• Nenhum resultado encontrado

Com a criação e a formulação de um novo sistema de saúde a partir do SUS, pode-se afirmar que houve uma grande mudança em boa parte da estrutura institucional e de incentivos de toda a economia brasileira. Especificamente no setor de saúde, a criação do SUS mexeu tanto com a participação do governo nas ações de saúde, seja como provedor ou contratante, quanto com a iniciativa privada. Apontar claramente causalidades nesse processo, pode se tratar de uma tarefa que talvez careça de uma maior precisão, haja vista as inúmeras leis e resoluções que ocorreram ao longo da década que impactaram de maneira distinta - muitas vezes conjunta - a saúde. Porém, é possível se estabelecer relações entre as variáveis, algo que será feito nesta seção.

Os dados serão apresentados de modo a tentar olhar a dinâmica da participação dos hospitais privados na provisão de serviços de saúde. Dada a histórica participação privada na saúde brasileira, é importante ver como o SUS afetou a oferta desses serviços, já que eles historicamente sempre tiveram bastante relevância, como mostrado na seção anterior. Para efeitos de focalização da abordagem, será feita uma distinção entre a oferta de serviços de saúde pelos hospitais privados no sistema de saúde, e de planos e seguros de saúde, os quais estão sendo excluídos neste estudo. Além disso, ao se referir à prestação de serviços privada, estão inclusos os estabelecimentos com e sem fins lucrativos, sendo explicitado no texto quando houver alguma diferenciação entre essas duas categorias.

Primeiramente, um dos dados mais relevantes para a taxa de participação dos hospitais privados no SUS é o número de Autorizações de Internações Hospitalares (AIH‟s) por competência. A AIH é a maneira pela qual os hospitais, sejam públicos ou privados, recebem os recursos após fazer algum tipo de procedimento hospitalar. Dessa maneira, uma cirurgia de apêndice que é feita em um hospital na data de hoje, por

41 exemplo, é paga pelo SUS após o preenchimento, por parte do hospital, dessa AIH. Após isso, com base em uma tabela do SUS que define quanto custa um procedimento desse porte e com essas características, o hospital é ressarcido pelos seus custos.

No Gráfico 7, com alguns dados que originaram o gráfico explicitados logo abaixo, se vê como houve uma grande tendência de queda na quantidade total de nº de AIH‟s Pagas a partir de 1992, pelos hospitais privados. Por outro lado, houve um crescimento do nº de AIH‟s pelos estabelecimentos públicos, porém ele menos que compensou a queda nos estabelecimentos privados, reduzindo o montante final em aproximadamente 14%. Esses dados sugerem uma tendência ao descredenciamento dos estabelecimentos privados com o SUS, cujos possíveis motivos serão mostrados na próxima seção.

Gráfico 8: Brasil – Nº de AIH‟s Pagas pelo SUS por Competência – 1992 a 2007

0 100 200 300 400 500 600 700 800 900 1000 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 Ano competência de AI H' s p ag as (milh are s) Público Privado

Ano Público Privado Total

1992 206.002 941.546 1.147.548 1995 211.702 713.084 924.786 1998 235.528 613.020 848.548 2001 289.279 583.187 872.466 2004 375.623 573.463 949.086 2007 434.342 552.783 987.125

Fonte: Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária 2009. Elaboração própria.

Os Gráficos 8 e 9 mostram a quantidade de estabelecimentos públicos e privados no total de estabelecimentos do Brasil em termos percentuais. A distinção entre os

42 gráficos reside na categoria “Com Internação” e “Sem Internação” se faz presente pelo argumento de que o Estado brasileiro não tem condições de prover todos os serviços de saúde para a população, o que inclusive já estava previsto na Constituição (art. 199, parágrafo 1), quando a mesma estabelece que a iniciativa privada deva complementar a oferta de serviços públicos. Como a rede privada antes do SUS era composta basicamente por hospitais onde há internação e que ofertavam serviços de maior complexidade se comparados ao sem internação (basicamente atendimento ambulatorial), analisar como esse índice se comportou ao longo dos anos – principalmente após o SUS - se torna interessante na medida em que há uma grande diferença na participação dos hospitais privados quando se leva em consideração essas duas categorias.

O que pode ser visto no Gráfico 8, é que claramente os hospitais privados predominavam, e ainda predominam, quando se leva em conta os estabelecimentos com internação, sendo que exatamente antes da criação do SUS, em 1988, eles representavam cerca de 75% do total, caindo para aproximadamente 58% em 2009, denotando uma queda bastante acentuada em 20 anos.

