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Contradições na afirmação do prestígio de ser professor

2. A FORMAÇÃO DOS TABUS ACERCA DO MAGISTÉRIO

2.4 Contradições na afirmação do prestígio de ser professor

A ambivalência de sentimentos que permeia a relação professor-aluno, ao se materializarem na prática social contribui decisivamente para a ampliação da aversão à profissão docente. Trata-se de uma contribuição, e não de não uma determinação, pelo fato de

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Um exemplo disso pode ser verificado nas manifestações do ressentimento na relação professor-aluno estudadas por Zuin (2003, 2008 e 2012).

que essa aversão, como todos os demais fenômenos sociais, é também uma síntese de inúmeras determinações.

Conforme Adorno (1995b) destacou, a aversão à profissão docente identificada na Alemanha na primeira metade do século XX deixa clara a incidência da materialidade social que circunscreve o mundo do trabalho numa sociedade de ordem capitalista e que, portanto, também determinam em certa medida sua produção.

Porém, compreender as motivações da aversão docente na dinâmica social implica considera-la como o resultado das contradições de uma sociedade onde o desenvolvimento de habilidades ligadas ao espírito não ocupam uma posição devidamente reconhecida.

Conforme temos apresentado até aqui, parte da aversão à profissão docente está alicerçada na existência das diversas formas de violência que se fazem presentes na relação professor-aluno e que são motivadas por uma sociedade que exige sutilmente padrões disciplinares que permitam a adaptação das pessoas às necessidades do sistema produtivo.

Quando nos referimos às frustrações dos professores diante das contradições objetivas e subjetivas que circunscrevem o exercício da sua profissão, não excluímos, por conseguinte, a evidente frustração que também acompanha os alunos na vida escolar. E, como afirma Zuin (2008, p. 54):

Refletir sobre a presença dessa sensação de frustração por parte dos alunos corresponde à importância do entendimento do processo de idealização e da formação das representações aversivas dos alunos para com os professores, ou seja, os chamados tabus. De fato, são muitas as situações vivenciadas no ambiente escolar que contribuem para o aparecimento dessas representações aversivas.

Portanto, a realização de uma análise crítica e dialética das motivações sociais da aversão à profissão docente perpassa a compreensão das origens e da dinâmica da formação das frustrações tanto dos alunos quanto dos professores. Por sua vez, se considerarmos o fato de que na perspectiva de Adorno (1995b) os tabus acerca do magistério têm motivações tanto de ordem objetiva quanto subjetiva, não é possível desprezar a influência do peso que as questões de ordem psicológica exercem sobre a forma como a sociedade no seu conjunto se relaciona com o magistério.

Um exemplo que enfatiza a importância dessa dimensão psicológica está na imagem do professor construída pelos alunos. Para Adorno (1995b) a questão fundamental é que essa imagem, a princípio, é resultante de um processo de idealização da figura do professor por parte do aluno, quando o considera um indivíduo situado acima das contradições às quais a sociedade está submetida.

Ora, ao deparar-se com o professor no ato do processo educativo o aluno vê essa imagem ser desfeita quando aquela perfeição previamente imaginada se desintegra diante das circunstâncias objetivas vivenciadas no interior da escola, por exemplo. Essa imagem idealizada pelo aluno está vinculada nos dizeres de Adorno (1995b) à disseminação constante de tipos ideais ocorrida na educação. Na medida em que esses tipos ideais não se efetivam na prática – uma vez que o professor está sujeito às contradições sociais reproduzidas em todo momento na educação – ocorrem frustrações nos alunos em relação aos professores.

No que diz respeito ao aparecimento destas frustrações nos alunos, Zuin (2008, p. 54) argumenta que para Adorno “[...] a imagem que os alunos possuem do professor torna-se extremamente pejorativa, sobretudo, quando há o descompasso entre os ideais de ego que são projetados na figura do mestre e suas atitudes que desmentem suas promessas de respeitar as opiniões dos alunos”.

