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O cotidiano e a consciência coletiva

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CAPÍTULO III OS SUJEITOS DA PESQUISA: A VOZ DO CAPOEIRA

3.4. O cotidiano e a consciência coletiva

Com as falas dos capoeiristas entrevistados, buscou-se explorar suas visões de homem e de mundo e em suas ações políticas, as suas percepções sobre a capoeira enquanto cultura e resistência, bem como sua percepção de consciência social na vida cotidiana. Já que vimos no tópico anterior que as lutas sociais em que se aproxima a capoeira, são fruto do cotidiano, das experiências e inquietudes que se expressam nele.

O cotidiano aqui é entendido não com uma percepção fatalista de ser espaço único de dominação, ou mesmo como espaço único de emancipação. Mas sim, em uma percepção dialética, entendemos o cotidiano, conforme nos fala Antunes apud Montano e Duriguetto (2011), como arena permanente de disputa, de lugar constante de alienação e desalienação. Assim:

No entanto, tão equivocado é identificar sumariamente o cotidiano como mero espaço de dominação, de alienação, como também é conceituá-lo diretamente como âmbito imaculado da emancipação, da desalienação. A esfera da cotidianidade é, substancialmente, e por sua natureza, uma permanente arena de disputa, “um espaço de disputa entre alienação e desalienação”. (ANTUNES apud MONTANO & DURIGUETTO, 2011, p. 99).

O cotidiano é, portanto, uma construção, um produto histórico. E é nessa esfera permeada de disputas e contradições que analisaremos como a consciência se constrói no cotidiano dos capoeiristas: ora desenvolvendo-se como uma consciência individual e imediata, ora como uma consciência coletiva.

As formas de consciência são determinadas pela realidade social e tal realidade se expressa no cotidiano. Marx e Engels (1993) falam que a produção das ideias, da consciência, está diretamente ligada com a atividade material dos homens. A consciência é o ser dos homens e o ser dos homens se concretiza através do seu processo de vida real.

Compreender aspectos da vida real desses capoeiristas, identificar suas condições materiais e objetivas, sua visão de homem e de mundo, seu reconhecimento da capoeira

115 enquanto movimento político, faz com se articulem possibilidades de entendimento da formação de um sujeito coletivo. Tal análise é uma referência indicadora da relação entre capoeira, expressão da cultura e lutas sociais.

Para isso, tomaremos como parâmetro as respostas apresentadas a partir das seguintes indagações: Como ocorreu sua aproximação com a capoeira? Qual a contribuição que a capoeira trouxe para os trabalhadores e trabalhadoras brasileiras? Para você, qual o papel da música na capoeira? Você considera a capoeira como manifestação cultural e como movimento social de luta e resistência?

As duas primeiras perguntas objetivaram compreender aspectos da vida cotidiana do capoeirista entrevistado e suas reflexões sobre a realidade social. Já a quarta para entender, de fato, como a música, enquanto expressão cultural, se faz importante na prática da capoeira. A última contribuiu para o entendimento sobre a consciência coletiva dos sujeitos da pesquisa.

Em relação a aproximação com a capoeira, todos os entrevistados relataram que iniciaram na capoeira na infância. 5 informaram que mantiveram o primeiro contato através da família. Inclusive, é algo muito falado nas respostas das entrevistas. Por vezes eles consideram a capoeira como algo familiar. Referem-se aos ensinamentos dos mestres, à ancestralidade, como algo familiar, a “família capoeira”. Como exposto em algumas falas:

A... vem de família, né. Minha mãe, já era, é baiana, é da retaguarda da religião de matriz africana e eu, desde cedo, com a musicalização, ai eu fui ver meu irmão uma vez brincando no quintal de casa, ai eu gostei da brincadeira. Foi até que eu, quando minha tia madrinha Maria, convidou a sua família que é o Mestre Asa Branca, Antonio Carlos Borges, e o Carlos Roberto Borges que é o Mestre Camarão, é convidou ele a fazer uma apresentação aqui no dia 20 de novembro. E calhou nesse 20 de novembro eu me apaixonar pela capoeira e começar a capoeira naquele dia mesmo. (CCCAB4).

