific Eletronic Library on line – SCIELO, no Portal de Periódicos CAPES e em alguns livros. Analisei tais concepções sob três aspectos: a constatação da carência de estudos sobre concepções de saúde; a diversidade de concepções de saúde entre os próprios profissionais de saúde e o papel da enfermagem em relação às concepções de saúde.

esta tese. A quem interessa a concentração de esforços no sentido de produzir modelos biomédicos de patologia, com forte inspiração mecanicista? Coelho (2002, p. 316) nos lembra que,

A carência de estudos sobre o conceito de saúde propriamente definido parece indicar uma dificuldade do paradigma científico dominante nos mais diversos campos científicos de abordar a saúde positivamente. Por outro lado, tal pobreza conceitual pode ter sido resultado da influência da indústria farmacêutica e de uma certa cultura da doença, que têm restringido o interesse e os investimentos de pesquisa a um tratamento teórico e empírico da questão da saúde como mera ausência de doença.

Há um consenso em relação à centralidade da noção de ‘doença’ para o discurso científico e práxiológico da Clínica. A Clínica desenvolve-se como saber justificado pela noção de patologia, incapaz de reconhecer positivamente a presença ou ocorrência da saúde nos sujeitos individuais. (ALMEIDA, 2000).

Estudos sobre concepções de saúde não iriam além do fato de a:

Saúde ser um direito conquistado através de ações institucionalizadas; nem saúde como um bem disponibilizado e adquirido por meio de processos mercantis ou políticos; nem saúde como valor humanístico decorrente de atos volitivos solidários. Trata- se de construir a positividade do conceito de saúde como tudo isso, verdadeiro ‘integral multinível’ de norma-valor-direito-bem-função- processo-estado. (COELHO, 2002, p. 330).

Podemos visualizar a pessoa de forma integral ao desenvolver as atividades profissionais de saúde e compreender a saúde como um conceito subjetivo, pois “não são as médias estatísticas, nem a fuga dos intervalos assim chamados normais que nos indicam o momento em que se inicia uma doença, mas sim as dificuldades que o organismo encontra para dar respostas às demandas que seu meio lhe impõe” .(CAPONI, 2003, p. 57).

A integralidade compreende a dimensão física, intelectual, moral e transcendental do ser humano, pois “a fronteira entre o normal e o patológico só pode ser precisa para um indivíduo considerado simultaneamente; é cada indivíduo quem sofre e reconhece suas dificuldades para enfrentar as demandas que seu meio lhe impõe”. (CAPONI, 2003, p. 70).

saúde é constatada na fala de alguns autores como Nordenfelt (1995, p. 5) quando afirma que “o conceito de saúde é obviamente relacionado a vários outros conceitos aplicados aos humanos, e muitas vezes é confundido com alguns deles. Esses conceitos, particularmente, são associados a normas, como ‘decência’, ‘moralidade’ e ‘legalidade’”.

A construção de conceitos é influenciada pelos referenciais teóricos utilizados na graduação e muitas vezes reforçados no serviço. Os espaços de discussão no cotidiano profissional, nem sempre, levam os profissionais de saúde a refletir sobre seus conceitos. Santos (1999, p. 22) colabora com o raciocínio com a seguinte afirmativa:

Como se pode constatar apesar de todas as tentativas em definir saúde, não tem havido concordância entre os profissionais sobre o significado da mesma, pois, pela complexidade do assunto encontra- se dificuldade de defini-la. O reflexo deste fato se materializa na ausência do partilhar comum ou unânime sobre o que é ter saúde, na ressonância da real dificuldade do que significa ”ser saudável” para cada indivíduo ou coletividade.

Assumir a complexidade do debate sobre a concepção de saúde pode ser um dos desafios de quem se preocupa em mudar um paradigma biologicista e centrado na doença. Criam-se conceitos através do modo de vida e da maneira de se comunicar com a vida.

Saúde também supõe um relacionamento estreito com felicidade. Qual é este relacionamento? A saúde é pré-requisito da felicidade? Uma outra importante relação é aquela entre ‘saúde’ e ‘habilidade’. Se saúde é de alguma forma relacionada à ‘habilidade’, como pode ser distinguida dos conceitos de excelência: talento, inteligência, força e criatividade? (NORDENFELT ,1995, p. 5).

