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DA CONTROVÉRSIA ACERCA DA FUNGIBILIDADE ENTRE AS TUTELAS

O parágrafo sétimo, do artigo 273 do Código de Processo Civil passou a possibilitar a concessão de medida cautelar incidental ao processo, verificada a presença de todos os pressupostos, quando o autor, a título de antecipação da tutela, requerer providência de natureza cautelar. Haveria sido instituída a fungibilidade entre os institutos processuais em questão? A resposta é negativa, em que pesem inúmeros posicionamentos em sentido diverso.

Inicialmente, temos que a fungibilidade somente é ostentada entre figuras de uma mesma natureza, sendo que os institutos da antecipação da tutela meritória e da cautelar ostentam naturezas totalmente diversas, (embora pertençam a um mesmo gênero, qual seja, tutela emergencial ou de urgência).

Totalmente repugnante a admissão da fungibilidade entre institutos diversos. O processo cautelar, conforme já exposto, refere-se a um instrumento de proteção da utilidade do provimento jurisdicional, ou seja, da utilidade do próprio processo, (instrumento do instrumento). O instituto da antecipação da tutela ou de seus efeitos refere-se a um adiantamento da tutela final nas hipóteses legais. O primeiro é simples cautela. O segundo é mérito.

Entendemos que a possibilidade de obtenção de medidas cautelares nos equivocados pedidos de antecipação de tutela são perfeitamente cabíveis, além da

disposição legal expressa, como decorrência lógica do princípio da instrumentalidade das formas – tendentes à concretização do princípio maior da efetividade da jurisdição.

A admissão da concessão de medida cautelar como “tábua de salvação”, ao pedido equivocado de antecipação de tutela é cabível em função de sua própria essência e natureza.

Nos moldes já explicitados, as medidas cautelares tendem a proteger o processo, ou a efetividade / utilidade do futuro provimento jurisdicional, sendo um instrumento dele. Se a medida cautelar é um instrumento da propria atividade jurisdicional, compete ao juiz, independentemente de maiores formalidades procedimentais, adotá-la sempre que necessário e lhe exposto pela parte interessada.

O artigo 125, inciso III, do Código de Processo Civil assim dispõe:

“Art. 125. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, competindo-lhe:

III – prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça.”

Ora, se incumbe ao juiz a prevenção e repressão de atos contrários à dignidade da justiça, compete a ele, na defesa do interesse da própria Jurisdição, coibir ou determinar a prática de atos tendentes a garantir que a tutela jurisdicional a ser concedida ao final, seja útil e exequível (visto que a impossibilidade / inutilidade acidental do provimento jurisdicional representam evidente contrariedade à dignidade da justiça).

Assim, vislumbrando o magistrado a possibilidade de se tornar inócua toda a atividade jurisidicional, deve ele determinar as medidas cautelares adquadas ao caso.

Em razão disso, bem como, repita-se, da expressa disposição legal, é que vislumbramos a perfeita possibilidade de concessão de medidas acautelatórias, pelo juiz, quando erroneamente pleiteadas sob a alcunha de antecipação de tutela.

Além do mais, o parágrafo sétimo, do artigo 273 do Código de Processo Civil é totalmente dispensável em razão do Poder Geral de Cautela do magistrado, previsto no artigo 798 do mesmo diploma jurídico.

O contrário, todavia, não pode ser aceito, ou seja, a concessão de antecipação de tutela quando houver um requerimento de medida cautelar (dita “fungibilidade de mão-dupla”).

Pela interpretação literal do dispositivo em questão (artigo 273, § 7° do Código de Processo Civil), não se admite a “mão-dupla” pela falta de previsão legal (ou seja, não se admite a concessão de tutela antecipada no caso de requerimento de antecipação de tutela a título de ação cautelar). Ocorre que simples e única interpretação literal é bastante combatida pela doutrina, que apresenta argumentos favoráveis à “mão-dupla”: 1) Cabe à parte deduzir os fatos, competindo ao juiz aplicar o direito – e isso independe do procedimento adotado, nem mesmo, a forma com que a prestação da tutela irá se concretizar; 2) Princípio da instrumentalidade das formas; e 3) Teoria da vontade – sempre deve prevalecer a vontade da parte, o

elemento subjetivo do interessado, independentemente de sua exteriorização por meio de uma petição inicial.

Entendemos, todavia, que a antecipação da tutela é algo muito grandioso para ser concedida sem requerimento expresso da parte. A antecipação de tutela é o adiantamento do pedido de fundo meritório.

O artigo 128 do Código de Processo Civil é expresso ao dispor que:

“Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposto, sendo-lhe defeso conhecer de questões, não suscitadas, a cujo respeito a lei exige a iniciativa das partes.” Assim, o adiantamento do pedido integra-o. Se não há pedido, (no caso em que a parte requer uma providencia cautelar e não o adiantamento da providencia final) expresso, ou iniciativa da parte interessada, não se pode admitir o deferimento sob o argumento da “fungibilidade”, sob pena de caracterização de expressa violação ao princípio da inércia da jurisdição e do direito de ação. Compete à parte dizer se quer, ou não a antecipação da tutela de fundo, bem como demonstrar a verificação dos requisitos / pressupostos legais.

Diante disso, muito embora possa ser admitida a fungibilidade nos casos de equivocado pedido de antecipação dos efeitos da tutela, com a consequente concessão de tutela cautelar, por expressa disposição legal, como forma de alcance da efetividade do processo, visto que seria admitida uma atuação Estatal diversa da pleiteada, possibilitando a eficácia e a consecução de seus fins, o contrário não pode ser aceito (fungibilidade de “mão – dupla”), ante a natureza dos institutos.

Nos termos já asseverados, a instrumentalidade das formas não pode desvirtuar a essência dos institutos, ainda que em prol da efetividade do processo, sob pena de caracterização da mais absoluta insegurança jurídica e ilegalidade.

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