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PROGRAMAS DE ENSINO PARA O ENSINO PRIMÁRIO DE SANTA CATARINA DE

4.4 Das obras didáticas nos grupos escolares catarinenses

No ano de 1911, Orestes Guimarães oficializou um parecer a pedido do governador de Santa Catarina, Vidal Ramos, acerca da adoção das obras didáticas a serem utilizadas nas escolas públicas do estado, através do Decreto n. 596, de 1911. O parecer deixava transparecer referências às obras que circulavam nas escolas públicas do estado paulista:

Para dar cumprimento ás ordens de Vossa Excellencia, comecei por fazer revisão das obras didacticas approvadas para as escolas publicas de S. Paulo (escolas isoladas, grupos escolares, escolas complementares), fazendo escolha d’aquellas que me pareceram melhores, por isso

que reunem condições pedagogicas,

incontestaveis, observadas pelo magisterio paulista durante vinte e poucos annos de prática (SANTA CATARINA, 1911f, p. 4).

O parecer dirigido ao governador iniciava lembrando que “a uniformisação das obras didacticas (livros de leitura, compêndios, cadernos, mapas, etc) muito contribuirá para o exito da reorganisação actual, melhorando as condições technicas do ensino”, além de acrescentar que “Taes obras desempanham funções de primordial interesse na educação de qualquer povo, pela decidida influencia exercida sobre o professor e alumno (...)” (SANTA CATARINA, 1911f, p. 3).

Orestes Guimarães argumentava que a utilização dos livros em sala de aula não iria substituir a atuação do professor ou impedir a influência do método tradicional:

De facto, substituir a palavra do professor cheia de convicção, de entonações apropriadas, e variedades de gestos – conjunto indispensavel para despertar a atenção – e substituir tudo isto pela linguagem dos compendios, muda e cheia de

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Vale destacar que não pretendemos analisar as obras didáticas utilizadas nos grupos escolares catarinenses, no entanto, buscamos saber quais eram os materiais didáticos que circulavam para a matéria da geometria e do desenho.

termos technicos, é matar a intelligencia em proveito da memoria (Idem, p. 5).

Em vista disso, Guimarães definiu um conjunto de livros a serem adotados nas escolas públicas do estado de Santa Catarina, referenciado em quatro anexos, de acordo com as informações abaixo:

O primeiro anexo destinava-se à biblioteca dos Inspetores Escolares junto a Diretoria da Instrução Pública. Na biblioteca dos Inspetores havia um total de 165 obras, formando um manancial de informações para pesquisas e estudos de observação e comparação. Essas obras serviam para “consultas d’aquelles que se queiram entregar os estudos de cousas didacticas” (SANTA CATARINA, 1911f, p. 4).

O segundo anexo listava as obras que deveriam compor a biblioteca dos grupos escolares, conforme o Art. 9 do Regimento Interno dos Grupos Escolares de 1911: “Os livros e mais objectos destinados ao ensino preliminar serão os approvados pelo Secretário Geral, mediante parecer e proposta do Inspetor Geral com exclusão de quaesquer outros” (SANTA CATARINA, 1911f, p. 4-5). Das 57 obras que compunham a biblioteca dos grupos escolares, apenas duas obras faziam referência ao ensino da geometria e do desenho: Primeiras Noções de Geometria Prática66, de Olavo Freire, e Curso de Desenho Geométrico, em três séries, de Dardignac.

No terceiro anexo são indicadas as obras para as crianças dos grupos escolares e escolas isoladas. Trata-se das seguintes obras dos grupos escolares:

Cartilha Arnaldo Barreto;

Leitura Preparatória Francisco Vianna;

Primeiro Livro Francisco Vianna;

Segundo Livro Francisco Vianna;

Terceiro Livro Francisco Vianna;

Minha Pátria Pinto e Silva;

Cadernos de calligraphia vertical Francisco Vianna;

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Trata-se de um livro com 226 páginas, incluindo 490 exercícios, 92 problemas resolvidos e 381 gravuras, cujas informações estão destacadas na capa da publicação. A geometria é distribuída em 21 capítulos, sendo os 13 primeiros destinados ao estudo da geometria plana, finalizando com o cálculo de áreas de polígonos. Os próximos capítulos se restringem à geometria espacial, incluindo também o cálculo de áreas e volumes de poliedros e corpos redondos (LEME DA SILVA, VALENTE, 2014).

No Regimento Interno de 1914 acrescentou-se a obra Contos Patrios, de Olavo Bilac e Coelho Netto (SANTA CATARINA, 1914b). Ainda segundo o regimento, cada aluno deveria ter um livro de leitura, um lápis de pedra, um lápis de pau, um caderno de caligrafia, um caderno de desenho, um caderno de linguagem, um caderno para as contas (3º e 4º anos), um caderno para cartografia (3º e 4º anos), uma lousa, uma caneta e penas, materiais para trabalhos manuais e folhas avulsas de papel, caso fossem necessários (Idem).

Os anexos n. 1 e n. 2 não contavam com uma aprovação específica, pois eram obras destinadas a consultas. No entanto, as obras do anexo n. 3 deveriam ser aprovadas e adotadas após a publicação dos programas de ensino dos grupos escolares e das escolas isoladas.

Já o quarto anexo apresentava 14 obras para uso das escolas complementares.

