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CAPÍTULO III “Só se você me der a câmera”! TICs e suas Possibilidades nas

3.2 Corpo e Movimento: Imaginação da “Gravidade Zero”

Uma das etapas do estágio que proporcionou diversas experiências para os envolvidos no processo de intervenção pedagógica, foi a organização de ensaios fotográficos que entrecruzou imaginação e movimento. Inspirados no projeto do fotógrafo alemão Jan Von Holleben intitulado Dreams of Flying (Sonhos de Voar), procuramos através de fotos criar um plano de ação que extrapolasse o real. A partir da intersecção entre as possibilidades técnicas da fotografia e a imaginação, buscamos, com as crianças, representar movimentos que desafiavam os limites da gravidade. Para tal proposta, posicionamos tatames de borracha no chão onde as crianças eram convidadas a se deitar e posicionar o corpo para compor a cena. Com auxílio de uma escada, fotografamos as crianças do alto com a câmera posicionada na vertical.

A seguir, apresentamos alguns exemplos de fotos que foram produzidas nos dois momentos de Educação Física que destinamos para o ensaio fotográfico:

Figura 17 – Super-Homem em Ação

Estas fotos representam algumas das cenas construídas com as crianças. Na primeira delas, a imagem traz uma criança voando em uma vassoura. Na segunda, o voo do super-herói. A terceira representa um salto desafiador entre caixotes. Já na quarta foto, temos um salto de paraquedas.

Inicialmente, podemos observar que as fotos são fruto de arranjos estáticos. Porém, ainda que feitas com as crianças praticamente imóveis, as imagens representam movimento. A linguagem que o corpo apresenta nestas fotos nos remente à sensação de movimento, mesmo sendo feitas a partir de uma posição estática. Como isso é possível? Realizar uma foto estática, mas que o resultado ilustra movimento? Este foi um pequeno dilema que enfrentamos logo nos primeiros momentos em que iniciamos as sessões de fotos. Afinal, era preciso que as crianças compreendessem o processo técnico implicado na organização do ensaio fotográfico. E, a partir desta compreensão, pudessem se entregar à proposta e construir suas próprias narrativas a partir das imagens.

Apesar de termos feito muitas explicações verbais orientando as crianças sobre qual a posição que elas deveriam ficar para que a foto fosse batida, elas não conseguiam compreender qual era esse posicionamento corporal e como aquilo iria representar que elas estariam voando de vassoura ou até mesmo saltando de paraquedas, sendo que elas estavam ali, totalmente Figura 19 - Saltando de Paraquedas

estáticas. Cabe ressaltar que esta transposição era difícil não apenas para as crianças, mas também para os adultos que acompanharam a proposta. Então, nos primeiros momentos, as crianças estavam bastante confusas.

Como bem descreveu o coordenador do projeto de Educação Física do NDI “às vezes as palavras não chegam, não dão conta de dizer o volume, a grandiosidade da experiência”. A solução encontrada, foi que além da explicação, era necessário a demonstração. A partir do momento em que Karoliny e eu, simulamos a situação e apresentamos paras as crianças o resultado da foto ali na hora, através do visor da câmera, elas ficaram encantadas com o que viram e se empolgaram para participar da brincadeira. Percebendo então que a demonstração foi um recurso pedagógico que auxiliou as crianças naquele momento, esta passou a ser realizada constantemente na dinâmica de produção das fotografias. A imagem abaixo ilustra um dos momentos de demonstração do professor deste exercício.

Outro aspecto bem interessante evidenciado no ensaio fotográfico foi a presença da ludicidade. Pensando nisso, alguns objetos foram disponibilizados, contribuindo para que a brincadeira e narrativa pudessem caminhar juntas no ensaio. Esta questão da ludicidade é destaca pela professora de sala:

[...] aquela é uma foto de posição parada, de um plano parado. E aí como trazer a questão de ludicidade para a criança ficar numa posição parada, mas não sem graça. Porque não é uma foto de estúdio, não é uma foto profissional. É diferente. É uma foto lúdica, é uma foto de brincadeira, é uma foto que tem um plano diferente, uma ação diferente, foi muito, muito bacana. Nesse sentido, os objetos que estavam à volta como a vassoura, a capa e etc... nossa, eles tem tudo a ver com a questão da ludicidade. Com a possibilidade de Figura 20 - Demonstração do Voo

imaginar, os objetos possibilitam o exercício imagético, são signos importantes para o processo imaginativo. (Depoimento professora de sala) Porém, não fomos somente nós estagiários que trouxemos elementos para dentro da sessão de fotos, contribuindo para a ludicidade. As próprias crianças levaram consigo seus brinquedos para compor a cenas da brincadeira, ou ainda se apropriaram de objetos que estavam a sua volta, tornando-os brinquedos e trazendo-os para dentro do cenário. Como destacam Oliveira e Rubio, “O brinquedo tem para criança um significado muito forte, pois é a ponte que liga a imaginação à brincadeira. Com ele a criança pode imaginar e dar novos significados tanto a objetos que não seja necessariamente um brinquedo, como aos brinquedos.” (OLIVEIRA; RUBIO, 2013, p.7). A seguir, trago algumas fotos que ilustram estes momentos em que objetos foram incorporados às cenas.

