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Nesta seção, apresento as unidades de sentido referentes ao tema currículo; são fragmentos que argumentam a necessidade de reformulação do currículo vigente, reformulações que tenham em vista o ideal de valorização dos conhecimentos extraescolares.

Um primeiro fragmento relacionado a essa categorização está na unidade C5, que expõe a importância de fazer ligações do conteúdo escolar com o cotidiano. Mendes (2010, p. 6) afirma que:

[...] Precisamos estabelecer relações entre os aspectos cotidiano e escolar da matemática, numa visão globalizante do ensino, para que possamos apresentar os conteúdos matemáticos a partir da interligação de saberes produzidos em diferentes ambientes socioculturais, admitindo o seu caráter cotidiano.

Assim, a priori, para um caminho de reformulação curricular, é imprescindível que os aspectos cotidianos se relacionem com a matemática escolar, buscando valorizar diferentes ambientes socioculturais com seus saberes historicamente produzidos. Todavia, faz-se necessário, como papel importante na educação, “[...] incluir no currículo da escola, elementos que contribuam para a reflexão e a conscientização sociocultural, política e econômica” (MENDES, 2010, p. 8).

Ainda nessa perspectiva de reformulação, apresento diversas argumentações que dão importância a inserir o saber cotidiano no currículo escolar. Em H4, o autor defende que:

[...] devemos dar importância ao conhecimento trazido pelo aluno à escola. Trata-se de uma bagagem de conhecimentos e cultura que todos trazem antes mesmo do início de sua escolaridade, em situação formal de ensino (CAMARGO, 2008, p. 7).

Embasado no pensamento etnomatemático, no fragmento H8, Camargo acredita que essa busca de reformulação do currículo poderá dar um futuro melhor a

muitos jovens e adultos, com a possibilidade de se diminuírem as desigualdades sociais:

Apoiando-me na Etnomatemática, entendo que valorizar as vivências e experiências do cotidiano significa, além de tudo, reconhecer esse sujeito, seu espaço, suas raízes, sua cultura e, principalmente, seus conhecimentos. Reconhecer significa, também, dar “voz” e resgatar nesses indivíduos seu direito à cidadania. Quem sabe assim não teremos uma sociedade com mais oportunidades e menos desigualdades sociais? (CAMARGO, 2008, p. 10).

Ainda, nessa tônica de repensar as implicações curriculares, em C6 há um relato nesse sentido:

[...] percebemos que as relações entre escola, comunidade e educação, precisam ser repensadas e reformuladas de modo que os estudantes possam explorar, entender e explicar a sua realidade, tendo a escola e a comunidade como produtores de conhecimento (MENDES, 2010, p. 8).

Em O3, a perspectiva de reformulação está presente também. A autora diz:

Nesse entendimento, as práticas escolares devem favorecer a interação escola e sociedade, possibilitando a compreensão da realidade, dos processos de trabalho e fenômenos cotidianos, contribuindo para a formação integral do educando, preparando-o para a vida democrática e para o dinâmico e competitivo mercado de trabalho (SAMPAIO, 2012, p. 3).

Nesse mesmo fragmento, a autora apresenta consequências da interação entre escola e sociedade, como, por exemplo, a influência no mercado de trabalho. Ela complementa, em O6, argumentando que “[...] é preciso valorizar o conhecimento que o aluno traz de casa, ter a sua necessidade como foco, pois a educação não se estabelece apenas em espaços formais, ela é contínua, dinâmica, multifacetada” (SAMPAIO, 2012, p. 5).

Com enfoque na Educação de Jovens e Adultos, em que é muito importante a valorização dos saberes dos discentes em sala de aula, de acordo com o que foi apresentado na categoria Cultura, a unidade F11, agora com a complementação da unidade F12, mostra que os conhecimentos prévios dos estudantes são considerados como primitivos aos conhecimentos em sala de aula. As autoras dizem em relação aos conteúdos curriculares que:

[...] nos níveis mais elementares do currículo, a tensão entre ambas é suportável, porém, nos níveis mais avançados do currículo, não dá para associar a expressão algébrica a algum aspecto cultural do aluno (SCHNEIDER; FONSECA, 2014, p. 1299).

As mesmas autoras alertam para não forçar as relações entre os conteúdos escolares e os conhecimentos prévios dos alunos. Assim, enfatizando que seu texto é referente à educação de jovens e adultos, destacam as autoras:

Com efeito, a intenção de forjar o que seria um novo status da Matemática da vida na abordagem escolar sucumbe à força da negação dos modos de conhecer do mundo do trabalho do aluno da EJA e desse aluno nesse mundo. “Com esse olhar não captaremos as marcas formadoras ou deformadoras que levam do trabalho. Perderemos a oportunidade de reconhecer o trabalho como matriz educativa” (SCHNEIDER; FONSECA, 2014, p. 1296).

