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1. FUNDAMENTOS HISTÓRICOS DO ESTADO CONTEMPORÂNEO

1.4. A Crise do Estado e suas Ineficiências

Ao longo do século XVIII, pôde-se notar a estruturação do Estado liberal, caracterizado pela adoção de uma postura de mero guardião da ordem e segurança nacionais, reduzindo sua atuação ao pequeno núcleo estratégico, correspondente, sobretudo, à defesa nacional, arrecadação e diplomacia. Era o Estado mínimo, alheio à área social e ao domínio econômico, os quais ficavam ao sabor das próprias forças sociais.

O modelo de Estado modesto começa a decair após a Primeira Guerra Mundial e a Revolução Russa, ruindo definitivamente na década de 30 do século passado. Isso porque o mercado livre e a inexistência de uma política social levaram as economias capitalistas à

insuficiência de demanda agregada, ensejando uma crise generalizada que abriu espaço para a emergência do Estado Social-Burocrático, de cunho intervencionista.

A nova visão do Estado reconhecia seu papel complementar nos âmbitos econômico e social. Isso significava, para o Estado intervencionista, a assunção da prestação de serviços sociais fundamentais, além do disciplinamento da ordem econômica, seja para limitá-la e permitir sua compatibilização com o interesse coletivo, seja para estimulá-la através da concessão de apoio financeiro, creditício e de infra-estrutura, ou ainda, através de sua atuação direta na prestação de atividades econômicas.

Surgiu, nessa nova realidade, o Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), nos países desenvolvidos, em especial na Europa; o Estado Desenvolvimentista e protecionista nos países em desenvolvimento do chamado Terceiro Mundo; e os Estados Comunistas do bloco soviético.

Aos poucos, a própria estrutura do Estado intervencionista, voltada para conformá- lo ao papel de um verdadeiro demiurgo social, na expressão de Bresser Pereira (1998, p. 52), tornou-o incapaz de desenvolver a contento todas as atividades que tinha assumido, induzindo a um processo descentralizante, tanto no que se referia à prestação de serviços públicos, quanto no tocante à realização, por interposta pessoa, de atividades econômicas.

Todo esse processo se efetivava graças aos métodos administrativos da desconcentração e da descentralização. No primeiro, concedia-se autonomia de gestão a unidades formadas nos limites de uma determinada pessoa jurídica, distribuindo-se atividades segundo uma subordinação hierárquica. O segundo implicava a técnica de transferência de atribuições a outro ente administrativo integrante da burocracia estatal, dotado de personalidade própria e de capacidade de se autogovernar, e sujeito, apenas, à tutela e vigilância da entidade criadora.

Nasceram, nesse último caso, as entidades da administração indireta (autarquias e empresas públicas), da mesma forma que se verificou uma crescente tendência à associação do Estado com o capital privado, através das sociedades de economia mista e de institutos como as concessões, permissões e autorizações de serviços públicos.

Contrariamente ao esperado, essa onda descentralizante não conseguiu superar os problemas do Estado intervencionista. Pelo contrário, o Estado hipertrofiado e super desenvolvido, ensejou uma queda ainda maior em seu grau de eficiência na prestação de serviços sociais e regulação econômica.

Nas palavras de Roberto Ribeiro Bazilli:

Esse gigantismo, em aparente contradição, leva o Estado intervencionista a se esgotar; sobrecarrega o Estado com tarefas dispensáveis e que são melhores desempenhadas pela iniciativa privada; dificulta a adequada realização das atividades essenciais do Estado; a eficiência diminui bem como acarreta a insuficiência de recursos [...] (Bazilli, 2000, p. 79).

Paralelamente, ao agigantamento do Estado, e contribuindo para o colapso do mesmo, verificou-se, a partir da segunda metade do século XX, uma profunda alteração no sistema econômico mundial, mudança essa capitaneada, sobretudo, pela aceleração do desenvolvimento tecnológico e pela redução dos custos de transportes e comunicações, fatos que conduziram a uma nova dinâmica do capitalismo internacional, correspondente à globalização, com a conseqüente integração das economias e dos mercados, rompimento de barreiras e acirramento da competição.

A globalização impôs uma dupla pressão sobre os Estados: por um lado cresceu o desafio estatal em proteger os seus cidadãos, dado que a lógica do mercado, privilegiado pela economia neoliberal, é favorável aos mais fortes e capazes e induz ao aumento da concentração de renda; de outro, exigiu do Estado maior eficiência na realização das tarefas públicas, de modo a aliviar as pressões sobre as empresas nacionais e facilitar sua concorrência frente ao mercado internacional.

Nesse novo contexto, de economia globalizada, intensa competição e reorganização da produção em escala mundial, a crise do Estado acabou por se configurar em três diferentes vertentes: crise fiscal, caracterizada pela crescente perda de crédito por parte do Estado e pela poupança negativa, tornando-o incapaz de realizar as políticas públicas; crise do modo estatizante de intervenção do Estado, o que significa o esgotamento do Welfare State e dos países comunistas; e crise do modelo burocrático de gestão pública, marcado pelos altos custos e baixa qualidade dos serviços púbicos.

Assim, o Estado Intervencionista, que no início do século passado foi apontado como fator de desenvolvimento, transformou-se em obstáculo ao crescimento econômico e social, e toda a crise estrutural descrita acabou por demandar imediatas alterações no seu modelo. Tal fato conduziu, na década de 80, a um movimento geral de reformas do Estado.

Por certo que, quando se fala em mudanças sociais mostra-se necessário especificar os sentidos nos quais esses conceitos seriam empregados.

Em primeiro lugar, a mudança social (e ‘histórica’) é concebida como um conjunto de forças cegas e impessoais, tendências estruturais e contradições às quais os agentes humanos estão expostos como objetos, ou mesmo como vítimas passivas a quem a mudança ‘acontece’. Esse tipo de mudança social consiste em tendência (variando do aquecimento global a mudanças nos gostos dos consumidores) que não foram iniciadas por alguém, e tampouco podem ser paradas por alguém. Em segundo, mudança social é vista como algo que resulta de esforços deliberados e intencionais de agentes humanos racionais para dar conta, individual ou coletivamente, de necessidades e problemas que eles encontram na sua vida social, econômica e política. A mudança social, nesse segundo sentido, é ‘alcançada’ e executada por agentes. Essa versão ativa e intencional do conceito enfatiza a subjetividade, a cooperação e busca racional de interesses e valores – a ‘construção’ da história ao contrário da exposição a forças e a. destinos históricos anônimos. (Offe:1999, p. 119).

Nos últimos 25 anos, inegavelmente, o mundo experimenta uma mudança em nível de ordem política, ou na forma de regimes em várias sociedades, observando-se regimes autoritários de várias formas, seja por regimes militares ou o socialismo, regimes teocráticos, que acabaram por desmoronar dando lugar a democracias constitucionais liberais, caracterizadas, num primeiro momento, pela presença dos direitos iguais e da participação política de todos os cidadãos, com a proteção dos chamados direitos humanos, civis e políticos, bem como o que Claus Offe (1999, p.121) define por accoutability 1.