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CAPÍTULO I – Manuais escolares: estatuto e funções; avaliação, adopção e apropriação

4. Instrumentos de recolha de dados

4.1. Construção do guião da entrevista

Apresentados e justificados os critérios que presidiram à escolha da entrevista como método de recolha de dados, pretende-se, agora, caracterizar o suporte escrito que serviu de apoio às conversas com os sujeitos que integram este estudo.

Uma vez que as informações obtidas a partir das entrevistas a professores constituiriam o objecto de análise a partir do qual procurar-se-ia apre(e)nder as percepções dos inquiridos sobre o(s) uso(s) que fazem do manual nas suas práticas educativas, dentro e fora do contexto da aula, optou-se por construir um guião a ser aplicado a todos os entrevistados. Como notam Lüdke e André (1986: 34),

«Quando o entrevistador tem de seguir muito de perto um roteiro de perguntas feitas a todos os entrevistados de maneira idêntica e na mesma ordem, tem-se uma situação muito próxima da aplicação de um questionário, com a vantagem óbvia de se ter o entrevistador presente para algum eventual esclarecimento.»

Por outro lado, uma vez que se pretendia fazer a análise comparativa do conteúdo das respostas dos docentes, com vista à compreensão das suas perspectivas sobre a forma como utilizam o manual escolar e os seus satélites, a aplicação de um conjunto de questões idênticas possibilitaria a obtenção de resultados mais homogéneos entre os diversos entrevistados. Conforme observa Tuckman (2000: 517),

«Para maximizar a neutralidade e a consistência das conclusões, é útil construir um esquema para a entrevista. A apresentação das mesmas questões a diferentes pessoas é uma estratégia para obter uma variedade de perspectivas sobre essas mesmas questões.»

Assim sendo, depois de formuladas as questões, com base nos objectivos e nas dimensões de análise previamente definidos, procedeu-se à sua ordenação, obedecendo a uma sequência lógica dos assuntos principais a serem gradualmente descobertos ao longo da conversa entre os participantes na entrevista (Lüdke & André, 1986).

Antes de ser aplicado à população alvo deste estudo, o questionário que serviu de base às entrevistas realizadas foi validado por dois investigadores na área da educação, e posteriormente testado junto de dois professores de Língua Portuguesa do terceiro ciclo, que responderam às perguntas propostas por escrito, a fim de se identificarem eventuais lacunas quanto à pertinência e/ou clareza das questões. Depois de analisadas as respostas e as dificuldades demonstradas, procedeu-se à revisão e aperfeiçoamento de algumas perguntas de acordo com os pareceres obtidos.

Deste exercício prévio, como forma de garantir a validade interna do instrumento a ser utilizado na recolha de dados, resultou um guião7 constituído por um questionário de cerca de

trinta perguntas, maioritariamente abertas, cujas respostas podiam ser mais ou menos longas, conforme os objectivos visados. Assim, há um leque de questões de resposta curta – onze em que o inquirido pode responder em poucas palavras ao que se pede e dez em que se pretende

7 Ver Guião da Entrevista – Anexo 2 (página 143).

discorrer livremente, atendendo ao tema em questão.

Partindo do pressuposto de que o(s) uso(s) que cada professor faz do manual escolar depende(m) não só das características deste utensílio pedagógico-didáctico, mas também das escolhas e práticas pessoais dos docentes (Tormenta, 1996), o questionário que aqui se apresenta procura conhecer as práticas educativas dos professores no que respeita à sua relação com os manuais escolares e/ou outros materiais de apoio ao ensino, assim como as razões que presidem ao(s) seu(s) modo(s) de apropriação.

As orientações do Currículo Nacional do Ensino Básico (Abrantes: 2001) explicitam as acções a implementar por cada professor na sua prática docente, a fim de desenvolver diferentes competências ao longo da aprendizagem dos alunos, entre as quais se destacam:

«Organizar o ensino prevendo a experimentação de técnicas, instrumentos e formas de trabalho diversificados» (p. 17)

«Organizar o ensino com base em materiais e recursos diversificados, adequados às diferentes formas de aprendizagem» (p. 21)

«Organizar o ensino prevendo a utilização de fontes de informação diversas e das tecnologias da informação e da comunicação» (p. 22)

Com o objectivo de averiguar se as práticas docentes vão ao encontro das directrizes do CNEB, no primeiro grupo de perguntas8, os professores são questionados relativamente aos

recursos pedagógico-didácticos que utilizam com maior incidência na preparação das suas aulas, indicando os critérios que subjazem à sua selecção.

Uma vez que os normativos legais determinam a adopção9 obrigatória de um manual

escolar para a disciplina de Língua Portuguesa, o segundo conjunto de questões10 tem como

objectivo identificar a relação dos professores com o manual adoptado no contexto da regulação externa da sua prática docente, designadamente na preparação das actividades lectivas: frequência do uso do manual adoptado; ordem a que obedece no tratamento das unidades didácticas; propostas de trabalho que selecciona e privilegia e os critérios implícitos às escolhas que faz.

