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TEMPESTADES GEOMAGNÉTICAS

2 ELETRODINÂMICA IONOSFÉRICA E OS EFEITOS DAS TEMPESTADES GEOMAGNÉTICAS

2.4. Campos Elétricos e Correntes no Sistema Magnetosfera-Ionosfera As partículas carregadas de um plasma reagem fortemente a campos elétricos e

2.4.1. Dínamo Ionosférico

2.4.1.1. Dínamo da Região E

O dínamo da região E é caracterizado por um circuito de correntes que flui em toda ionosfera combinada à ação do vento e dos campos elétricos, especialmente no lado diurno da Terra. Há geração de vórtices de corrente, no sentido anti-horário no hemisfério norte, e no sentido horário no hemisfério sul, conhecidos como sistema Sq (solar quiet) de correntes. Esse sistema produz variações no campo magnético terrestre e são alterados em períodos de aumentos na atividade solar. De forma simplificada, o mecanismo de geração destas correntes é dado como segue.

O vento de maré (U r

) sopra através do campo geomagnético e provoca a colisão dos átomos e das moléculas do ar neutro com os elétrons e os íons da ionosfera. Embora estas partículas carregadas movam-se inicialmente na direção de U

r

, seus movimentos são dependentes do campo geomagnético. Na região E, onde a girofrequência é menor (maior) do que a frequência de colisão para os íons (elétrons), os íons são transportados juntamente com o vento, enquanto os elétrons movem-se com menores velocidades. Esta separação de cargas induz o campo elétrico

B U E r r r × = (2.5)

que, por sua vez, gera uma corrente elétrica ) (U B E J r r r r × = =σ σ , (2.6)

onde σ é a condutividade. Em qualquer ponto onde esta corrente não satisfaça a condição ∇.J =0

r

, cargas elétricas são acumuladas e a ionosfera torna-se polarizada. Um campo elétrico de polarização −∇φ (sendo φ o potencial elétrico) é estabelecido e auto ajusta-se até que a condição ∇.J =0

r

seja atendida (RISHBETH, 1997). O campo elétrico total produzido pelo dínamo,

φ ∇ − × =(U B) ED r r r , (2.7)

é mapeado pelas linhas do campo geomagnético por toda a ionosfera equatorial e de baixas latitudes e produz o movimento de deriva vertical (para cima) e zonal (para oeste) do plasma da região F ionosférica diurna (KELLEY, 1989). O sistema de correntes resultante deste campo é dado por

] ) [( ~ φ σ × −∇ = U B J v r r , (2.8)

em que σ~ é o tensor condutividade.

Na Figura 2.7 é mostrado o sistema Sq de correntes e os campos elétricos gerados. Os campos elétricos zonais resultantes deste sistema são para leste durante o dia e para oeste durante a noite.

Figura 2.7. Sistemas Sq de correntes, durante períodos de equinócio e mínima atividade solar. FONTE: Denardini (2003).

As condutividades ionosféricas podem ser examinadas na Figura 2.8. A condutividade Pedersen (σP,) é perpendicular ao campo magnético e paralela ao campo elétrico e tem seu pico em torno de 140 km; a condutividade Hall (σH) apresenta seu pico em torno de 120 km sendo perpendicular ao campo magnético e ao campo elétrico. Essas condutividades diminuem rapidamente abaixo e acima destas altitudes. Notam-se também na Figura 2.8 os altos valores da condutividade paralela (σ||), que é a condutividade ao longo das linhas de campo magnético e na direção do campo elétrico, sendo independente de B

r

. Em grandes altitudes, as partículas carregadas são, numa primeira aproximação, confinadas às linhas de campo magnético onde elas se movem livremente devido à alta condutividade. Nesse caso, as linhas de campo magnético atuam como equipotenciais e não há campos elétricos capazes de promover uma redistribuição de cargas. Desta forma, os íons e elétrons tornam-se “congelados” às linhas de campo magnético, manifestando assim o forte acoplamento do plasma e do campo magnético na magnetosfera (WHITTEN e POPPOFF, 1971). Mais considerações

acerca das condutividades ionosféricas podem ser encontradas em Rishbeth e Garriot (1969), Whitten e Poppoff (1971), Kelley (1989), e outros.

Figura 2.8. Perfis de condutividades (Hall, Pedersen e Paralela) diurnas (linhas sólidas) e noturnas (linhas tracejadas) na ionosfera terrestre.

FONTE: Adaptado de Schulz (2007).

As altas condutividades da região E são responsáveis pela geração das correntes descritas anteriormente. Como mostrado na Figura 2.7, na região equatorial o fluxo de corrente aponta para leste durante o dia. Além disso, nas altitudes do dínamo da região E há uma intensificação dessa corrente para leste sobre uma faixa latitudinal estreita compreendendo ±3°, centrada no equador geomagnético. Essa corrente intensificada foi denominada Eletrojato Equatorial (EEJ) por Chapman (1951) e é consequência da geometria quase horizontal das linhas do campo geomagnético na região do equador magnético associada às altas condutividades (RISHBETH e GARRIOT, 1969; FORBES, 1981).

