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2 PELOS CAMINHOS DA PRODUÇÃO ACADÊMICA: DIÁLOGO COM AS

2.3 CONTRIBUIÇÕES DO PPGE/UFES À EDUCAÇÃO DO CAMPO

Muitas pesquisas desenvolvidas pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, PPGE/UFES, em diferentes linhas de pesquisa tratam de questões políticas, históricas e culturais dos povos campesinos do Espírito Santo, como é o caso das pesquisas de Weber (1998), Zen (2006), Perini (2007), Castelluber (2014), Lovatti (2014), Dettmann (2014) e Moreto (2015). Dessas, quatro contribuíram mais especificamente para o nosso estudo, por serem desenvolvidas em comunidades com características semelhantes ao nosso objeto de estudo: Weber (1998), Lovati (2014), Dettmann (2014) e Moreto (2015).

A pesquisa de Weber, um estudo etnográfico sobre a escolarização entre os descendentes pomeranos na comunidade de Melgaço em Domingos Martins, considera a influência da Igreja Luterana no processo de escolarização dos pomeranos, bem como a resistência que ainda há para cumprir a escolarização dos anos finais do ensino fundamental. Por se desenvolver numa escola multisseriada, a pesquisa de Weber detalha minuciosamente o cotidiano desta escola na comunidade pesquisada: a chegada dos alunos e da professora, a realização das tarefas, a divisão do quadro de giz para atender às diferentes séries, o uso do livro didático com excessivo uso de cópia, sem intervenção do professor, a comemoração de datas como Páscoa, o recreio com brincadeiras de roda e queimada, a escovação e as aulas de recreação.

Weber considera que, em uma escola unidocente, o cotidiano escolar é fortemente imprimido pelas características da professora: Ela e as demais pessoas envolvidas dão sua contribuição específica, repetindo, recriando e criando a cultura, o dia-a-dia da escola. Nesse sentido, há aspectos positivos e outros nem tão positivos sendo vividos na comunidade escolar, mas segundo a autora, esse cotidiano afinal é a escola possível e real para as crianças, daquela comunidade naquele espaço de tempo (WEBER, 1998, p.198).

No entendimento de que as discussões de escolas multisseriadas do campo, não podem estar desvinculadas das discussões do atendimento à educação infantil no campo, encontramos em Lovati (2014), um diálogo sobre as propostas de atendimento

às crianças do campo. O estudo aponta que a formação e docência na educação Infantil no campo, no município de Itapemirim-ES indicam o início da organização infantil neste contexto, que se expressa pela manutenção dos espaços físicos e proposta de formação continuada. No entanto, sinalizam para a necessidade de investimentos no atendimento da demanda com estruturas físicas apropriadas e que as formações sejam específicas ao contexto do campo, integrando os referenciais da Educação do Campo.

O estudo evidencia que a maior parte do atendimento à Educação Infantil no campo, no município pesquisado é feito em escolas de Ensino Fundamental ou em classes multisseriadas. Na análise de Côco (2011), esta é uma realidade recorrente no Espírito Santo, mas a autora alerta que “a especificidade da Educação Infantil, aproximada à especificidade das crianças que vivem no campo, não pode sucumbir à lógicas educativas de síntese na figura do aluno que vai pra escola” (CÔCO, 2011, p. 12). Por outro lado, esta forma de atendimento, contrasta com a decisão de muitos municípios em formar polos de atendimento no campo em Centros de Educação Infantil, cujo acesso se faz pelo uso de transporte escolar.

Sem dúvida esse atendimento atende à especificidade das crianças pequenas, mas coloca em evidência um problema já apontado anteriormente na pesquisa de Pantel (2011), em que o transporte escolar utilizado desde à Educação Infantil passa a ser naturalizado pelas famílias, enfraquecendo a escola da comunidade, pela preferência das famílias em matricularem os filhos na escola de Ensino Fundamental do polo. Não se trata aqui de crítica a um ou a outro atendimento, mas de alertar para que as formas de atendimento à Educação Infantil e às séries iniciais do Ensino Fundamental sejam pensadas dentro da lógica de atendimento à infância no campo e que alternativas sejam pensadas em conjunto com as comunidades para um atendimento satisfatório.

Por sua vez, a pesquisa de Dettmmann (2015), apresenta contribuições quando considera as características de uma professora em articular os saberes escolares com os saberes que emergem da experiência, o que na comunidade pomerana, faz toda a diferença no processo de ensino e aprendizagem. O foco da pesquisa de Dettmann são as práticas e saberes da professora pomerana para o desenvolvimento de uma educação intercultural e evidenciou que as práticas da professora se ressignificam na

interação com os saberes culturais, experienciais e coletivos produzidos na dinâmica escolar e comunitária, pois os saberes culturais que possui a movem na busca de mais conhecimentos para melhorar as suas práticas como docente. Essas práticas possibilitam o diálogo da cultura escolar com a cultura da escola, promovendo a vivência das experiências locais e o acesso ao saber universal.

A tese de Moreto (2015), Gerações de Professoras de Classes Multisseriadas do Campo consistiu de um estudo sobre os processos de formação e trabalho vivenciados por diferentes gerações de professoras de escolas de classes multisseriadas do campo no município e Santa Teresa, no Espírito Santo. Utilizando- se do conceito de gerações elaborado por Karl Mannheim (1993), a pesquisa caracterizou dois grupos geracionais distintos: um primeiro grupo de professoras que nasceram na década de 1960 e um segundo grupo de professoras que nasceram na segunda metade da década de 1970. O primeiro grupo se orienta pelo forte senso de dever, encaram a profissão como vocação. O segundo grupo, são de professoras que apresentam uma orientação ou representação coletiva produtivista. Mais que saber o que fazer, as professoras deste grupo preocupam-se com o como fazer e para isso buscam construir um repertório de atividades visando a produtividade do aluno. Também nesta lógica produtivista, as professoras do segundo grupo, desdobram-se para acompanhar processos de formação com o objetivo de manterem-se competitivas no mercado.

Quanto à multissérie, o primeiro grupo não a considerava como o principal problema, uma vez que tinham que desempenhar várias tarefas, como cozinhar limpar e dar aulas. Já para o segundo grupo, a multisseriação é um empecilho, diante das cobranças por produtividade a que estão submetidas. Segundo Moreto (2015), tais exigências por produtividade têm levado as professoras de escolas de classes multisseriadas a um constante processo de comparação com as escolas unisseriadas em busca de uma suposta igualdade de condições para os alunos e para elas.

A pesquisa de Moreto (2015) nos faz pensar sobre os processos que mantinham a escola e o professor atrelados à comunidade e nos processos que aos poucos apartaram a escola e o professor da comunidade. Nos faz pensar sobre o interesse deste estudo que procurou compreender as imagens fotográficas na mediação das

memórias dos sujeitos sobre a escola multisseriada na comunidade campesina, em Santa Maria de Jetibá-ES.