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O Cristianismo como manifestação da Verdade: a síntese da fé, razão e a vida

2. O Cristianismo como manifestação da verdade

2.3. O Cristianismo como manifestação da Verdade: a síntese da fé, razão e a vida

No Cristianismo não se pode falar da fé e da razão como se fossem duas realidades separáveis. O homem é a união corpo e alma, é a junção da sua fé e da sua razão. O Cristianismo é o servo da verdade, porque é uma religião que tem como missão salvar as almas, e assim, como Esposa d’Aquele que é Verdade, deve levar essa verdade à todos.

Um dos objectivos do Cristianismo, senão o principal, é mostrar à sociedade actual, mais do que nunca, que quando o homem separa a sua fé da razão, está a inferiorizar-se a si mesmo, a reduzir-se a um ser muito limitado. Ratzinger sobre isto diz:

A religião, porém, por mais que seja necessária a sua diferenciação do plano da ciência, não se deixa restringir a um sector. A sua finalidade é precisamente integrar o homem na sua totalidade, ligar sentimento, entendimento e vontade entre si e mediar entre uns e outros, e dar ao desafio do todo, ao desafio da vida e da morte, da comunidade e do eu presente e do futuro. Ela não pode arrogar-se a solução de problemas que têm a sua própria especificidade, mas tem de capacitar para as decisões últimas nas quais está sempre em jogo a totalidade do homem e do mundo127.

O autor deixa entender que toda a crise que a humanidade passou é devida a este corte e separação da totalidade do mundo (homem racional e homem crente). Podemos ver isto no início do iluminismo, corrente que apelava à separação entre o homem racional e o homem crente, afirmando que só a razão é suficiente para a salvação do homem e colocando o homem no centro do universo.

Quando esses correntes filosóficos apelam à «morte de Deus», o Cristianismo deve ainda com mais força e fé, com mais intensidade, arvorar uma fé que passa pelo testemunho, mostrando à sociedade que a razão tem seus limites e que o homem precisa de ser crente, isto é, ser um indivíduo que procura perceber o mistério que o circula.

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ENEDICTUS XVI, Summus Pontifex convenit legatos Scientiarum, apud Studiorum

Universitatem Ratisbonensem disserens de: «Glaube, Vernunft und Universität. Erinnerungen und Reflexionen», in AAS 98 (2006) 730-731.

Mas só pode compreender esse mistério à luz da fé. Como já dizia Santo Agostinho, «crer para compreender e compreender para crer».

É urgente que a razão e a religião se encontram – isto é um desafio, uma função difícil, mas não impossível, em que o Cristianismo deve investir cada vez mais. «Não há outra maneira: razão e religião têm de se encontrar outra vez, sem se dissolverem uma na outra… porque o que está em causa é o homem, o mundo. E ambos, claramente, não têm salvação, se Deus não for considerado de modo convincente»128. É todo o ser humano-corpo, alma e espírito que procura a Verdade, poe-se ao serviço d’Aquele que nos liberta.

Se é só a verdade que liberta, o Cristianismo tem a missão de colocar no centro da sua evangelização a verdade, isto é, mostrar aos homens que Deus é o único que liberta, que nos preenche, que tem todas as respostas para as nossas questões.

Deus revela-se porque quer ser conhecido. Portanto o Cristianismo deve levar aos homens um Deus que se encarna, porque nos ama e quer a nossa salvação. É preciso mostrar a todos que o Cristianismo não é um sistema, nem deve ser visto como um edifício acabado, pois «é um caminho, e é próprio de um caminho que, só entrando nele, se possa saber como nele caminhar»129.

O Cristianismo é um Acontecimento: o Verbo que se fez carne e habitou entre nós (cf. Jo 1,14) assumiu toda a nossa condição, excepto o pecado. É uma síntese entre a fé e a razão, porque os Apóstolos afirmam: «Nós acreditamos no amor» (1Jo 4,16). Perante tudo que já foi dito, a integração do homem e a religião é fundamental e urgente, porque a verdade santifica (cf. Jo 17) e liberta.

O Cristianismo, apelando a verdade, trabalhando para a sua credibilidade, deve sempre mostrar que Jesus Cristo é o único salvador, a síntese da razão, fé e vida. Nunca deve deixar de reivindicar ser a verdadeira religião, porque uma religião só é verdadeira quando se coloca ao serviço da verdade.

