• Nenhum resultado encontrado

Correios na América portuguesa: percalços do processo de centralização

Assistentes de correio na América portuguesa: resistências locais ao serviço postal

Conforme apontado no capítulo anterior, a família Gomes da Mata garantiu para si jurisdição para o ultramar em 1657, com a compra do ofício de Correio-mor das Cartas de Mar. A partir de então, o detentor do ofício pode nomear assistentes para todos os domínios, exceto a Índia. Isso significou a expansão do correio enquanto instituição moderna para os domínios imperiais portugueses.

Contudo, a aplicabilidade do correio tal como formulado no espaço europeu entre os séculos XVI e XVII ganhou diferentes contornos ao entrar em contato com as instâncias administrativas atuantes no ultramar. A gestão da comunicação a distância, cada vez mais entendida no Reino como um elemento passível de organização e coordenação por agentes atuantes em favor da Coroa, muitas vezes não teve o mesmo entendimento pelos poderes locais então instituídos. No espaço imperial, o envio de cartas era organizado de maneira diversa, pautado no costume e em práticas culturais arraigadas, as quais não estavam submetidas à uma lógica de organização centrada em qualquer aparato administrativo formal. Isso fica claro quando se toma como exemplo as resistências impetradas aos Assistentes de Correio-mor em algumas capitanias.

A existência de Assistentes de Correio-mor não era novidade em Portugal, e, no século XVII, existiram oficiais nomeados para localidades como Porto, Coimbra, Aveiro e Braga. Contudo, estes só foram subordinados ao Correio-mor do Reino em 1606, no momento da venda do ofício ao 5º Correio-mor Luís Gomes Coronel da Mata202. A partir desse momento, da Mata pode nomear seus Assistentes e receber um valor pago em dinheiro por estes (uma pensão), que seria uma porcentagem do porte cobrado pelas cartas das regiões em questão 203. A extensão desse sistema para o restante do Império português só foi feita após a compra do ofício de Correio das Cartas de Mar, em 1657. Com isso, Luís Gomes da Mata, 7º Correio-mor,

202 19/07/1607. Alvará de Felipe II regulando a situação dos correios assistentes no Porto, Coimbra, Aveiro e

Braga, nomeados antes da venda do ofício de correio-mor do Reino. Godofredo Ferreira, Documentos dos séculos

XIII a XIX relativos a correios: séculos XVIII e XIX, org. Isabel Sanches, vol. III (Lisboa: Fundação Portuguesa

de Comunicações, 2008), 125.

203 Conforme se pode ver das pensões cobradas no Inventário dos bens com que faleceu o Correio mor do Reino,

António Gomes da Mata, de 1644. Godofredo Ferreira, Documentos dos séculos XIII a XIX relativos a correios: séculos XVIII e XIX, org. Isabel Sanches, vol. III (Lisboa: Fundação Portuguesa de Comunicações, 2008), 213.

71

conquistou para si o direito de nomear Assistentes em diversas partes do ultramar, o que foi feito ao longo dos anos 1660. Diferentemente do caso do Reino, provavelmente os Assistentes dos domínios não pagavam nenhuma pensão ao Correio-mor. Na verdade, estes oficiais conseguiam para si o direito de recolher a totalidade do porte das cartas que chegassem aos portos do ultramar a partir da compra do ofício de assistente das mãos do Correio-Mor do Reino, que tinha o direito de aliená-lo204.

A partir desse momento, foi reafirmada a importância do Correio-mor para garantir o bem público. Com a extensão do poder da família Gomes da Mata para o ultramar, é possível perceber o funcionamento de uma estrutura governativa na qual o Rei buscava materializar seu poder no vasto espaço imperial por meio da representação de seus agentes. Essa estratégia também permitia com que os vassalos atribuídos a determinado ofício construíssem «sentimento de pertença» ao Império205. Esses dois pontos constituíam o que a historiografia chama de «economia política de privilégios»206.

