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Foto 37 – Foto do jardim junto ao Pátio Coberto

2. EDUCAÇÃO INFANTIL E CURRÍCULO: buscando a teoria para

2.2 Currículo: contornos teóricos e históricos

O currículo surgiu como objeto de estudos e pesquisas nos Estados Unidos dos anos de 1920, objetivando racionalizar a construção, o desenvolvimento e a testagem dos currículos escolares, impulsionado por grupos ligados à administração da educação (BERTICELLI, 1998; LOPES; MACEDO, 2002; MOREIRA, 1997a, 1997b, 1998; MOREIRA; SILVA, 1999; SANTIAGO, 2006; SILVA, 2001).

Esboçava-se, a partir de então, uma concepção de currículo que o considerava como algo meramente técnico, neutro, dissociado da realidade que o cercava e compreendido como elenco de disciplinas e listagem de conteúdos, objetivos e metodologias. De acordo com Berticelli (1998) e Moreira (1998), essa concepção neutra de currículo só começaria a ser questionada em nosso país em meados da década de 1980.

No do final dos anos de 1980 e início dos anos de 1990, os estudos, os debates, as temáticas e teorizações sobre currículo se intensificaram e se diversificaram, e o campo passou a receber a influência dos estudos de Michael Apple, Henry Giroux e Michael Young. A contribuição teórica desses autores levou à compreensão de que o currículo é um espaço de relações de poder e, naquele contexto, compreendia-se que ele estava fortemente marcado pelas questões referentes à classe social (BERTICELLI, 1998; LOPES; MACEDO, 2002; MOREIRA; SILVA, 1999; SILVA, 2001).

Assim, o campo do currículo foi se configurando como um campo teórico forte e alguns espaços de produção do conhecimento passaram a exercer influência no Brasil. Um desses espaços é o Grupo de Trabalho sobre Currículo (GT 12 - Currículo) da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPED). Criada em 1978, a ANPED realizou suas primeiras reuniões para discutir temas gerais da educação vinculados aos Programas de Pós-Graduação e, a partir de sua 4ª Reunião Anual, ocorrida em 1981, passou a organizar grupos de trabalho. O GT 12 - Currículo foi criado em 1986 e atualmente

reúne pesquisadores vinculados a universidades e instituições de pesquisa brasileiras e latino-americanas que vêm se dedicando ao estudo de questões concernentes ao campo do currículo. O grupo vem discutindo, a partir e através de múltiplos referenciais teórico-epistemológicos e metodológicos, essas questões, entendendo currículo, no mais amplo sentido do termo. Esse trabalho dos pesquisadores do GT, em seus grupos de pesquisa de origem e em eventos da área, tem sido divulgado por meio de publicações e da organização e

participação em eventos, nacionais e internacionais os mais diversos (ANPED, GT 12 - CURRÍCULO, s/d).

Segundo Lopes e Macedo (2002), com a contribuição desse Grupo de Trabalho, os estudos sobre currículo passaram a discutir a relação entre currículo e conhecimento a partir do aprofundamento das questões referentes às relações entre conhecimento científico, conhecimento escolar, saberes populares e saberes do senso comum.

Por volta de meados da década de 1990, uma nova feição da teoria curricular crítica passou a se delinear com a colaboração dos estudos pós-estruturalistas, dos estudos de gênero, da psicanálise, dos estudos sobre sexualidade, dos estudos culturais, do multiculturalismo e dos estudos sobre raça e etnia. Surgia, assim, o que Silva (2001) passou a denominar de teorias pós-críticas de currículo. Para esse autor, tais teorias ampliaram as discussões entre a relação saber e poder, visando compreender também as conexões que se estabelecem com as questões de gênero, raça, etnia, sexualidade, cultura e identidade, para além da relação com a questão da classe social.

Analisando o fortalecimento e a ampliação do campo do currículo no Brasil a partir de 1990, Lopes e Macedo (2002, p. 19) afirmam que, se na primeira metade da década prevaleciam os estudos de caráter mais sociológico, ancorados nas teorias críticas de currículo; na segunda metade a grande marca do campo parece ser o hibridismo que se pauta em uma multiplicidade de interpretações.

