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3. A filosofia da inclusão

3.1. Da integração à inclusão

“Se há uma noção difícil de deixar clara ao interlocutor, para ajuda-lo a compreendê-la, é a da integração de indivíduos considerados diferentes num grupo social. É difícil integrar uma população particular numa sociedade pois, a partir de uma população particular numa sociedade pois, a partir de uma certa percentagem de indivíduos

diferentes, a população de origem teme perder a sua identidade” (Roncin, 1992)

Há muito que se contextualizou a educação especial, num quadro de ensino limitado a escolas especiais para o acompanhamento e formação dos jovens afetados. Perante diferentes incapacidades intelectuais e físicas levaram sempre a um mesmo encaminhamento para locais exclusivos deste tipo de crianças.

Na realidade, se por um lado as consequências das deficiências físicas e sensoriais eram obrigatoriamente atribuídos ao individuo como sendo “ uma vez deficiente, deficiente para sempre” assim como as dificuldades sentidas por este padrão de alunos na escola eram denominadas de deficiência mental, qualquer criança ou jovem com notáveis dificuldades físicas, sensoriais, mentais, comportamentais ou de comunicação, era distintamente considerado como sendo diferente do resto dos alunos, com características consideradas inalteráveis e permanentes assim sendo, fazia todo o sentido a existência de um sistema educacional separado do ensino regular.

Ao longo do tempo a sociedade sofreu grandes alterações na forma como encaravam os indivíduos com “deficiências”.

No proémio do século, os sistemas educativos focavam-se em modelos de exclusão. Foram surgindo colégios especiais para as diferenciadas deficiências.

Chegado o momento das escolas públicas incluírem na sua responsabilidade educativa um currículo profícuo para estas crianças, dotando-as de ferramentas suficientes para uma vida futura condigna, continuaram a segrega-las, colocando-as em classes especiais, separadas das outras crianças. As crianças com problemas comportamentais ou de aprendizagem eram direcionadas para classes regulares, não podendo beneficiar de acompanhamento específico.

Com o regresso de muitos mutilados e perturbados mentais no final da II Guerra Mundial, as sociedades modificaram a forma de ver estes indivíduos sentindo o dever da tentativa de reabilitação destes, surgindo assim muitos movimentos, no auge dos anos 60. Com o surgimento destes movimentos, os pais revelam o seu descontentamento face aos procedimentos escolares que conduzem ao isolamento dos filhos, passando então a falar-se de integração.

Segundo (Correia, 1997), o princípio da integração impõe um processo de mudança da escola regular e também da educação especial, para que a criança com NEE goze de uma educação apropriada, tendo em conta as necessidades e interesses de cada um.

Ainda segundo o mesmo autor, o princípio da diversificação de respostas para o atendimento destas crianças, está patente no sistema em cascata de (Deno, 1970), que se baseia num conceito de avaliação positiva, de forma a identificar as áreas fortes do potencial educativo, evitando a classificação em categorias negativas. Os serviços educativos devem dar à criança uma diversificação de práticas educativas, que vão desde a situação mais exclusiva, ou seja, cuidado total, ate à situação de integração plena na classe regular. Qualquer dos níveis em que a criança seja colocada pretende-se que seja um patamar para um imediatamente superior. Os níveis da cascata de Deno, segundo (Correia, 1997) são os seguintes:

Nível 1 – Atendimento na classe regular, recorrendo o professor a serviços de apoio e dirigindo o programa de intervenção;

Nível 2 – Atendimento na classe regular, mas o aluno recebe apoio direto do professor de educação especial, sendo o programa de intervenção dirigido pelos dois;

Nível 3 – Atendimento na classe regular e na sala de apoio, sendo também o programa de intervenção dirigido pelos dois professores;

Nível 4 – Atendimento na sala de apoio a tempo inteiro, sendo portanto o programa elaborado por especialistas;

Nível 6 – Atendimento no domicilio, sendo o programa também elaborado por especialistas;

Nível 7 – Atendimento em instituições especializadas (hospitais, lares…). Logo que os objetivos sejam alcançados, a criança, colocada num meio mais restrito, deve evoluir para um ambiente cada vez mais integrador. O objetivo de cada nível é sempre preparar a criança para o nível imediatamente acima.