No caso dos correios, isso significava a manutenção de um sistema que garantisse, de forma eficiente, a comunicação à distância, a partir da delegação da função a um vassalo. Logo, a distribuição do poder régio se deu pela nomeação de pessoa competente, investida no ofício de Correio-mor das Cartas de Mar. Essa forma de pensar e estruturar a realidade administrativa da época pode ser vista em correspondência de Luís Gomes da Mata ao Conselho Ultramarino, no qual indicou os graves prejuízos ao público pelo fato de os governadores das capitanias não fazerem cumprir a ordem de se nomear os correios assistentes:

[...] que para o ofício das Cartas do Mar, foi Vossa Majestade servido mandar-lhe dar o regimento impresso que oferece, o qual até agora nas conquistas e partes ultramarinas se não guardou, por descuido de não haver pedido provisão especial para os Governadores lhe fazerem guardar e se tem seguido inconvenientes de se furtarem e perderem cartas e letras que se viessem remetidas em saco lacrado pelos seus Assistentes, a ele suplicante, se não perderiam. Pelo que, pede a Vossa Majestade que atento ao bem público que disto resulta,

204 Luiz Guilherme Machado, “Os Assistentes do Correio mor na Bahia”, Projeto de Pesquisa, História Postal

(blog), acessado 15 de dezembro de 2017, http://historiapostal.blogspot.com/2008/02/os-assistentes-do-correio- mor-na-bahia.html.

205 Fragoso, Gouvêa, e Bicalho, “Uma leitura do Brasil Colonial – bases da materialidade e da governabilidade no

Império”, 75.

72

lhe faça mercê mandar passar provisão especial para os Governadores e Ministros das conquistas e partes ultramarinas, para que façam guardar-lhe o dito regimento (...)207.

Não obstante a extensão do sistema ao espaço imperial, é necessário levar em conta que os Assistentes de Correio-mor tinham poder de atuação limitado. Isso ajuda a compreender a resistência colocada à atuação desses oficiais em algumas capitanias. O Regimento de 1658 indica que os Assistentes eram responsáveis pela recolha e distribuição das cartas que vinham por mar, e não há na norma menção a correspondência pela via terrestre. Na prática, devido decisões tomadas pela própria Coroa, os Assistentes do ultramar acabaram por ter poder restrito se comparado àqueles do Reino, em cujo domínio também se incluíam as comunicações terrestres. A partir de 1730 a Coroa utilizou esse silêncio no regimento para limitar a atuação dos Assistentes somente ao espaço portuário, e foram impedidas as implantações de serviços terrestres em capitanias como Bahia, Pernambuco, São Paulo e Minas Gerais208. Isso provavelmente ocorreu devido a necessidade da Coroa em proteger o segredo e os caminhos das Minas, que foram palco de revoltas fiscalistas nos anos 1720209.

De acordo com Romulo Valle Salvino, é justamente essa proibição das rotas postais interiores que impactará a implantação de correios nas capitanias durante todo o século XVIII. Isso causou uma diferença essencial entre o desenvolvimento dos correios de terra em Portugal e na América portuguesa. Enquanto no primeiro caso houve um incentivo aos Assistentes de Correio para que mantivessem as comunicações interiores, no Brasil, por necessidade de controle do ouro e da informação escrita, a Coroa interditou a existência de serviços postais terrestres210. As pesquisas a esse respeito apontam para uma política centralizadora da Monarquia portuguesa, que teria tentado, por meio dessa ação, diminuir os poderes locais e controlar a circulação de informação escrita pelos caminhos das Minas 211. De acordo com Luciane Scarato, «A lógica era que, quanto mais restrito fosse o número de acessos às Gerais –

207 AHU, Reino, maço 33 apud Luiz Guilherme Machado, “A Nomeação dos Primeiros Assistentes do Correio-

mor no Ultramar”, Projeto de Pesquisa, História Postal (blog), acessado 15 de dezembro de 2017, http://historiapostal.blogspot.com/2008/02/nomeao-dos-primeiros-assistentes-do.html., grifo nosso.

208 Romulo Valle Salvino, “Correios extraviados entre Lisboa e as minas: uma contribuição para a História dos

Assistentes do Correio-mor no Império Português (séculos XVI-XVIII).”, in 5o Encontro Internacional de História

Colonial: Cultura, Escravidão e Poder na Expansão Ultramarina (Século XVI ao XIX) (Maceió: Edufal, 2014),

1115.

209 Idem, 1114.

210 Romulo Valle Salvino, “Cartas da terra: o Correio mor e a centralização do poder no Reino e na Colônia”,

Postais - Revista do Museu Nacional dos Correios 1 (2013): 50–51.

