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Capítulo 2 – Pragmática: uma questão prática concreta

2.5 Contexto: do anonimato ao protagonismo no processo comunicativo

O contexto é um conceito que ao longo dos anos ficou adormecido nas preocupações dos linguistas e filósofos da linguagem, sendo ignorado e desconsiderado por muitos pesquisadores, apesar de já ser objeto nos estudos vinculados à análise do discurso. Com o reconhecimento e o afloramento dos estudos pragmáticos ele começa a conquistar um papel fundamental no cenário investigativo, além de ser extremamente pertinente e interessante à área da educação durante os processos de ensino e aprendizagem. O contexto é, portanto, um constituinte fundamental dos estudos e análises pragmáticas.

Para a pragmática, como vimos anteriormente, o contexto é um elemento essencial para a interpretação dos enunciados no ato comunicativo. É demasiadamente importante considerar que o contexto não é apenas a situação local em que ocorrem os atos comunicativos, porque ele pode ser linguístico, mental, situacional, sociocultural, circunstancial etc.

Segundo Santos (2013) o contexto foi considerado uma fronteira que separaria a semântica da pragmática, porque a semântica estuda o significado de uma proposição sem considerar o contexto, ao passo que a pragmática analisa o significado vinculado ao contexto. Citamos no item 1.1 que sintaxe, semântica e pragmática podem ser estudadas separadas, porém, só adquirem uma compreensão apropriada quando analisadas em relação recíproca umas com as outras.

Apesar de estar em voga nos estudos linguísticos pragmáticos, definir o conceito de contexto não é uma tarefa muito fácil, e, talvez não seja uma necessidade eminente como é a de utilizá-lo e de apropriar-se dele, como elemento constituinte fundamental das análises no processo inferencial. Segundo a TR, o contexto pode ser caracterizado momentaneamente como uma constante inconstante, pois é estável e efetivo no ato comunicativo, mas, modifica-

se a todo instante, a cada enunciado e a cada informação nova, vinculando-se ao lugar, momento, cultura, situação de uso, público etc.

Para a TR, o contexto no momento do ato comunicativo, geralmente contém informações derivadas de contextos imediatamente anteriores. Assim, um ato comunicativo só poderia ser de fato interpretado sem nenhuma imprecisão, tal qual o falante deseja, caso ele tivesse acesso ao contexto mental do ouvinte no momento da enunciação, fato este que sabemos ser impossível, visto que se trata de seres humanos e os diversos contextos, nos quais estão inseridos, modificam-se a todo instante.

Como a proposta desta investigação está voltada para a análise de textos na perspectiva da Teoria da Relevância, o contexto é um elemento indispensável durante o processo investigativo. Vale ressaltar que ele é uma circunstância fundamental na produção textual, pois através dele será possível identificar, justificar e chegar a resultados que permitam entender muitos elementos implícitos no texto.

2.5.1 O texto no contexto

Ao solicitar uma produção textual a um estudante, primordialmente o professor deve levar em consideração o que é possível para ele naquele momento. Um dos fatores para que haja uma produção bem sucedida é o conhecimento prévio sobre o assunto/tema proposto. Ou seja, é necessário que exista algum vestígio e/ou registro presente na memória enciclopédica do aluno, ao passo que se isso não acontecer ele encontrará dificuldades no processo inferencial, já que seu “banco de dados” mental não encontra nenhum registro armazenado sobre tal assunto. Exemplifiquemos isso:

(4) - Um professor do terceiro ano do ensino fundamental I propõe aos seus alunos (crianças na faixa etária de 9 anos), uma produção de texto falando sobre a crise política do Brasil.

Obs: Neste período escolar, as crianças estão começando a produzir seus primeiros ensaios textuais.

Pois bem, provavelmente a criatividade será grande, mas as chances de que estes alunos consigam produzir um texto que esteja devidamente voltado ao tema proposto será mínima ou nula. Sobre a escrita Olson destaca que:

[...] Para dominar a escrita, não basta conhecer as palavras, é necessário aprender a compartilhar o discurso de alguma comunidade textual, o que implica saber quais são os textos importantes, como devem ser lidos ou interpretados, como devem ser aplicados na fala e na ação. [...] Pensamos no domínio da escrita como condição ao mesmo tempo cognitiva e social: a capacidade de participar ativamente em uma comunidade de leitores que concordam com certos princípios de leitura. (OLSON, 1998, p. 75 apud LERNER, 2002, p.61)

Tomando como base as palavras da citação, e levando em consideração a idade cronológica dos alunos do terceiro ano, podemos deduzir hipoteticamente que os estudantes não devem fazer parte da chamada comunidade textual que discute ciências políticas. O contexto situacional destes alunos é outro neste momento, porque estão iniciando as atividades voltadas à produção textual, ou seja, estão aprendendo como montar um texto e os elementos que devem utilizar em sua construção. Neste momento o processo de aprendizagem não é favorável ao desempenho solicitado, é bem provável que os dados armazenados na memória enciclopédica desses alunos não tenha suporte suficiente para a realização da tarefa, assim como o contexto linguístico deles também não seja satisfatório.

Porém, é interessante ponderar que, mesmo sem ter todos os requisitos acima, para desempenharem a proposta, de certa maneira estas crianças irão utilizar o seu “processador” mental na tentativa de processar aquilo que a professora pediu, o que exigirá um esforço cognitivo muito alto das crianças e, consequentemente não causará o efeito esperado.

Todo texto é, portanto, uma construção linguística, na qual estão presentes vários elementos, por isso ele só poderá ser produzido (autor) e interpretado (leitor) quando houver um conhecimento de mundo em torno desse processo de construção e interpretação. As variáveis linguísticas, culturais, sociais, históricas etc exercem um poder de influência muito grande tanto na produção, quanto na interpretação do leitor.

Salientamos mais uma vez a importância de identificarmos as pessoas como indivíduos ativos e únicos, pois os significados atribuídos nas diversas situações comunicativas são exclusivos de cada ser humano, e o(s) contexto(s) condiciona(m) tanto a produção quanto a recepção de textos