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4 Resultados

4.3 Razões ao perfil de alinhamento estratégico das ações de capacitação

4.3.2 Contingências do Setor de capacitação

Conforme perspectiva contingencial relatada por Delery e Doty (1996), as práticas de gestão de pessoas sofrem influência de fatores internos e externos que devem ser identificados e considerados. As dificuldades encontradas para a condução das atividades do setor de capacitação foram identificadas pelos participantes da entrevista coletiva e classificadas segundo as categorias de fatores interferentes apresentadas por Côrtes (2016) segundo Camões (2013) e Fonseca (2013). A Tabela 21 dispõe apenas das categorias dos fatores que foram identificadas como interferentes à atuação da unidade treinamento estudada, sendo nesse caso não contemplados demais aspectos trazidos pela literatura e que na pesquisa não foram citados ou não foram identificados como limitadores.

Tabela 21. Fatores interferentes encontrados para a condução das atividades da unidade de capacitação

Fatores Categorias

Institucionais Contexto externo

Organizacionais

Recursos financeiros e orçamentários

Engajamento do quadro de servidores

Comunicação

Aspectos culturais

Setoriais

Inserção estratégica da unidade GP

Reputação da unidade de GP

Estruturação da unidade de GP

Metodologia de implementação

Coexistência do papel funcional de GP

Nota. Fonte: Elaborado pela autora segundo as categorias apresentadas por Côrtes (2016), Camões (2013) e Fonseca (2013).

Ao todo, 11 das 24 categorias apresentadas por Côrtes (2016) segundo Camões (2013) e Fonseca (2013) foram abordadas pelos participantes da pesquisa. Houve alguns casos em que as dificuldades relatadas e classificadas em determinadas categorias remeteram aspectos de demais categorias, mostrando ligações entre as dificuldades enfrentadas. Esses e demais resultados caracterizam o cenário institucional, político, organizacional e setorial no qual o setor de capacitação desempenha suas atividades, e serão detalhados a seguir. A Tabela 22 indica, para cada categoria de fator, as dificuldades relatadas pelos participantes.

Tabela 22. Dificuldades para a condução das atividades da unidade de capacitação relatadas

Fatores Categorias Dificuldades relatadas

Institucionais

Contexto externo A conjuntura econômica, macropolítica e social do país são desfavoráveis ao investimento em capacitação.

Políticos

Configuração política da organização

Predominância de critérios informais (“por proximidade”) na aprovação de certas ações educacionais.

Organizacionais

Recursos financeiros e orçamentários

Quantidade e qualidade insuficiente dos recursos financeiros controlados pela organização.

Engajamento do quadro de servidores

Pouco envolvimento dos servidores das regionais nas políticas e práticas de capacitação.

Comunicação Falha da disponibilização de informações ao público externo e interno.

Aspectos culturais Alto grau de resistência à mudança dos indivíduos

Setoriais

Integração estratégica de GP Incoerência das metas instituídas pela área de estratégia para a unidade de capacitação.

Reputação da unidade de GP Alto número de reclamações sobre a ineficácia dos programas e ações de capacitação.

Estruturação da unidade de GP Quantidade e qualidade insuficiente dos recursos humanos e materiais controlados pelo setor de capacitação.

Metodologia de implementação O setor de capacitação e desenvolvimento não dispõe de uma política de capacitação e desenvolvimento documentada.

Ações de capacitação oferecidas conforme demandas emergentes.

Coexistência do papel funcional de GP

Excesso de afazeres administrativos em detrimento de atividades estratégicas e táticas no setor de capacitação e desenvolvimento.

Nota. Fonte: Elaborado pela autora segundo as categorias apresentadas por Côrtes (2016), Camões (2013) e Fonseca (2013).

Inicialmente, é importante rememorar que os fatores institucionais, apontados no início da Tabela 22 dizem respeito as características do ambiente externo que de alguma forma influenciam as políticas e práticas da gestão estratégica de pessoas (Côrtes, 2016) e, no caso desse estudo, ao desempenho das atividades da unidade de capacitação. Dentro dos fatores institucionais aspectos do contexto externo foram citados como dificuldades enfrentadas pela unidade de capacitação. Os participantes relataram que as mudanças econômicas e sociais que acontecem no país geram impactos na instituição e consequentemente na unidade de treinamento principalmente no que se refere ao investimento em capacitação, uma vez que em períodos de crise nacional são diminuídos os valores destinados ao custeio das ações educacionais.

