• Nenhum resultado encontrado

Embora as atividades que seguem tenham sido planejadas para o último momento do projeto, elas não têm um caráter conclusivo, de encerramento. A partir

50

da avaliação relativa à experiência com Julius, é possível cogitar a continuidade do projeto conforme a organização curricular, enveredando com a turma pela história do século XX, com ênfase para a República brasileira.

Isso será de fato viável, caso tenha sido estabelecido – e eu acredito que esse objetivo seja alcançado – com a turma um referencial para nossos estudos: A memória e a necessidade de narrá-la. O século XX apresenta diferentes conteúdos para esse exercício, mais uma vez o destaque vai para o Brasil republicano, onde a pergunta sobre os descendentes dos escravizados encontrará terreno fértil para semear novas discussões. Dessa forma, esse momento é mais um elo com o passado escravista e com a República, que se consolida oligárquica, favorecendo a significação do processo histórico com os estudantes, do que a conclusão do projeto.

Nesse momento final, procuro alcançar os seguintes objetivos:

● identificar algumas características do estilo de vida dos descendentes de escravos no pós abolição;

● identificar que a realidade dos descendentes de escravizados foi diversa; ● concluir com os alunos a visão que buscamos construir do escravizado e do ex-escravizado como um agente que usava suas experiências para construir suas expectativas;

● intensificar a reflexão sobre o racismo e a exclusão que marcam a sociedade brasileira hoje.

Suportes

O elemento catalisador para as atividades desse momento permanece relacionado ao quilombo. Para isso, apresento à turma um novo fragmento da história de Julius (Anexo VI) no qual ele tem uma visão do tio Nestor falando sobre a comunidade quilombola onde nasceu e passou parte de sua juventude. Em seguida, proponho um pequeno texto que deve ser apresentado como uma fala de um morador da comunidade quilombola para o Julius (Anexo VII).

A literatura permanece como importante suporte para pensar a História e também a narrativa. Selecionei, nesse sentido, um trecho do livro Memória do Cativeiro, publicado pelas autoras Ana Lugão Rios e Hebe Mattos, que permite trabalhar algumas realidades vividas por descendentes de escravizados no pós- abolição (Anexo VIII). Saliento que o tema do pós-abolição ainda se constitui uma

51

lacuna no ensino de História, que lentamente começa a ser preenchida em estreito diálogo com novas pesquisas na historiografia.

Propostas para motivar a reflexão

Partindo da leitura do novo fragmento da história do Julius, convidamos os alunos a seguirem o personagem na busca de informações sobre o tio Nestor. Assim, proponho que a turma imagine a ida de Julius a uma dessas comunidades. Mais uma vez, estamos diante da possibilidade de uma pesquisa, que pode ser feita de forma rápida na internet, referente às comunidades quilombolas como permanência transformada da história. É importante levantar quantas comunidades quilombolas existem no estado do Rio de Janeiro; buscar depoimentos de moradores dessas comunidades; identificar e selecionar imagens dessas comunidades.

Proponho levar Julius para a Comunidade de Santa Rita do Bracuí, localizada em Angra dos Reis e, para isso, uso como roteiro o texto “Remanescentes das Comunidades dos Quilombos: memória do cativeiro, patrimônio cultural e direito à reparação”, das professoras Marta Abreu e Hebe Mattos. Nesse texto temos acesso a: Informações sobre a organização da comunidade a partir da doação de lotes de terra feita em testamento pelo senhor Comendador José de Souza Breves, em 1878; sobre como os mais velhos transmitiram suas experiências de vida através da contação de histórias, preservando toda uma memória; sobre como tradições culturais, com realce para o jongo, foram preservadas. Além disso, temos acesso ao trabalho das historiadoras, comparando o depoimento de um morador da comunidade com outras fontes; a informações de como a fazenda do senhor Breves se adequava ao tráfico ilegal após 1831; à luta da comunidade na preservação da terra, o que representa preservar a própria comunidade, suas práticas culturais e sua memória.

O texto elaborado, para ser apresentado como a fala de um morador da comunidade, visa ressaltar a importância da terra para a organização da comunidade e, consequentemente, para a preservação da sua memória. O texto busca, também, fazer referência ao Jongo, abrindo a possibilidade para o professor apresentar um vídeo sobre essa manifestação cultural ou realizar mais uma proposta de pesquisa. Assim, proponho novas questões: Por que a terra é importante para o morador da comunidade? É possível retirar da fala do morador formas das quais a comunidade se utilizou para preservar sua memória? Quais? Por que a cantoria da comunidade é

52

importante para os professores e para o resto do mundo? O que podemos fazer para colaborar na luta dessas comunidades para preservar suas memórias?

Está aberta a oportunidade de mostrar como muitas dessas comunidades tiveram seus direitos estabelecidos na Constituição de 1988, um momento marcado pelo crescimento dos movimentos sociais. Como o reconhecimento desses direitos estimulou outras comunidades, surpreendendo os setores conservadores (LEITE, 1999, p. 127). E, ainda, salientar as ameaças constantes, vivida por seus moradores, provenientes de poderosos vizinhos interessados em suas terras.

O fragmento da narrativa do Julius que usamos nessa aula nos informa sobre a saída de tio Nestor da sua comunidade para a cidade, fixando-se no bairro do Estácio, transformando-se em operário. Reafirmamos que a comunidade quilombola só existe pelo fato de seus integrantes terem se fixado em uma determinada região, o que não impede que um ou outro elemento tenha circulado por outras realidades. Objetivamos, com isso, mostrar a diversidade das experiências vividas pelos descendentes de escravizados. O que podemos comprovar com o trecho retirado do livro Memórias do Cativeiro (anexo IX), que dá protagonismo a pessoas assumidamente negras descendentes de escravizados.

Proposta de atividade

• A criação de cartas endereçadas a comunidade quilombola contando a experiência vivida em sala de aula com o projeto Julius.

Conforme sinalizado nessa dissertação, o personagem Julius já foi utilizado em várias salas de aula, com diferentes abordagens, durante minha trajetória docente. Porém, esta é a primeira vez que Julius e os personagens envoltos em sua história são abordados por uma perspectiva teórica e uma organização detalhada para serem apresentados aos alunos. O resultado dessa experiência, realizada com turma do nono ano, é apresentada no terceiro capítulo, no qual a descrição reflexiva sobre o desenvolvimento das atividades permitirão analisar aspectos relevantes para sua prática, entre acertos e dificuldades.

53

CAPÍTULO 3

Documentos relacionados