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5 REFLEXOS DAS INOVAÇÕES DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL NOS

5.2 INOVAÇÕES IMPLÍCITAS

5.2.2 Contagem de prazos processuais em dias úteis

O tema “prazos processuais” foi bastante modificado com a entrada em vigor do CPC/15. Destaca-se, porém, a inovação quanto à forma de contagem de prazos. Com efeito, o teor do art. 219, caput, assevera que, agora, os prazos devem ser contabilizados em dias úteis, e não mais em dias corridos, como era consagrado no antigo CPC.

Dessa forma, a partir de então, desprezam-se os dias que são considerados feriados (sábados, domingos, feriados e dias em que não houver expediente judiciário) na contagem dos prazos processuais, tanto aqueles determinados por lei, como os estabelecidos pelo julgador.

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SOUZA, Marcia Cristina Xavier de; NETTO, Fernando Gama de Miranda. Impactos do Novo Código de Processo Civil no sistema dos Juizados Especiais. In: Novo código de processo civil: impactos na legislação extravagante e interdisciplinar, Vol. 1. – São Paulo: Saraiva, 2016. p.387.

A antiga forma de contagem tinha como pressuposto o fato de que os advogados trabalhavam ininterruptamente135, sendo, dessa forma, altamente prejudicial à classe. Buscou-se, portanto, com essa novidade, a preservação do descanso dos advogados (garantia constitucional prevista no art. 7º, XV da Constituição Federal), atendendo-se, assim, uma antiga demanda da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).136

Por outro lado, é também verdade que esta inovação alonga o processo, estendendo-o, a depender do caso, em até cerca de duas semanas. Em razão disso, muito se tem questionado acerca da aplicabilidade desta inovação aos demais âmbitos processuais do ordenamento jurídico brasileiro.

No sistema processual do trabalho, por exemplo, desde a entrada em vigor da Lei nº 13.467/17, responsável pela reforma trabalhista, passou-se a adotar a contagem de prazo de acordo com o CPC/15, isto é, em dias úteis. Assim, a redação do art. 775 da CLT foi alterada, passando a dispor que “Os prazos estabelecidos neste Título serão contados em dias úteis, com exclusão do dia do começo e inclusão do dia do vencimento”.

No que tange aos Juizados Especiais, entretanto, a questão ainda não está pacificada, apesar do claro posicionamento do FONAJE contrário à aplicação dessa nova regra. Nesse contexto, em nota técnica de nº 01/2016, o FONAJE se manifestou no sentido de rejeitar a aplicabilidade do art. 219 nos Juizados Especiais. Veja-se:

(...) com o advento do Novo Código de Processo Civil (CPC de 2015), por força do artigo 219, a justiça cível dita comum passa a conviver com a contagem de prazos legais e judiciais em dias úteis, em inexplicável distanciamento e indisfarçável subversão ao princípio constitucional da razoável duração do processo. Todavia, forçoso é concluir que a contagem ali prevista não se aplica ao rito dos Juizados Especiais, primeiramente pela incompatibilidade com o critério informador da celeridade, convindo ter em mente que a Lei 9.099 conserva íntegro o seu caráter de lei especial frente ao novo CPC, desimportando, por óbvio, a superveniência deste em relação àquela.137

Em igual sentido foram editados, no XXXIX Encontro, em Maceió-AL, dois Enunciados do FONAJE: o Enunciado nº 165, em que consta que “Nos Juizados

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ROCHA, Felippe Borring. Op. cit. p. 129.

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NÓBREGA, Rafael Estrela. Op. cit. p. 350.

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Especiais Cíveis, todos os prazos serão contados de forma contínua” e o Enunciado nº 13 da Fazenda Pública, cujo teor determina que “A contagem dos prazos processuais nos Juizados da Fazenda Pública será feita de forma contínua, observando-se, inclusive, a regra especial de que não há prazo diferenciado para a Fazenda Pública - art. 7º da Lei 12.153/09.”

Já no âmbito dos Juizados Especiais Federais, o posicionamento foi pacificado em sentido contrário138. Com a publicação da Resolução CJF-RES- 2016/00393, fixou-se o entendimento de que se aplica a contagem de prazo em dias úteis aos Juizados Especiais Federais, de acordo com o que dispõe o art. 6º-A do regimento interno da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU): “Na contagem de prazos em dias, computar-se-ão apenas os dias úteis”.

Ademais, em que pese os enunciados do FONAJE servirem como orientações aos operadores do direito no âmbito dos Juizados Especiais139, os Estados vêm divergindo quanto à aplicação dessa novidade. Enquanto os Tribunais de Justiça do Estado de São Paulo140 e Rio de Janeiro141, por exemplo, já editaram Enunciados no mesmo sentido do FONAJE, a Turma de Uniformização dos Juizados Especiais do Distrito Federal já se posicionou em sentido contrário aos dos Enunciados supracitados, editando seu próprio Enunciado, de nº4, no qual consta que: “Nos Juizados Especiais Cíveis e de Fazenda Pública, na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis, nos termos do art. 219 do Código de Processo Civil.”

