• Nenhum resultado encontrado

2. A EXPERIÊNCIA DO SERVIÇO DE EDUCAÇÃO E RESPONSABILIZAÇÃO

2.2 GRUPOS REFLEXIVOS DE GÊNERO

2.2.1 Dados estatísticos dos atendimentos

Durante toda a execução do Serviço, compreendida entre os meses de setembro de 2008 e novembro de 2009, o SERH atendeu a 628 (seiscentos e vinte e oito) homens autores de violência contra mulheres das cidades de Nova Iguaçu, Mesquita, São João do Meriti e Nilópolis, sendo considerado como atendimento o encaminhamento desses homens para, pelo menos, uma entrevista com a equipe técnica.

O gráfico a seguir colacionado mostra o número dos atendimentos realizados mensalmente pelo Serviço:

Gráfico 1. Número de homens encaminhados mensalmente

Como se observa da leitura do gráfico, os meses compreendidos entre setembro de 2008 e janeiro de 2009, portanto os cinco primeiros meses de funcionamento do serviço, registraram um número bem reduzido de homens encaminhados. Roberto Amado, coordenador geral do SERH, em colaboração com esta pesquisa, informou que o baixo número de homens encaminhados deveu-se a uma visão bastante crítica da juíza titular do Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Nova Iguaçu, que acreditava que muitos homens estavam a responder processo judicial injustamente e, por conta disso, o encaminhamento ao Serviço não era necessário.

O profissional esclarece que esse não era o entendimento da equipe técnica do serviço, que julgava oportuno o encaminhamento de todos os homens denunciados, independente do juízo de culpabilidade, por estarem vivenciando uma possível situação de violência, sendo em demasia importante a participação deles nos grupos reflexivos.

O aumento no número dos atendimentos observado no gráfico a partir do mês de fevereiro de 2009 foi creditado à mudança do juiz titular do referido Juizado Especial, que comungava do entendimento da equipe técnica do serviço. Segundo Amado verbalizou durante entrevista, o novo juiz, inclusive, solicitou da equipe do SERH uma capacitação dirigida especificamente para os conciliadores, em sua maioria estudantes de Direito, que eram os responsáveis pela realização das audiências preliminares, bem como para a equipe multidisciplinar, que era responsável pelo atendimento às mulheres.

A capacitação teria ocorrido entre os meses de maio a julho de 2009, com aulas expositivas semanais para levar maior conhecimento aos conciliadores e equipe interdisciplinar sobre os impactos da violência contra a mulher e a importância do encaminhamento dos homens para atendimento no SERH. Além de expor a metodologia, os encontros serviram para a simulação de audiências preliminares no intuito de se buscar, junto aos conciliadores, a melhor forma de encaminhar os homens ao serviço. Como assegura Roberto Amado, esta capacitação tornou-se estratégica para o Serviço, vez que os homens encaminhados pelo Juizado Especializado eram oriundos dessas audiências preliminares, conforme demonstra o gráfico abaixo:

Gráfico 2. Origem dos homens atendidos segundo encaminhamento

Fonte: ISER, 2010. Vê-se, portanto, que a maior parte dos encaminhamentos partiu do Poder Judiciário, sobretudo do Juizado Especial de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Nova Iguaçu. Outras instituições da rede de atendimento à mulher, como a DEAM; o Ministério Público e organizações não governamentais realizavam pouquíssimos encaminhamentos, o que pode nos levar a pensar que a atuação em rede, de suma importância para o bom desenvolvimento da ação, talvez não tenha sido priorizada.

Conforme expressam Larry Bennett e Oliver Williams, em escrito que analisam a experiência de serviços estrangeiros para homens autores de violência contra a mulher, a organização da rede em que o serviço está inserido tem considerável impacto para a sua eficácia. Para os pesquisadores (BENNETT; WILLIAMS, 2001, p. 7), é fundamental que o programa não seja desenvolvido de maneira isolada de outras ações comunitárias direcionadas ao enfrentamento da violência contra a mulher.

Igualmente, merece destaque a adesão espontânea de homens que se viam diante de uma situação de violência, embora pequena, mas que sinaliza para a importância do serviço como espaço ao qual podem recorrer.