Levar a Boa Nova para todos é a missão do Cristianismo e ele não deve deixar de assumir essa sua verdade. Podemos frisar que a novidade que o Cristianismo traz para os primeiros discípulos e para os demais homens é ver Deus amor, um Deus que envia seu Filho para a salvação de todos. Por isso, o Cristianismo diz: «16Nós conhecemos o amor que Deus nos tem, pois cremos nele. Deus é amor, e quem

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J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 130. 129 J. RATZINGER, Fé Verdade Tolerância, 131.

permanece no amor permanece em Deus, e Deus nele» (1 Jo 4,16). Diante desta profissão de fé, todos os homens podem ser irmãos e irmãs, a partir do único Deus.

Quando se diz que o Cristianismo é a síntese entre a fé a razão, notamos isto presente no Logos, quando S. João diz que no princípio era o Logos – acreditamos que n’Ele estão resumidas toda a fé e a razão. Podemos subir a fasquia e dizer que o Cristianismo é a verdadeira síntese da fé e razão. Porque «ao contrário doutras grandes religiões, o Cristianismo nunca impôs ao Estado e à sociedade um direito revelado, nunca impôs um ordenamento jurídico derivado duma revelação. Mas apelou para a natureza e a razão como verdadeiras fontes do direito; apelou para a harmonia entre razão objectiva e subjectiva, mas uma harmonia que pressupõe serem as duas esferas fundadas na Razão criadora de Deus»130.

Agora podemos questionar: porque que é que o Cristianismo teve sucesso na sua missão (teve uma expansão rápida)? O que é que o levou a ser uma religião mundial? Ratzinger no livro «Fé-Verdade-Tolerância» responde a esta questão dizendo que o «Cristianismo entrou no mundo com a consciência de uma missão universal. Os fiéis de Jesus Cristo, desde o primeiro momento, sabiam-se na obrigação de transmitir a sua fé a todos os homens; viam na sua fé um bem que lhes não pertencia a eles, a esse bem tinham todos direito. Seria traição não levar até ao último recanto da terra o que lhes fora entregue»131.

Esta sede de levar o Evangelho a todos os confins da terra (cf. Act 1,8), de pôr em prática aquilo que Jesus Cristo, ensinou, pregou e testemunhou, deixou os primeiros discípulos e os outros com a certeza de que aquilo que receberam de Cristo era para ser transmitido a todos (cf. Mt 28,19-20). A Igreja Católica não recebeu da parte de Jesus Cristo a fé exclusivamente só para si, para a colocar num vaso, mas com a missão de anunciar a todos as nações as palavras da vida eterna (cf. Jo 10,10).

Essa transmissão de fé recebida podia não ter sucesso, nem cativar aqueles que não conheciam Cristo, por terem uma cultura diferente. Contudo a mensagem do Evangelho ia passando, formando comunidades, mudando vidas. Porque «a força do Cristianismo, que fez dele uma religião mundial, consistiu na sua síntese de razão, fé e vida; uma síntese que se diz sumariamente na expressão religio vera»132. Mais específico, o cardeal Ratzinger afirma que «o Cristianismo ultrapassou os limites da

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ENEDICTUS XVI, Iter apostolicum in Germaniam: ad Berolinensem foederatum coetum

oratorum, in AAS 103 (2011) 665.

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J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 53. 132 J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 156.

sabedoria escolar filosófica exactamente por o Deus pensado se encontrar connosco como o Deus vivo (…) o Cristianismo convenceu, digamo-lo de maneira simples, pela união da fé com a razão, e pelo acento da acção na caritas, na assistência amorosa aos que sofrem, aos pobres e aos fracos, para além dos limites das classes sociais»133.

Uma síntese entre a fé, a razão e a vida fez do Cristianismo uma religião mundial. Isto leva o Cristianismo a desafiar cada homem a não se conformar-se com ser e permanecer um cego de nascença para aquilo que lhe é essencial. A renúncia à verdade nunca pode ser definitiva.

