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McKenna (2010, p. 1) cita sua experiência na Escola de Negócios Said da Universidade de Oxford, quando um dos alunos veio até ele expondo sua preocupação. A crise econômica em 2000 havia deixado a maioria dos alunos da escola de negócios lutando para encontrar emprego, quando apenas um ano antes eles teriam recebido ofertas de vários empregadores bem conhecidos. O estudante começou por descrever sua experiência de trabalho, como gerente geral, tanto em sua empresa familiar e também em outra empresa tradicional, antes de fazer um MBA. O homem, em seus vinte e poucos anos, explicou que estava tendo dificuldade para encontrar um emprego em alguma empresa de consultoria ou em um banco de investimento pois ninguém estava contratando durante a recessão da época. Dada a sua experiência de trabalho e sua provada competência, Por que não procurar um trabalho desafiador numa grande indústria? questionou o professor. O estudante sorriu, respondendo que se realmente quisesse outro emprego na indústria, por que teria gasto todo esse tempo e dinheiro para fazer um MBA?

A partir desta situação, McKenna (2010) descreve sua percepção no grande interesse na profissão de consultoria. Ao final dos anos noventa, as agências de emprego alocaram estudantes das principais escolas de negócios nas empresas de consultoria e bancos de investimento. O autor comenta que, embora as escolas de negócio esperavam criar um novo “profissional de negócios”, ao final do século XX, as principais empresas líderes de serviço

profissionais tinham capturado e então redirecionado a elite das escolas de negócios para servir as necessidades especializadas de sua própria “quase-profissão”.

O desafio central do trabalho de McKenna no seu livro “The world’s newest

profession” é buscar explicações para o notável domínio desta profissão, de consultor, no

mundo e, para tanto, resgata o histórico de crescimento do setor destacando os principais agentes e as Big Three, Big Four ou Big Six, de acordo com o período. O autor também destaca que a indústria de consultoria prospera junto com a economia, e também com a mudança, sendo que pertence à economia do conhecimento (MCKENNA, 2010).

Torna-se importante reconhecer o contexto geral de crescimento desta indústria, de uma perspectiva do novo formato das organizações, inseridas na sociedade do conhecimento. De acordo com Pereira e Barbosa (2008, p. 97) “as organizações tem sofrido transformações intensas em sua dinâmica, devido às mudanças constantes em seus ambientes de negócios”.

Diante desse cenário, elas vêm se esforçando no sentido de acompanharem tais mudanças, interpretá-las e compreenderem as implicações para seus negócios; além de buscarem atualização sobre os fatores de mudança e utilizarem as informações nas tomadas de decisões.

Almeida et al. (2006, p. 2) comentam que a consultoria organizacional pode ser entendida como atividade mediadora do conhecimento na empresa e no sistema-cliente, sendo o consultor a figura responsável por disseminar a cultura do management, que gera impactos no âmbito organizacional, por meio da incorporação de ações e tomadas de decisões, legitimando novas ideias e práticas gerenciais. Compreende-se então, o papel dos consultores como multiplicadores da cultura do management. Os autores comentam o papel social de intelectual que tem o consultor, uma vez que fomenta a atividade intelectual, em artigo que discutem sobre o conhecimento, como cultura dinâmica e evolutiva e apresentam a consultoria organizacional como propiciadora da disseminação do conhecimento, entendendo o consultor como agente intelectual nesse processo.

Vale destacar o entendimento de Mannheim (1974) acerca do intelectual, sobre o qual, de acordo com o autor, pode ser identificado por apresentar características comuns que o distingue dos outros grupos sociais: a) estão de posse de conhecimento aplicável, expresso por seus certificados; b) são selecionados a partir de princípios que englobam educação, posição social e renda; e c) obtêm status social, conferido por um ethos vocacional, que os aproxima de uma missão voltada para a coletividade.

Conforme Almeida et al. (2006, p. 5), os intelectuais não têm um papel privilegiado na sociedade, nem estão situados numa camada social acima das demais, que lhes

confira supremacia. O status social desse grupo está vinculado à criação e disseminação de ideias que formarão a opinião dos cidadãos, numa perspectiva mais crítica.