A questão do respeito aos alunos, inclusive às suas opiniões, é uma das atitudes mais polêmicas da relação professor-aluno. Conforme veremos nas próximas sessões, no ensino superior esse respeito mantém-se negado em diversas situações. No entanto, neste caso apresenta-se de forma mais sutil na medida em que o desrespeito à opinião do aluno pode ser justificado por uma questão de imparcialidade que rege o ensino dos conteúdos científicos, sobretudo, nos cursos de formação de professores. Ou seja, o desrespeito à opinião do aluno não seria uma decisão do professor, mas uma ação qualificada cientificamente.

Voltando à questão da frustração dos alunos em relação aos seus mestres motivada, entre outras coisas, pela existência dos modelos ideais, Zuin (2008) apresenta a indicação de uma atitude que possivelmente poderia contribuir para amenizar o seu efeito. Segundo o autor:

Talvez não fosse equivocado afirmar que o educador que discute com seus alunos sobre o fato de que é um ser humano, sujeito a falhas e acertos, possa contribuir para que os alunos não se subordinem tanto em relação aos modelos idealizados, promovendo o processo de superação (Aufhebung) de uma autoridade que também se educa durante o processo educativo formativo (ZUIN, 2008a, p. 56)

Concordamos com o autor sobre a possibilidade de contribuição desta atitude do professor perante seus alunos. Certamente, a regressão da humanidade do professor diante das circunstâncias materiais da vida, inclusive no exercício de sua profissão, abriria espaço para a o debate não apenas desta, mas de outras questões relativas à profissão docente.

Contudo, reconhecemos que, por se tratarem de questões constituídas historicamente na condição de tabus, dificilmente serão empreendidas pelos professores na educação escolar,

reduzindo, assim, a possibilidade da efetivação de ações, mesmo que imediatas, que contribuam para as suas superações.

A consequência desse contexto é a postergação constante de ações promotoras de reversão da tendência histórica de produção da aversão docente. Diante disto, ocorre o acirramento das contradições inerentes ao exercício da docência que são sentidas por cada geração de estudantes e profissionais do magistério.

Não obstante as variantes que a institucionalização da docência adquire em cada sociedade, exprimindo seus aspectos singulares, a aversão a esta profissão parece encontrar, variando o grau de intensidade, as mesmas condições objetivas de reprodução. Adorno (1995, p. 97) identifica a presença desta repulsa no comportamento dos jovens alemães universitários. Sobre eles o autor faz a seguinte observação:

Permitam-me começar pela exposição da experiência inicial: justamente entre os universitários formados mais talentosos que concluíram o exame oficial, constatei uma forte repulsa frente aquilo a que são qualificados pelo exame oficial, e em relação ao que se espera deles após este exame. Eles sentem seu futuro como professores como uma imposição, a que se curvam apenas como falta de alternativas. É importante ressaltar que tenho a oportunidade de acompanhar um contingente não desprezível de tais formandos, com motivos para supor que não se trata de uma seleção negativa.

A falta de alternativas destacada pelo filósofo frankfurtiano em relação aos iniciados no magistério alemão denota a preocupação relativa às condições de trabalho sob as quais os atores educacionais, sobretudo, os professores, estão submetidos no exercício do seu ofício.

No núcleo dessa aversão se congregam os elementos de ordem material e subjetiva conforme destacamos acima. Porém, Adorno (1995b, p. 98) reconhece que historicamente “[...] a imagem do magistério como profissão de fome aparentemente é mais duradoura do que corresponde à própria realidade na Alemanha”.

Ou seja, os aspectos econômicos da profissionalização docente são de longa data na história da educação e determinam em grande medida a tendência da aversão. Adorno (1995b) reconhece essa tendência material inerente ao magistério subscrevendo-a às motivações subjetivas da aversão.

Para melhor exemplificar essa relação histórica, Adorno (1995b, p. 98) cita as observações feitas por professores e professoras quanto à sua atuação profissional quando se apresentam em anúncios matrimoniais em jornais. Nessas observações, ambos procuram deixar claro que: “[...] não são tipos professorais, não são mestres de escola.” Segundo eles, essas observações procuram esclarecer aos possíveis pretendentes ao relacionamento amoroso

que, apesar de serem professores, não se encontram nas mesmas condições em que seus colegas do ensino primário se encontram.