Venho de família de praticantes da capoeira, assim, cresci assistindo até o dia em que finalmente iniciei. Aos 7 anos de idade.(CCCAB5). Eu tenho um tio que sempre foi capoeirista né. Eu já nasci sabendo disso. Eu tinha quatro anos de idade, minha irmã seis e ele já passava uns treininho pra gente. A gente não tinha muito entendimento certinho, mas ele já passava ginga, estrelinha, que hoje é o aú, né? Alguns movimentos. Então, desde muito novo. (CCCAB9).

Os outros 5, no entanto, relataram que buscaram a prática por diversão, vontade de praticar um esporte, por ter “se encantado” pela capoeira e também como forma de disciplinar a criança. Como mostra algumas falas:

116 Quando eu era criança, pra, antigamente, pegava a capoeira pra disciplinar as crianças. Então, como a gente era muito levado, ai papai e mamãe levou, né, pra capoeira pra disciplinar. E ai aconteceu de eu estar gostando e continuei praticando. (CCCAB2).

Me aproximei da capoeira em 93, em julho de 93, é, eu me aproximei da capoeira mais assim como um meio de diversão. Porque, assim, na minha época, as crianças jogavam bola, soltava pipa e eu fazia isso tudo, mas eu queria algo diferente. E eu consegui, esse algo diferente que eu digo é em termo de arte marcial, eu sempre fui muito apaixonado por arte marcial, via na televisão, só que devido a questões financeiras, a única que eu tive oportunidade de me aproximar foi da capoeira. Porque as outras eram todas muito caras e eu não tinha condições e a capoeira era praticamente, ai, ela acontecia na periferia, era gratuito e, então foi a única que consegui me aproximar e me identifiquei. Tanto que depois dela eu tentei passar pra outras artes e não consegui mais. Fiquei com a capoeira. (CCCAB3). O um envolvimento com a capoeira veio desde os meus 6 anos de idade. Eu fazia judô e tinha uns coleguinhas na época que fazia capoeira e um dia eu escutei aquele som diferente e fiquei curioso e acabei trocando o judô pela capoeira. A capoeira tem uma magia que contagia quem vê e acaba trazendo a vontade de praticar. Pois a capoeira é uma arte livre, pois deixa o seu praticante a vontade em suas expressões corporais. (CCCAB6).

O fácil acesso à capoeira nas comunidades de origem dos praticantes entrevistados foi, de fato, um fator relevante para a inserção deles, ainda na infância. Ou seja, senão por questões culturais e familiares, as crianças se envolveram com a capoeira porque era algo acessível, concreto na realidade em que viviam, ainda que seus objetivos fossem praticar um esporte, ou contribuir na “disciplina”. Em relação ao acesso, uma fala chama atenção quando retoma o impacto da capoeira na comunidade local (da sede do Centro Cultural de Capoeira Águia Branca):

Ah sim, aqui é, na redondeza que é a região fabriciana que a gente chama... são mais ou menos é, 5 ou 6 bairros próximos. É, quase todo mundo passa aqui pelo menos e cada pessoa que passa sai com um depoimento, sai com uma fala, sai com uma mudança de vida, mesmo que ele não continue praticando a capoeira, aquilo ali modifica um pouco na vida dele, porque muitos jovens não têm perspectiva nenhuma pra vida, tem pouco acesso à cultura, pouco acesso a, até ao esporte e tal e eles veem aqui como uma, como essa possibilidade. E quando eles chegam em busca só desse esporte, eles percebem e aprendem essa forma de vida né, de atitude e tal, e saem modificados. Então, é, tem um impacto sim, é, em muitos que passam por aqui.

117 Mesmos que eles não fiquem. E alguns deles se formaram aqui, inclusive são professores da instituição e esse impacto não, num se limita aqui a redondeza, porque a gente tem vários núcleos espalhados por Uberaba né, e ai, é, isso acontece nesses núcleos também e muitas pessoas de locais distantes vem até a instituição pra fazer capoeira também e sempre saem com esse mesmo depoimento de mudança de vida de anseio por algo melhor né, de mais força pra poder é, batalhar. A gente sempre valoriza muito o estudo, sempre busca que eles estudem né. É isso. (CCCAB1).

Um aspecto interessante das falas é que, direta ou indiretamente, os entrevistados iniciaram e se desenvolveram na capoeira por questões do seu cotidiano, que correspondiam e correspondem à sua cultura e realidade social. Nesse sentido, e por tudo que vimos até aqui sobre a característica dos movimentos que surgem sobretudo pela experiência cotidiana de um grupo, observa-se que no relato sobre como uma entrevistada reconhece o impacto local na vida dos praticantes de capoeira, existe um elemento sociocultural.

