• Nenhum resultado encontrado

5. DISCUSSÃO

5.5 Correlações entre os resultados das análises

Ao buscar fatos que diferenciassem os grupos DPPV e asma, considerados representativos de um grupo maior, o das doenças respiratórias, partiu-se para a análise das correlações entre as medidas acústicas e fisiológicas. A intensidade do primeiro harmônico apresentou correlação positiva com a intensidade do segundo harmônico, com a diferença de intensidade entre os harmônicos, com a freqüência fundamental eletroglotográfica e com o índice de velocidade (p ≤ 0,05) (Tabelas 22 e 23). Estes dados concordam com a literatura na medida em que destacam a similaridade dos valores da freqüência fundamental, obtidos por meio da análise acústica e eletroglotográfica (Vieira et al, 1997) e a associação das medidas de intensidade espectral à configuração glótica (Hartl et al, 2003).

A diferença de intensidade espectral dos dois primeiros harmônicos apresenta correlação negativa com o coeficiente de contato semi-automático e automático e correlação positiva com o índice de velocidade e com a freqüência fundamental (p ≤ 0,05) (Tabelas 22 e 23). Estes dados indicam que a medida acústica se relaciona ao dado fisiológico e que a maior diferença de intensidade dos dois harmônicos iniciais determina menor contato das pregas vocais.

Quanto às medidas acústicas de longo termo, referentes às diferenças da média de intensidade entre faixas de freqüência que representam o declínio espectral, identifica-se correlação positiva do índice de velocidade tanto com a diferença de intensidade média entre as faixas de 0 a 1 kHz e 1 kHz a 5 kHz quanto com a diferença de intensidade média entre as faixas de freqüências de 0 a 1.6 kHz e 1.6 kHz a 5 kHz. Portanto, quanto maior a diferença entre as faixas de freqüência, o declínio espectral é mais abrupto, a duração do índice de velocidade é maior, o que repercute nas variações das fases de contato–fechamento e contato–abertura do ciclo glótico (Tabela 23).

Quanto às correlações entre as medidas eletroglotográficas, o coeficiente de contato (CC) semi-automático tem correlação positiva com o CC automático e negativa com o índice de velocidade (p ≤ 0,05) (Tabela 23). A medida área do CC automático tem correlação positiva com o CC automático (p ≤ 0,05) (Tabela 23).

A descrição da qualidade vocal, segundo os correlatos perceptivo-auditivos, acústicos e fisiológicos, nos indivíduos asmáticos com e sem DPPV, evidenciam

alterações que apontam a importante relação entre a produção do sinal vocal e a dinâmica respiratória (Iwarsson, 1998, Thomasson, 2003).

Neste trabalho, houve a tendência à detecção de alterações das modalidades perceptivo-auditivas, acústicas e fisiológicas de avaliação da qualidade vocal nos grupos com asma (com e sem DPPV) com nuances que os diferenciaram parcialmente. Na análise perceptivo-audtiva, os grupos DPPV e asma se distinguiram em função de ocorrências laríngeas de curto termo, mais freqüentes no grupo asma. Estas alterações na esfera perceptivo-auditiva corresponderam a achados acústicos de mudança no declínio espectral e nas medidas de intensidade espectral de longo e curto termo, apontando que os grupos asma e DPPV diferenciaram-se de forma que o grupo asma revelou maior alteração de padrão vibratório glótico. Em relação aos resultados da avaliação fisiológica, novamente os grupos com asma (com e sem DPPV) tiveram inadequações na onda Lx e na medida índice de velocidade, o que, novamente, diferenciou os grupos DPPV e asma. Destaca-se que na correspondência das três análises (perceptivo-auditiva, acústica e fisiológica), as alterações tiveram maior impacto no gênero feminino do grupo asma.

A diferença da qualidade vocal entre os grupos asma e DPPV pode estar relacionada à dificuldade do controle do fluxo aéreo. No grupo DPPV há redução no fluxo inspiratório e supõe-se, como conseqüência, menor volume pulmonar, posição laríngea elevada, hiperfunção, aumento da tensão do pescoço e ombros, com compressão da traquéia, constrição laríngea à fonação e maior coeficiente de contato de pregas vocais (Iwarsson et al, 1998, Iwarsson, 2001). No grupo asma há a redução do fluxo expiratório com possível redução da pressão subglótica.

Desta maneira, os parâmetros fisiológicos da dinâmica respiratória como pressão subglótica, volume pulmonar e fluxo aéreo parecem ter influência direta nas alterações da qualidade vocal e merecem maior atenção, tanto em termos de avaliação como de abordagem terapêutica.

A alteração do padrão respiratório traduz-se, também, em padrões inadequados de vibração das pregas vocais (Hoit et al, 1993, Iwarsson et al, 1998, Iwarsson, 2001) e, conseqüentemente, alteração da qualidade vocal (Cukier, 2003). Tais achados revelam aos fonoaudiólogos a necessidade de aprofundamento do

estudo das particularidades da função respiração diante da demanda fonatória, uma vez que há aspectos complexos que não são tradicionalmente abordados nos procedimentos de avaliações propostos. Outra abordagem que se faz necessária na rotina clínica é a avaliação laringoscópica com luz estroboscópica, permitindo o melhor refinamento da onda mucosa.

Neste ponto da discussão vale retomar a dificuldade no diagnóstico da DPPV e ressaltar que, apesar de existir certo delineamento que distingue os falantes destes grupos estudados (com e sem DPPV, diferenciados a partir da análise de um exame laringoscópico), não há separação categórica dos doentes, repercutindo na constante dificuldade do diagnóstico preciso e sugerindo a implementação de abordagens terapêuticas para ambos os grupos, considerando as manifestações clínicas sob ponto de vista médico e fonoaudiológico.

Por isso, em virtude de alterações respiratórias, há o impacto da alteração da qualidade vocal, de distintas formas. O tratamento fonoaudiológico com abordagem direcionada ao aumento do fluxo inspiratório, usando técnicas de respiração costodiafragmática e controle do fluxo expiratório, além de envolver a pressão subglótica e a resistência das pregas vocais, proporciona maior volume pulmonar com maior capacidade torácica, abaixamento da traquéia e da laringe, redução da pressão subglótica e da tensão (Thomason, 2003), menor coeficiente de contato e melhor padrão vibratório das pregas vocais (Milstein, 2004).

Da análise integrada dos correlatos perceptivo-auditivos, acústicos e fisiológicos da qualidade vocal de indivíduos asmáticos com e sem DPPV emergem particularidades de manifestação que merecem cuidadosa implementação de procedimentos de avaliação e tratamento das alterações vocais decorrentes de doenças da esfera respiratória.

Análises desta natureza são possíveis apenas diante da adoção de referenciais teóricos que permitam aprofundar as relações entre percepção e produção do sinal vocal, numa visão dinâmica da fala e de suas complexas relações com outras funções exercidas em cooperação, como é o caso da respiração. Os resultados obtidos foram possíveis graças à adoção do referencial das ciências da fala, partindo da fonética clínica.