Em 1917, o governador do estado, Felippe Schmidt, aprovou o decreto n. 1.062, o qual propunha uma nova revisão das obras a serem adotadas nas escolas públicas, sob o argumento de que:

(...) o exito dos methodos de ensino depende, em grande parte, do criterio na adoptação de obras didacticas;

(...) a fiscalisação do ensino deve ser exercida sobre essa adopção;

(...) algumas obras actualmente em uso nas escolas e mandadas adoptar pelo Decreto n. 696 de Junho de 1911, já não satisfazem as necessidades do ensino publico, ministrado pelo Estado; e tendo em vista a proposta do Secretario Geral e o parecer da commissão por esse nomeada,

Decreta:

Art. Unico. Ficam adoptadas para serem usadas nas escolas publicas estaduaes as obras e material didactico constantes da relação que a este acompanha, assignada pelo Secretario Geral dos Negocios do Estado.

Relação das obras e material didactico a que se refere o Decreto supra:

Cartilha – Ensino Rapido – M. Oliveira; Cartilha Analytica – M. Oliveira; Cartilha Analytica – Arnaldo Oliveira; Paginas Infantis – M. Oliveira; Segundo Livro – Francisco Vianna;

Terceiro Livro – Francisco Vianna; Nossa Patria – Rocha Pombo;

A.B.C. do Agricultor – Dr. Dias Martins;

Grammatica Expositiva Elementar – Eduardo C. Pereira;

Anthologia Brazileira – de Eugenio Werneck; Calligraphia Vertical – Francisco Vianna; Calligraphia Ronder – Otto Boehm;

Quadros de Linguagem Oral – Ramon Roca e outros;

Mappas de Parker – F. Parker;

Cartões para trabalhos – Breser e Rocca; Livro do Mestre – Miguel Milano;

Material para tecelagem – D. Rozina Soares e Miguel Milano;

Curso de Cartographia – José Carneiro e Pedro Voss

(SANTA CATARINA, 1917, p. 63-64).

Em 1928, o governador Adolpho Konder aprovou uma nova revisão das obras a serem adotadas nas escolas isoladas, nos grupos escolares, nas escolas complementares e na escola normal, de acordo com o decreto n. 2.186, ao considerar que:

(...) os resultados dos methodos de ensino depende, em parte, do criterio da adopção de obras didacticas;

(...) a fiscalisação do ensino deve começar pela escolha dessa adopção;

(...) algumas obras actualmente em uso nas escolas e mandadas adoptar pelo Decreto n. 1.602, de 7 de novembro de 1917, já não satisfazem as necessidade do ensino publico,

Decreta:

Art. 1º. – Ficam adoptadas, para serem usadas nas escolas publicas, as obras da relação que a este acompanha, assignada pelo Secretario do Interior e Justiça;

Art. 2º. – A presente adopção não poderá ser alterada, na forma do n. 3 do art. 94 do Regulamento Geral, pelas autoridades escolares e professores.

Art. 3º. – Revogam-se as disposições em contrario.

Relação das obras a que se refere o Decreto desta data:

Para Grupos Escolares

1. Cartilha analytica Marianno Oliveira 2. Cartilha analytica Arnaldo Barreto

3. Primeiro Livro Henrique Fontes

4. Segundo Livro Henrique Fontes

5. Terceiro Livro Henrique Fontes

6. Quarto Livro Henrique Fontes

7. Terceiro Livro (Corações de Crianças) Rita Barreto

8. Contos Patrios

Olavo Bilac e Coelho Netto 9. Mappa da America do Norte J. Monteiro

10. Mappa do Brasil J. Monteiro 11. Mappa da America do Sul J. Monteiro

12. Mappa da Europa J. Monteiro

13. Mappa da Asia J. Monteiro

14. Mappa da Africa J. Monteiro 15. Mappa da Oceania J. Monteiro 16. A.B.C. Geographico General Niox 17. Mappa de figuras geometricas Henrique Figueiredo

18. Mappa do Systema Metrico Olavo Freire 19. Cadernos de Calligraphia Olavo Freire

20. Mappas de Parker Weisflog

21. Calligraphia Vertical F. Vianna

22. Ronde O. Boehm

(SANTA CATARINA, 1928b, p. I-III).

A partir dos indicativos dessas obras didáticas que circularam nos programas de ensino para os grupos escolares, podemos observar que não havia nenhuma obra específica para o ensino da geometria ou do desenho nas obras listadas em 1911, 1914 e 1917. No entanto, em 1928, adotou-se o Mapa de Figuras Geométricas, de Henrique Figueiredo. Embora não tenhamos encontrado esse mapa, a fim de averiguar sua configuração, acreditamos que os conteúdos relacionados às figuras geométricas tinham como indicação a utilização de mapas como material didático de apoio visual para o ensino de geometria e de desenho. Esses mapas, que continham imagens coloridas e adornavam as salas, eram quadros murais utilizados pelo professor em suas atividades (SILVEIRA, 2013).

Assim, entre as décadas de 1910 a 1950, as crianças contavam tanto com a presença do professor quanto com um conjunto de materiais para sua educação e instrução como, por exemplo, obras didáticas, cadernos, mapas, coleções e quadros. Esses conjuntos de materiais, pensados aqui como dispositivos, contribuíram para possíveis aproximações entre as matérias de geometria e de desenho. Provavelmente, esses dispositivos foram pensados e organizados a partir das regras propostas para o ensino primário catarinense.

Dos discursos políticos, usando a educação como mote, moldavam-se ensinos de geometria e de desenho. Isso porque esses saberes contribuíam para a formação de um indivíduo que precisava ser preparado para poder lidar com as demandas no trabalho, resolver questões do cotidiano, e ainda, para a formação de um cidadão civilizado e disciplinado. A partir disso é possível entender o ensino na escola como uma estratégia atrelada a outros discursos relacionados ao cenário catarinense da época, entre os quais, o desenvolvimento econômico, o progresso e o cidadão que respeita a pátria.