Gohn (2001) mostra que os movimentos populares revelam uma dinâmica interna que, gradualmente, busca uma ruptura com a alienação, com elementos que fundam solidariedades, com potencial transformador em determinada realidade social.

Nesse período surgiram também diversos estudos destacando o elemento sociocultural como o grande potencial transformador desses movimentos, ao mesmo tempo que assinalavam: a prática cotidiana desses movimentos leva a formação de uma contracultura, ou seja, uma cultura que há uma ruptura com a alienação, com a cultura dominante, em que os indivíduos desenvolvem passos no sentido de tornar- se sujeitos da própria história. (GOHN, 2001, p. 163).

A autora também nos fala da importância dos bairros na vida social dos indivíduos como espaço de identificação por meio de vizinhança, de espetáculos, festas e, no caso de nosso estudo e, ratificado por uma de nossas entrevistadas, também pela capoeira. Assim, essa facilidade do acesso à capoeira vincula-se a realidade social cotidiana, as quais trazem demandas populares.

Então, esse processo de reconhecimento e aprendizagem cultural gerado na cotidianidade dos indivíduos que compõem o movimento e a articulação natural com as demandas populares (sobretudo nas áreas de educação e lazer), propiciam a efetividade de processos pedagógicos de politização.

118 Cultura e educação convergem na cotidianidade dos integrantes do Centro Cultural de Capoeira Águia Branca. Não somente a educação formal (que também é estimulada pelos líderes do grupo a fim de garantir a permanência na política de educação das crianças e adolescentes que praticam capoeira), mas optamos por trabalhar, até mesmo pela realidade apresentada, com o conceito ampliado de educação. Ou seja, a educação é abordada enquanto “forma de ensino/aprendizagem adquirida ao longo da vida dos cidadãos; pela leitura, interpretação e assimilação dos fatos, eventos e acontecimentos, que os indivíduos fazem, de forma isolada ou em contato com grupos e organizações” (GOHN, 2001, p. 173).

Sobre isso, identificamos algumas falas em que a cultura e educação convergem, momento em que os capoeiristas a reconhecem como espaço de formação.

A capoeira é instrumento de formação, a capoeira, ela trabalha os vários conceitos do ser, né. Desde a responsabilidade, do carinho, do amor, dos valores que, que enaltece e cresce qualquer um ser humano. A capoeira é muito mais além que o pensamento. Eu costumo dizer que a capoeira ela é uma escola sem fim. (CCCAB4).

Então, eu fiz parte da criação do Centro Cultural né? É, e na época a gente criou o Centro Cultural como instituição pra que ele pudesse é, receber recurso público mesmo, né, que era uma academia, mas na comunidade local, não conseguiria sobreviver como academia privada, cobrando mensalidade e tudo e tal. Então a gente buscou regulamentar enquanto instituição até porque o nosso papel, já sempre foi, veio do nosso mestre um papel de formação mesmo, social, né formação cidadã, formação pra vida, ne. Então nosso trabalho é nesse sentido de acordar a pessoa para o papel dela, para a existência dela, né, nesse mundo. Então não tinha porque continuar sendo uma academia que cobrava mensalidade e tudo e tal, uma academia simplesmente mercado. (CCCAB1).

A capoeira ela necessita da união para forma um grupo e este mesmo desenvolver o que chamamos de "show" que é o que as pessoas vêem quando se deparam com uma apresentação de um grupo de capoeira. Alunos, instrutores, professores, contra-mestres e mestres se juntam no balanço e axé dos instrumentos mostrando a beleza da luta atraves dos movimentos de capoeira. Isso é a capoeira, a interação de pessoas, envolvidos no ensinamento e aprendizado a cada dia da criança ao idoso. E tudo que é passado para nós é colocado em prática e se transforma em "show" para que o público possa apreciar e vivenciar um pouco do que é a vida de um capoeira. Todos aprendem e todos ensinam. E qualquer um pode praticar. Seguindo os ensinamentos de um mestre. (CCCAB5)