Esse cenário de diminuição de gastos, é provocado por fatores externos à organização e que, portanto, estão fora de seu controle, restando às unidades lidarem internamente com os novos desafios impostos pelo ambiente externo. Aqui fica clara a relação entre os fatores interferentes, uma vez que o problema relatado como de origem institucional culmina em uma

dificuldade de proporção organizacional, qual seja a de recursos financeiros e orçamentários, descrita logo mais no texto.

Quanto aos fatores políticos, que versam sobre os relacionamentos intra e intergrupos considerando relações de poder e influência (Camões, 2013; Côrtes, 2016), apenas a categoria “Configuração política da organização” foi citada como aspecto interferente. Nesse sentido, foi relatada a predominância de critérios informais na aprovação das ações educacionais, de modo que em certas ocasiões a escolha pela concessão ou não de custeio de cursos aos funcionários está atrelada ao nível de proximidade entre o indivíduo solicitante e o funcionário responsável ou detentor de poder de decisão, o denominado “coleguismo”, não sendo considerados critérios formais no processo decisório de TD&E. Essa realidade oferece margem para a realização de ações educacionais desvinculadas aos referenciais estratégicos do negócio, uma vez que, não considerados os resultados de um diagnóstico de necessidades de aprendizagem a oferta de cursos fica sujeita ao interesse dos participantes e não da instituição, como de fato é o caso das ações pertencentes ao programa de incentivo à educação, indicadas como ações “não vinculadas” oriundas de interesses voltados aos indivíduos e suas carreiras. Além disso, a predominância de critérios informais, pautados na proximidade dos indivíduos, para a aprovação de certas ações educacionais também pode justificar o grande percentual de vinculação das ações à dimensão de suporte organizacional do mapa estratégico (tabela 13) uma vez que, em termos físicos e estruturais (organograma) as unidades de gestão de pessoas e de capacitação, onde são tomadas as decisões de TD&E, estão ligadas à unidade matriz da organização, responsável pelos processos de suporte e gestão da instituição com um todo.

Ainda sobre os fatores políticos, é importante ressaltar que embora na entrevista realizada os respondentes tenham discorrido sobre questões de apoio da alta administração e descontinuidades administrativa, aspectos dessa origem não se enquadraram no presente estudo como dificuldades enfrentadas pela unidade, uma vez que os entrevistados identificaram como positiva a última mudança na diretoria de gestão de pessoas, que por sua vez trouxe certos níveis de apoio às ideias da unidade.

Partindo para os fatores organizacionais, indicados por retratarem características do ambiente interno da organização (Côrtes, 2016), categorias de “recursos financeiros e orçamentários”, “engajamento do quadro de servidores”, “comunicação” e “aspectos culturais” foram apontadas. Sobre os recursos financeiros e orçamentários, foi relatada a falta de orçamento necessário para viabilizar as práticas e iniciativas planejadas pelo setor, sobretudo causada por fatores externos, como citado na parte inicial do texto. Há uma grande preocupação

por parte dos funcionários entrevistados quanto à diminuição dos recursos destinados à capacitação em contraste com um cenário de recente perda de pessoal devido ao desligamento de mais de mil funcionários no Plano de Demissão Voluntária – PDV. Os entrevistados afirmam ter perdido o conhecimento acumulado pelos indivíduos que não mais contribuirão para a organização. De modo geral, os indícios de restrição orçamentária tendem a incentivar a implementação de ações educacionais menos onerosas à organização, o que possivelmente justifica o menor percentual de investimento em capacitação para as dimensões finalísticas do mapa estratégico, especificamente relacionadas à geração de conhecimento, categoria com maior média de custo por ação educacional.

Quanto a falta de engajamento do quadro de servidores, é importante ressaltar que a dificuldade se aplica mais aos funcionários lotados nas unidades regionais do que na matriz da organização tendo sido essa medida de alguma forma constatada, além dos relatos da entrevista, na figura 9 de ações educacionais, que demonstra o número de participantes por estado brasileiro.

A categoria “comunicação” foi pontuada na entrevista como barreira à implementação exitosa das práticas de TD&E, na medida em que se afirmou haver falhas na comunicação institucional, sobretudo no que tange ao alcance das informações destinadas aos públicos de interesse. As informações remetidas a divulgação de ações da unidade de capacitação encontram-se dispersas e pouco relacionam-se à aspectos de sensibilização e obtenção do engajamento do corpo funcional. Aqui é possível verificar a ligação entre os fatores interferentes, engajamento e comunicação, ambos classificados como dificuldades e possíveis instrumentos capazes de justificar, em parte, o alinhamento estratégico das ações educacionais.

