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CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DOS JORNAIS E DEFINIÇÃO DO CORPUS

5. A PARCERIA SEADE / DIEESE

5.2 CRITÉRIOS PARA ESCOLHA DOS JORNAIS E DEFINIÇÃO DO CORPUS

CORPUS

A importância escolha do jornal impresso como fonte historiográfica já foi aqui tratada anteriormente. A despeito do papel exercido hoje pela imprensa escrita brasileira, esta foi, durante o período abordado por nosso estudo, o grande veículo “formador de opinião” entre as elites dirigentes e intelectuais, tradicionais disseminadoras da informação para todo o corpo da sociedade, principalmente no que diz respeito ao estabelecimento de uma agenda de

  assuntos que se quer por em pauta, discutir ou até incutir. A PED enquanto objeto de estudo também já foi devidamente justificada. Resta-nos demonstrar as sucessivas etapas que nos fizeram chegar até a composição do corpus definitivo, já que o período abordado é muito extenso e qualquer esquematização amostral poderia ou ser excessiva ou insignificante. Esse dilema acompanhou também a escolha dos jornais.

Originalmente o projeto previa a utilização da Folha de São Paulo (FSP) por ter sido um jornal que, no período, impôs seu padrão aos demais jornais brasileiros, baseado em estratégias de marketing e também por ser um dos pioneiros na publicação destacada de suas próprias pesquisas. A Folha, durante o período abordado, elevou significativamente sua tiragem e com o sucesso nas vendas pautou as mudanças de seus concorrentes diretos ou indiretos. Em alguns momentos pode ter sido considerado como um jornal popular ao mesmo tempo em que era influente entre os círculos empresariais, governamentais e artísticos, enfim um legítimo “formador de opinião”. Esses aspectos nos parecem suficientes para a sua inclusão no rol dos analisados.

O outro jornal escolhido originalmente, a Gazeta Mercantil, ao contrário da FSP, era um jornal voltado a um público específico ― o empresário em busca de informações comerciais ou de política econômica. Supõe-se que tal leitor tenha um interesse específico pelos números, e a estatística nas páginas da Gazeta fosse uma ocorrência usual. A comparação entre eles poderia nos fornir de elementos interessantes de modo a procedermos uma análise entre dois jornais diferentes, em que um traz a estatística como acessório e o outro, os números e porcentagens como base fundamental do que deseja comunicar aos seus leitores. Tais diferenças, porém, tornaram-se um problema, já que a

estrutura de ambos é totalmente diferente, dificultando a esquematização comparativa para fins de análise.

Esse problema foi resolvido com a introdução do jornal O Estado de São

Paulo (OESP). A estrutura dos dois jornais obedece aos mesmos padrões de

tratamento da informação, à mesma sucessão de cadernos e ao mesmo material informativo, porém redigidos e dispostos de forma diversa. Dessa comparação podemos observar ainda as diferentes posturas perante temas como globalização, desemprego, liberalismo etc., expostas em seus editoriais e em suas colunas de opinião, além das matérias que tratam especificamente da PED. Optamos, assim, por realizar a pesquisa baseando-nos no OESP e na FSP.

Os dois jornais que investigaremos travaram uma verdadeira batalha comercial nos anos da década de 1990. A briga por leitores e consequentemente pela receita publicitária foi marcada também por mudanças na linha editorial dos dois jornais no período. Enquanto a FSP oscila entre posturas, ora mais ora menos liberais e faz do agressivo marketing sua ponta de lança, o OESP, que sempre rezou pela cartilha do liberalismo, expressa-se com mais ênfase e desenvoltura quando o assunto é a crítica ao peso do Estado na condução da economia e suas variações aqui postas em questão no que se refere ao uso das pesquisas como legitimadora das teses liberalizantes. Dessa forma, enquanto a FSP se aproximaria, ao menos enquanto estratégia de marketing, das lutas pela plenitude democrática almejada pela sociedade civil, como no caso das “Diretas Já”, o OESP segue postulados mais conservadores, como quem defende uma tradição e se orienta totalmente por ela.

  No período abordado por nosso estudo a liderança de vendas, tanto de exemplares como de anúncios passou do OESP para a FSP. A disputa foi motivo de trocas de posicionamentos e de tentativas de assimilação de estratégias, principalmente por parte do Estadão que, entre outras coisas, sentindo a importância das pesquisas do Datafolha na composição das matérias e a divulgação maciça das pesquisas eleitorais, criou o Dataestado e assim passou a ter também mais matérias baseadas em pesquisas.

Quanto à composição do painel amostral das matérias a serem analisadas, o projeto original previa a análise de cerca de 360 notícias, o que se revelou impraticável além de desnecessário. Em termos de conteúdo, as matérias que retratam a divulgação da PED pouco se diferenciam. O “entorno” da notícia e suas significações históricas, em alguns momentos, tornaram-se mais significativos em termos de análise do que a matéria sobre a PED em si.

Optamos por uma amostragem que trouxesse uma edição por mês de cada jornal, de modo que, a cada ano, usássemos a edição de um determinado mês, e assim sucessivamente ― por exemplo, em 1985 as edições do mês de janeiro; em 1986, fevereiro etc. A montagem de algum outro tipo de amostragem “científica” foi matutada até que percebemos que a simples seleção de um painel com exemplos significativos dentro dessa condição amostral aleatória resolveria essa questão a contento para o que queríamos demonstrar.

Quanto ao recorte temporal, baseamo-nos em fatores que pudessem agregar sentido em termos de: a) acontecimentos históricos significativos; b) presença das estatísticas nas páginas dos jornais. Assim, o ano de 1985 marca

o início da publicação da PED e o ano de 2000 uma espécie de saturação da prática de retratar a realidade pelas estatísticas.

Em termos de acontecimentos históricos podemos situar em 1985 a maturação das discussões acerca da necessidade (não só da possibilidade) de liberalização da economia no Brasil, e o ano de 2000 como o que marca a efetivação de parte das privatizações e demais medidas liberalizantes que a imprensa defendeu. Naquele momento já havia se instaurado uma nova ordem econômica e seus temas correlatos deixaram de ser assunto específico dos cadernos de economia para pautarem boa parte da agenda política do país.

No que concerne aos acontecimentos históricos, compreendemos ser este período ― 1985 a 2000 ― um dos mais ricos em termos de acontecimentos no Brasil e no mundo. O Brasil, no período histórico aqui proposto, teve sua primeira experiência de governo civil após a ditadura militar; uma Assembléia Constituinte; as primeiras eleições democráticas; quatro moedas diferentes; entre outras mudanças. Já a imprensa deixou de ter segmentos ditos alternativos, surgidos em profusão durante as décadas de 1960/70, o que criou um espaço considerável para a expansão dos ditos “jornalões”.

No mesmo o período o mundo passou por diversas mudanças, como a queda do muro de Berlim e com o consequente “fim das ideologias”, a hegemonia da economia de mercado. Num momento tão rico em significações político-econômicas, pode-se captar o movimento que levou a imprensa a privilegiar as pesquisas tidas como “exatas” em detrimento de uma descrição mais textual ou literal das questões abordadas.

  Por fim, entre 1985 e 2000, a questão “desemprego” passou a configurar-se como uma das principais preocupações da população. No mesmo período o índice medido pela PED dobrou em termos percentuais. Tais fatores reunidos justificam plenamente o recorte estabelecido para a delimitação do

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