119 Nas duas primeiras falas, os entrevistados compreendem a capoeira enquanto espaço de formação cotidiano. Ou seja, são experiências, com os valores, na forma de ser e agir no mundo. Na segunda, especificamente, mostra como o Centro Cultural de Capoeira Águia Branca tornou-se uma organização não governamental, local, a partir daí, formalizado que propicia rica experiências de educação não-formal. Revelam as suas dimensões socioculturais, citam a temática da cidadania. A terceira fala remete ao entendimento de que, ainda que a capoeira seja um espaço de aprendizado cotidiano, ela não perdeu a sua forma de expressão cultural. Ou seja, ela existe na cotidianidade como movimento, mas se expressa, se manifesta também enquanto espetáculo, apresentação, nas palavras da entrevistada, o “show”.

É interessante pensarmos no histórico da capoeira apresentado até aqui. Que, de fato, é mais do que a história de uma luta, mas sim de um povo, de uma realidade, que se transformou e transforma no decorrer do tempo. Na época colonial, os escravos eram submetidos a extremas condições de dominação. Não tinham uma educação libertadora. Precisaram criar formas de resistência até mesmo para que conseguissem sobreviver (momento em que também foi criada a capoeira). Depois, as lutas já tinham objetivos distintos e se aproximavam com demandas de outros trabalhadores, ou outros segmentos (como a questão do negro/racismo, por exemplo).

A partir da década de 1990, os diversos movimentos sociais passam por uma transformação, muitos são institucionalizados, assim como ocorreu com a instituição pesquisada. Gohn (2001) em sua obra, mostra claramente essa metamorfose dos movimentos sociais. Metamorfose que ocorre em meia a uma linha tênue de demanda sociais de um segmento, criação de formas de resistência e cooptação e repressão do Estado.

Temas como educação, formação e cidadania são comuns no movimento, em busca de uma reflexão crítica, de uma reflexão libertadora. Curioso compreender a transformação histórica da capoeira. Primeiro enquanto movimento de resistência dos escravos até pela sobrevivência (os “não-cidadãos”). Depois, enquanto movimento coletivo e político com uma de suas buscas da cidadania.

Não vamos tecer, aqui, grandes reflexões sobre o conceito de cidadania e sua relação com a capoeira (a qual requer dedicação, inclusive, para uma outra pesquisa). Mas não poderíamos deixar de mencioná-la, além por ter sido citada pelos próprios capoeiristas, já que ela se faz relevante para pensarmos a relação dos capoeiristas com a consciência coletiva.

120 Gohn (2001) fala que existe uma forma de cidadania moderna, em que os sujeitos presentes, em determinados movimentos, assumem postura de sujeitos de suas histórias, com uma atuação coletiva (ainda que não organizada e autônoma) que se funda na noção do direito à diferença. Não apenas mais ao direito à vida (como ocorria nos tempos da escravidão), mas no direito de autodeterminação em questões como raça/etnia, gênero, orientação sexual, entre outros.

A concepção de cidadania que resulta desse cenário busca corrigir diferenças instituídas, destacando o valor da igualdade. A solidariedade volta a ser amálgama mobilizadora dos grupos sociais. A participação política dos cidadãos se dá na esfera dos iguais. Ainda que haja diferenças de classes entre os participantes de um movimento ou ação coletiva, e interesses diferentes quanto a fins a serem atingidos,” é na condição de um carente de um direito social, ou de um tratamento discriminatório que se estabelece a relação de reciprocidade interna nos movimentos”. (GOHN, 2001, p.209).

Diante disso vamos buscar entender se os capoeiristas pesquisados reconhecem o movimento como sendo de classe ou se compreendem a participação, mas palavras de Gohn (2001) “na esfera dos iguais”.

3.4.1 O que pensa o capoeira

Para iniciarmos a reflexão de como os capoeiristas pesquisados reconhecem o movimento da capoeira, vamos utilizar as respostas dadas no que tange às suas percepções de como a capoeira contribui para os trabalhadores e trabalhadoras brasileiras. Para compreendermos o entendimento que eles tem sobre o movimento em geral, vamos partir das respostas que mostram se eles consideram a capoeira como movimento cultural e movimento social de luta e resistência.