211 Maria da Graça Menezes Mourão, “O cerceamento da comunicação por Correios na ‘capitania de todos os

73

a grande fonte Setecentista de riquezas da Coroa portuguesa – mais fácil e menos oneroso seria o trabalho de vigiá-las, de evitar o contrabando e de protegê-las contra invasões estrangeiras»212.

Essa é uma das explicações para o fato de os assistentes nunca terem conseguido atuar plenamente no espaço da América portuguesa, haja vista que os agentes de governo locais não viam utilidade em um Correio marítimo pautado sobretudo na já existente estrutura de navios mercadores. Localmente, a maior necessidade era de um sistema que mantivesse as comunicações interiores, especialmente após a descoberta do ouro nas Gerais.

No que diz respeito às capitanias costeiras, a ineficácia do serviço prestado pelos Assistentes aparece descrita de forma intensa em petições das Câmaras e homens de negócio dirigidas ao Conselho Ultramarino. A grande rotatividade de navios de comércio, que permitia a circulação frequente de correspondência, fez com que o ofício fosse visto pelos poderes locais como desnecessário. Isto faz sentido especialmente ao levar-se em consideração que o maior trabalho dos Assistentes era a mera organização e distribuição das cartas que entravam e saíam dos portos dentro das embarcações de comércio. Talvez os vassalos vissem maiores vantagens caso esses oficiais disponibilizassem embarcações próprias para o traslado postal, que circulassem em itinerário diferente dos navios de comércio213. Mas esse não era o caso.

Associado a isso, uma grande questão colocou as Câmaras e homens de negócio contra os serviços postais instituídos: o peso do pagamento de taxa para um tipo de serviço que lhes era pouco útil. Tome-se como exemplo o caso de Pernambuco em 1673, quando foi nomeado para Assistente de correio Bento da Costa. A essa altura, a Câmara entrou em contato com D. Pedro e pediu que a capitania fosse isenta do pagamento do porte, pois alegavam não haver necessidade de atuação de um correio na região. Foi afirmado o seguinte:

Pedimos a Vossa Alteza postados a seus Reais pés com asumição de Leais Vassalos, em nome de todos estes Povos, seja servido livrá-los deste dispêndio, pois não estão estes moradores, capazes de o fazerem, com a carga dos impostos que pagam, e estas capitanias

212 Luciane Cristina Scarato, “Caminhos e descaminhos do ouro nas Minas Gerais: administração, territorialidade

e cotidiano (1733-1783)” (Dissertação de Mestrado, UNICAMP, 2009), 31–33.

213 Importa lembrar que entre 1649 e 1766 a navegação para a América portuguesa funcionava pelo sistema de

frotas. Sendo assim, por questões de segurança, as embarcações entravam e saíam dos portos todas em um mesmo dia (em comboio), em períodos pré-definidos. Apenas algumas exceções existiam, de navios oficiais que circulavam isoladamente. Os navios de aviso, por exemplo, eram utilizados esporadicamente para envio de correspondência oficial fora do sistema de comboios, conforme apontado em: Eduardo Frutuoso, Paulo Guinote, e António Lopes, O movimento do porto de Lisboa e o comércio luso-brasileiro (1769-1836) (Lisboa: Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 2001), 45.

74

até o presente não necessitarem, que nelas houvesse esta ocupação de Correio; esperamos da Clemência de Vossa Alteza assim no-lo conceda para que estes moradores sejam aliviados nesta parte214.

Bento da Costa provavelmente nunca conseguiu desempenhar seu ofício. Isso porque, na primeira metade do século XVIII, há notícia de que nenhuma tentativa de implantar um serviço de correio em Pernambuco havia logrado. Essa é a informação constante em um processo de 1738, quando houve novo esforço de um assistente em assumir o ofício, o qual recebeu fortes críticas das Câmaras de Recife e Olinda. Na petição de Olinda, há a indicação de que, de fato, ninguém havia conseguido atuar na região até aquele momento: «Que haviam cento, e tantos anos que estava de posse do dito ofício, e que nunca o mandara erigir nestas Capitanias, e que a prescrição imemorial tinha forças de privilégio»215.