O consultor pode perfeitamente ser encaixado na descrição de intelectual, conforme argumentação dos autores, porém questiona-se acerca do status social que apresentam, pois é uma característica marcante dos profissionais de consultoria os artigos renomados em vestuários e equipamentos de tecnologia. São visivelmente diferenciados, como apontam até algumas piadas acerca dos consultores.

Porém, o papel de intelectuais, como já exposto, pode ser ratificado a partir dos trabalhos de Paula e Wood Jr (2008, p. 176), para quem o principal produto vendido pelas empresas de consultoria é o conhecimento e com isso a gestão do conhecimento vem se tornando um dos grandes trunfos das empresas de consultoria. Os autores comentam alguns fatores fundamentais para a manutenção do sucesso desta indústria de aconselhamento:

1) A importância do capital intelectual;

2) A construção de parcerias estratégicas no campo da tecnologia da informação;

3) A criação de soluções integradas para melhor atender aos clientes; 4) A cobertura global;

5) A reputação e a marca; e

6) Colaboração e compartilhamento de riscos com os clientes.

A partir de tais fatores, vale referenciar a citação de Block (2001, p. 2), que descreve o consultor como uma pessoa em posição de exercer alguma influência sobre um indivíduo, grupo ou organização, porém sem poder direto para introduzir mudanças. O poder pertence ao gerente (ou dono) da organização. Para qualificar o consultor, o autor distingue três tipos dos de habilidades: técnicas, interpessoais e de consultoria, propriamente, ligadas ao processo da mesma, desde o início, diagnóstico, implementação e finalização (BLOCK, 2001, p. 4).

Considerando a importância das habilidades interpessoais, destaca-se no trabalho de Wood e Caldas (2005, p. 96), em suas contribuições finais, o desgaste psicológico que envolve a atividade de consultoria, na qual os profissionais são permanentemente submetidos a situações de pressão e experimentam sentimentos de injustiça, impotência e frustração. Os consultores a todo momento são testados, são postos à prova, uma vez que sua “ferramenta” de trabalho é composta por um ativo intangível, seu conhecimento, e necessita de comprovação para alcançar “aceitação” no mercado (WOOD e CALDAS, 2005, p. 96).

Fincham (1999, p. 337) também destaca a necessidade constante de legitimação do conhecimento do consultor. O autor aponta e questiona como os consultores demonstram valor para os clientes, e como estabelecem o valor de seus conselhos. A resposta é que isso ocorre através do que é latente no discurso do consultor: essa gama de técnicas teóricas, meios de controlar a imagem que o cliente percebe, e a definição dos problemas dos clientes.

Autores sugerem que o ato de aconselhamento por um especialista externo implica uma inadequação no entendimento do próprio cliente. Por isso, independentemente da qualidade do aconselhamento, a legitimação do processo depende de "resultados simbólicos", como a impressão de que o cliente recebe dos profissionais e suas técnicas. Outros estudiosos têm explorado como consultores, por meio de metodologias científicas, competência dos praticantes negociam na realidade das aparências, já que há pouco em direção ao significado objetivo para julgar seu conhecimento e soluções. A força da retórica também deve ser enfatizada (FINCHAM, 1999, p. 338).

Consultores qualificam a relação com os clientes como indispensável e dependente, e utilizam uma série de estratégias de legitimação: eles alegam que não estão vendendo um produto mas oferecendo um negócio desinteressado; eles tomam o cuidado de não serem identificados como meros portadores de soluções técnicas, mas com alto nível de habilidades técnico-organizacional. De acordo com Fincham (1999 p. 338), os consultores exploram as áreas onde os clientes não são aptos a qualificar a qualidade da consultoria devido à natureza intangível do conhecimento dos consultores, que permite um escopo para eles construírem a realidade, por meio da qual persuadem os clientes que eles devem comprar um serviço de alta qualidade.

Executivos têm aceitado o mérito dos consultores porque alguns especialistas têm provado ser hábeis para dominar, manipular e ampliar novas esferas do conhecimento complexo (McKENNA, 2010, p. 11). Os consultores se dedicam a especializar-se em uma tarefa, por isso podem aproveitar de uma economia pessoal de escala. Essas economias são evidentes mesmo nas profissões clássicas, embora o medo da superespecialização, já que especialistas dentro de organizações burocráticas tem tomado o lugar de generalistas.