Como previsto na metodologia do Serviço, os homens encaminhados eram submetidos a três entrevistas preliminares aos grupos reflexivos. Considerando que foram 628 homens encaminhados, deveriam ter sido realizadas 1884 entrevistas. Todavia, em alguns casos, as três entrevistas não eram suficientes, sendo realizada uma quarta entrevista para aprofundar algumas questões. Em outros, os homens abandonavam o serviço entre uma entrevista e outra. Assim, foram realizadas 1243 entrevistas durante a execução do projeto. O gráfico seguinte mostra a participação dos homens em cada uma das entrevistas:

Gráfico 3. Número de homens atendidos, por entrevista

Fonte: ISER, 2010. Observa-se, portanto, que o número de desistências registradas entre uma entrevista e outra é bastante significativo. Entre a primeira e a segunda entrevista, 283 (duzentos e oitenta e três) homens abandonaram o serviço. Entre a segunda e a terceira entrevista, esse número é menor, porém ainda bastante elevado: 107 (cento e sete). Deste modo, aproximadamente 62% dos homens que foram encaminhados ao Serviço sequer chegaram a participar dos grupos reflexivos de gênero.

Com os homens que venceram a barreira das entrevistas preliminares, foram formados 21 (vinte e um) grupos reflexivos. Desses, apenas 07 (sete) conseguiram cumprir a meta de vinte encontros. A tabela abaixo mostra, em números, a participação dos homens nesses grupos:

Tabela 1. Participação dos homens nos grupos que cumpriram a meta de vinte encontros

Fonte: ISER, 2010. Os outros 14 (quatorze) grupos formados registraram entre três e dezenove encontros e a participação dos homens neles pode ser analisada a partir da tabela seguinte:

Tabela 2. Participação dos homens nos grupos que não cumpriram a meta de vinte encontros

Fonte: ISER, 2010. Cumpre explicar que o grupo de número 10 foi cancelado após o décimo encontro, pois contava com menos de sete participantes e uma frequência média de quatro participantes por encontro. Assim, esses homens foram realocados para outros grupos. Já o grupo de número 12 sequer chegou a realizar seu primeiro

encontro e o grupo de número 18 foi realizado na cidade de Nilópolis, não tendo seus dados divulgados pelos facilitadores.

Ainda, é importante frisar que, de acordo com as orientações técnicas elaboradas pela equipe do SERH, o usuário que tivesse três faltas consecutivas ou cinco faltas alternadas sem justificativa seria considerado como desistente, uma vez que não atingiria 75% de presença nos encontros dos grupos reflexivos. Entretanto, tal fato não significaria que o usuário seria banido das reuniões. Com isso, tem-se que 190 (cento e noventa homens) compareceram até o último encontro e, deste, 107 tiveram frequência mínima de 75%.

Cumpre ressaltar que os altos índices de desistência registrados pelo SERH é uma constante já experimentada em serviços dessa natureza em outras partes do mundo. Segundo um estudo elaborado por David Adams (2003), em programas estrangeiros as taxas de desistência e não aderência ao serviço variam entre 25% e 65%. Contudo, não é demais reforçar que todas essas informações foram produzidas e repassadas pelo ISER, portanto, pelos próprios profissionais envolvidos na execução do serviço.

Para a etapa dos grupos focais, os pesquisadores responsáveis por sua condução realizaram nove grupos, com duração média de uma hora e vinte minutos cada, no período de 22 de agosto a 04 de dezembro de 2009, com a participação de 74 usuários dentre os que estiverem envolvidos até o fim dos grupos reflexivos. Os grupos eram norteados por um mesmo roteiro de perguntas, sendo que a primeira dizia respeito à compreensão das situações de conflito entre os homens e suas parceiras após a participação no Serviço.

Daniel Costa Lima, um dos pesquisadores contratados exclusivamente para realizar a avaliação do serviço e um dos responsáveis pela condução dos grupos focais, relatou em entrevista para este pesquisador que esta primeira pergunta era a principal motivadora de discussões e falas. Ele relata a experiência com esses grupos focais em um relatório final de avaliação e monitoramento, elaborado em parceria com Ângela Souza Neves e Simone Gomes. Segundo os autores, a realização dos grupos focais tinha por principal objetivo estimular os usuários a discutirem sobre assuntos correlatos à participação deles no SERH/Nova Iguaçu e, deste modo, aprofundar a experiência dos homens no serviço. O referido relatório foi cedido para esta equipe de pesquisa, que se utilizará de algumas de suas partes a

seguir, quando se busca traçar o perfil dos homens atendidos pelo SERH/Nova Iguaçu.