Assim, vemos que os representantes da Câmara pautaram-se no costume imemorial para tentar livrar-se da implantação do Correio. Pediam ao Rei que fosse mantido um direito garantido desde muito tempo. Este era um posicionamento típico dentre as instituições do Antigo Regime que tratavam diretamente com a Coroa. Especialmente as Câmaras eram, de acordo com a historiografia, um «espaço político de negociação»216. Ou seja, apesar de serem representantes do rei, os oficiais camarários «possuíam interesses identificados ao seu grupo social»217. Entre o século XVII e XVIII, a questão da liberdade das cartas era um dos pontos nos quais os interesses locais eram defendidos frente ao centro da Monarquia.

O governador de Pernambuco, levando em consideração as deliberações das Câmaras de Olinda e Recife, decidiu interceptar a atuação do Assistente, mas somente para as cartas de terra. Portanto, este só teria o papel de distribuir as missivas que chegassem pelo mar. O despacho real de 1739 indica que o governador «deferiu bem e na conformidade das minhas ordens»218. Ou seja, a Coroa tentou fazer com que a jurisdição do Assistente fosse somente relativa às cartas da comunicação transatlântica, e não dos correios interiores. Contudo, era justamente contra a atuação nos portos que os poderes locais se colocavam, por haver formas

214 30/04/1674. Carta do governador da capitania de Pernambuco, D. Pedro de Almeida, para o príncipe regente

D. Pedro, sobre a nomeação de Bento da Costa para assistente do correio-mor do Reino. Ferreira, Documentos dos

séculos XIII a XIX relativos a correios: séculos XVIII e XIX, III:275.

215 09/04/1738. Carta dos oficiais da Câmara do Recife para D. João V informando os motivos, inconveniência e

inutilidade de se criar o ofício de correio-mor na capitania de Pernambuco. Ferreira, III:331.

216 Fragoso, Gouvêa, e Bicalho, “Uma leitura do Brasil Colonial – bases da materialidade e da governabilidade no

Império”, 76.

217 Idem, 77.

75

já conhecidas, rápidas e eficientes de distribuição das cartas pelos navios de comércio. Mas é verdade, também, que o serviço terrestre era visto como pouco utilitário, pois os viajantes transportadores de gado, escravos e gêneros de comércio igualmente levavam de forma gratuita qualquer correspondência necessária para o interior.

Eventos similares ao caso pernambucano ocorreram na Bahia, quando Bartolomeu Fragoso Cabral, nomeado em 1669, sofreu resistências da Câmara e dos homens de negócio baianos que tentaram impedir sua atuação a partir de petição dirigida à D. Afonso VI. Por meio deste documento, é possível inferir que, possivelmente, apesar do primeiro Assistente de correio, Manoel Teixeira de Carvalho, ter sido nomeado em 1662, o mesmo nunca chegou a assumir seu posto. Isso por que o Juiz do Povo e moradores da Bahia afirmaram que na cidade nunca tinha havido Correio de mar, até 1669, quando Bartolomeu Fragoso Cabral tentou assumir o ofício219.

Neste processo, como no caso de Pernambuco, foi apresentado um principal motivo para que Cabral não tomasse posse: o ônus que o povo teria ao pagar pela taxa de transporte das cartas, que, ainda por cima, ia para usufruto exclusivo de um particular. Segundo a Câmara, se o lucro fosse dirigido aos cofres régios, não haveria embargo: «se fora o encargo dela para a fazenda de Vossa Alteza ou seu Real serviço a não pedíramos porque para ele estamos tão prontos que nunca faltaremos»220. Além disso, a petição do Juiz do Povo e moradores de Salvador, anexada ao mesmo processo, indicava que a taxa trazia prejuízo «sem que resulte em serviço de Sua Alteza, antes em notório detrimento dos vassalos do dito senhor […]»221.

Portanto, os suplicantes reivindicavam para si o mesmo direito que possuía o Estado da Índia, aonde a jurisdição do Correio-mor não atuava, havendo liberdade para que os vassalos enviassem suas cartas da forma como bem entendessem, conforme constava no Regimento do Correio-mor das Cartas de Mar de 1657. É interessante notar que o Juiz do Povo e demais moradores da Bahia possuíam essa informação, demonstrando conhecimento do Regimento. Buscaram, dessa forma, utilizar a própria norma da Coroa para reivindicar para si o direito da

219 08/07/1672. Carta dos oficiais da Câmara da Baía para D. Afonso VI, pedindo para não serem obrigados a

mandar as cartas ao assistente do Correio mor do Reino. Godofredo Ferreira, Documentos dos séculos XIII a XIX

relativos a correios: séculos XVIII e XIX, org. Isabel Sanches, vol. III (Lisboa: Fundação Portuguesa de

Comunicações, 2008), 272.