Gráfico 9: Brasil - Participação dos Estabelecimentos com Internação no Total por Competência em (%) – 1976 a 2009. 0 0,125 0,25 0,375 0,5 0,625 0,75 0,875 1 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1992 (1) 1999 (1) 2002 (1) 2005 (1) 2009 (1)

Estabelecimentos Públicos Estabelecimentos Privados

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária 2009. Elaboração própria. (1) Exclusive os estabelecimentos que realizam exclusivamente Serviços de Apoio à Diagnose e Terapia.

43 Ao verificar-se o mesmo dado, porém selecionado para estabelecimentos sem internação hospitalar, se vê uma grande participação de estabelecimentos públicos no total. Ao contrário do gráfico anterior, onde a participação privada é bastante relevante, aqui os estabelecimentos privados não passaram de 30% do total em toda a série histórica. Uma das justificativas para essa diferença é que procedimentos que remuneram melhor o hospital em relação ao custo do procedimento são aqueles de alta complexidade, e que, em geral, necessitam de internação. Portanto, seguindo uma lógica do prestador privado de serviços de saúde, oferecer somente ambulatório e não ter leitos para internação é “menos lucrativo”, já que a tabela de pagamento para procedimentos ambulatoriais (ou de baixa complexidade) é menos rentável para o hospital em relação à tabela de alta complexidade.

Gráfico 10: Brasil - Participação dos Estabelecimentos com Internação por Competência em (%) – 1976 a 2009. 0 0,125 0,25 0,375 0,5 0,625 0,75 0,875 1 1976 1977 1978 1979 1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1992 (1) 1999 (1) 2002 (1) 2005 (1) 2009 (1)

Estabelecimentos Privados Estabelecimentos Públicos

Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Departamento de População e Indicadores Sociais, Pesquisa de Assistência Médico-Sanitária 2009. Elaboração Própria. (1) Exclusive os estabelecimentos que realizam exclusivamente Serviços de Apoio à Diagnose e Terapia.

Para analisar como os hospitais com fins lucrativos se portaram após a criação do SUS, estão explicitados na Tabela 4 os hospitais divididos entre aqueles com fins lucrativos, sem fins lucrativos e públicos. Nessa tabela se percebe quão acentuada foi a queda dos hospitais com fins lucrativos (denotados na tabela como “Demais privados”)

44 na participação geral de todos os índices. Como a séria histórica abrange um período relativamente curto, porém que conteve a maior parte das mudanças nas regras de financiamento do SUS, essa queda pode estar muito relacionada a essas mudanças contínuas.

Em 1995, por exemplo, a participação dos hospitais privados com fins lucrativos nos gastos do SUS com internações correspondia a aproximadamente 37% do total. Já em 2005, o mesmo item correspondeu a 17% da participação, uma queda de aproximadamente 54% em apenas 10 anos. Além disso, sua participação no quantitativo de internações, no mesmo período, também teve uma queda acentuada, aproximadamente no mesmo montante da queda na participação dos gastos do SUS. Logo, pode-se inferir que uma das causas dessa queda foi o descredenciamento dos hospitais privados com fins lucrativos do SUS, além de um aumento da quantidade de hospitais privados sem fins lucrativos e dos hospitais públicos. Vale ressaltar que no período analisado houve uma queda de aproximadamente 13% no quantitativo total de leitos e de 10% no número de internações pagas pelo SUS, apesar da população brasileira ter crescido cerca de 18% (Carvalho et. al., 2009, p.59).

Tabela 5: Brasil: Perfil da Rede de Assistência Médica Hospitalar – 1995 a 2005

Fonte: SIH/SUS – Datasus/MS. Elaboração: CARVALHO ET. Al (2009). (*) últimos dados são de 2003.

Outro ponto a ser destacado na Tabela 4 é que houve majoritariamente uma transferência da participação de hospitais privados com fins lucrativos para os sem fins lucrativos. Apesar da participação dos hospitais públicos ter crescido no período, o dado mais relevante é a queda da participação dos hospitais com fins lucrativos acompanhado da subida, quase em montante igual, dos hospitais sem fins lucrativos. Logo, é

45 importante ressaltar que a provisão de serviços de saúde não mudou muito em sua composição se for feita uma análise entre públicos e privados, já que a maior mudança ocorreu dentro da categoria dos “privados”.

Documentos relacionados