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5.2 INTERTEXTUALIDADE

5.2.1 Détournement

O termo détournement, formulado por Grésillon e Maingueneau (1984) é um caso de intertextualidade implícita que “consiste em produzir um enunciado que possui as marcas linguísticas de uma enunciação proverbial, mas que não pertence ao estoque dos provérbios reconhecidos” (GRÉSILLON e MAINGUENEAU, 1984, p. 114, apud KOCH, BENTES, CAVALCANTE, 2007, p. 45). Para os autores, o détournement pode ser do tipo lúdico, quando, desprentenciosamente, há jogos com a sonoridade de palavras, ou do tipo militante, com finalidade esclarecedora ou de atribuir certa autoridade a um enunciado, como nos casos de captação, e também com finalidade de subverter a ideia do intertexto em prol de interesses diversos.

68 Nosso posicionamento vai ao encontro da opinião de Koch, Bentes, Cavalcante (2007) que pensam ser do tipo militante todo e qualquer détournement, já que ele sempre levará o interlocutor a alcançar novos sentidos. Então, segundo as autoras, neste caso, o objetivo de um détournement “é levar o interlocutor a ativar o enunciado original, para argumentar a partir dele; ou então, ironizá-lo, ridicularizá-lo, contraditá-lo, adaptá-lo a novas situações, ou orientá-lo para um outro sentido, diferente do sentido original”, ou seja, possui valor subversivo (KOCH; BENTES; CAVALCANTE, 2007, p. 45).

Para Cavalcante (2013), o détournement é um “tipo especial de párodia, mas parece restringir- se a textos mais curtos, muitas vezes a provérbios, frases feitas etc., não chegando a transformar um texto completo em outro, em todos os casos” e também que é uma derivação, já que o détournement “parte de um texto preexistente, transformando-o e ressignificando-o”, e ainda afirma que outros fenômenos textuais podem ocorrer no mesmo contexto em que ele ocorre (CAVALCANTE, 2013, p. 159-160).

Segundo de Koch, Bentes, Cavalcante (2007), a noção de détournement tal qual formulada por Grésillon e Maingueneau (1984), seria capaz de abarcar as diversas formas de intertextualidade em que um intertexto sofre alterações ou adulterações visando a produção de novos sentidos, todavia, é imprescindível que o texto-fonte seja reconhecido. Estas alterações também são conhecidas por operações de retextualização e podem ser efetuadas por meio de substituições, supressões, acréscimos e transposições operadas sobre o texto-fonte. Por meio destas formas de retextualização é que diversos tipos de détournement se realizam.

Quando o détournement ocorre por substituição, fonemas ou palavras podem ser substituídos por outros, como se observa em quase todas as propagandas da Hortifruti, nas campanhas Hollywood e Ritmos. Em “Gosto muito de você leãozinho” (Trecho da música “O Leãozinho”, interpretada por Caetano Veloso) a palavra “leãozinho” foi substituída por “limãozinho” em “Gosto muito de você, limãozinho” (Figura 1- Limão - Campanha Ritmos), entretanto a semelhança sonora foi conservada.

Um détournement realizado por acréscimo ocorre quando uma formulação adversativa ou algum outro tipo de acréscimo é feito em um intertexto. Um exemplo é o texto da figura 12,

69 em que à palavra “Shrek”, nome do filme que constitui o intertexto, foi acrescentado o fonema /ʃ/, ou a sílaba “chu”, transformando-o em “Chuchurek”.

Nos casos em que um détournement ocorre por supressão, como o próprio nome já diz, é suprimido algum elemento do texto-fonte, letra, palavra, entre outros que possam ser significantes do processo de retextualização. Já em se tratando de détournement por transposição, a ordem das palavras de um texto é alterada, como no exemplo trazido por Koch, Bentes, Cavalcante, (2007, p. 51), em que o texto “Pense duas vezes antes de agir” sofre détournement por transposição quando retextualizado em “Aja duas vezes antes de pensar” (Chico Buarque, “Bom Conselho”).

Destarte, é por meio de todas estas “formas de retextualização, isto é, de transformação de um texto em outro” que “operam-se (...) diversos tipos de détournement” (KOCH; BENTES; CAVALCANTE, 2007, p. 51). Estas autoras ainda esclarecem que

[...] os détournements têm sempre valor argumentativo, em grau maior ou menor. [...] com base no mesmo intertexto, é possível muitas vezes argumentar em sentidos opostos. É claro que, sendo o mesmo texto fonte inserido em dois contextos diferentes, um em que há captação, outro em que ocorre a subversão, a orientação argumentativa será diferente. Contudo, ela poderá ser também diferente em se tratando de dois casos de subversão. Tudo vai depender, evidentemente, do contexto mais amplo em que o texto que sofreu o détournement se encontra inserido, tanto do co-texto, quanto do entorno visual (ilustrações, gráficos, charges etc.), ou, ainda, do contexto situacional imediato ou mediato (KOCH, BENTES, CAVALCANTE, 2007, p. 58).

Diante do que foi exposto sobre o détournement, notamos que este tipo de intertextualidade implícita é bastante comum na esfera da publicidade, já que, como podemos observar em diversas propagandas, a intenção de convencer o leitor é muito maior, em razão de haver um jogo de interesses mercadológicos oculto neste tipo de discurso. Nas propagandas, que compõe o corpus desta pesquisa, por exemplo, o détournement dá margem a uma argumentação a favor do mercado Hortifruti e dos seus produtos, configurando assim um recurso textual de grande importância na elaboração das propagandas. Observamos também que o détournement de filmes, músicas e foram bem explorados na elaboração das campanhas Hollywood e Ritmos.

70 Dada a necessidade de atestar a noção de acessório aplicada aos adjuntos adverbiais em contextos reais de uso, conjugaremos os conceitos até agora mencionados, considerando, principalmente, os da Linguística Funcional e os da Linguística Textual para analisar o corpus deste trabalho. Para esta pesquisa é indispensável pensar nos textos como sendo um artefato dinâmico, multifacetado e multimodal. É preciso considerar também o gênero textual em que ocorre o uso desses elementos de natureza adverbial bem como os recursos textuais nele utilizados. Tal conjugação de conceitos contribuirá para chegarmos a uma conclusão acerca do funcionamento dos adjuntos adverbiais na língua em uso, ou melhor, no gênero textual propaganda.

Para o cumprimento de tal propósito, também se faz necessário tomarmos conhecimento sobre os estudos que temos hoje acerca desse gênero textual e dos elementos que o compõem.

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6 O GÊNERO TEXTUAL PROPAGANDA

No decorrer deste capítulo, apresentaremos algumas concepções de diferentes teóricos a respeito de gênero textual, também evidenciaremos que, de acordo com nossas intenções e necessidades, lançamos mão de diferentes estruturas linguísticas em determinados contextos de uso. Nesse sentido, apoiaremo-nos em Bakhtin (2003), Bazerman (2005), Marcuschi (2008) e Cavalcante (2013). Em seguida, trataremos especificamente do gênero textual propaganda, apresentando suas características, funções, linguagem, estrutura, e ainda, discorreremos brevemente sobre slogan, parte integrante das propagandas, a fim de trazer contribuições para a interpretação dos textos nas análises.