Em resumo, o baixo engajamento das regionais em contraste com o alto engajamento dos funcionários lotados na matriz, por si só faz menção aos padrões de maior vinculação estratégica na dimensão de suporte do mapa, visto que a maior parte do corpo funcional que se dedica à atividades de suporte está lotado na matriz. Acrescido a isso, é possível dizer que as falhas de comunicação das ações de treinamento e a falta de sensibilização por mensagens institucionais reforçam esse padrão de disparidade entre os públicos (matriz e regionais), tendo em vista ainda, que as informações de divulgação podem muitas vezes não alcançar com efetividade os receptores de outros estados.

Os aspectos culturais constituem a última categoria de fatores organizacionais citados na entrevista. A cultura organizacional, não direcionada à inovação, possui fortes traços de resistência à mudança. Os entrevistados atribuem esse quadro principalmente ao fato de que o corpo funcional possui muitos funcionários antigos e de idade avançada, geralmente pouco

adeptos de novas práticas e formas de trabalho. De modo geral, os fatores culturais aqui indicados não puderam ser apontados como razão direta ao alinhamento estratégico tal como se deu, isto porque a cultura trata-se de uma variável permeável aos diversos processos organizacionais, não podendo, ao menos com os dados coletados, inferir relações de causa e efeito.

Por fim, foram discutidos os fatores setoriais instituídos como dificuldades enfrentadas pela unidade de capacitação no desempenho de suas atividades. Tendo em vista que os fatores setoriais são aqueles que estão sob controle da própria unidade de TD&E, foram identificadas cinco categorias: integração estratégica, reputação, metodologia de implementação, estruturação da unidade de capacitação e coexistência do papel funcional (Côrtes, 2016; Fonseca, 2013).

Acerca da integração estratégica de GP, a maior dificuldade relatada diz respeito a interação da unidade de capacitação com às áreas de estratégia organizacional. Nota-se certo distanciamento entre das áreas, de modo que a unidade responsável pela estratégia da instituição não considera na construção de metas e indicadores de resultados elementos da realidade organizacional e setorial no que se refere a TD&E. Tudo isso resulta na incoerência de medidas estratégicas frente ao cenário pouco vantajoso vivenciado pela unidade de capacitação. Na prática, essa é uma realidade evidenciada principalmente pelo aumento das metas de capacitação mesmo diante da diminuição dos recursos para a promoção de ações educacionais. “Aumentar a meta da capacitação e diminuir o recurso, isso pra mim é incoerente. Uma medida inversamente proporcional”, citou um dos entrevistados.

Como mencionado anteriormente, as restrições orçamentárias de modo geral, tendem a incentivar a implementação de ações educacionais menos onerosas à organização. Essa medida se potencializa quando são impostos padrões de exigência voltados ao cumprimento de metas tendentes ao aumento da oferta de cursos. A dificuldade relatada, portanto, em certa medida pode justificar o grau de desalinhamento das ações educacionais, uma vez que os cursos não vinculados à estratégia organizacional constituem grande parte do volume de ações implementadas ao mesmo tempo que são classificadas com a menor média de custo por ação (tabela 13), o que pode orientar a decisão por capacitar mais através de ações que gerem maiores índices de ações realizadas e onere menos do orçamento. Esse pensamento faria das ações desalinhadas “vantajosas” sob o ponto de vista do “custo-benefício” no que se refere ao cumprimento das metas impostas.

Outra dificuldade de natureza setorial identificada nos relatos foi a baixa reputação da unidade de capacitação, que consiste na desaprovação, pelo corpo funcional, do trabalho

realizado pela unidade. Segundo os respondentes, o setor de capacitação é uma das áreas mais citadas negativamente nas pesquisas de clima organizacional, o que contribui para a disseminação de uma visão de descrédito às práticas de TD&E e reforça seu perfil “não estratégico” perante à organização. De modo geral, não se pode dizer que a má reputação da unidade justifica os padrões de alinhamento estratégico outrora levantados, mas vale buscar entender quais tipos de reclamações são mais recorrentes de modo à utiliza-las como subsídio para otimização dos processos de TD&E, sobretudo no que se refere ao levantamento de necessidade de aprendizagem onde os níveis de “relevância” são construídos mediante referencias organizacionais, de tarefas e de pessoas (Meneses et al, 2010).