Abordar a questão de que o Cristianismo é a síntese da fé, razão e vida coloca- nos num patamar de ver a sua relação com as outras religiões, com o estado. Fica desde já esclarecido que o Cristianismo não é invenção dos homens, nem muito menos de algum estado, mas é o desejo querido por Deus e a resposta livre do homem. No Cristianismo notamos que a fé cristã não é criada pela poesia ou politica, as duas dimensões que estão na origem das religiões. O cardeal Ratzinger tem uma frase muito rica e profunda onde nos apresenta o Cristianismo como a vitória da desmitologização, como a religio vera, dizendo: «No Cristianismo, o esclarecimento racional tornou-se religião, não o seu adversário. Porque foi assim, porque o Cristianismo se entendeu a si mesmo como vitória da desmitologização, como vitória do conhecimento e, com ele, da verdade, por ele tinha de ser visto como universal e ser levado a todos os povos: não a partir de uma espécie de imperialismo religioso, mas como verdade que torna supérflua a aparência»134.

Diante desta atitude do Cristianismo, apresentada na citação anterior, é logico que a Igreja começasse a ser vista como uma religião sem Deus, um atentado contra o politeísmo, ou até como uma inimiga do império romano. Isso aconteceu e acontece, ou seja, o Cristianismo fazia cair os fundamentos do Estado, por não querer ser religião entre religiões, mas vitória do conhecimento sobre o mundo das religiões, rejeitando a visão filosófica que vê o homem como um ser que tem um corpo como cárcere da alma e afirmando que o homem é imagem e semelhança do Deus (cf. Gn 1,26-27; Gn 2, 4-7; 1 Ts 5,23; Jo 1,14; 1 Jo 1,1-3). A força do Cristianismo fundamenta-se nesta definição no cosmos da religião e da filosofia, porque não adora um Deus impessoal, que existe simplesmente no nosso pensamento, mas um Deus que se fez homem e veio habitar no meio de nós (cf. Jo 1,14). «Se, porém, o Deus que o pensamento encontra também vem

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J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 155. 134 J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 152.

ao nosso encontro, no interior de uma religião, como Deus que fala e age, então significa isto a reconciliação entre pensamento e fé»135.

De tudo que já falamos até agora, levanta-se uma questão: esta pretensão do Cristianismo em ser a síntese de fé, razão e vida, como a religio vera, será que deve ser apresentada no mundo de hoje? Diante do progresso da ciência e do iluminismo vale a pena ter a pretensão da religio vera? Segundo cardeal Ratzinger e também santo Agostinho, bispo de Hipona, na sua obra «a verdadeira religião», a religio vera é a unidade de pensamento e fé. No Cristianismo notamos isto: no Verbo de Deus desde do princípio está presente a força criadora da razão.

O Cristianismo não terá de deixar a pretensão em ser a religo vera nem inserir-se na visão neoplatónica ou budista ou hinduísta, mas defender a sua pretensão em amar, conhecer e servir a verdade e ser a luz que este mundo precisa. Porque a religião como comportamento último do homem nunca é apenas teoria, mas razão e fé. Não cré num Deus impessoal, mas num Deus Uno, Trino, que, não querendo a morte eterna dos homens, envia o Seu Filho Unigénito para a salvação de todos. A razão e o Cristianismo nunca podem ficar definitivamente separados, porque o iluminismo que queira ver-se livre desta opção de vida que o Cristianismo apresenta e vive, não é uma evolução, mas sim uma involução, porque o homem é corpo e alma, razão e fé. A Igreja desafia a humanidade a conhecer e a amar Aquele que é a verdadeira síntese da fé e razão.

Não nos preocupamos em apresentar o Cristianismo como verdadeira religião, mas em dizer que ele tem a pretensão em ser a religio vera (a síntese/unidade de razão e fé), porque nenhuma religião possui a verdade, pelo contrário é a verdade que a possui. Mas a sua pretensão em ser a religio vera nunca deve ser deitada fora, porque se «o seu conteúdo mais profundo deverá consistir hoje – afinal como naqueles tempos – em que amor e razão, como pilares fundamentais da realidade, sejam conduzidos à sua unidade: a verdadeira razão é amor, o amor é a verdadeira razão. Na sua unidade são o verdadeiro fundamento e a finalidade de todo o real»136. Esta pretensão em ser a religio vera só pode continuar e continua a partir da unidade dos pilares amor-razão. É nesta unidade que o homem pode conhecer e amar a verdade que se lhe revela no Logos, que aparece como o amor criador até ao ponto de se fazer com-paixão com os homens.

