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4. OS MODELOS DE ADERÊNCIA À FATOS ESTILIZADOS E DE FORMULAÇÕES

4.2. CONTEXTUALIZAÇÃO DA TEORIA ECONÔMICA EM UMA DISCUSSÃO

Os autores iniciam o trabalho dando ênfase a interação contraditória do papel dos salários na dinâmica capitalista. Segundo eles, tal contradição se traduz no fato de que salários mais altos significam maiores custos de produção e tende a reduzir o investimento. Porém, ao fornecer um maior poder de compra aos trabalhadores, eles também estimulam o consumo porque aumentam, relativamente, seu poder de compra.

Como se sabe, os salários são a principal fonte de demanda a partir das famílias. Assim, uma variação na taxa salarial causa um efeito complexo - e até ambíguo - sobre o nível de emprego e produção. Isso explica a existência de pontos de vista contrários na relação entre os salários e o nível de emprego e produto. Ademais, fornece também uma base econômica para sustentar diferentes ideologias políticas em relação a gestão da economia capitalista.

O objetivo central Bhaduri e Marglin (1990) é desenvolver um modelo contendo uma estrutura macroeconômica que trata a questão relatada anteriormente entre salários e desemprego, com o propósito de servir de referência para as diferentes ideologias políticas contestadoras do debate acerca do tema. Em outras palavras, o modelo tem a intenção de fornecer base científica para o debate sobre as flutuações na taxa salarial. A análise é conduzida a partir de uma perspectiva keynesiana que reconhece a importância central da demanda efetiva. O salário real é tratado como uma variável exógena. Para cumprir com o objetivo de analisar as flutuações da taxa de salário, as demais variáveis foram assumidas como endógenas enquanto suas oscilações afetam a variável salário real exógenamente. Segundo os autores, isto difere da estrutura da TG bem como da abordagem de Kalecki, dado que os mesmos tratam esta variável como endógena. Resumidamente, na TG o investimento autônomo determina a demanda efetiva por meio do mecanismo multiplicador. Ademais, a demanda efetiva determina o nível do produto e este, por sua vez, determina a taxa real de salário. Da mesma forma, os preços determinados no modelo de Kalecki deixam pouca margem para variações exógenas na

taxa de salário real na medida em que o nível de preços e o nível do salário mantêm uma relação aproximadamente proporcional.

Após a discussão da variável “salário real” ser tratada como exógena, os autores iniciam o modelo primeiramente em um contexto de uma economia fechada a fim de simplificar alguns pressupostos. Posteriormente, para uma economia aberta, os autores pressupõem que um relativo controle das variações exógenas da taxa real de salário podem se tornar viáveis por meio de políticas, como o ajuste na taxa de. Após isto, o modelo é desenvolvido para um contexto mais amplo, de uma economia aberta, em seguida são analisadas as limitações e as potencialidades do mesmo, que foi de grande inspiração para os modelos que se seguiram após os anos 2000. Sendo este citado diversas vezes na literatura, tanto de autores que fazem modelos, quanto os que trabalham apenas na discussão teórica.

Para atribuir a central importância da demanda efetiva na determinação do nível de atividade econômica (z), os autores reconstruíram uma curva similar a curva IS de Hicks. Nesta, os mesmos relacionam diferentes níveis de atividade econômica no mercado de commodities, à diferentes taxas de salário real (que está inversamente relacionada à margem de lucro (h), segundo a estruturação matemática do modelo). Isso resultou no surgimento de dois regimes econômicos, dependendo do sinal da inclinação da curva no ponto (derivada). Quando a derivada da curva é inclinada para baixo no gráfico (zh), considera-se válida a ideia considerada sub consumista que enfatiza um “efeito demanda” benéfico de um salário real mais alto. Isto foi descrito como um regime estagnado no modelo.

Inversamente, se a derivada da curva é inclinada para cima no gráfico, obtém-se um regime dinâmico, baseado na relação investimento e lucro. Este último regime contradiz a visão sub consumista ao apoiar a posição ortodoxa de que o "efeito de custo" de uma maior taxa de salário real reduz a atividade econômica (crescimento). Em contraste com o sinal da inclinação da curva - fundamental para caracterizar os dois regimes - sua elasticidade em valor absoluto é um indicador dos limites da cooperação entre capital e trabalho. Isso pode ser resumido estabelecendo uma curva similar a IS de Hicks (linear por simplicidade) que gira gradualmente da posição vertical para a posição horizontal. A rotação no sentido anti-horário e horário da curva em torno do ponto P irá caracterizar se o regime é estagnado ou dinâmico, respectivamente.

Ao mostrar que a cooperação entre classes (ou conflito) é possível em qualquer um dos regimes (estagnado ou dinâmico), a análise dos autores desmistifica um equívoco comum de que a visão de cooperação entre capital e trabalho deriva exclusivamente da lógica estagnada do subconsumo (maior capital leva a um maior trabalho/salários que por sua vez eleva o

consumo). Essa observação se torna evidente e relevante em uma economia aberta, altamente dependente do comércio exterior e sensível à concorrência internacional de preços.

Qualquer "efeito demanda" positivo de um salário real doméstico mais alto, seguindo a lógica estagnacionista, tende a ser compensado pelo seu "efeito custo" negativo na competitividade internacional dos preços, devido a uma maior dependência do mercado externo. Portanto, uma economia aberta poderia ser cada vez mais direcionada à lógica dinâmica, enfatizando a ideia de baixos custos trabalhistas. No entanto, a cooperação entre as classes ainda é possível se for alcançado um excedente de exportação suficientemente grande em escala global para manter o emprego e a massa salarial altos. Contudo, a impossibilidade de todos os países alcançarem superávit de exportação simultaneamente torna essa estratégia inerentemente falha em um modelo que consideram grande número de países.

O reconhecimento de que quantidades (utilização da capacidade) e preços (salário real) podem se ajustar simultaneamente em um modelo dinâmico mais geral, levanta uma questão conceitual mais profunda em relação à interpretação da própria curva IS de Hicks, que foi realizada neste modelo. Graficamente, isso pode ser tratado como o local da utilização da capacidade estacionária, ou seja, Dz = 0, isto sendo implicitamente assumido na análise dos autores, também no o local onde o nível de preço é estacionário, ou seja, Dp = 0. Os autores afirmam que esta última está implícita na Teoria Geral de Keynes (especialmente pp. 17- 18.289.301). Abaixo (Figura 7) segue o gráfico-resumo em idioma original do resultado dos autores.

Figura 7 – Resumo dos resultados obtidos por áreas: a interação das curvas no espaço “Margem de lucro (h) versus Capacidade de utilização (z)”.

Fonte: Bhaduri e Marglin (p. 389, 1990).

Em suma, o principal resultado de Bhaduri e Marglin (1990) é que a elevação dos salários não é uma questão direta e intimamente prejudicial ao crescimento. Como visto nesta exposição acima, mesmo em uma visão mais conservadora (onde uma expansão de salário tem um efeito negativo sobre os custos) os autores demonstram que é possível que exista uma contrapartida a nível macroeconômico que permita que haja crescimento concomitantemente com esta expansão salarial.

Em última análise, Bhaduri e Marglin levantam uma das questões mais importantes da macroeconomia moderna, qual seja: o excesso de demanda por commodities leva primeiramente a um ajuste de quantidade ou de preços? Segundo eles, a resposta exigiria um modelo mais amplo do que os modelos que eles elaboraram.

4.3. CONCENTRAÇÃO DE MERCADO E INOVAÇÃO TECNOLÓGICA NA PROMOÇÃO