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III. ÁREAS DE ESTUDO

3.1.1. Contextualização socioeconômica

Historicamente, o Ceará vivenciou quatro reestruturações sociais, importantes para a compreensão das significativas transformações nas dinâmicas social, econômica e política, que repercutiram, sobretudo em diferentes modos de organização do espaço e suas formas de produção (Quintiliano & Lima, 2008).

A primeira fase consistiu na reestruturação da pecuária, demarcada pela reocupação do Ceará no século XVII; a segunda fase foi da produção de algodão, que consistiu na principal atividade do Estado nos séculos XIX e XX, consorciada com a pecuária e a agricultura de subsistência; a terceira fase foi a da indústria, que foi baseada na produção do algodão e do couro até a segunda metade do século XX. A quarta fase se iniciou na década de 1990 e consistiu na abertura das atividades modernas, distribuídas em três eixos estruturantes das políticas territoriais: promoção do turismo; atração e interiorização de novas indústrias; e, a agricultura empresarial (Pequeno Marinho, 2010).

Nos séculos XVII e XVIII, a região do Jaguaribe foi povoada em decorrência da criação do gado, com a instalação de fazendas para a pecuária extensiva, que produziam charque para as áreas canavieiras e de mineração na Bahia e Minas Gerais. Destacavam-se no processo de uso dos solos as atividades agrícolas irrigadas, pincipalmente com as culturas de milho, feijão, arroz, limão, banana e outras frutas regionais. Estas terras baixas antes eram utilizadas para o plantio de capim, destinados à pecuária leiteira e de corte. Com o comércio do charque e as fábricas de beneficiamento de carne (carne de sol ou charque) foram formados os primeiros núcleos urbanos e vilas da região (Soares, 2000; Maia, 2005).

Durante o século XVIII, houve significativas alterações nos processos produtivos e organizativos do espaço agrário na planície aluvial do Baixo Jaguaribe. Momento este em que a capital do Estado descobre o semiárido como área propícia à produção de algodão e incorpora-o ao processo produtivo, antes considerado como território impróprio, desvalorizado, ocupado somente para a criação do gado. No baixo Jaguaribe havia várias usinas de descaroçar algodão e extrair o óleo. Esta atividade induziu a instalação de teares e fábricas de tecidos, contribuindo para o crescimento econômico da região (Pequeno Marinho, 2010).

Durante a segunda metade do século XIX, a carnaúba passou a ser um ícone na região, devido ao papel que desempenhou na cultura e economia locais. A cera era o produto mais importante desta palmeira, que era exportada para o mercado internacional. O tronco da carnaúba era utilizado na construção dos cata-ventos de madeira, utilizados nos sistemas de irrigação para as fruticulturas locais. Juntamente com a produção do algodão, a carnaúba foi importante para o processo de urbanização da região como para a formação da elite política e econômica, visto que muitas pessoas chegavam para trabalhar na produção e acabavam fixando residências, havendo a necessidade de um comércio mais diversificado para atender às necessidades da crescente população (Soares, 2002; Gomes & Assis, 2008).

Na segunda metade do século XX, a produção de algodão e carnaúba entra em crise, pela desvalorização destes no mercado nacional e internacional. A cera vegetal de carnaúba deixa de ser exportada em função do desenvolvimento de matéria-prima sintética de menor custo. Os proprietários voltam a investir na criação de gado e no cultivo de frutas. A expansão da fruticultura introduz novos mecanismos de irrigação dos pomares, como os motores a gás e a óleo diesel. O início da agricultura moderna é capitaneado pela intervenção do Estado, para viabilizar a prática da agricultura irrigada, através dos perímetros públicos de irrigação implantados pelo Departamento Nacional de Obras Contra Secas (DNOCS), nas décadas de 60 e 70 (Soares, 2002; Maia, 2005; Pequeno Marinho, 2010).

Desde a criação dos projetos de irrigação, com a construção de açudes, adutora e canais, até os dias atuais, a política hídrica tem sido direcionada para diversos setores, atendendo a demandas econômicas e sociais que modificam de acordo com o contexto histórico, como estratégia para o desenvolvimento do Estado (Benevides, 2011).

Os projetos hídricos realizados no Ceará, sobretudo após a criação da Secretaria de Recursos Hídricos, vem atender a uma demanda industrial e populacional

crescente e concentrada, impulsionando vários setores da economia, como a agricultura irrigada, o turismo, a pecuária e a carcinicultura, com o aumento da oferta hídrica e a evolução nos processos de gestão (Soares, 2002; Benevides, 2011).

A produção de arroz foi a atividade que mais se destacou nesse processo de modernização agrícola iniciado na década de 60, expandindo-se fortemente a partir da década de 80, tornando-se um dos produtos característicos da paisagem rural do Baixo Jaguaribe. Em torno dessa atividade se constituíram cooperativas, associações e empresas com forte presença na região (Soares, 2002; Maia, 2005).

A partir da década de 70, a região Jaguaribana passa a ser alvo de uma política “modernizante”, com incentivo do Estado para a fixação empresarial, inclusive de multinacionais, através da construção do açude Castanhão e outras barragens e estações de bombeamento. Nos anos 90, acontece a substituição do colono pelo técnico agrícola, agrônomos e empresários (Elias, 2003; Maia, 2005).

Desde o final da década de 90, dentre os agronegócios do Baixo Jaguaribe, o segmento que mais cresce é a carcinicultura (criação de camarão em cativeiro), levando o Estado ao primeiro lugar na exportação de camarão entre todos os estados brasileiros em 2003. Boa parte dos empreendimentos de carcinicultura se encontra localizada em Aracati, que registrou 77 dos 143 empreendimentos existentes na região do Baixo Jaguaribe no ano de 2003 (Bonini, 2006).

A carcinicultura, por seu interesse socioeconômico, insere-se como um elemento fundamental no processo de transformação da paisagem nos estuários do Ceará. Bastando, para tanto, observar que o cultivo de camarões se apresenta como uma atividade econômica de relevante importância para o Estado do Ceará. De acordo com a Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará S/A (ADECE, 2010), o Ceará foi o segundo maior produtor de camarão do país em 2009, com uma produção de 22 mil toneladas registradas. A expectativa era de produzir 30 mil toneladas até o final de 2010, ultrapassando o Rio Grande do Norte, até então maior produtor de camarão em cativeiro no País (ADECE, 2010; Rodrigues & Kelting, 2011).

A expansão e o sucesso da atividade camaroeira no nordeste se deve a introdução da espécie Litopenaeus vannamei (Boone, 1931), conhecido como camarão branco do pacífico. A espécie, originária da costa do Pacífico, é exótica ao litoral brasileiro e se adaptou bem às condições climáticas e de qualidade da água presentes nos estuários do nordeste, que apresenta clima mais estável, mais quente e com altas

temperaturas médias, possibilitando o cultivo durante os doze meses do ano (Cunha, 2004; Bonini, 2006; Rodrigues & Kelting, 2011).

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