Ainda segundo o mesmo autor, o modelo de Demo foi aperfeiçoado por (Reynolds e Birch 1997), com o objetivo de incluir o maior número de alunos com NEE em ambientes regulares. Neste modelo o ensino deve ocorrer, sempre que possível, num ambiente integrador. Só em circunstâncias extremas é que as crianças deverão frequentar classes especiais. Destas formas de colocação surgem diferentes níveis de integração, consoante o envolvimento educativo em que a criança se encontra. Assim, e de acordo com (Soder, 1981), in (Niza, 1996)podemos considerar a integração com quatro níveis distintos:

Integração Física – pouca participação do aluno nas atividades da classe regular; os alunos encontram-se no mesmo território, mas com atividades educativas separadas e utilizando os mesmos espaços em momentos diferentes.

Integração Funcional - participação mais significativa do aluno nas atividades da classe, com utilização simultânea dos mesmos espaços.

Integração Social - integração efetiva da criança, desempenhando um papel no grupo, vericando-se interação significativa com os colegas.

Integração Social ou Comunitária - acesso e participação na comunidade para além da escolaridade obrigatória, durante a vida adulta.

Prosseguindo a caminhada da integração, foi promulgada uma lei, em 1975, “Public Law 94-142”, aprovada pelo Congresso dos Estados Unidos, considerada como uma das mais importantes na história da educação. O aspeto com maiores implicações nesta lei está contido na frase “alternativa menos restritiva”, tal como refere (sprinthal & sprinthal 1993), que significa que todos os alunos terão que ser educados num meio o mais normal

possível, tendo a escola de se adaptar, pois esta tem o dever de incluir e não de excluir. Esta lei determina ainda:

 A existência de uma resposta educativa para todas as crianças e jovens deficientes;

 A criança deficiente deve ser educada juntamente com os colegas não deficientes durante o maior espaço de tempo;

 Estas crianças devem ter ao seu dispor a mesma gama e variedade de programas da escola disponíveis a todas as outras crianças;

 A existência e implementação de um Programa Educativo Individual (PEI), para qualquer criança com NEE, que requeira uma intervenção educativa especializada.

Em 1978 publica-se em Inglaterra um relatório, “Warnock Report”, levando a que surjam novas práticas e ideias sobre integração. Tal como é referido nos documentos (OCDE, 1994), segundo este relatório não há crianças “deficientes”, mas sim com NEE, que necessitam de ver as suas necessidades atendidas pela escola regular, quaisquer que sejam as suas dificuldades.

(Correia, 1997), quanto ao conceito de NEE, refere que ele se aplica a crianças e adolescentes com problemas sensoriais, físicos, intelectuais e emocionais e também com dificuldades de aprendizagem derivadas de fatores orgânicos ou ambientais. O mesmo autor identifica ainda a descrição de alunos NEE, como sendo aqueles que apresentam problemas de aprendizagem durante o seu processo escolar, exigindo por isso uma atenção particular e recursos educativos diferentes dos usados para os seus colegas da mesma faixa etária.

