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Historicamente, a concepção do orçamento como instrumento de planejamento surgiu por ocasião do liberalismo, posto que, com o absolutismo, não havia controle, nem prestação de contas aos cidadãos, a respeito dos recursos públicos. Não é difícil imaginar que, diante do poder ilimitado do rei, as finanças públicas se misturavam com os gastos pessoais do soberano.

Portanto, nesse primeiro momento, a partir do surgimento do Estado liberal, o orçamento ganha status de instrumento de planejamento, com regulação normativa, para limitação do poder estatal. Conforme afirma Oliveira (2013, p. 400), “classicamente, o orçamento era uma peça que continha a previsão das receitas e a autorização das despesas, sem preocupação com os planos governamentais e com os interesses efetivos da população. Era mera peça contábil, de conteúdo financeiro”. Nessa visão, originalmente, o orçamento servia como peça documental para a previsão das receitas e a autorização de realização das despesas.

A partir do século XIX, o orçamento ganha enorme relevância social. A delimitação das receitas e despesas já constituía fator relevante, em razão do cenário social que surgia. O liberalismo estava materializado diante das exigências em prol do controle dos gastos públicos e limitação dos poderes do Estado sobre a gestão das finanças públicas. Nesse viés, Torres (2014, p. 342) afirma que

[...] os povos conquistaram o direito de dominar as finanças do Estado e, ao mesmo tempo, o de controlar as escolhas democráticas, ante as preferências reveladas no processo eleitoral, no que concerne à realização contínua dos fins do Estado, da efetividade dos direitos e da apuração do cumprimento dos programas dos governantes eleitos pelo voto popular.

No entanto, é importante esclarecer que a primeira preocupação do orçamento clássico não contemplava o planejamento orçamentário, mas sim, buscava promover o equilíbrio fiscal, para evitar a tributação excessiva sobre a população. À época, a ideologia liberal, defensora da intervenção mínima do Estado, prevalecia em reação ao absolutismo, e buscava- se, portanto, o controle dos gastos públicos e a atuação mínima do Estado nas relações entre os particulares. Essa concepção, do equilíbrio entre receita e a despesa, prolongou-se por muito tempo. “Durante os dois primeiros séculos, desde a revolução britânica de 1688, o

orçamento, como instrumento político, foi o escudo para defesa dos contribuintes contra os governos [...]” (BALEEIRO, 1998, p. 425).

Ainda no século XIX, o Estado foi mudando de perfil e começou a abandonar a neutralidade no período do laissez-faire. Assim, passou a intervir mais tanto na economia, quanto nas relações sociais, a fim de corrigir as distorções do sistema econômico e incentivar o desenvolvimento (GIACOMONI, 2009). Já, no século XX, principalmente, após a tragédia da Segunda Guerra Mundial, o caráter instrumental procedimental e formal do orçamento foi cedendo espaços para as novas concepções, agora, já alinhadas com a ideia de planejamento.

leEm razão da maior intervenção do Estado na economia, contrariando os postulados da ideologia liberal, o orçamento transformou-se em um instrumento utilizado pelo governo, para enfrentar as crises nos momentos de depressão, desemprego, e em um meio para combater a inflação e a promoção de investimento (BALEEIRO, 1998).

Em síntese, foi, praticamente, no século XX, que o orçamento ganhou mais notoriedade e passou a assumir outras funções, não se resumindo numa simples previsão de receita e autorização de despesa. Assim, constituiu-se num expressivo instrumento de administração, empregado como documento hábil de auxílio ao governo, na fixação de metas e objetivos a serem alcançados. Contudo, em razão da crise instalada nos anos de 1970, motivo de desequilíbrio nas contas públicas e do endividamento dos países mais desenvolvidos, o Estado do bem-estar social passou a ser contestado.

No Brasil, com o processo de organização das finanças do país, a partir da Constituição Imperial, de 1824, deu-se início ao tratamento formal do orçamento. A primeira lei orçamentária brasileira surge em 1827, porém, em razão de diversos fatores, tais como, os deficientes mecanismos arrecadadores nas províncias, as dificuldades de comunicação e conflitos com as normas legais, a lei teve frustrada a sua aplicação, todavia, o primeiro orçamento, pelo contexto, teria sido aprovado apenas em 1830 (GIACOMONI, 2009).

Importantes alterações orçamentárias foram instituídas pela Constituição Federal em 1891, a respeito da distribuição de competências em matéria orçamentária. O Congresso Nacional, por exemplo, assumiu a função privativa pela elaboração do orçamento, sendo de iniciativa da Câmara dos Deputados. Outro ponto de destaque foi a preocupação com o controle e a tomada de contas do executivo, o que resultou na criação de um Tribunal de Contas.

Mais tarde, em 1922, foi instituído o Código de Contabilidade da União. Com isto, formalizou-se a prática do Poder Executivo fornecer, ao Poder Legislativo, todos os elementos para que esse poder exercitasse sua atribuição de iniciar a elaboração da lei

orçamentária (GIACOMONI, 2009). Para esse o autor, a proposta de modernização do Estado, em 1930, resultou na centralização da maior parte das funções públicas na área federal.

Em outro contexto, a Constituição Federal, outorgada em 1934, representando essa nova realidade, deu destaque especial ao orçamento, atribuindo a competência por sua elaboração ao Presidente da República. O Poder Legislativo encarregava-se da votação do orçamento e do julgamento das contas do Presidente, com auxílio do Tribunal de Contas.

Em decorrência da nova Constituição Federal, em 1937, a proposta orçamentária seria elaborada pelo Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP), junto à Presidência da República, e votada pela Câmara dos Deputados e pelo Conselho Federal, mas, na realidade, o orçamento sempre foi elaborado pelo Poder Executivo (GIACOMONI, 2009). Pela Constituição Federal de 1946, o orçamento retoma a sua característica mista, o Poder Executivo elaborava o projeto de lei do orçamento e encaminhava para discussão e votação nas casas legislativas. Além disso, foram consagrados importantes princípios orçamentários, como a unidade, a universalidade, a exclusividade e a especialização.

A situação, em 1967, foi diferente. A Constituição inovou e retirou prerrogativas do Poder Legislativo, a respeito do orçamento e a realização de despesa, limitando a sua autonomia acerca da iniciativa de leis ou emendas que criavam ou aumentavam despesas e emendas ao projeto de lei do orçamento (GIACOMONI, 2009).

Nas décadas seguintes, a Constituição Federal de 1988 dedicou-se atenção especial ao tema do orçamento público e instituiu competência privativa do Presidente da República à iniciativa das leis orçamentárias: “Art. 84 - Compete privativamente ao Presidente da República: XXIII - enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento previsto nesta Constituição”.

Outra importante inovação, de acordo com Oliveira (2013), é o fato de que, com a Constituição de 1988, o poder de emendar o orçamento ganhou mais liberdade. Corroborando, Giacomoni (2009) esclarece que a Constituição retornou ao Poder Legislativo a prerrogativa de propor emendas sobre a despesa no projeto de lei de orçamento. Além do mais, o Executivo deve encaminhar ao Legislativo, anualmente, o projeto de lei referente à Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO), para orientação da Lei Orçamentária Anual (LOA).