Para complementar sua conclusão, Adorno (1995b, 98-99) destaca ainda a utilização de expressões depreciativas do magistério utilizadas não apenas em alemão, mas também em outros idiomas. Segundo ele:

[...] além do alemão, também outras línguas apresentam uma série de expressões degradantes para o magistério; o mais conhecido em alemão é Pauker (quem ensina com a palmatória como quem treina soldados a marchar pelas batidas dos tambores); mais vulgar e também relacionado em alemão a instrumentos musicais é Steisstrommler (quem malha o traseiro); em inglês, utiliza-se schoolmarm para professoras solteironas, secas, mal- humoradas e ressentidas.

Nos dois exemplos apresentados por Adorno fica evidente a carga afetiva negativa que o magistério carrega em si. Levando em conta o fato de que ambos os casos são simultâneos na realidade cotidiana, fica evidente a ligação entre as motivações de ordem objetiva (sobretudo, econômica) e de ordem subjetiva.

Apesar das questões econômicas do magistério serem discutidas com mais intensidade no âmbito da profissão, elas não deixam de acompanhar o aparecimento dos tabus já citados por Adorno (1995b). Isso é comprovado pelo próprio autor quando discute o sentimento da categoria docente quando sua profissão é comparada a outras de maior prestígio. Ou seja, ele destaca que na Alemanha as profissões ligadas à jurisprudência e à medicina apresentam um grandioso prestígio por parte da população, o que não ocorre na mesma proporção com magistério.

No entanto, em relação ao magistério, de acordo com Adorno (1995b), observa-se a existência de uma diferença em relação aos níveis de ensino. Ocorre que, no caso alemão, o ensino universitário não sofre a mesma depreciação se comparado ao ensino básico. Sendo assim:

Numa complementariedade peculiar parece encontrar-se o inabalado prestígio do professor universitário, apoiado inclusive em estatísticas. De um lado, o professor universitário como a profissão de maior prestígio; de outro o silencioso ódio em relação ao magistério de primeiro e segundo graus; uma ambivalência como esta remete a algo mais profundo. Na mesma ordem de questões situa-se a proibição do título de “professor”, negado na Alemanha

pelos docentes universitários aos docentes de segundo grau (hoje chamados de Studienräte, algo como conselheiro de estudos)*10.

Esta evidente diferença de prestígio entre os professores universitários e da educação básica é marcante para acentuar as motivações da aversão à profissão docente. Isso ocorre pelo fato de que essa situação condensa aspectos tanto objetivos quanto subjetivos na medida em que há tanto uma desigualdade salarial dos professores de ambos os níveis e ainda uma menor ocorrência de atos de violência entre professores e alunos do ensino superior. Contudo, isso não significa que não existam tabus acerca do magistério superior, mas que seus efeitos se reduzem em razão do próprio papel desempenhado pelo professor universitário.

Adorno (1995b) ainda afirma que essa situação encontrada na Alemanha no período em que ele elaborou seus estudos não era exatamente igual àquelas encontradas em outros países. Ele cita a França como exemplo de sociedade que, naquele momento, não apresentava o mesmo rigor de discrepância observado na sociedade germânica. Mas, ao mesmo tempo, deixa claro que isso não corresponde à redução do prestígio da profissão docente nesta sociedade.

Ao compararmos os exemplos e as observações de Adorno (1995b) com a realidade das sociedades contemporâneas podemos verificar a presença de diversas semelhanças. A própria temática do desprestígio do professor tem sido tema de pesquisas na área da educação nos últimos anos11.

O desprestígio da docência encarado como fragmento de um processo maior de produção da aversão docente é situado por Adorno (1995) sob a contradição existente entre a afirmação da importância da profissão docente e a real posição de status que os professores detêm na sociedade.

[...] Afirmei que na Alemanha a pobreza do professor é uma imagem do passado. Contudo, permanece inquestionavelmente a discrepância entre a posição material do docente e a sua exigência de status e poder, que deveriam lhe corresponder ao menos conforme prega a ideologia vigente.

Essa discrepância não deixa de afetar o espírito. (ADORNO, 1995b, p.