Segundo as autoras, “o processo de hibridização ocorre com a quebra e a mistura de coleções organizadas por sistemas culturais diversos, com a desterritorialização de produções discursivas variadas, constituindo e expandindo gêneros impuros”, que passam a caracterizar o campo do currículo como um campo contestado e hibridizado, cuja marca principal seria a “[...] mescla entre o discurso pós-moderno e o foco político na teorização crítica” (LOPES; MACEDO, 2002, p. 47).

Diante da multiplicidade de relações que se estabelecem na contemporaneidade, concordamos com as autoras e compreendemos que as teorizações de caráter mais globalizantes, as chamadas metanarrativas, não dão mais conta de explicar os fenômenos sociais, políticos, econômicos, educacionais e curriculares. Essa compreensão força-nos a enxergar os fenômenos sociais a partir de diferentes perspectivas.

Em relação ao currículo, isso não se dá de maneira diferente. Assim, atualmente, são muitas as possibilidade de compreensão do currículo. Dentre elas, podemos citar o avanço

teórico que o Grupo de Estudos e Pesquisas em Políticas Curriculares (GEPPC/UFPB), do qual fazemos parte, tem vivenciado nos últimos anos.

Desde a sua criação, o GEPPC pauta seus estudos em uma concepção crítica de currículo. Nos últimos anos, alguns de seus integrantes19 vêm desenvolvendo seus estudos sobre as políticas curriculares enfatizando as perspectivas pós-estruturais e com foco nos estudos laclaunianos.

Pereira (2009, p. 170), por exemplo, passa a assumir uma compreensão de currículo como “redes de significações permeadas pelo poder, em constante processo de deslocamento”. Para a autora, essa compreensão inicial a leva a entender que a elaboração de políticas curriculares é resultado de um constante e complexo processo de negociação entre os sujeitos envolvidos, o que leva alguns membros a assumirem uma concepção de currículo como redes discursivas, entendendo que sua (re)significação e elaboração se dá

através de redes polissêmicas de sentidos e significados nos diferentes tempos e espaços. Portanto, o currículo encontra-se sempre em processo de construção. O movimento que lhe caracteriza traz, a nosso ver, inúmeros discursos, não antes revelados ou lidos. Em síntese, seria o meu discurso, o seu discurso e os nossos discursos. Além disso, não se deve esquecer o discurso oficial que o norteia, mas que não impede seu movimento nem a constituição de novas redes discursivas de sentidos e significados (ALBINO et al, 2010, p. 7).

Avançando nos estudos com o Grupo, Pereira (2010) passa a assumir uma compreensão de currículo como uma prática discursiva articulatória, afirmando que o

fazer curricular acontece através das vozes, ruídos, dos silêncios que se instalam no dia a dia da escola e das interações entre os seus sujeitos e o meio social, com a finalidade de compreender como fazer as mediações entre currículo oficial e o currículo real, ou seja, o currículo que é prescrito e legitimado através do currículo oficial, e, o currículo real que registra a autopromoção de saberes originada das experiências de vida dos sujeitos, que são construídas e reconstruídas no dia a dia escolar (PEREIRA, 2010, p. 10-11).

A partir desse breve resgate histórico do campo do currículo no Brasil e em decorrência de sua ampliação teórica, compreendemos que este artefato social e cultural não pode mais ser pensado como algo meramente técnico, neutro, desvinculado e desarticulado de outras questões educacionais.

19 Outros membros do GEPPC, como nós, continuam estudando currículo e políticas curriculares com base nas contribuições de teóricos críticos, como Paulo Freire, Henri Giroux e Michael Apple.

Assim, podemos perceber que, desde o seu surgimento até os dias atuais, o currículo, como campo de estudos e pesquisas, tem evoluído de maneira considerável e, conforme Santiago (2006, p. 73), “evoluiu de um campo eminentemente técnico – com preocupações centradas na organização e desenvolvimento do conhecimento e tem Tyler como representante de maior repercussão no Brasil – para um campo multidimensional”.

Nesse sentido, concordamos com Silva (2001, p. 150) ao afirmar que

o currículo tem significados que vão muito além daqueles aos quais as teorias tradicionais nos confinaram. O currículo é lugar, espaço, território. O currículo é relação de poder. O currículo é trajetória, viagem, percurso. [...] O currículo é texto, discurso, documento. O currículo é documento de identidade (SILVA, 2001, p. 150).