Como podemos observar na figura 21, as duas crianças estão com um objeto posto em suas costas. O material são bolas antigas que foram cortadas ao meio pela professora de Artes da instituição com a intenção de torna-las chapéus. As crianças, inicialmente, ao verem estes objetos, colocaram-nos nas suas cabeças (talvez pelos usos já feitos deste material em outros momentos na instituição). Porém, as metades de bola eram demasiado grandes, ficaram folgados e acabavam caindo da cabeça das crianças.

Então uma das crianças, se apropriando deste objeto, transformou-o em uma espécie de fantasia e começou a experimentá-lo de diversas formas. Em uma destas possibilidade, a criança se ajoelhou e pôs o objeto em suas costas, como mostra a imagem a seguir:

Ao perceber que o que ela havia feito a lembrava de um animal, ela começou a demonstrar para todos e falar que com aquele brinquedo nas costas, ela havia se tornado uma tartaruga. A ideia ficou tão atrativa que outras crianças também começaram a experimentar essa representação corporal. Elas gostaram tanto, que as próprias crianças levaram essa brincadeira para dentro do ensaio fotográfico. Segundo elas, as tartarugas também iam saltar de paraquedas e não somente as crianças. E foi isso que as duas crianças na figura 21 queriam representar: as tartarugas saltando de paraquedas.

Outros brinquedos trazidos pelas crianças também fizeram parte dos cenários. Muitas delas faziam questão de que o brinquedo estivesse presente no momento das fotos, como podemos ver nas seguintes imagens:

Nesta imagem, podemos observar três objetos que potencializaram a ludicidade nas aulas: a vassoura e a capa, objetos que caracterizavam a bruxa, e o cachorrinho de pelúcia, brinquedo trazido por uma das crianças para instituição.

Figura 23 - O Voo da Bruxa e seu "Cãozinho" de Pelúcia

Nesta outra foto, o menino também usa uma capa para brincar. Neste caso, a capa é um elemento que catalisa a imaginação para que a criança se torne um super-herói na cena. Em suas mãos, pulando junto com ele entre os caixotes, está um boneco do personagem Homem de Ferro.

Já na figura 25, o brinquedo que foi trazido pela criança para saltar junto com ela de paraquedas foi a boneca. Essa era uma criança bastante tímida e, no momento da realização da foto, percebemos que se a boneca fosse inserida na cena – ou seja, se a boneca não saltasse de paraquedas juntamente com ela – ela não iria participar. Assim, posicionamos as duas para que a fotografia/salto acontecesse.

Outro fator determinante no momento das fotografias foi a interação e a brincadeira entre as crianças em cima do tablado em que as fotos estavam sendo realizadas. A todo instante, as crianças interagiam umas com as outras, observando e imaginando situações através das fotos que os colegas iam realizando e, até mesmo, dando dicas de qual objeto utilizar na hora da foto, ou ainda, discutindo qual objeto cada um iria usar no momento em que eles fossem tirar as fotos em grupo. Esta interação pode ser observada nas imagens a seguir.

Nesta imagem, as crianças que participaram discutiram entre elas qual capa cada uma iria utilizar para que todos, uma vez fantasiados, pudessem voar como os super-heróis.

Já na figura 27, as meninas realizaram o salto interligadas entre si através de um barbante. Foram as próprias meninas que trouxeram essa ideia de construir a cena do pulo em uma situação em que uma ajudasse a outra através da conexão pelo barbante.

Estes foram apenas alguns exemplos de imagens que foram criadas através da apropriação do cenário por parte das crianças. Esta relação de co-produção cultural com as crianças não aconteceu somente no ensaio fotográfico. Durante todo o estágio, deixamos que elas pudessem se expressar e trazer elementos que modificassem as propostas das aulas. No Figura 26 - O Voo dos Super-Heróis

caso das fotografias, em decorrência do envolvimento das crianças como sujeitos do processo de criação das cenas, um arranjo que poderia ser entediante pelo fato de exigir que as crianças ficassem imóveis ao posar para as fotos se tornou uma brincadeira: estar imóvel era, no momento das fotografias, uma ação lúdica, envolvente e criativa.

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