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DAR+ SN (SN=uma X-ada denominal)

4 ALGUNS TIPOS DE ESTRUTURAS DAR+SN COM VERBO SUPORTE

4.3 DAR+ SN (SN=uma X-ada denominal)

São apresentadas neste subcapítulo algumas reflexões acerca da formação e do comportamento das estruturas com verbo-suporte dar+SN denominal, sob o ponto de vista das propriedades morfossintático-semânticas.

De acordo com Basílio (2002), para as estruturas dar+SN denominais, a categoria que serve de base para a nominalização é um nome, representado por N. Com a adição do sufixo –ada, ocorre uma mudança semântica, que permite ao falante formar substantivos a partir de outros substantivos, como: garrafa/ garrafada; caderno/ cadernada, conforme é ilustrado a seguir:

a) Ana deu uma garrafada no ladrão.

Garrafa (base-Nome) - sufixo –ada - garrafada (nome)

Vê-se que com o sufixo –ada a categoria da base se mantém a mesma na palavra complexa (garrafa/ garrafada): garrafa é um nome e garrafada continua sendo um nome. A partir desse raciocínio, a palavra simples garrafa sofre um processo de nominalização denominal, resultando no nome garrafada. Para que haja um processo de nominalização, é necessário que o nome tenha os seguintes traços:

[+N] [-V] nominalização denominal N N+(ada)

Caderno – cadernada ada Garrafa - garrafada ada

Desse modo, as formações denominais em -ada apresentam, em sua maioria, as seguintes características: i) são derivacionais; ii) não mudam a categoria sintática de base – garrafa (N); garrafada (N); iii) em alguns casos, podem interferir na definição do gênero – o caderno [+masc]; a cadernada [+fem].

b) João deu uma cadernada em Maria.

Observa-se que a base caderno pertence ao gênero masculino e, quando a ela se adiciona o sufixo –ada, tem-se um Nome de gênero feminino.

Para os exemplos (caderno/ cadernada) há mudança de gênero; para (garrafa/garrafada) o gênero permanece o mesmo. Esse fato ocorre porque é adicionado às bases (garrafa e

caderno) o sufixo –ada.

A atuação desses sufixos está relacionada, sobretudo, às palavras simples e complexas. Mateus et alli (1990) estabelecem uma distinção nesse sentido, definindo que quando o sufixo formador da palavra é um dos morfemas a, e ou o, a palavra é simples; quando o sufixo é diferente dos morfemas citados, são formadores de palavras complexas, uma vez que eles são o resultado da aplicação do processo de formação de palavras. Como exemplo, o nome

alfinete:

o alfinete - a alfinetada um alfinete - uma alfinetada *um alfinetada - o alfinetada

Alguns estudos atribuem o sufixo –ada de modo mais generalizado, ou seja, um só sufixo para as formações denominais e deverbais. Porém, Liz (2005), com base nas reflexões de Alina Villalva (cp), constata que os sufixos dessas estruturas são distintos, (-ada e –da,

respectivamente), como uma maneira de abarcar as três conjugações verbais. Também Basílio, em seus trabalhos faz referência ao sufixo –da para a formação deverbal. Neste estudo adotamos os dois tipos de sufixos X-(a)da5 para diferenciar as duas formações.

Com referência ao processo de formação de verbos a partir de nomes, Basílio (2004, p. 36) afirma que esses verbos se concentram na denotação de ações definidas pelo substantivo base, sobretudo como objeto da ação e também como instrumentos, como (carimbo/ carimbar,

pincel/ pincelar, lixa/ lixar, etc.).

Nesse sentido, o exemplo (d) a seguir, não é uma forma verbal correspondente à forma nominalizada em (c).

c) Ana deu uma cadernada no João. d) *Ana cadernou o João.

Essas construções, à primeira vista, parecem de fato garantir que não existem formas verbais correspondentes à forma nominalizada e que para essas construções como em (d), o falante encontra outro nome na língua. Entretanto, a dinamicidade da língua permite certos usos que não estão previstos pelas normas sistematizadas e que podem servir a funções pragmáticas. Nesse sentido, um questionamento que parece válido é: até que ponto é possível assegurar/generalizar que todas as formações deste tipo não são possíveis? Para observação, seguem alguns exemplos:

e) Ana deu uma canetada no irmão. f) O juiz deu uma canetada no processo.6

g) O guarda canetou o João7.

5 Os parênteses são para explicar os dois tipos de sufixos (-ada e –da).

6 Eu havia dito também que ao trabalhar sobre o texto encaminhado pela FENAJ, o MTE aproveitou para dar uma "canetada", permitindo que, sendo aprovado pelo Legislativo [...].

Disponível em: <http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=289JDB005> . Acesso em 22 abr. 2009.

7Quando estava chegando perto da Gávea, um motorista de Kombi fez um sinal para mim. – Ô, um PM te canetou ali atrás. Volta lá e desenrola com ele, amigo.

Diante das construções (e) e (f) é possível facilmente perceber que são equivalentes do ponto de vista estrutural, mas que há uma distinção: a formação (e) é denominal e aponta para o sentido de um golpe. O exemplo (f) trata-se de uma formação deverbal, que veicula o sentido de dar um parecer ou assinar um processo.

Comportamento semelhante pode-se observar nos seguintes exemplos: h) Ana deu uma garfada no João.

i) Ana deu uma garfada no macarrão. j) Ana garfou o macarrão.