Desse modo, compreendemos que a evolução do campo do currículo tem ampliado os estudos e discussões, bem como as temáticas a ele relacionadas. Assim, a contribuição das teorias críticas nos mostrou que o currículo não poderia ser compreendido como um artefato neutro, mas sim imbricado em complexas relações de poder.

Para Santiago (2006, p. 74), a concepção crítica tem nos mostrado que existem diferentes maneiras de abordar o currículo e que “ele pode ser tomado como (1) disciplina curricular; pode também ser abordado como (2) campo de investigação científica; e ainda, como (3) prática pedagógica”. Com base na autora, compreendemos que o currículo pode ser concebido como o conjunto de todas as atividades que são desenvolvidas na escola e que são significativas para a aprendizagem dos educandos.

Como estamos analisando o currículo em ação, assumimos uma concepção crítica de currículo a partir da abordagem de currículo como prática pedagógica, pois entendemos que precisamos superar a concepção tradicional de currículo que o entende como uma seleção prescritiva de conteúdos a serem “transmitidos” aos alunos através de lições planejadas pelos professores.

Sabemos que, mesmo com a contribuição dos estudos das teorias críticas e pós- críticas que questionaram a suposta neutralidade do currículo (SILVA, 2001; MOREIRA; SILVA, 1999), parece que essa concepção tradicional ainda se faz presente nas escolas brasileiras, como pudemos constatar em estudo de Mestrado (AMORIM, 2005). Entretanto, é a concepção crítica que assumimos nesta pesquisa. Uma concepção que compreende que a maior preocupação em relação ao currículo não está ligada à sua elaboração, ou seja, ao como fazer o currículo, mas sim aos efeitos deste no processo

educativo, ao que ele causa nos educandos (MOREIRA; SILVA, 1999; SANTIAGO, 2006; SILVA 2001).

Nesse sentido, Apple (2008) nos ajuda a compreender que existe uma íntima relação entre a economia e a organização da sociedade capitalista, e que esta influencia a organização de outras esferas sociais, entre elas, a educação, a cultura e o currículo. Ao desvelar a estreita relação que existe entre economia e educação, economia e cultura e, por conseguinte, entre economia e currículo, o autor nos chamou a atenção para o fato de que existe uma estreita articulação entre a forma como a economia está organizada e a forma como a escola e o currículo são organizados. Desse modo, passamos a compreender a estreita relação entre o currículo e os interesses econômicos e a nos questionar a favor de quem o currículo opera.

Giroux (1997, 2000), ao centrar suas críticas em relação às perspectivas técnicas que dominavam as abordagens curriculares, ajuda-nos a compreender que a ênfase na dimensão técnica do currículo acaba escondendo o caráter histórico, ético e político das ações educativas e curriculares que, desse modo, contribui para a reprodução. Avançando em seus estudos, o autor foi buscar as bases da sua teoria crítica no conceito de resistência, preocupando-se em apresentar uma alternativa para essa questão, visando a superação do pessimismo e do imobilismo resultantes da influência das teorias da reprodução.

Ao enfatizar a questão da necessidade de se pensar a educação e o currículo como fenômenos históricos e, portanto, possíveis de serem modificados, o autor afirmava ser possível visualizar um espaço para a mudança. E, desse modo, passou a defender uma “pedagogia da possibilidade”, pautada no conceito de resistência e direcionada ao desenvolvimento de uma pedagogia crítica. Pedagogia que deveria estar respaldada por uma opção política e ter como foco central a desconstrução da concepção dominante de educação e de currículo e a construção de outra concepção à luz de uma política cultural que entende que o fenômeno educativo está interligado não só a questões de poder, como também a construção de valores e significados sociais (GIROUX, 1997, 2000).

Ao analisarmos os estudos citados, principalmente o de Henry Giroux, chama-nos a atenção a influência do pensamento de Paulo Freire, uma vez que este não é devidamente reconhecido como um autor que exerce influência no campo do currículo em nosso país.