A relação entre saúde e felicidade não é necessariamente direta. Ter saúde nem sempre significa ter felicidade: “A percepção de saúde como algo essencial à família, não exclusivamente como seres biológicos, mas como seres globais, reflete a importância deste conceito para o viver da família, numa perspectiva individual e de núcleo familiar, até a interação com o contexto externo”. (MARTIN, 1998, p. 9).

A estratégia de saúde da família, implantada a partir de 1994, com a criação dos Pólos de Educação Permanente tem procurado mobilizar a formação permanente dos trabalhadores em saúde, através de parcerias envolvendo o

Ministério da Saúde, Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde, Instituições de Ensino Superior e Escolas Técnicas de Saúde públicas e privadas. Iniciativas como estas propiciam aos profissionais de saúde a oportunidade de discutir e incorporar questões importantes do Sistema Único de Saúde, destacando-se as concepções de saúde, de família e de sociedade, através de um trabalho de reflexão crítica sobre as práticas, bem como de (re)construção permanente de uma identidade pessoal e profissional. (SILVA, 2005).

Embora existam diversas óticas sobre o conceito de saúde, a relação entre saúde e normalidade depende da bagagem formativa e de vivência profissional acumulada pelo enfermeiro ou enfermeira e do meio social em que se vive. Caponi (2003, p. 68) enfatiza que “é preciso pensar em um conceito de saúde capaz de contemplar e integrar nossa capacidade de administrar de forma autônoma esta margem de risco, de tensão, de infidelidade, e por que não dizer, de ‘mal-estar’, com que inevitavelmente devemos conviver”.

O terceiro aspecto aborda considerações sobre o papel da enfermagem em relação às concepções de saúde, pois tal foco em saúde não é novo para a Enfermagem. “No Século 19, Florence Nightingale conceituou a enfermagem em termos de ambiente saudável, e focalizou a habilidade da enfermeira em auxiliar o potencial de cura pessoal dos clientes. Este interesse em saúde evoluiu até a conceituação e questionamentos atuais”. (MELEIS, 1992, p. 37).

Qual a justificativa para a ênfase na doença se a Enfermagem se preocupa com as questões da saúde desde a sua origem? Uma possível explicação poderia ser a compreensão de saúde construída ao longo da história da Enfermagem. Ao incorporar a idéia de que a Enfermagem é holística e reconhecer que as respostas a todas as necessidades das pessoas dependem das dimensões física, psicológica, espiritual, social, e cultural, novas perspectivas de atuação profissional poderão ser vislumbradas. (ROYAL COLLEGE OF NURSING, 1996). Os (as) enfermeiros (as) tem que combinar informações sobre cultura e avaliação clínica do paciente para prover um cuidado sensível que respeite a pessoa. Talvez a melhor forma de fazê- lo seja combinar valores, através da negociação entre as tradições e o respeito às escolhas individuais. (CHEN, 2001).

É um caminho complexo a ser percorrido, mas um desafio necessário à crescente demanda de necessidade de cuidados que a humanidade está carente. A citação do World Bank mencionada a seguir (apud ROYAL COLLEGE OF

NURSING 1996, p. 32) aponta uma expectativa para a Enfermagem desde 1996, quando destaca que:

O reconhecimento da contribuição das enfermeiras para a saúde e o bem estar das comunidades vem eclodindo recentemente pelo Banco Mundial, o qual recomenda enfaticamente aos governantes que utilizem seus recursos para encontrarem enfermeiras e parteiras que prestem cuidados primários em saúde.

O papel da Enfermagem está vinculado à concepção de saúde adotada na sua prática. Na sua atuação como profissional da saúde que atende às necessidades básicas das pessoas, há o risco não só implícito, mas bastante claro, de que em nome da saúde dos clientes, os profissionais possam ou busquem “atuar” e interferir no atendimento de todas as necessidades dos sujeitos, o que, na verdade, pela sua abrangência, poderia significar a interferência na existência do homem como um todo. (LUNARDI, 1999).