Cabe ressaltar aqui que um importante resultado da deriva E B r r

× é que o campo elétrico zonal equatorial (na direção leste-oeste) gerado pelo dínamo da região E, que tipicamente aponta para leste no lado diurno da Terra, será responsável pelo movimento vertical ascendente do plasma da região F sobre a região do equador geomagnético, o

que ocorre enquanto as forças de pressão são suficientes para manter esse movimento de subida. Da mesma forma, o campo elétrico zonal que aponta para oeste na região equatorial (caso tipicamente noturno) causará uma deriva para baixo do plasma. Assim, ao longo do dia, a deriva vertical do plasma da região F é para cima durante o dia e para baixo durante a noite, na região equatorial, em períodos isentos de perturbações geomagnéticas, e está relacionada diretamente ao campo elétrico zonal equatorial.

Um importante resultado do movimento ascendente do plasma na região equatorial, durante o dia, é a formação da Anomalia de Ionização Equatorial (AIE). A elevação do plasma até altitudes em que a taxa de recombinação é menor propicia um maior tempo de vida dos constituintes do plasma. Devido aos efeitos de gradiente de pressão (∇p) e

gravitacionais (g), o plasma adquire movimento descendente que se dá apenas por difusão ao longo das linhas de campo geomagnético, deixando de ser vertical devido a girofrequência das partículas do plasma ser dominante sobre a frequência de colisão em maiores altitudes (NOGUEIRA, 2009). Dessa forma, o plasma de longa vida difunde-se ao longo das linhas de campo magnético para regiões de maiores latitudes, depositando- se nas latitudes magnéticas de aproximadamente ± 20° e formando os picos da AIE (KELLEY, 1989). O mecanismo responsável por este fenômeno também é chamado de efeito fonte. A Figura 2.9 apresenta um esquema da AIE.

Figura 2.9. Diagrama esquemático do transporte do plasma na região equatorial. FONTE: Adaptado de Kelley (1989, pag. 193).

Os picos de ionização associados à AIE são mostrados na Figura 2.10; eles se formam no entorno do equador geomagnético e sofrem grandes variações durante os períodos magneticamente perturbados, como será discutido nas próximas seções. Nesta figura é mostrado um mapa de TEC feito a partir de um arquivo IONEX (SCHAER et al., 1998) disponibilizado pelo Jet Propulsion Laboratory (JPL – NASA) através do site ftp://cddis.nasa.gov/gps/products/ionex/. O mapa mostra o desenvolvimento da AIE às 22:00 UT.

Figura 2.10. Mapa de TEC produzido a partir de arquivo IONEX, para o dia 04 de Janeiro de 2010 as 22:00 UT, mostrando os picos da AIE.

Os ventos meridionais nestas latitudes também produzem um fluxo inter-hemisférico de ionização podendo causar assimetrias nos picos da AIE. Resultados de simulação apresentados por Balan et al. (1997) mostram o efeito combinado do campo elétrico zonal para leste e de um vento trans-equatorial (meridional), como pode-se observar na Figura 2.11, que mostra estes resultados para três longitudes diferentes. Essa simulação foi feita para as estações de Trivadrum (Índia), Fortaleza (Brazil) e Jicamarca (Peru), todas situadas sobre o equador geomagnético. Devido à separação geográfica latitudinal destas três estações, a magnitude do vento meridional varia bastante, mesmo durante os equinócios. Sobre Jicamarca, que se situa em 12°S (geográfico), o vento meridional aponta para o sul ao meio-dia, o que causa a inclinação no vetor de fluxo do plasma

mostrado na Figura 2.11. Um efeito oposto é verificado sobre Trivadrum, localizada em 10°N, enquanto sobre Fortaleza (4°S) forma-se um efeito fonte aproximadamente simétrico. A inclinação nos vetores de fluxo do plasma é responsável pela formação da AIE assimétrica.

Figura 2.11. Esquerda: Efeito fonte simulado pelo modelo SUPIM para três setores longitudinais distintos, Jicamarca (Peru), Trivadrum (Índia) e Fortaleza (Brasil). A inclinação dos vetores de fluxo do plasma é causada por ventos trans- equatoriais. Direita: Localização geográfica do equador geomagnético (topo) e declinação magnética das três localidades estudadas (embaixo).

FONTE: Adaptado de Balan et al. (1997).

É importante ressaltar aqui que a AIE e o Eletrojato Equatorial são gerados pelos mesmos campos elétricos primários, e, portanto, suas intensidades estão relacionadas, ou seja, um eletrojato intenso (fraco) estará associado a uma AIE bastante (pouco) desenvolvida. Assim, suas variabilidades também estarão relacionadas, porém essas variabilidades estão sujeitas à resposta de cada um desses fenômenos a uma mudança no

campo elétrico primário. Apesar da deriva vertical do plasma (que gera o efeito fonte) responder prontamente às mudanças no campo elétrico zonal, as respostas na AIE ocorrerão somente após 2 a 4 horas, dependendo dos processos de transporte e dos tubos de fluxo envolvidos no instante destas mudanças. Enquanto isso, a resposta do EEJ a essas mudanças no campo elétrico zonal ocorre dentro de alguns segundos. Assim, é correto relacionar as variabilidades da AIE e do EEJ se as modificações no campo elétrico primário tiverem tempos de escala maiores que 2 horas (ABDU, 2005). Essas considerações são importantes nas investigações de clima espacial das perturbações ionosféricas equatoriais.

Dessa forma, medidas das derivas do plasma feitas por radares ou experimentos a bordo de satélites são de extrema valia na investigação das características do campo elétrico equatorial, que é o modulador primário dos principais fenômenos da ionosfera equatorial. Mais detalhes sobre a deriva vertical da região F e os campos elétricos associados serão apresentados na próxima seção.