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Após a apreciação sobre esses autores junguianos, pode-se perceber que o tema é de fundamental importância para o corpo teórico da psicologia analítica. Todos os autores concordam essencialmente com a autenticidade da psique, destacando que o inconsciente é um fenômeno natural e fundamental do ser humano. Defendem uma psicologia de base criativa de onde todos os processos psíquicos derivam e creem na afirmação da criatividade como o instrumento principal para se compreender o homem. Afirmam que psique produz formas espontaneamente.

Tecendo uma comparação mais próxima entre os autores, pode-se afirmar que para Neumann (1974) a criatividade consiste em um impulso natural, uma tensão emocional característica de um complexo capaz de transformar a vida do sujeito. Ela se manifesta como uma síntese entre o subjetivo e o objetivo, tendo como função principal desenvolver a personalidade. Storr (1993) afirma que a criatividade tem uma função adaptativa que auxilia na reorganização da experiência interna. A partir da tensão gerada pelos opostos, se manifesta em forma de algo novo, original, que auxilia no reestabelecimento do equilíbrio da psique.

Para Hillman (1984, 2010a), a criatividade é um impulso que amplia a consciência e desenvolve a personalidade, ocorrendo a partir das imagens que acontecem ao indivíduo. Por considerar que a criatividade é anterior à criação, entende que ela se manifesta em imagens e tem como principal função possibilitar o ‘Fazer alma’. Staples (2009) entende que a criatividade, além de ser uma urgência instintiva, consiste em uma organização dos elementos que surgem à consciência. Manifesta-se através da integração dos opostos e tem a função de espelhar o indivíduo a si próprio, conduzindo-o em seu desenvolvimento e tornando-o mais autêntico.

Pode-se perceber, nas considerações teóricas apresentadas, uma preocupação em justificar a psicologia junguiana a partir da realidade psíquica, colocando-a como fator primário e estrutural do ser humano. Essa preocupação é uma busca pela legitimidade do fenômeno da psique e uma tentativa de reorientar e suavizar a postura que valoriza apenas a supremacia da razão. E é a partir deste entendimento de que a psique é um fenômeno verdadeiramente natural do ser humano, que os autores defendem a criatividade como caminho principal para o desenvolvimento do homem. É ela quem auxilia na elaboração dos processos psicológicos, amplia a consciência, promove o contato do sujeito consigo mesmo e torna-o mais autêntico, facilitando o processo de individuação. Os autores

compartilham a opinião de que a criatividade é um impulso para a criação, uma urgência instintiva que induz o homem a pensar além de si mesmo.

Pode-se destacar que há concordância de que o ato criativo está sempre acompanhado do risco da destruição. Neumann (1974) destaca que o inconsciente é visto como ameaçador pela consciência que se distanciou exageradamente dele. Hillman (2010a) postula que este sofrimento é parte inerente do ‘fazer alma’, do caminho que o sujeito precisa fazer para se relacionar com o inconsciente. A este aspecto, Staples (2009) adiciona que estabelecer esta relação é um ato de ordenação diante do caos, ou uma reestruturação do equilíbrio psíquico, na visão de Storr (1993).

Neumann (1974) e Storr (1993) se encontram na defesa de que o sujeito criativo está em conflito entre o arquétipo da mãe e o arquétipo do pai, buscando na solução criativa uma forma de resolver esta tensão. Ambos se encontram ainda na defesa de que, para que o ato criativo ocorra, o sujeito deve suportar a tensão, fruto dos opostos. Deve possuir o ego suficientemente forte para adiar a resolução da tensão até que se sinta satisfeito com seu resultado. Staples (2009) também converge ao mesmo ponto ao afirmar que a criatividade é um espaço vazio, um útero à espera da concepção, uma abertura na consciência que precisa ser mantida até que a criação aconteça.

Um ponto comum entre os autores, que precisa ser destacado, é que o tema da criatividade muitas vezes é analisado a partir do fenômeno artístico, o que pode levar a um entendimento dúbio dessas afirmações. Principalmente em Neumann (1974) e Staples (2009), mas também em Storr (1993), vê-se que em determinados momentos o termo ‘arte’ surge como sinônimo de ‘criatividade’. Tal confusão é inerente ao próprio método de estudo empregado pelos autores, que se voltaram exclusivamente ao fenômeno artístico para investigar os atributos da criatividade. Hillman (1984) se destaca por fazer inserções para alertar que a criatividade é anterior à arte. Este assunto será retomado durante a discussão.

Finalmente, os autores se encontram na defesa de que a criatividade é um processo de transformação e desenvolvimento da personalidade do homem, de resolução das oposições e tensões psíquicas, uma energia que impulsiona o desenvolvimento psicológico do homem e atua como peça fundamental do processo de individuação.

4 PANORAMA ATUAL SOBRE CRIATIVIDADE NA PERSPECTIVA JUNGUIANA

Passa uma borboleta por diante de mim E pela primeira vez no universo eu reparo Que as borboletas não tem cor nem movimento, Assim como as flores não têm perfume nem cor A cor é que tem cor nas asas da borboleta, No movimento da borboleta o movimento é que se move O perfume é que tem perfume no perfume da flor A borboleta é apenas borboleta E a flor é apenas flor. (PESSOA, 2005, p. 63)

Este capítulo tratará de artigos e publicações pesquisados sobre o tema da criatividade produzidos por alguns dos principais autores junguianos contemporâneos, assim como clássicos que permanecem relevantes. As afirmações e desdobramentos desses textos ponderam sobre a importância da criação para o homem e a relevância de seu estudo no desenvolvimento do campo da psicologia analítica. As produções apresentadas pelos autores estão agrupadas em temas que destacam aspectos que permitem uma compreensão do fenômeno estudado.