100-101) (Grifos Nossos)

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Antigamente os docentes dos colégios também possuíam o título de Professor, hoje restrito a quem é habilitado no concurso de livre docência das universidades e nomeado professor universitário. ( Nota do Tradutor).

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A influência dessa discrepância sobre o espírito a qual Adorno se refere consiste na determinação da materialidade social sobre a subjetividade humana. Obviamente, essa não é a única determinação, mas dentre todas as possíveis, ela tem um impacto relevante.

Assim, soma-se à influência material a conjuntura histórica que congrega todos os aspectos subjetivos derivados do uso das punições físicas e simbólicas que caracterizam a relação professor-aluno na história educacional da humanidade desde as antigas civilizações.

Mesmo a discrepância entre a condição material do docente a exigência de status destacada na análise de Adorno (1995) é uma condição inerente à educação escolar desde seus primórdios, conforme ocorrera no Egito e na Grécia Antiga quando os mestres eram, na sua maioria, escravos.

Apesar de Adorno (1995) não tomar como referência as primeiras civilizações como ponto de partida para seus estudos sobre o menosprezo do professor, ele remete ao menos à Idade Média e começo da Moderna como bases para a compreensão do decorrer histórico da aversão à profissão docente. E mesmo assim, reconhece que se trata de um fenômeno que tem origem remota.

Essa retomada histórica da constituição de um sentimento social sobre um objeto que também é social, como ocorre com a profissão docente, requer como fundamento o pressuposto de que enquanto as condições objetivas que permitem a manifestação de uma consciência social não forem superadas, essa consciência tende a se prolongar na realidade.

Essa asseveração remete à necessidade de identificação dos mecanismos que favorecem a permanência de determinada atitude ou comportamento social. É nesse processo de identificação que Adorno (1995) situa a existência da projeção feita ao professor de sentimentos ambivalentes que remonta ao próprio aparecimento da profissão.

Sobre isso Adorno (1995b) constata que historicamente sempre existiu uma desvalorização do domínio de habilidades relacionadas ao espírito. E, essa desvalorização era paralela ao engrandecimento às forças físicas. Em ambos os casos, Adorno identifica a existência de certo rancor, ou seja, um ressentimento por não haver conseguido adquirir esta ou aquela capacidade. Vejamos o seguinte exemplo (Adorno, 1995b, p. 102-103):

[...] Uma atitude em que se misturam o respeito pela independência do espírito e um desprezo, ainda que tênue, por quem, não portando armas, logo pode ser tornar vítima de esbirros. Movidos por rancor, os analfabetos consideram como sendo inferiores todas as pessoas estudadas que se apresentam dotadas de alguma autoridade, desde que não sejam providas

de alta posição social ou do exercício de poder, como acontece no caso do

parte de suas funções, o ódio ou a ambiguidade que caracterizava o ofício do monge é transferido para o professor (Grifos Nossos).

A projeção deste rancor em relação ao professor é um fenômeno extremamente complexo para ser compreendido. Adorno (1995b, p. 103) reconhece essa dificuldade logo em seguida à afirmação acima quando procura responder os motivos da continuidade dessa projeção ao longo da história. Mas, apesar desta dificuldade, ele arrisca uma interpretação acerca dos motivos da continuidade dessa projeção em relação aos professores.

Para discorrer sobre isso, Adorno (1995b, p. 103) argumenta que “[...] A ambivalência frente aos homens estudados é arcaica”. Nesse sentido ele cita não apenas a profissão docente, mas também aquelas relacionadas à medicina e à jurisprudência como exemplos em que se verificava inicialmente a presença da ambivalência de sentimentos. Assim, o autor interroga os motivos pelos quais, no decorrer da história, essa ambivalência foi sendo destituída das demais profissões e permanecendo apenas em relação ao professor.