Quando indagados sobre a contribuição que a capoeira trouxe para os trabalhadores brasileiros, destacamos algumas respostas:

Não sei, se for pelo esporte, a capoeira... eu não vejo muita contribuição assim, que nem eu falei, antigamente ela dava um leque né. Se você fosse bom de capoeira, você se tornaria um bom professor e teria alunos. Mas você teria que ser bom de capoeira. Hoje você

121 pode ser um capoeirista médio, se você tem um diploma, você vai ter alunos. Se você for um capoeirista bom, você é bom, mas você não é formado em nada, seu leque de alunos vai ser pequeno. Porque você só vai poder dar aula na sua residência, ou numa pracinha da vida como eu já vi capoeirista fazendo. (CCCAB2).

Sim, somos todos trabalhadores. Afinal, lutamos por um mesmo ou parecidos ideais, na constante busca pela aceitação, respeito, melhorias (tanto pessoal quanto profissional) afinal, a capoeira também é um meio de trabalho, pois permite que pessoas deem aulas em escolas, academias e acaba se tornando uma renda. E tudo que envolve pessoas, envolve também necessidades sociais, culturais, psicológicas, monetárias, fisiológicas entre outras. E isso gera essa "luta", essa busca constante por crescimento e melhorias. (CCCAB5).

Na resposta, a entrevistada correlacionou a contribuição da capoeira enquanto possibilidade de profissão, de fonte de renda. Remeteu ao início da capoeira, em que não era exigida nenhuma formação profissional para além do conhecimento da capoeira. Assim, se o indivíduo fosse bom capoeirista, se envolvesse com a prática, era reconhecido. Atualmente, para ocupar espaços formais de trabalho, é exigido formação superior, sobre na área de Educação Física. Realidade que permeia a fala da entrevistada. Sua crítica, então, se deu na formalidade exigida atualmente: as vezes uma pessoa pode não se envolver tanto com a capoeira, mas consegue um espaço de trabalho; enquanto outra pessoa tem envolvimento de vida mas não tem formação, logo, perde espaço de trabalho. A possibilidade de trabalho com a capoeira também foi abordada na segunda resposta.

Bom é, diria que a contribuição que ela trouxe, desde a época da escravidão eu imagino que ele como, na situação de pessoas presas, né, eles tinham pouco o que se fazer, muito pouco o que se fazer. Então, imagino eu que nessa época era uma forma de se expressar, de divertir, de fazer algo diferente, né, o seu trabalho árduo que eles tinham. Acho que era uma forma diferente que eles tinham de se interagir, né. (CCCAB3).

A capoeira, ela pode ser dividida em duas fases, né. A fase do profissionalismo, daquela pessoa que vive do, da capoeira, o profissional da capoeira, que a vida dele é a arte da capoeira, trabalha com a capoeira; e o simpatizante da capoeira, que é o trabalhador, né. Aí nesse ponto eu posso observar o seguinte, que o trabalhador tem as obrigações a ser cumpridas, né? Trabalha. Ai quando sai do seu serviço pra, extravasar um pouco daquela energia ou até mesmo pra buscar boas energias, ele vai pra prática da capoeira. Então a capoeira pra mim hoje, é uma forma de, além de você cuidar do seu físico, cuida da mente, do seu espírito, né? Mente sã, espírito são. E a

122 capoeira hoje, pra mim, eu sou trabalhador e vejo pelo lado do trabalhador que a capoeira é um lado de buscar essa energia, de buscar essas amizades que a gente constrói dentro da, dentro dum grupo de capoeira e sempre tá renovando aquela energia mesmo. E a forma que você tem de diversão, de divertir. Aonde os escravos usavam a capoeira antigamente como uma forma de diversão também. Na roda de alegria, na roda de conversa, numa roda de jogo e a capoeira é isso: um momento que você tem pra extravasar, que você tem aquela liberdade de expressão corporal que eu falei. Aonde você vai transpirar, você vai superar suas dificuldades, seus limites corporais, enfim, é isso pra mim. A capoeira é muito rica nesse aspecto. Que eu posso estar cansado o que for, sair do meu trabalho, e ir pra capoeira, eu renovo minhas energias dentro da capoeira. (CCCAB6).

Já nessas duas respostas, observamos que a contribuição entendida é baseada na possibilidade de lazer que a capoeira traz, desde o período de sua criação. Lazer que possibilita a expressão do corpo, que traz liberdade em meio a uma rotina que aprisiona. É um lazer que possibilita identificação com alguns pares.

É, como eu falei, a contribuição da capoeira, ela não, ai... Eu posso

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