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CAPÍTULO 2 – FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA EDUCAÇÃO

2.2 A creche no sistema de ensino brasileiro

Segundo Kuhlmann (2005), as instituições de educação infantil caracterizadas como creches eram novidade por volta do século XIX e muitas delas surgiram para atendimento exclusivo aos pobres. Tinham portanto caráter assistencialista e discriminatório.

Essa concepção educacional marcada pelo assistencialismo em instituições infantis determinou por muito tempo a concepção de trabalho em educação infantil. No Brasil, a vinculação das creches aos órgãos governamentais de serviço social e não aos órgãos do

23 O município de Presidente Prudente ainda não delegou aos professores o trabalho com crianças com menos de 2 anos de forma regulamentada.

48 sistema educacional teve como consequência a ausência de pesquisas educacionais na área, pelo menos até a década de 1970.

A pedagogia das instituições educacionais para os pobres é uma pedagogia da submissão24, uma educação assistencialista arrogante que humilha para depois oferecer o atendimento como dádiva, como favor aos poucos selecionados para o receber. Esse tipo de educação parte de uma concepção preconceituosa da pobreza e que, por meio de um atendimento de baixa qualidade, pretende preparar os atendidos para permanecer no lugar social a que estariam destinados. A educação assistencialista foi pensada como prática intencional, criada no interior de instituições constituídas para esse fim, com o intuito de cuidar sem educar. A primeira característica a ressaltar dessa concepção educacional é que as instituições eram defendidas pela sociedade, por isolar as crianças (pobres) dos meios passíveis de contaminá-las, como a rua. Além disso, a qualidade educativa desse tipo de instituição estava ligada à baixa qualidade do atendimento, porque preparava a criança para viver em seu próprio meio. Tratava-se, portanto de uma educação mais moral do que intelectual.

Sobre as instituições de educação infantil brasileiras atuais, Oliveira (2010) mostra que elas são o reflexo da expansão do trabalho feminino na atividade industrial e no setor de serviços, dentro de uma perspectiva de urbanização cada vez maior. Pois as contradições sociais e econômicas geradas pela miséria e pelo desemprego acentuam as desigualdades no uso de bens sociais, inclusive de acesso às oportunidades à educação, pelas diferentes classes coexistentes na sociedade. Portanto, a adoção de uma concepção assistencialista ou educativa quase sempre depende da classe social a que pertencem as crianças atendidas.

No Brasil, a creche como segmento da educação infantil, portanto, como instituição educativa, sofreu grande pressão para que se aprofundasse a discussão de uma proposta verdadeiramente pedagógica comprometida com o desenvolvimento total e com a construção do conhecimento pelas crianças pequenas em lugar de um trabalho regido pela assistência social.

Como já visto, a integração das creches aos sistemas de ensino é conquista recente da educação brasileira. Fruto das lutas pela democratização da escola pública, desde a década de 1970, com ações de educadores e pressões de movimentos sociais feministas, conquistou-se o reconhecimento da educação como dever do Estado e direito da criança, expressamente estabelecido pela Carta de 1988. A promulgação da LDB nº. 9.394/96 integrou

24 Expressão utilizada por Kuhlmann em Pedagogia e Submissão (2005) e que se refere ao tipo de pedagogia oferecida às classes sociais baixas a partir da metade do século XIX.

49 definitivamente as creches e pré-escolas ao sistema de ensino brasileiro, como a primeira etapa da educação básica. E uma vez incluída na educação básica, a educação infantil passou a ter seu financiamento e requisitos profissionais garantidos nas diretrizes que se referem à Educação e não mais à Assistência Social.

No caso da creche e pré-escola a LDB nº. 9.394/96 permite diferentes formas de organização e de práticas pedagógicas e define a regulamentação no sistema de ensino nas esferas federal, estaduais e municipais, no que se refere a autorização, supervisão e avaliação institucional. E, uma vez a creche incluída no sistema de ensino brasileiro, as esferas responsáveis iniciaram um período de elaboração de propostas pedagógicas baseadas na gestão democrática, que se deve voltar para o aperfeiçoamento pedagógico. O padrão de qualidade a ser obedecido pela creche passa a incluir critérios de desenvolvimento de competências nas crianças, além de outros requisitos que uma instituição para crianças deve apresentar: ambiente saudável, limpo, organizado, com cuidados físicos atentamente organizados. Assim, a inclusão da creche no sistema de ensino exigiu investimentos financeiros em educação e o estabelecimento de princípios de valorização profissional.

No que tange ao financiamento de verbas para a educação infantil, Oliveira (2010) salienta que ele cria mecanismos que possibilitam dar maior visibilidade do atendimento realizado e dos gastos efetivados tanto para o gestor da educação como para os usuários do serviço.

Com a LDB, pré-escolas e creches deixam de ser vistas como cursos livres – como até então os cursos pré-escolares eram considerados, e excluem cadastros na Assistência Social como principal requisito para os serviços voltados à população de baixa renda. A criança passa a ser concebida como sujeito de direitos, entre os quais está a educação, agora não mais como favor, e sim como dever do Estado.

Mesmo após a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, continua a existir confusão entre os termos assistencialismo e assistência: como a creche precisava se tornar um lugar educacional, necessidades fundamentais de assistência à criança pequena foram postas em segundo plano. Projetou-se então uma educação infantil de modelo escolarizante, “como se nos berçários precisasse haver lousa e ambientes alfabetizadores.” (Kuhlmann, 2005, p. 206).

Pergunta Kuhlmann:

[...] de que adianta dizer que as creches precisam deixar de ser assistencialistas para se tornarem educacionais? Essa polarização não leva a nada. Ou pior – e aí se revela a armadilha referida acima – leva a uma concepção assistencialista anterior ao sugerir que sua superação iria ocorrer

50 se substituísse assistência por educação. Ora, quem é que poderia afirmar, se refletisse ponderadamente, que na creche as crianças não precisam de cuidados, de assistência? (KUHLMANN, 2005, p. 206, grifos do autor). Mas, o que significa cuidar e educar na educação infantil?

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