Sabemos que Paulo Freire não se dedicou a estudar ou a escrever sobre as questões curriculares. Entretanto, apesar de não ter se preocupado, especificamente, em tratar do

currículo, este é um tema que se encontra presente em muitas de suas obras (FREIRE, 1996, 1998a, 1998b 2001, 2003).

Pautando-nos em uma visão mais ampla de currículo, que o considera como aquilo que de fato ocorre em nossas escolas e salas de aula como resultado da interação entre os sujeitos do ato educativo e o objeto de conhecimento, buscamos em Freire (1996, 1998a, 1998b 2001, 2003) os fundamentos teórico-metodológicos que pudessem embasar um entendimento crítico de currículo e de proposta curricular que leve em consideração o direito de educandos e educadoras a terem acesso a uma escola e um currículo que os considerem como sujeitos do ato educativo e garantam-lhes o pleno acesso ao conhecimento produzido socialmente.

Para respaldarmos a nossa opção por analisar o currículo em ação nas creches em uma perspectiva freireana, pautamos-nos nas contribuições de Santiago (1998; 2006), uma vez que a produção teórica da autora tem tomando como referência a obra de Paulo Freire para com ele discutir currículo.

Com base nesse referencial teórico, assumimos a compreensão de currículo como um artefato significativo que perpassa a organização e funcionamento da escola e que se materializa nas práticas educativas realizadas por educandos(as) e professores(as), a partir da seleção, organização e sistematização dos conhecimentos e das experiências de aprendizagem a serem socializadas no contexto escolar. Assim, além das clássicas perguntas “o que” e “como” do currículo, faz-se necessário refletir sobre o porquê, o para que e o para quem desse currículo.

Para nós, o currículo, entendido como artefato social e cultural, é o resultado do diálogo entre as dimensões teóricas, políticas e legais que orientam as práticas curriculares e as ressignificações destas, em um processo contínuo de ação-reflexão-ação, coletivamente organizado e realizado de forma democrática no âmbito das instituições de ensino brasileiras.

Nessa perspectiva, aproximamo-nos de uma visão mais atual de currículo que o compreende como “um todo significativo, como um texto, como um instrumento privilegiado de identidade e subjetividades” (MOREIRA, 1997b, p. 15). Nesse sentido, o currículo passa a ser entendido como plano ou proposta (o documento, o currículo formal ou oficial) e como aquilo que realmente acontece na escola e na sala de aula (o currículo processo ou em ação), sem que se perca de vista a existência do currículo oculto (regras, normas e valores implícitos que regem o trabalho educativo).

Concebendo o currículo com base neste referencial, só é possível compreendê-lo de forma inter-relacionada com uma política de formação social mais ampla. Assim, é possível entendê-lo como resultado de um trabalho coletivo e articulado com a construção de um projeto político-pedagógico para a escola brasileira.

Nesse sentido, concordamos com Santiago (1998, p. 39) quando ela afirma que “a evolução conceitual e a ampliação dos estudos no campo do conhecimento curricular vêm revelando a necessidade de uma abordagem ampla de currículo”. E acreditamos que é esta visão ampla que precisa ser inserida nas discussões das instituições educacionais.

Para além do entendimento de currículo como documento, este artefato passa a ser entendido como um projeto político-social que, nas instituições educacionais, deve ser “traduzido como situações de ensino que se corporificam nas e com as práticas escolares cotidianas” (SANTIAGO, 1998, p. 39).

Uma abordagem ampla de currículo percebe-o como um artefato social e cultural que extrapola o espaço escolar e diz respeito à construção de identidades. É nesse ponto que o currículo se articula com a construção de um projeto político-social e passa a ser compreendido como

um espaço vivo de construção de conhecimento resultante do pensamento, das experiências dos sujeitos e das suas interações de natureza histórica, social e biológica. O currículo, portanto, é o resultado da incorporação das interações da vida dos sujeitos que se manifestam dentro e fora do espaço escolar (PEREIRA, 2004a, p. 53).

Ao se afirmar que a educação e o currículo encontram-se imbricados em complexas relações de poder, reforça-se a necessidade de compreendê-los não mais como questões meramente técnico-metodológicas e, portanto, aparentemente neutras, desinteressadas e desarticuladas de outras questões sociais, políticas e culturais. Compreendendo que a educação é política e que o currículo está imbricado nessa relação, faz-se necessário desvelar a favor de quem e de quê ele está operando.