Uma religião que apresenta Deus como amor, que tem a pretensão em ser religio

vera, adora um Deus pessoal, feito homem, é digna de ser credível, porque tem a

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J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 152. 136 J. RATZINGER, Fé – Verdade – Tolerância, 162-163.

sensibilidade de levar o homem a ser discípulo do Deus amor, a construir uma civilização do amor. E não põe de lado a racionalidade, mas assume-a, sente que uma fé sem a razão é fideísmo e uma razão sem a fé é cega. Como diz santo Agostinho «religue-nos, portanto, a religião ao único Deus omnipotente, pois entre a nossa mente, pela qual entendemos o Pai, e a verdade, isto é, a luz interior pela qual entendemos, não foi interposta nenhuma criatura. Veneremos, portanto, nele e com ele, a própria verdade»137.

Porque toda a vida que é racional obedece à verdade imutável e se não lhe obedece torna-se depravada. A humanidade que rejeita a verdade revelada no Filho de Deus, acabará por cair num abismo, de perder o rumo da sua existência, ser imagem desta verdade anunciada.

Decorrendo desta nossa exposição, podemos arriscar, e é um risco aceitável, afirmar que o Cristianismo é religio vera, porque nele acontece uma profissão de fé num Deus Uno e Trino, que é comunhão, que se fez homem. Só um Deus assim merece um recto culto. Se a religião verdadeira consiste em viver de tal modo que a nossa mente esteja em perfeita união com a verdade (a que nos é revelada no Logos, de uma forma plena na sua cruz), da qual depende no seu ser e no seu agir, enquanto mente racional, sem interposição de nenhuma criatura ou fantasma do espírito, então é credível o Cristianismo no meio dos homens. O Cristianismo adora um Deus Pai que revelou todo seu mistério de amor e verdade na pessoa de Seu Filho Jesus Cristo, portanto, como diz santo Agostinho, «inclinando-nos para Deus e religando só a ele as nossas almas – que é de onde se julga que deriva a palavra religião – nos abstivermos de toda a superstição?»138.

Uma religião verdadeira não é aquela que deseja possuir a verdade, mas é aquela que reconhece que é possuída pela verdade imutável; nela vemos uma perfeita unidade das duas realidades mais profundas da vida humana, a fé e a razão – é esta a realidade professada e vivida no Cristianismo.

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AGOSTINHO, A verdadeira religião, LV, 113. 138 AGOSTINHO, A verdadeira religião, LV, 111.

2.4. A credibilidade do Cristianismo em Balthasar em

paralelo com Ratzinger/Bento XVI

Todo o ser humano anseia por encontrar o amor, viver o amor e sentir-se amado. Nós, antes de amarmos, somos amados pelo Filho de Deus que nos ensina a amar uns aos outros como Ele nos amou. Esta busca constante levou-nos a exigir provas da sua existência, mas infelizmente buscamos em outras pessoas quando deveríamos começar a buscar o verdadeiro sentido do amor e da verdade n’Aquele que nos revelou a plenitude do amor na Cruz.

Balthasar enquadra Ratzinger na via do amor; segundo a sua obra, «só o amor é

digno de fé». Podemos afirmar que a teologia de Ratzinger sobre a credibilidade do

Cristianismo vai na mesma linha de Balthasar (foram colegas, andaram na mesma universidade).

Apesar de Ratzinger mostrar o Cristianismo como a síntese da razão, fé e vida, ele não quer dizer que o Cristianismo é uma filosofia, ou uma religião que parte da ideia humana mas sim é uma religião credível, porque não foi fundada por homens, mas por Cristo, Verbo encarnado, que veio habitar no seio de Maria, deu aos Apóstolos o poder de comandar a Igreja.

Para Balthasar aquilo que faz o Cristianismo ser uma religião credível é a encarnação do Verbo, que morreu na cruz pela remissão de todos os homens. O Deus do Cristianismo não é um Deus distante, mas sim um Deus invisível que se fez visível (cf. Jo 1,1-18; 1Jo 1-4). Ele defende que toda a teologia e a estética do Cristianismo devem centrar-se no drama da cruz, a maior manifestação da glória de Deus.

Ratzinger diz que a verdade que o Cristianismo apresenta não é uma verdade do próprio homem, mas d’Aquele que é a própria verdade, o caminho e a vida. Devemos sempre levar esta verdade a todos, assim como Ele nos manifestou na Cruz.