Do ponto de vista de Choppin (1992: 114),

8 Perguntas 1. a 1.2. do questionário do Guião da Entrevista (Anexo 2 – página 143). 9 Portaria n.º 1628/2007 de 28 de Dezembro.

10 Perguntas 2. a 2.2.1. do questionário do Guião da Entrevista (Anexo 2 – página 143). 57

«L’organisation logique, cohérente, progressive du manuel, la qualité des résumés, la pertinence de la documentation, l’abondance des exercices dispensent l’enseignant de recherches personnelles, de réflexion critique. Le manuel se présenterait comme un cours tout fait, comme un cours modèle, et l’inciterait à adopter un comportement pédagogique routinier, sclérosé.»

Tendo em conta o(s) uso(s) do manual escolar adoptado, e no sentido de (re)conhecer que práticas pedagógicas ocorrem no contexto específico da sala de aula, o leque de questões subsequente11 procura aferir com que regularidade os professores utilizam este dispositivo de

ensino e aprendizagem; que propostas de trabalho seleccionam e quais as razões que presidem a essas escolhas; que recursos e materiais didácticos do manual privilegiam; com que frequência utilizam os mesmos, de que forma são aproveitados e que factores condicionam as suas escolhas.

Entretanto, os quarto e quinto grupos de questões pretendem auscultar em que medida os professores promovem o uso do manual escolar e de outros recursos pedagógico-didácticos por parte dos alunos, dentro e fora do contexto da sala de aula. No que respeita ao trabalho desenvolvido no decorrer das aulas, as perguntas12 do primeiro conjunto anteriormente referido

têm em vista verificar o tipo de tarefas que são propostas aos alunos e em que instrumentos se apoiam para as realizar. Por seu turno, o segundo grupo de questões13 incide sobre o trabalho de

casa, visando aferir que partido é que os alunos tiram do manual escolar adoptado e avaliar a importância deste dispositivo na construção do conhecimento e na aquisição de competências, bem como no fomento da sua autonomia relativamente à aprendizagem (o saber/o saber-fazer). A este propósito Vieira, Marques e Moreira (1999: 533) defendem que

«Uma pedagogia para a autonomia requer a mobilização de recursos múltiplos de aprendizagem, entre os quais figuram os materiais de consulta – o dicionário, as gramáticas, as enciclopédias, a Internet, etc. Uma apropriação do aluno ao saber implica o acesso a diversas fontes de saber, em substituição de uma dependência quase exclusiva ao professor.»

Se considerarmos que a cada um dos professores são atribuídos diferentes anos de escolaridade e diversas turmas e que, por sua vez, cada turma encerra uma heterogeneidade mais ou menos acentuada de alunos, cuja individualidade requer uma atenção diferenciada, o

11 Perguntas 3. a 3.4.2. do questionário do Guião da Entrevista (Anexo 2 – página 143). 12 Perguntas 4. a 4.2. do questionário do Guião da Entrevista (Anexo 2 – página 143). 13 Perguntas 5. e 5.1. do questionário do Guião da Entrevista (Anexo 2 – página 143).

pretendeu-se com o sexto leque de questões14 compreender em que medida o uso do manual

escolar é condicionado por esta variedade de níveis de ensino e de alunos, cujos conhecimentos e competências são necessariamente diversificados.

Atendendo ao facto de que a avaliação é um factor indissociável e determinante no processo de ensino e aprendizagem, o sétimo conjunto de questões15 visa conhecer de que

forma os professores estruturam os seus testes de escritos e quais as fontes que presidem à sua elaboração. Numa altura em que o Ministério da Educação impõe a realização de Exames Nacionais – de Língua Portuguesa e de Matemática – também ao nível do Ensino Básico, procurou-se averiguar em que medida os docentes procuram seguir as tendências legais, nomeadamente, no que respeita à tipologia de exercícios, ao que a experiência indica, tão contrária ao que tradicionalmente se aplica(va) num teste de avaliação escrita.

O último grupo de questões16 possui um carácter mais abrangente com vista a perceber

até que ponto o manual escolar é, na perspectiva dos professores, (im)prescindível à sua prática pedagógica e as razões que sustentam a posição assumida:

«A ideia de prática pedagógica refere-se, de forma comum, directamente às actividades de ensino (relação professor/alunos) no espaço de aula, para ‘dar’ um certo programa. O papel do professor, evidentemente, transborda muito para além deste conceito redutor: a planificação das aulas, a elaboração de materiais didácticos, a avaliação e algumas funções de foro mais burocrático – uma multiplicidade de actividades distanciadas, de certa maneira, da relação didáctica.» (Tormenta, 1996: 63-64)

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