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Conversão ética

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3. HUGO ASSMANN E A QUESTÃO DA ESPIRITUALIDADE E A EDUCAÇÃO PARA A

3.2 As Conversões Epistemológicas, Éticas e Espirituais e a Educação para

3.2.2. Conversão ética

A segunda forma de conversão diz respeito a conversão ética para a educação, para a solidariedade e também para a reconstrução da sociedade na qual vivemos.

Entende-se ética como uma reflexão acerca dos valores que orientam a conduta, tanto das pessoas quanto da sociedade. De acordo com Johannes Hessen, o valor é “a qualidade de uma coisa que só pode pertencer-lhe em função de um sujeito dotado com uma certa consciência capaz de a registrar” (HESSEN, 1967, p. 47). A partir dessa conceituação de valor, podemos observar que o valor não é algo por si existente, mas ele existe na ideia de alguém; por consequência, o mesmo possui uma relação com o sujeito que não pode ser desvinculada, uma vez que, caso isso ocorra, estaria sendo coisificado. Dessa maneira, ética e sujeito devem estar em consonância para que seja possível alcançar o efeito desejado. Caso isso não ocorra, a ética acontecerá de maneira deturpada.

Na atualidade, por exemplo, a nossa sociedade vem presenciando o fenômeno da globalização que universaliza as relações mercantis e descarta o outro se achar que é preciso, o que acaba por fragmentar e desestabilizar a noção de ética que possuímos. A primeira responsabilidade deve ser a de incorporar o outro, de percebê-lo como individuo participante do nosso mundo. Maturana nesse sentido nos fornece uma importante ajuda para podermos entender tal concepção:

Em 1955 eu era estudante na Inglaterra. Visitei, com vários amigos chilenos, uma exposição de quadros de um pintor japonês sobre a destruição e o sofrimento gerados pela bomba atômica lançada sobre Hiroshima. Ao sair, um dos meus amigos disse: ‘- Que me importa que tenham morrido 100 mil japoneses em Hiroshima se eu não conhecia nenhum! Ouvir isto me deu calafrios e, ao mesmo tempo, me pareceu maravilhoso. Agradeci ao meu amigo que o tenha dito, porque me fez entender algo fundamental: se não tenho imaginação para incorporar aqueles japoneses no meu mundo aceitando-os como legítimos outros na convivência, não posso preocupar-me com o que lhes aconteça como consequência de meus atos. Sua honestidade era maravilhosa e reveladora, ainda que chocante. (MATURANA, 1998, p. 73).

A partir dessa visão de responsabilidade ética, é possível se evitar as duas barbáries citadas por Morin: “a barbárie de destruição e morte, que vem do fundo das eras e a barbárie anônima e fria do mundo técnico-econômico” (MORIN, 2000, p. 72.)

Nesse ponto vale a pena lembrarmos que é necessário que passemos por uma conversão ética que incentive o ser humano a tomar importantes decisões, ou seja, que leve o ser humano a uma mudança de comportamento, a um rompimento de pensamento e também de caráter individualistas que já foram formados pelo sistema. Com isso, se faz possível possuir condições de conceder maior valor aos atos alicerçados em preceitos éticos-humanizadores e universais que enfatizem a solidariedade, a comunhão e os laços fraternos no convício social.

A conversão ética é uma importante possibilidade de mudança para todos aqueles que são oprimidos vivendo sob o domínio do capitalismo, possibilita também caminhos para uma vivencia mais solidária em sociedade. Tais caminhos precisam trilhar pela via da reciprocidade, da compaixão, que “abram as janelas armadas com linhas divisórias” (ASSMANN, 2001, p.89), reinventando relacionamentos interpessoais, onde todos possuam direitos iguais, possuindo plena consciência da necessidade mutua para sobreviverem. Nesse sentido, Sung e Silva vão afirmar:

Mas a vida nos ensina que ninguém, ou quase ninguém, pode viver totalmente isolado, não somente por causa das necessidades afetivas, mas também por causa das necessidades materiais. (...). A necessidade de conviver com os outros nos leva à necessidade de estabelecermos relações que permitam a sobrevivência de todos os que compõem a coletividade. Isso significa na prática que os meus direitos e interesses não podem ser absolutizados na medida em que entram em conflito com interesses e direitos de outros com os quais necessito conviver. A absolutização dos meus interesses seria a negação dos direitos de outros e a declaração de que eu não necessito deles para viver. Se cada um toma este tipo de atitude, torna-se impossível a vida em grupo social. (SUNG; SILVA, 2011, p. 20-21)

Podemos notar que a educação é de fundamental importância para o aparecimento da conversão ética, uma vez que a mesma pode contribuir para inserir nos alunos o que é tido como sabedoria ética, que por sua vez é reflexo da conversão, uma vez que “somos ainda carentes de sabedoria ética para o mundo complexo no qual vivemos” (ASSMANN; SUNG, 2000, p.267). É necessário, também, ter um certo embasamento no pensamento complexo, tendo em vista que sua compreensão é de suma importância, para conseguirmos entender a dinâmica do universo que por si só é complexo, o próprio ser humano e a sociedade que também são complexos:

A educação baseada no pensamento complexo nos ajuda a entender melhor a relação complexa e contraditória entre os desejos que nascem da sensibilidade solidária e os princípios organizativos da sociedade. Além disso, nos permite entender um pouco melhor as razões do enfraquecimento da noção da responsabilidade na nossa sociedade e também nos mostra caminhos para o fortalecimento do sentimento de responsabilidade ética e da solidariedade. (ASSMANN; SUNG, 2000, p. 267).

Em síntese, podemos afirmar que carecemos de uma práxis educativa constante que possa interferir e transformar a realidade na qual vivemos, da mesma maneira que esse ser humano pós-moderno possa dispor de um diálogo

crítico e reflexivo, onde a criação não seja privilegio restrito da elite dominante. A educação é uma das principais portas que deve ser aberta para acolher, multiplicar e nutrir para que a conversão ética possa acontecer.

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