Em F4, as autoras trazem “[...] a ideia de que a aprendizagem deve ir do concreto ao abstrato é apontada como o primeiro traço recorrente no ideário educacional sobre aprendizagem” (SCHNEIDER; FONSECA, 2014, p. 1294).

Contemplando, em N5, há a seguinte consideração:

Do ponto de vista da ação educativa, consideramos ser importante incorporar ao trabalho em Educação Popular e na EJA conhecimentos, práticas sociais e culturais e critérios de validação diferentes daqueles que consagraram a ciência e a alta cultura europeia como superiores aos demais conhecimentos e culturas, buscando horizontalizar as relações entre eles (FREITAS, 2012, p. 9).

Focalizando agora a profissão que é a tônica desse trabalho, Menezes e Costa (2012) consideram, em dois fragmentos do artigo, que a valorização da matemática extraescolar – e elas citam a matemática do pedreiro como exemplo – tornaria o ensino mais humano. Em P7, alegam que:

Acredita-se que as ideias matemáticas mobilizadas pelos pedreiros e carpinteiros, na interpretação de uma planta indica a possibilidade de contextualizar o ensino a partir do conhecimento matemático do cotidiano tornando-o mais humano (MENEZES; COSTA, 2012, p. 3).

Já, em P8, acrescentam que:

Dessa forma, se no contexto escolar a matemática do cotidiano for reconhecida, valorizada e relacionada aos conceitos matemáticos formais propostos nas propostas curriculares, já se está abrindo caminhos para fazer do ensino da matemática algo mais humano (MENEZES; COSTA, 2012, p. 3).

Indo ao encontro dessas apresentações de Menezes e Costa (2012), Camargo (2008) destaca a valorização de reconhecer os saberes adquiridos no cotidiano das pessoas e cita, como exemplo, a matemática do pedreiro, conforme exposto na unidade H6:

Essa valorização se fazia necessária para reconhecer os saberes adquiridos no cotidiano das pessoas, pois com isso, estaria também valorizando suas práticas sociais, ou seja, valorizando a maneira de pensar e de resolver cálculos matemáticos dos agricultores, pedreiros etc., que são conhecimentos tão importantes quanto os ensinados dentro da sala de aula (CAMARGO, 2008, p. 6).

Menezes e Costa (2012), em P3, demonstram a importância dos conhecimentos dos profissionais, que são tão importantes quanto os ensinados em sala de aula, relatando sobre o pensamento matemático do pedreiro, pois:

Esse pensamento matemático caracteriza esse grupo de profissionais, pois possuem formas próprias de matematizar os fenômenos envolvidos na construção de uma casa, estratégias que foram sendo aprimoradas e repassadas de geração a geração, isto é, conhecimentos construídos com a experiência adquirida no convívio em grupo (MENEZES; COSTA, 2012, p. 2).

Em P6, as autoras também apresentam que:

A possibilidade de utilizar o processo de construção de casas para contextualizar o ensino de matemática atende o pressuposto dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, o qual indica que através da contextualização de determinados conteúdos o aluno se sente mais à vontade para aprender e também é uma forma de dar um significado real ao conteúdo abstrato, ao aproximá-lo, mesmo que indiretamente da realidade (MENEZES; COSTA, 2012, p. 2).

Para finalizar a construção dessa categoria, apresento mais duas unidades retiradas o texto de Freitas (2012). A N3, que diz:

Consideramos que este desenho de currículo poderia ser trabalhado em qualquer das escolas citadas em pesquisas analisadas, quer seja de uma comunidade pesqueira, de trabalhadores da construção civil ou trabalhadores camponeses rurais, com as devidas adaptações provenientes de um apurado diagnóstico a respeito do desenvolvimento e expectativas desses estudantes. E reelaborado em um constante processo dialético do conhecimento com as experiências e novos e antigos saberes desses alunos (FREITAS, 2012, p. 8).

O currículo citado em N3 trata-se de um currículo de contemplação da diversidade de pensamentos, em que, em cada realidade, o currículo seria reelaborado para resultados satisfatórios. Já em N4, Freitas também argumenta que a reformulação deve ser feita nos livros didáticos.

E, por fim, uso das palavras de Camargo (2008), que afirma que “[...] sem dúvida, a Matemática Escolar deve ter um papel que favoreça a construção de uma cidadania” (CAMARGO, 2008, p. 5).

Em comum, essas unidades de sentido têm o enfoque na reformulação do currículo, levando em conta conhecimentos trazidos pelos estudantes também trabalhadores. É muito forte a reivindicação pela valorização, nos currículos escolares, desses conhecimentos. Alguns autores chamam a atenção, porém, para a forma que isso ocorre, com o cuidado de não forçar, em situações não propícias, para que aconteça alguma relação entre saberes escolares e extraescolares.

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