Nesse sentido, os estudos de Moreira e Silva (1999), Silva (1995), Lopes e Macedo (2002), Macedo e Pereira (2009) e Pereira (2004a) ajudam a compreender que o currículo é um artefato social e cultural que opera no sentido da formação de identidades e subjetividades, e os estudos de Giroux (1997, 2000) e Giroux e Mclaren (2008) argumentam que o currículo está relacionado a uma forma particular de política cultural. Política cultural que foi se efetivando como forma de manter o status quo e disseminar a

ideologia dominante através de práticas educacionais que têm privilegiado uma forma particular de cultura, a cultura dominante, e o conhecimento socialmente disseminado como válido.

Mesmo que dominante, essa política cultural foi sendo questionada e, através da ação de educadores(as) críticos(as), foi sendo percebida como capaz de atuar como contra- hegemonia na “criação de novas relações sociais e novos espaços públicos que corporifiquem formas alternativas de experiência e luta” (GIROUX; MACLAREN, 2008, p. 132-133).

Entendendo a educação e o currículo como forma de política cultural, passamos a entender as instituições educacionais como espaços coletivos de discussão e de elaboração de propostas pedagógicas e curriculares que, para nós, precisam estabelecer conexões entre o político e o pedagógico no sentido de construir conhecimentos e proporcionar o desenvolvimento democrático e cidadão das crianças e, também, das professoras.

Ao pensarmos a educação, a escola e o currículo sob essa ótica, defendemos que a atuação dos profissionais da educação não pode mais se pautar na visão que os definem basicamente como técnicos e “tarefeiros”. Passamos a compreender que os professores “podem ter uma atuação pedagógica como intelectuais” (GIROUX; MACLAREN, 2008, p. 141) e formar uma “intelectualidade pública” capaz de compreender e problematizar “os interesses políticos e ideológicos que estruturam seus trabalhos” e lutar para “estabelecer a prioridade da ética e da justiça social acima da lógica do mercado e da linguagem do individualismo excessivo”, objetivando a construção de uma sociedade mais justa, democrática e humana (GIROUX, 2000, p. 72-73).

Ao situar as instituições educacionais e seus profissionais a partir desse referencial, queremos colocar em evidência o trabalho educativo que ocorre diariamente nessas instituições, o que exige uma preocupação com a produção do conhecimento e, portanto, do currículo. É nesse sentido que argumentamos que a construção ou organização do currículo precisa se dar no âmbito de cada estabelecimento de ensino, pois é nesse espaço que o currículo se coloca em ação, sem que sejam desconsideradas, evidentemente, as diretrizes mais amplas traçadas em âmbito nacional e local.

Ao defendermos a construção do currículo no âmbito de cada estabelecimento de ensino, enfatizamos que “a compreensão de currículo abarca a vida mesma da escola, o que nela se faz ou não se faz, as relações entre todas e todos que fazem a escola. Abarca a força da ideologia e sua representação não só enquanto idéias, mas como prática concreta”

(FREIRE, 2003, p. 123), e compreendemos o currículo como “a expressão da política educacional que resulta do diálogo entre diversos campos do conhecimento e do confronto de interesses de grupos que se instalam na escola/sala de aula” (SANTIAGO, 1998, p. 39- 40).

Nessa perspectiva, compreendemos ser necessário que os profissionais que atuam no sistema de ensino comecem a entender o currículo como uma elaboração coletiva e não, apenas, como algo dado e indiscutível. Entendemos que é preciso que os professores compreendam que este artefato está imbricado em complexas relações de poder e não como um pacote pronto e acabado que chega “de cima para baixo” e que foi pensado por meia dúzia de “iluminados”. Nesse sentido, acreditamos que o estudo e as discussões sobre as políticas curriculares poderão suscitar a ressignificação do currículo no âmbito das instituições educacionais.

Com base em nossas análises, entendemos que essas discussões foram parcialmente incorporadas na legislação brasileira e podemos afirmar que existe um respaldo legal para que cada instituição educacional assuma o seu espaço e construa localmente o seu currículo, tanto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), quanto nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), conforme abordamos no próximo capítulo.

Historicamente, a preocupação com a seleção e a organização do conhecimento

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