Também é favorável à aplicação da novidade trazida pelo CPC nos Juizados Especiais o Conselho Federal da OAB; o Fórum Permanente de Processualistas Civis (FPPC), que editou Enunciado nº 416, dispondo que “A contagem do prazo processual em dias úteis prevista no art. 219 aplica-se aos Juizados Especiais

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CAVALCANTE, Bruno Arcoverde. Aplicações do Novo Código de Processo Civil aos Juizados Especiais Cíveis. Revista Síntese: Direito Civil e Processual Civil, São Paulo, v. 19, n. 109, set./out. 2017. p. 57.

139 THÓ, Hanna. Op. cit. p. 33. 140

Enunciado nº 74 do FOJESP: “Todos os prazos, no Sistema dos Juizados Especiais, serão contados de forma contínua, excluindo o dia do começo e incluindo o dia do vencimento”. Disponível em: http://www.tjsp.jus.br/Noticias/noticia?codigoNoticia=30796&Id=30796. Acesso em: 04/02/2018.

141 AVISO CONJUNTO TJ/COJES nº 15/2016. Enunciado nº 12.2016: PRAZOS – FORMA DE

CONTAGEM: “Os prazos processuais em sede de Juizados Especiais Cíveis são contados em dias corridos, inaplicável o artigo 219 do Código de Processo Civil de 2015.” Disponível em: http://www.tjrj.jus.br/documents/10136/18972/aviso-conjunto-tj-cojes-15-2016.pdf. Acesso em: 04/02/2018.

Cíveis, Federais e da Fazenda Pública”; bem como a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (ENFAM), que aprovou o Enunciado de nº 45, cujo teor explicita que “A contagem dos prazos em dias úteis (art. 2019 do CPC/2015) aplica-se ao sistema de Juizados Especiais.”

Fato é que as leis que compõem o sistema dos Juizados são omissas quanto à forma de contagem dos prazos processuais, o que justifica a incidência supletiva e subsidiária do CPC/15 para suprir a referida omissão, tal como já ocorria com o CPC/73. Entretanto, imprescindível que se faça uma análise da compatibilidade com os princípios norteadores dos Juizados.

Os que defendem a inaplicabilidade da regra em comento aos Juizados os fazem em razão de uma suposta incompatibilidade da nova regra com o princípio da celeridade que rege sistema dos Juizados Especiais. Ocorre que, como já mencionado anteriormente, a celeridade prevista no art. 2º da Lei nº 9.099/95 deve ser compreendida como “duração razoável do processo”, expressão essa constitucionalmente consagrada, e não como uma “rapidez” desejada a qualquer custo.

Ademais, faz-se mister ressaltar que não é a forma em que são contados os prazos que é decisiva para se ter um processo célere ou não142. A concretização da tão buscada celeridade dos procedimentos sumariíssimo dos Juizados encontra barreira, a bem da verdade, em um problema estrutural do judiciário brasileiro, bem como da própria sociedade e suas inúmeras demandas judiciais, que acabam por abarrotar os Juizados Especiais por todo o Brasil. Assim, não seria a contagem de prazo em dias úteis que iria trazer uma demora desproporcional ao procedimento sumariíssimo, de modo a desvirtuar a finalidade pela qual os Juizados Especiais foram instituídos.

Isso posto, considerando que a regra da contagem de prazo visa resguardar um direito essencial do advogado, sendo este um elemento indispensável à

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Nesse sentido, Rogério Licastro dispõe que “De fato, não é razoável ponderar que contar apenas dias úteis para fins de cumprimento de prazos no âmbito da Lei 9.099/95 tornaria o rito desta moroso, ou ainda mais moroso (pragmaticamente falando). É de domínio público que as ações judiciais que tramitam nos juizados especiais cíveis Brasil afora exigem meses e anos para que atinjam sua conclusão, meses e anos estes que não deixarão de ser, com o perdão pela repetição, meses e anos porque alguns poucos dias não úteis foram excluídos do cômputo de prazos!“ MELLO, Rogério Licastro Torres de. Contagem de prazos nos juizados especiais deve obedecer regra do novo CPC. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-mar-31/contagem-prazos-juizados-especiais- obedecer-cpc. Acesso em: 30/01/2018.

administração da justiça143, e que não traz dilações indevidas ao processo, conclui- se que essa regra não é incompatível com o núcleo duro dos Juizados, incluindo-se aqui o princípio da “celeridade”.