Segundo McKenna (2010, p. 12), a questão que deixa os analistas perplexos não é a função que desempenham os consultores, mas a forma. Os críticos, em geral, não questionam porque os executivos necessitam contratar especialistas em reorganização administrativa, tecnologia da informação ou estratégia corporativa, mas questionam porque permanecem externos à empresa, porque não são internalizados. Firmas tem fronteiras e essas

deveriam ser mantidas fortes, porém a consultoria de gestão floresceu primeiramente porque tem permanecido fora dos limites tradicionais da firma. Para o autor, a consultoria floresceu onde os benefícios da economia de conhecimentos excedem os custos da contratação externa. Em cada caso, uma decisão do executivo sobre se o uso de consultores para resolver os problemas internos dependia de despesa incremental do consultor: uma estimativa dos custos de transação relativos.

Nesse mesmo sentido, Canback (1998; 1999) justifica a existência das empresas de consultoria a partir do aumento dos custos indiretos das empresas, ou seja, os custos gastos com a administração do negócio e não com atividades diretamente relacionadas à produção. A partir daí, segundo o autor, ficaria fácil presumir um considerável aumento nas chances de ocorrerem problemas de coordenação e gerenciamento na busca da realização de economias de escala e de escopo. Nesse sentido, consultores externos podem surgir como agentes que possuem informações a um menor custo do que o de se obter essas informações internamente.

Armbruster (2010, p. 17) cita quatro teorias que podem apresentar justificativas importantes a respeito da consultoria de gestão, baseadas em: Teoria dos Custos de Transação e Teoria da Sinalização, vindas da Economia, e Neoinstitucionalismo Sociológico e Teoria do Enraizamento, vindas da área de Sociologia.

A Teoria do Neoinstitucionalismo Sociológico se baseia no argumento que é uma crença na eficiência de determinada prática ou solução, em vez da eficiência comprovada, que determina ou influencia a ação econômica, e destaca que prevalece a legitimidade sobre a eficiência técnica, para o ambiente organizacional, as decisões são baseadas nas decisões das outras organizações, que são os elementos do isomorfismo.

A Teoria da Sinalização argumenta que nos mercados bens que necessitam de credenciais, na incerteza da qualidade, fornecedores investem nas características de produtos ou serviços que sinalizam status, qualidade e confiabilidade, utilizam os fatores de entrada como indicadores dos resultados das saídas. Como exemplo, pode-se citar os certificados de MBA das escolas de negócio renomadas como garantia da qualidade do profissional, como fazem as grandes empresas consultorias, ao contratarem os melhores alunos das melhores instituições.

A Teoria dos Custos de Transação, como já apresentado acima, seria outro fator importante na proposta de Armbruster. O autor destaca a decisão “comprar ou fazer”, e aponta fatores como a incerteza, a frequência e a especificidade, e quanto maiores, maior a eficiência se desenvolvido internamente. A consultoria, porém, apresenta justamente o inverso destes fatores.

Finalmente, a Teoria do Enraizamento que desafia a Teoria dos Custos de Transação, pois afirma que as decisões são delimitadas por laços sociais, e que a eficiência da transação é apenas uma consideração ou possibilidade.

A partir de outro ponto de vista, Sturdy (1997 p. 391) apresenta três possíveis explicações para o uso da consultoria, por exemplo no caso de projetos de Tecnologia de Informação, geralmente, as razões dadas podem incluir:

 Executivos querendo exercitar o controle sobre a gestão e o investimento em TI, mas a quem falta a perícia.

 O usuário ou gerente do departamento de sistema de informação desprovido de habilidades ou recursos para um projeto e/ou, menos explicitamente, competindo um com o outro.

 Um indivíduo ou um dos grupos acima usando de objetividade e/ou status de consultor para legitimar ou influenciar um curso de ação.

Outros fatores inter-relacionados podem incluir: promessa de solução para problemas organizacionais novos ou continuados; mudança com um motivador em si; imagem e status individual e corporativo; pressões competitivas e poder de persuasão dos consultores.

Para Sturdy (1997), o processo de consultoria é de natureza existencial dialética e estrutural. Gerentes tendem a se comportar com incerteza e/ou insegurança e então buscam um senso de segurança, controle ou ordem, os quais são oferecidos pelos provedores de novas ideias. De acordo com suas pesquisas, os consultores identificaram nos clientes uma insegurança quanto às tarefas compatíveis ao seu trabalho, na coordenação e controle de algo imprevisível, como o mercado, ambiente, organização e empregados.