Por ser extremamente cauteloso em relação às conclusões a que chega acerca dos fenômenos sociais, Adorno (1995b, p. 103) adverte que “[...] Explicar por que algo não ocorreu sempre implica grandes dificuldades do ponto de vista da história do conhecimento”. Feita esta observação ele arrisca uma possível interpretação das motivações da permanência dessa projeção negativa em relação à profissão docente. Para tanto, toma como exemplo um fato, segundo ele, facilmente observado pelo senso comum:

Os juristas e os médicos não se subordinam àquele tabu e são igualmente profissões intelectuais. Mas, estas constituem hoje o que se chama de profissões livres. Subordinam-se à disputa concorrencial; são providas de melhores oportunidades materiais, mas não são contidas e garantidas por uma hierarquia de servidor público, e por causa dessa liberdade gozam de maior prestígio (ADORNO, 1995b, p. 103).

Essa constatação evidencia mais uma vez a influência da materialidade sobre a dimensão subjetiva da sociedade. E, insere-se neste conjunto, a própria imagem que o professor faz de si na medida em que ele reconhece todas essas diferenças elencadas por Adorno quanto à sua profissão quando comparada às demais. Na quarta seção deste trabalho abordaremos essa questão ao analisar um programa de formação de professores que teve início nos finais da década passada.

Na comparação acima feita por Adorno (1995b) em relação à profissão docente e as demais, opõe-se ainda diferenças que, em decorrência do modo de produção predominante na sociedade, podem favorecer em maior ou menor grau o nível de rejeição a cada uma delas.

No que tange os benefícios das profissões asseguradas pela estabilidade do cargo público – como ocorre com a docência, por exemplo – a garantia do exercício contínuo da profissão muitas vezes é utilizada como sinônimo de vantagem em relação às profissões liberais, como a do médico e dos advogados, por exemplo. Contudo, Adorno lembra que, em contrapartida, a exigência do cumprimento de horários estabelecidos pelo relógio-ponto e a rotina exercida no interior de escritórios – ou salas de aula, no caso do professor – expressam a desvantagem trabalhista dessa categoria. Neste sentido, Adorno (1995b, p. 103) chega a afirmar que, trabalhando sob estas condições, estes profissionais “[...] se assemelham a verdadeiros animais de carga [...]”.

Mas, um aspecto se mostra relevante em relação aos cargos públicos dos quais o professor é integrante. Conforme já afirmamos a partir de Adorno (1995b), a projeção negativa feita em relação aos intelectuais não se aplica nos casos em que o indivíduo desfruta de verdadeiro prestígio econômico ou que detém algum poder efetivamente outorgado em razão do cargo ocupado.

No caso do exercício da profissão docente, não há a presença dessa combinação acima e nem mesmo de cada um destes elementos separados. Isso confere à docência uma “imagem maquiada” tanto de status quanto de poder. Pois, na prática efetiva da profissão o docente não alcança objetivamente nem a riqueza material, nem mesmo o efetivo de ação e decisão. Em razão disso, Adorno afirma que:

[...] Por sua vez, os juízes e funcionários administrativos tem algum poder real delegado, enquanto a opinião pública não leva a sério o poder dos professores, por ser um poder sobre sujeitos civis não totalmente plenos, as crianças. O poder do professor é execrado porque só parodia o poder verdadeiro, que é admirado. Expressões como “tirano de escola” lembram que o tipo de professor que querem marcar é tão irracionalmente despótico como só poderia sê-lo a caricatura do despotismo, na medida em que não consegue exercer mais poder do que reter por uma tarde as suas vítimas, algumas pobres crianças quaisquer. (ADORNO, 1995b, p. 103-104)

Numa sociedade capitalista como a que vivemos atualmente, a necessidade de status e poder – econômico ou funcional – se apresenta como indispensável à lógica produtiva na medida em que o consumo de mercadorias é defendido como o caminho exclusivo para a satisfação dos desejos particulares dos indivíduos. Se as pessoas desejam a posse desses dois elementos (status e poder), eles são projetados nas personalidades das profissões, compondo os chamados “tipos ideais” tão enfaticamente apontados por Adorno (1995b). Certamente,

estão excluídas deste leque todas aquelas profissões que historicamente estiveram alheias a estes princípios, como é o caso do magistério.

Portanto, a partir da congregação destes elementos de ordem material e subjetiva é que, na perspectiva adorniana, desencadeia todo o movimento histórico de aversão à profissão