Alinhado aos assuntos supracitada, foram elencadas questões a respeito da categoria “metodologia de implementação”. Os relatos indicaram que não há uma política de capacitação que oriente os processos e práticas de TD&E, tendo apenas sido feito o plano de educação corporativa – PEC, cujo perfil configura-se com relato de pesquisa que, segundo os participantes, não abarca todos os processos do sistema de treinamento tal como deveriam ser realizados (levantamento de necessidades, planejamento e execução, e avaliação de treinamento). Ainda assim, mesmo que haja em certa medida orientações quanto à implementação de ações educacionais, mais uma dificuldade foi apontada: as demandas emergenciais por capacitação, recebidas por força de lei. Os integrantes da unidade de capacitação relataram que mesmo diante de pouco aporte financeiro, quando treinamentos desse tipo são solicitados, abre-se mão do planejado para executar o obrigatório. “A gente tem que cumprir esses treinamentos obrigatórios, às vezes estamos deixando treinamento importante para os funcionários, focando em treinamentos previstos por lei, às vezes a gente tem que priorizar alguns treinamentos que não eram priorizados anteriormente” (participante 1). Geralmente, questões como estas norteiam a divisão dos recursos e acabam por decidir, em certa medida, quais ações educacionais serão implementadas, afetando consequentemente o perfil de alinhamento estratégico constatado.

Finalmente, as categorias de estruturação da unidade de GP e coexistência do papel funcional foram relacionadas nos relatos dos entrevistados. Segundo os participantes, a unidade de capacitação conta ao todo com o quadro de 33 funcionários, porém, desses apenas 6 são analistas e de fato trabalham com processos de TD&E, os outros executam atividades de apoio voltadas à manutenção das estruturas físicas do centro de treinamento e à logística dos eventos educacionais que ocorrem na instituição. A quantidade e qualidade insuficiente dos recursos humanos do setor de capacitação foi pontuada como dificuldade enfrentada, pois causa sobrecarga principalmente aos analistas que se deparam com um excesso de afazeres

administrativos e por muitas vezes tendem a abrir mão de dedicar-se aos processos mais estratégicos de TD&E. “A mesma pessoa que mata um leão por dia tem que fazer outros projetos” (participantes 2).

Dessa forma, os pontos falhos e faltantes identificados no plano de educação corporativa, tais como a ausência da análise organizacional no levantamento de necessidade de aprendizagem, e nas demais atividades de cunho estratégico ou tático podem ser justificados, em alguma medida, pelo perfil inadequado da força de trabalho uma vez que tal dificuldade culmina na não dedicação aos processos de planejamento e execução estratégica das práticas de políticas TD&E.

Em suma, partindo de uma visão geral da presente seção puderam ser destacados principais aspectos interferentes à condução das atividades da unidade de capacitação, sobretudo como vistas a identificação de elementos que constituíssem possíveis razões ao alinhamento estratégico das ações educacionais implementadas (objetivo iii).

Primeiramente, foi verificado o alto grau de impacto da restrição orçamentária na forma com que os processos internos da unidade de capacitação foram estruturados. Em três das quatro categorias de fatores (institucionais, organizacionais e setoriais) a questão financeira foi apontada como dificuldade enfrentada pela unidade e por vezes fez-se como ponto de partida ou razão no processo decisório de TD&E. É importante destacar que, essa evidencia também pôde ser percebida em trechos de falas dos participantes, tais como “por causa do corte nos gastos [...]”, “Como nós temos pouco dinheiro destinado para capacitação [...]”, dentre outros. Constatou-se ainda que o processo decisório de TD&E, antecedente à escolha pela implementação de ações educacionais alinhadas ou não alinhadas aos referenciais estratégicos, também sofre interferências ligadas à predominância de critérios informais de aprovação, devido à configuração política da organização, e ao recebimento de demandas emergenciais por força de lei, de modo que, em ambos os casos tomam-se vias “não convencionais”, ou ao menos não previstas pelo planejamento de TD&E para a oferta de capacitação.

Por fim, questões de prontidão de capital humano necessário para o desempenho de tarefas do setor foram ressaltadas em duas categorias: “estrutura da unidade de GP” e “coexistência do papel funcional”. De maneira geral, a conclusão acerca desse tema volta-se para uma dificuldade basilar da unidade em atuar estrategicamente de modo a pensar e repensar seus processos tendo em vista ao referencias estratégicos do negócio. Interferências estruturais como esta tendem a qualificar as unidades de GP com de perfil instrumental e não estratégico.

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