O autor enfatiza o modo como as pressões geradas pela competitividade sobre clientes e consultores, combinados com a cultura norte-americana de anti-intelectualismo e visões machistas, levam à adoção e comercialização de técnicas simplistas, e, portanto, necessariamente falhas. Contudo, argumenta Sturdy (1997, p. 392), é a ansiedade inconsciente dos gerentes e seu conjunto de fantasias, como “destruir o inimigo” (competição) e uma dependência acrítica sob um líder ou ideia, o que resulta num ciclo de altos e baixos de novas ideias.

A percepção predominante é das inseguranças pelas quais passam os gerentes e executivos, destacando as estratégias retóricas e persuasivas dos consultores. O reconhecimento, conforme afirma Sturdy (1997, p. 394), da ameaça potencial das soluções dos consultores para os gerentes destaca a necessidade de reconhecer a resistência e ação

aparentemente auto interessada, em vez dos consultores se comportarem como simplesmente vulneráveis e inseguros ou agentes do capital (servindo aos interesses do capital sobre o trabalho). O autor representa seu argumento por meio da Figura 1 a seguir:

Figura 1 - Ciclo clientes versus consultoria

estímulos reforços desafios renovação Fonte: Sturdy (1997, p. 397)

De acordo com a Figura 1, outras explicações são dadas, tais como as normas gerenciais de estar “atualizado” ou contradições estruturais e ciclos macroeconômicos. Em particular, a ansiedade gerencial não pode ser isolada das estruturas sociais e econômicas para atingir problemas “reais”. Em vez disso, é uma condição e consequência daquelas estruturas e suas tensões e contradições inerentes. Além disso, de acordo com o modelo de consultoria sugerido, a ênfase é recolocada no destaque das inseguranças dos consultores e contem a visão dos gerentes como vítimas passivas. Desta forma, um modelo interativo do processo de consultoria é proposto na Figura 1, o qual sugere como a consultoria é estimulada pelo seu fornecimento e é então criado o ciclo de estímulos e reforços, de desafios e renovação.

Considerando todos os aspectos citados, torna-se importante destacar aqui as conclusões de Paula e Wood Jr (2008, p. 176), que elencam as tendências experimentadas pelas consultorias nos últimos anos:

 aumento do nível de exigência dos clientes, com crescimento da pressão por resultados e a não aceitação de longos relatórios ao final do processo, mas a apresentação de resultados efetivos da ação dos consultores;

 aumento da atratividade do setor, combinada com a relativa ausência de barreiras de entrada, leva a um aumento da competição; baseado no constante aumento da complexidade no mundo organizacional, em que os consultores aprenderam a se torna indispensáveis, ou pelo menos convencer as pessoas de que são;

Interesses dos clientes em novas ideias Indústria da consultoria Preocupação de garantir a sensação de controle sobre o ambiente e identidade (ex: como

competentes) Sensação de controle sobre ambiente e identidade (Exemplo: como especialistas técnico-políticos)

 um direcionamento para a área de tecnologia de informação e gestão do conhecimento, que conduz a investimentos em capital intelectual e a uma aproximação dos centros de pesquisas e do mundo acadêmico. Empresas de consultoria são, de fato, organizações de conhecimento intensivo, cuja principal fonte de lucratividade está nas ideias que geram, manipulam e aplicam;

 aumento das críticas e a crise de credibilidade, devido às expectativas frustradas e aos erros cometidos em projetos; e

 mudança na forma de relacionamento com o cliente e na forma de conduzir os projetos, devido ao novo padrão de exigência e às críticas.

Tais tendências são comprovadas pelos noticiários e reportagens acerca deste setor. Deve-se considerar, finalmente, que os principais agentes deste campo não estão parados esperando por um desfecho, mas criam estratégias e se movimentam na disputa por espaço, fazendo alianças por meio de fusões ou aquisições de empresas menores, como estratégia de manutenção de sua dominação ou simplesmente para não serem excluídos. Torna-se necessário distinguir o conjunto de fatores que podem ser importantes nessa disputa.