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4 A GOVERNANÇA ELEITORAL NO DESENHO INSTITUCIONAL

4.1 DA RELEVÂNCIA DA GESTÃO ELEITORAL PARA A DEMOCRACIA

Embora seja um desejo um tanto quanto onírico a realização de eleições perfeitas, pode se afirmar inexistir sistema, método ou desenho institucional que garanta eleições infensas a falhas e lapsos (FREIDENBERG, 2017:1126). Como produto de uma atividade humana a eleição é passível de falibilidade, o que demanda criar mecanismos de gestão eleitoral que assegurem padrões mínimos de higidez para consolidação democrática. Assim, de início, importa expor o uso corrente do termo gestão eleitoral ao invés de administração eleitoral. Em nosso sentir o vocábulo gestão engloba, além das atividades de adjudicação e elaboração de regras, todas atividades do ciclo eleitoral servindo adequadamente ao escopo da governança eleitoral. Em consonância com esse entendimento o politicólogo Barrientos Del Monte descreve:

Quizá el término gestión electoral es más útil que administración electoral, este último utilizado regularmente sólo para referirse a los organismos electorales que administran las elecciones, obviando aquellos encargados del contencioso electoral u otros organismos secundarios (como los de registro electoral) pero relevantes. La gestión electoral abarca todos aquellos elementos institucionales que involucran las funciones de administración, control y justicia de procesos electorales y de mecanismos de democracia directa si se contemplan legalmente. Se compone de tres elementos: a) las leyes y normas en las cuales se fundamenta, b) los procedimientos en sí mismos, y c) los organismos electorales, pudiendo ser de administración y/o de justicia electoral, que de acuerdo a sus características condensan en sí mismos un determinado modelo de gestión electoral (2010:100).

A democracia é um sistema que busca conferir sobretudo legitimidade a autoridade haurida da eleição, devendo ser o processo eleitoral não só justo no âmbito interior

dos que promovem a eleição, mas ainda para todos os demais atores políticos envolvidos. (TERAN, 2015:102). É uma missão notadamente complexa.

A dificuldade na análise da gestão eleitoral reside de imediato na enorme quantidade de modelos ao se apreciar em estudo comparado os organismos eleitorais de outros países, sendo a heterogeneidade o símbolo mais presente. Contextos históricos, sociais e políticos conformam as regras do jogo que buscam promover eleições limpas e referendar a isonomia no pleito (SANTOLAYA, 2012:41).

Inexiste no cenário mundial um modelo único, perfeito e acabado de gestão eleitoral. Goodwin-Gill expõe:

Al propio tiempo se tiene debidamente en cuenta el hecho indiscutible de que no hay un solo modelo electoral apropiado para todos los países, sino que cada uno debe forjar el sistema más adecuado para realizar la voluntad del pueblo en un determinado contexto social, histórico y cultural (2006:108).

O desenho de gestão eleitoral de cada país sofre influência de diversos fatores, tais como, origem histórica, características culturais, capacidade econômica e desenvolvimento político, sendo sempre necessário recorrer a aspectos comparativos com o fito de estabelecer standards que sirvam para contribuição em reformas políticas, bem assim, como mecanismo de avaliação por organismos internacionais que estudam processos eleitorais.

Oportuno discorrer que a gestão eleitoral apresenta maior relevo nos países que participaram da terceira onda democrática, porquanto, nesse cenário de transição, a legitimidade advinda da escolha limpa, clara e imparcial por parte dos cidadãos servia de base para fortalecimento da democracia, e, concomitantemente evitava retrocessos autoritários.

Como exemplo da ausência de um modelo único e perfeito, e a possibilidade de diversos modelos díspares atuarem adequadamente, garantindo a competição política legítima, tem-se o modelo espanhol:

Parece haver um amplo consenso entre as forças políticas e na doutrina sobre o fato de que o peculiar modelo espanhol funciona de maneira muito adequada, já que, em que pesem sua debilidade institucional e sua discutível configuração, promove processos eleitorais indiscutidos e resolve conflito satisfatoriamente para os contendentes. Nota-se que apesar de as decisões da Junta Eleitoral Central serem sempre recorríveis judicialmente, na prática muito raramente o são, pelo que tende a atuar como a última instância por todos os efeitos (SANTOLAYA, 2012:58).

Como condição sine qua non para definição de um sistema como democrático

definição dos ganhadores e perdedores na eleição. Servindo a gestão eleitoral como fundamental tanto das democracias consolidadas e principalmente para as democracias em consolidação, atua também na finalidade de garantir a liberdade de associação e expressão, com fontes alternativas de informação, a força da lei e o respeito aos direitos humanos, bem como a prestação de contas dos governantes (BARRIENTOS DEL MONTE 2012; DAHL, 1992).

Reforçando o papel da gestão eleitoral Freidenberg inclui aspectos como a eficácia, eficiência, transparência e autonomia para gerar confiança institucional:

La gestión de las elecciones debe ser eficaz, eficiente, transparente y autónoma tanto del gobierno como de los partidos em general. El papel protagónico de los órganos de la gobernanza electoral tien de a ser más visible en las democracias emergentes o en aquellas elas que son débiles los procesos administrativos y altos los niveles de desconfianza entre los actores políticos (2017:1021).

Outro aspecto de relevo quando se observa a gestão eleitoral e seus respectivos órgãos é o fator de que essas instituições colaboram para a accountability horizontal, ao lado de oposição legislativa, agências de auditoria, comitês anti-corrupção, servindo como entidade com a missão de fiscalizar e limitar o poder de quem governa (DIAMOND E MORLINO, 2044:26). Sendo essencial à democracia a possibilidade de alternância do poder, resta cristalino que o órgão eleitoral que determina os vencedores e os perdedores precisa estar assegurado em sua independência e autonomia.

Por oportuno, importa tratar sobre o nascedouro da justiça eleitoral do Brasil, que tem raiz profunda com a busca de uma gestão mais independente, imparcial e eficiente, de modo a evitar fraudes e ilegalidades.

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