O relatório “Warnock Report” sublinha ainda a importância do desenvolvimento de métodos e organizações para estas crianças, sendo a necessidade de cada uma o mais importante no suporte para a integração. Propõe uma série de recomendações, que vão desde a participação dos professores até à participação de todos os outros técnicos, pais e ainda autoridades locais. Com a publicação deste relatório e segundo (Niza, 1996), o enfoque medico nas deficiências do aluno desloca-se para o enfoque da aprendizagem escolar de um currículo ou programa. Verifica-se assim a passagem do modelo médico

para o modelo educativo. Tal como refere (Costa, 1996) para promover a aplicação da Declaração Mundial da Escola para Todos, proclamada na Conferencia de Jomtien, na Tailândia em 1990, a Unesco publicou uma obra intitulada “Teachers Education Resource Pack”, da autoria de Mel Ainscow, na tentativa de ajudar as escolas e os professores a lidar com as diferenças dos alunos. As estratégias chave sugeridas nesse documento têm como base as seguintes orientações: aprendizagem ativa, negociação entre alunos e professores, demonstração prática e feedback, avaliação contínua e apoio. Ainscow propõe ainda a formação contínua de professores e a abertura da escola aos pais e à comunidade.

Todas estas estratégias e novos conceitos foram reforçados posteriormente numa conferência que decorreu entre 7 e 10 de Junho de 1994, em Salamanca, organizada pelo Governo Espanhol em cooperação com noventa e dois governos e vinte e cinco organizações internacionais, com a participação de mais de trezentas pessoas. Fruto desta conferência surge a (Declaração de Salamanca, 1994)com o objetivo de promover a EDUCAÇÃO PARA TODOS com o objetivo de promover a EDUCAÇÃO PARA TODOS, lançando o desafio a todos os países para que procedam às mudanças fundamentais ao nível político, económico, social e educacional, no sentido de garantir a educação de crianças e jovens com NEE.

Desta conferência, saiu a proclamação dos seguintes princípios, pelos quais se devem orientar os diferentes governos:

 Cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias:

 Os sistemas de educação devem ser planeados e os programas educativos devem ser implementados, tendo em vista a vasta diversidade destas características e necessidades:

 As crianças e jovens com NEE devem ter acesso às escolas regulares, que a elas se devem adequar e ir ao encontro das suas necessidades:

 As escolas regulares constituem os meios mais eficazes de combater as atitudes discriminatórias, criando comunidades abertas e solidarias.

Como refere (Costa, 1996) surge assim um novo conceito, o de “Escola Inclusiva”, no sentido de escola para todos, num meio o mais normalizado possível, onde sejam dadas

a todas as crianças as mesmas condições de aprendizagem, não descurando os meios técnicos e intervenção especializada necessária. A escola deverá ser apoiada por serviços competentes e eficazes que formam equipas multidisciplinares, de modo a darem resposta aos problemas educativos, sociais, psicológicos e médicos. A escola regular terá de se tornar mais flexível, mais aberta aos pais, aos professores de apoio e à comunidade em geral. É necessário que a escola se torne mais autónoma para poder resolver os seus próprios problemas e dos seus alunos.

Segundo (Correia, 1995)com esta declaração inicia-se uma outra fase relativamente aos pressupostos e princípios que fundamentam a educação dos alunos com NEE. Associando a ideia de escola inclusiva à de escola para todos, sublinha que “não há ninguém de fora”, o que não acontecia com a ideia de integração, a qual supõe pôr dentro da escola alguém que, à partida, está excluído.

A mesma autora refere que, embora as primeiras experiencias de integração no nosso país tenham acontecido de forma pontual, tendo-se desenvolvido sobretudo a partir dos anos setenta sem qualquer suporte lega (Costa, 1996) atualmente em termos de legislação, é evidente a partilha dos princípios e pressupostos educativos preconizados noutros países.

O novo conceito, o de Escola Inclusiva, implica para (Costa, 1995, nº33) não só mudanças significativas em diferentes áreas, que passam pelas reformas de politica global, reformas na organização do sistema educativo, na metodologia e nos planeamentos globais da educação e da escola, mas também uma grande mudança de atitudes de todos os intervenientes no processo, constituindo para nós professores, um desafio, que se realiza através da nossa pratica pedagógica, contribuindo para a criação de sociedades acolhedoras e inclusivas.

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