Segundo o teólogo do amor (Balthasar), não se pode apresentar o primado de Pedro, o fiat de Maria, a Tradição e o número de fiéis como a credibilidade do Cristianismo. Mesmo que isso nos leve a ver o Cristianismo como a vero religio, não podemos dizer que isto faz da Igreja Católica uma religião credível.

«Só o amor é digno de fé»139 – É isso que faz do Cristianismo uma religião credível. Segundo Balthasar, «o amor de Deus que é graça, contém necessariamente em

si as condições da credibilidade e, por conseguinte, as oferece e as comunica»140. Portanto, é o próprio Deus que nos revela o seu Amor e nos mostra aquilo que é credível para o Cristianismo. Este amor revelado deve ser o instrumento principal da pastoral, a linguagem do dia-a-dia.

Para Ratzinger, o fiat de Maria é um dos motivos que faz do Cristianismo uma religião credível, este sim que permitiu que o Verbo se encarnasse e habitar entre nós. Para Balthasar, o fiat de Maria foi uma preparação: «se o amor de Deus espargido nas trevas do não-amor não tivesse preparado, na sua própria difusão, este seio (Maria foi pré-resgatada pela graça da cruz, ou seja, é o primeiro fruto do espargimento de Deus na noite da perdição), o amor nunca teria mergulhado nesta noite e teria sido de todo incapaz»141.

Deus preparou no seio de Maria a manifestação do seu amor. Ele revela-nos o Seu Amor como auto-amor, e devemos responder ao Amor com amor. É o que é pedido ao Cristianismo, que leve este Amor a todos.

O maior desafio do Cristianismo, segundo Ratzinger e Balthasar, é nunca perder o rumo deste Amor, porque, estando fora do lugar do amor revelado na cruz, o Cristianismo deixa de ser uma religião credível. Só aquele amor revelado na cruz é credível de ser transmitido nesta época de muita contradição.

A Tradição Apostólica, o fiat de Maria, as Escrituras, o número de fiéis, tudo isto, sem a revelação do Amor na Cruz, que pede uma resposta a priori, perde qualquer importância. Só o amor reconciliado com o amor revelado é credível de ser transmitido. O Cristianismo deve mostrar a todos que, fora do amor revelado na Cruz, a vida do ser humano perde sentido; uma ciência, autónoma, uma filosofia que tente ser auto- suficiente, fora do drama do amor revelado, perde orientação, torna-se vazio.

As propostas pastorais de Ratzinger e Balthasar de uma certa forma cruzam-se: se o primeiro defende o Cristianismo como guardião da verdade, uma religião que resume a fé, a razão e a vida num só, porque o homem é tudo isto junto, já o segundo diz que o Cristianismo deve colocar no centro da pastoral o amor.

Se Jesus Cristo é caminho, verdade e a vida, S. João diz-nos que Deus é Amor. Portanto, tanto Balthasar como Ratzinger apresentam as mesmas razões que faz o Cristianismo ser uma religião credível: a Igreja é a discípula do Deus Amor, deve beber

140 H. U. von BALTHASAR, Só o amor é digno de fé,71. 141 H. U. von BALTHASAR, Só o amor é digno de fé,73.

do amor de Jesus, ser o rosto visível d’Aquele que se fez homem para que o homem fosse divinizado e levado a categoria do filho de Deus.

Quando Hans Urs von Balthasar afirma categoricamente que “ só o amor é digno de fé “, ou seja, apenas o amor é credível, o que Balthasar vai defender é que Deus não precisa do Cosmo e do homem para se credibilizar. Deus auto revela-se, é amor que se auto glorifica. A revelação de Deus em Jesus Cristo é a sua própria credibilidade, a plenitude da revelação do verdadeiro amor. A revelação de Deus não precisa de nada que lhe dê credibilidade, porque ela mostra-se como amor e apenas o amor de Deus é credível de ser anunciado.

Nesta linha, Joseph Ratzinger afirma que, se o conteúdo da fé é o amor, o amor e a fé são duas realidades inseparáveis. Tudo aquilo que Deus quer dizer ao homem é credível no amor que sai d’Ele mesmo. Mesmo sabendo que o homem responde a um amor que antes vem ao seu encontro, não se pode desligar a Igreja da glória divina, esta glória que é o próprio Deus Amor.

Portanto, o verdadeiro critério da autenticidade do elemento cristão não pode ser