220 Idem, 270. 221 Idem, 271.

76

liberdade das cartas, considerado mais justo, por ser menos oneroso. No mesmo sentido, a Câmara afirmava o seguinte:

Sobre tantos tributos, e donativos voluntários que este Povo pôs sobre si, e seus poucos cabedais, nos quer o Correio-mor introduzir neste estado, e cidade pensão e tributo de

irem as cartas a um seu sustento para que não fique liberdade alguma a estes [rasgado].

Vossa Alteza que com tanto Amor, e dispêndio o servem, e Porque Vossa Alteza foi servido libertar deste encargo ao estado da Índia, não merece menos a Vossa Alteza o do Brasil, pois o tem servido com o sangue, e serve com a fazenda [...]222.

O argumento estava centrado no fato do Correio-mor introduzir pensão para as cartas, que serviria somente para seu próprio sustento. Ou seja, seria cobrança para beneficiar somente o Assistente, não sendo útil para a Coroa e muito menos para os vassalos. Claro, a única vantagem para os homens de negócio da Bahia seria a prestação do serviço, uma forma supostamente segura e mais rápida de enviar e receber correspondência. Mas esse benefício não convenceu os suplicantes, uma vez que existiam formas de envio de cartas ágeis, confiáveis, menos onerosas e conhecidas por todos os que se correspondiam com regularidade. Além disso, de acordo com a Câmara, já existia na Bahia pessoa encarregada de fazer o serviço de organização, embarque e desembarque das cartas, sem cobrar nada, que era o Meirinho do mar223.

Logo, pouca vantagem viam os vassalos baianos na criação de um ofício no qual o serviço provido era-lhes já suprido de outra forma e, mais grave ainda, vinha acompanhado da cobrança de uma taxa para favorecimento de um particular. Para defenderem melhor este argumento, os homens de negócio esboçaram um interessante cálculo sobre quanto a cobrança do porte lhes custaria ao ano:

E somado o (sic) cada um dos homens de negócio há de pagar de porte das cartas que lhe vem do Reino e suas conquistas paga cada um mais de vinte mil reis, por ano, e a este respeito os mais moradores que menos negócio e correspondência têm e ficam os moradores com um perpétuo e grande tributo imposto a favor de um só homem, e sem

222 08/06/1670. Carta dos oficiais da Câmara da Baía para D. Afonso VI, pedindo para não se praticar naquele

estado a provisão que se passou ao Correio-mor do Reino para ter correios assistentes nas conquistas. Godofredo Ferreira, Documentos dos séculos XIII a XIX relativos a correios: séculos XVIII e XIX, org. Isabel Sanches, vol. III (Lisboa: Fundação Portuguesa de Comunicações, 2008), 267, grifo nosso.

223 08/07/1672. Carta dos oficiais da Câmara da Bahia para D. Afonso VI, pedindo para não serem obrigados a

mandar as cartas ao assistente do Correio mor do Reino. Godofredo Ferreira, Documentos dos séculos XIII a XIX

relativos a correios: séculos XVIII e XIX, org. Isabel Sanches, vol. III (Lisboa: Fundação Portuguesa de

77

nenhum interesse de sua Alteza de sua Real Coroa antes de grande prejuízo de seus vassalos224.

A partir dessa indicação, e tendo a informação do valor mínimo cobrado por cada carta, Luiz Guilherme Machado inferiu o fluxo médio global de correspondências comerciais que iam para a Bahia225. De acordo com o Regimento do Correio das Cartas de Mar, de 1657, o preço cobrado por uma carta de até 4 maços era de 20 réis. Assim sendo, se cada negociante gastasse mais de 20$000 réis por ano, conforme consta da petição, o número de cartas recebidas por cada indivíduo seria de mais ou menos mil ao ano. Multiplicando este número por 50 indivíduos (de 200) que assinaram a petição, Machado conclui que a média anual de cartas comerciais recebidas na capitania é de 50 mil226. É importante ter-se em mente, contudo, que a petição parece conter exagero com a intenção de enfatizar o ponto de que a opressão fiscal seria altíssima, mas acreditamos que essa informação pode ser um indício de que o número de cartas

Documentos relacionados