Com referência ao processo de formação de palavras que envolve o sufixo -ada, a classificação é controversa porque os estudos tradicionais o considera com o mesmo sentido, como se comportasse do mesmo modo nas sentenças. De acordo com Cunha e Cintra (2001, p. 94) “formam-se substantivos a partir de outros substantivos: –ada”, defendendo que a formação de ambas as nominalizações pode ser prevista do mesmo modo. Entre outros exemplos, os autores citam:

“1) Porção contida num objeto: bocada, colherada. 2) Ferimento ou golpe: dentada, facada. [...]”.

Assim, o sentido contido em (1) seria “porção contida num objeto”. Então, a interpretação mais viável para (e) e (h) – canetada no irmão/ garfada no João - seria a contida em (2) “ferimento ou golpe”. Portanto, é possível entender que canetada e garfada têm o mesmo tipo de formação. Porém, sob o ponto de vista dos gramáticos, traz, muitas vezes, divergências quanto à classificação dos sufixos, julgando algumas formações agramaticais, pois não consideram as propriedades de distribuição sintática desses sufixos. Nesse sentido, a previsibilidade de (e) e (i), seria entendida da mesma forma. No entanto, uma interpretação mais adequada para essas estruturas pode ser feita através da distribuição sintática dos nomes que vai depender do contexto em que estão inseridos.

À parte as divergências dos estudos gramaticais, pode-se argumentar que os sufixos fazem mais do que alterar a classe gramatical. Há fortes indícios de que os sufixos trazem em si uma carga semântica variável que é acrescida à base.

Sobre o assunto, Sandmann (1989, p. 30) comenta que existem equívocos no sistema gramatical da língua portuguesa, citando como exemplo contra-argumentativo, justamente o sufixo –ada, o qual não tem o mesmo significado em formações como: martelada, ‘golpe de martelo’, facada, ‘pontada com a faca’ e laranjada, ‘suco de laranja’, dentre outros sentidos que o sufixo pode adquirir, em certas situações de uso. Retomando o exemplo colherada, citado acima em (1), poderia ser usado de formas diferentes:

k) Ana deu uma colherada de mel ao menino. l) Ana deu uma colherada na cabeça do menino.

As duas estruturas são distintas do ponto de vista semântico: em (k), colherada significa porção contida no objeto colher; em (l), um gesto de agressão com o objeto colher. Do ponto de vista sintático, em (k), o complemento (de mel) contribui para explicar que colherada se refere a um recipiente cheio desse conteúdo. Em (l) o complemento (na cabeça) expressa um locativo que passa a designar um instrumento.

De modo geral, percebe-se que os sufixos podem assumir múltiplas acepções, e empregá-los com exatidão, adequando-os às situações variadas, requer e revela completo conhecimento do idioma. Ao buscar informações a respeito dos sufixos, tem-se a impressão de que eles apenas alteram a classe gramatical da palavra – de verbo a substantivo; que acrescentam à base, um significado superficial, ação, resultado e estado, mantendo-se a idéia característica dos verbos. Sobre o assunto, Basílio (2002, p. 8-10) diz que “atribuir ao sufixo a função de mudar a classe gramatical de uma palavra não é suficiente, mesmo porque existem processos de derivação sufixal em que não há alteração da classe de palavras, citando como exemplo o caso dos diminutivos – mesa/ mesinha, sapato/ sapatinho”.

De modo semelhante, no exemplo deste estudo, garrafa/ garrafada não houve alteração da classe gramatical, mas isso não significa que ela não possa ocorrer simultaneamente à mudança semântica de um vocábulo. Segundo a autora, a formação de novas palavras é motivada pela utilização da idéia de uma palavra em uma ou outra classe gramatical e a necessidade de um acréscimo semântico numa significação lexical básica, ao qual é agregado o princípio de economia da língua, que tem como foco a eficiência do processo comunicativo.

Assim sendo, parece verdadeiro afirmar que a palavra derivada por meio do uso de prefixos e sufixos mantém uma relação de significado com sua base. Essa relação semântica que o sufixo mantém com a base relaciona-se à natureza verbal. Com referência aos sufixos –(a)da, várias propriedades, sobretudo, semânticas são agregadas. Especificamente, o sufixo –da tem a função de atender às exigências semânticas, sintáticas e morfológicas, ou seja, estão em jogo as três funções.

No que se refere às exigências semânticas, a base deve se ligar a um nome. Quanto à exigência sintática, a base deve ser da categoria [+N, -V]. Para a questão morfológica, parece haver restrições relacionadas a palavras, cuja base é um nome que apresenta forma pluralizada, tomando-se como exemplo a palavra piresada, derivada do nome (pires), devido à estranheza de sua formação.

Nesse sentido, existe a possibilidade de formação de verbos a partir de substantivos, com o objetivo de designar ação ou processo a ser expresso pelo verbo, como:

m) João deu uma carimbada no requerimento. n) João carimbou o requerimento.

Contudo, tanto dar uma carimbada no requerimento (ação de carimbar), como dar uma

carimbada no João (um golpe), relacionam-se ao nome carimbo. É a mesma possibilidade que

ocorre com o substantivo garfo ao formar garfada/ garfou.

Observa-se assim, que para as estruturas com o verbo-suporte dar+SN, as condições de produtividade dos sufixos –ada (empregado em formações denominais), que ficam somente no domínio derivacional, a regra é menos produtiva do que as estruturas deverbais, que estão no domínio flexional e derivacional, como se observa em 4.4., a seguir: