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CAPÍTULO II- CARACTERIZANDO O TERCEIRO SETOR

3. Debilidades e Definições do Terceiro Setor

Além do problema que cerca a dificuldade de identificação da origem do termo, anteriormente assinalada, Montaño (2005) identifica outras três debilidades relacionadas ao Terceiro Setor. Para ele, a segunda debilidade do termo se refere à falta de consenso entre os autores, quanto à caracterização das entidades que comporiam esse setor. Pois:

para alguns incluem-se as organizações formais (cf. Salamon, apud Fernandes, 1994:19); para outros, contam até as atividades informais, individuais, ad hoc (Fernandes, 1994:26 e 109); para outros as fundações empresariais seriam excluídas (Flasco, apud Acotto e Manzur, 2000); em outros casos, os sindicatos, os movimentos políticos insurgentes, as seitas etc., ora são considerados pertencentes, ora são excluídos do conceito. (MONTAÑO, 2005: 55 e 56)

Fernandes (1994) demonstra claramente que Terceiro Setor seria composto apenas por manifestações pacíficas, portanto organizações como Movimento dos Sem-Terra (MST), as lutas civis, étnicas e raciais não entrariam no conceito do Terceiro Setor. “Contudo, não sendo estas atividades pertencentes ao primeiro setor, o Estado, menos ainda ao segundo setor, o Mercado, deveriam também ser considerados Terceiro Setor.” (Idem: 56)

A terceira debilidade está na confusão de ter no setor diversos sujeitos com aparentes igualdades nas atividades, porém com interesses, espaços e significados sociais diversos, contrários e até contraditórios. Um dos exemplos, citados por Montaño (2005:56), é a junção do Green Peace (defesa do meio-ambiente com táticas radicais), FIESP17, Creches Comunitárias (conquistas dos moradores), caridade individual, movimento pelas “Diretas Já” e atividades ‘sociais’ de um vereador”.

17 Federação das Indústrias de São Paulo

A última debilidade teórica se refere ao caráter não-governamental, autogovernado e não-lucrativo do setor, “características estabelecidas no IV Encontro Ibero-Americano do Terceiro Setor e por diversos autores.” (MONTAÑO, 2005:57). No caso, das organizações não-governamentais (ONG´s) que, segundo o autor supracitado, hoje são basicamente financiadas por entidades, muitas vezes governamentais, por meio de parcerias18, ou são contratadas de forma terceirizada, pelo próprio Estado, para exercerem funções que caberiam a ele. Sendo assim, ficam duvidosas as características de não-governabilidade e autogovernabilidade, tendo em vista a forte tendência de estarem ligadas à política de governo. E como a sobrevivência dos projetos, a abrangência e prioridades estão condicionadas aos agentes financiadores, notadamente o próprio governo, evidenciando que não possuem a autonomia que pretendem.

Também em relação às ONG´s, o caráter não lucrativo pode ser questionável, pois pesquisas têm demonstrado que parte dos recursos repassados pelo Estado acabam custeando as despesas de operalização, não chegando aos destinatários, nisto pode-se considerar os salários pagos aos altos funcionários de algumas organizações, chamadas de ‘pilantrópicas’. (MONTAÑO, 2005: 58).

Quanto a “não-lucratividade” dessas entidades, nota-se que as organizações sem fins lucrativos (OSFL) envolvem diversos tipos organizativos. Como exemplo, as fundações - “braços assistenciais de empresas” (Roberto Marinho, Bradesco, Bill Gates), (Idem, 2005: 58) que não podem negar o interesse econômico na realização de ações em prol do social, que pode ser por meio da isenção de impostos, melhoria da imagem dos seus produtos ou como propaganda das atividades que exercem. Desta forma, mesmo que indiretamente têm um fim lucrativo.

Mesmo considerando o termo carente de rigor teórico e desarticulador do social, sem consenso acerca da origem, composição e características, não é possível negar sua existência. Montaño (2005) considera a participação da sociedade civil em atividades antes realizadas pelo Estado um fenômeno real, que precisa ser analisado criticamente, não apenas setorizando a realidade social. A sociedade civil não deve ser entendida como “autonomizada do Estado e do mercado e desarticulada do processo histórico de reforma do capital”. (Idem: 183)

18 Para Montaño, parceria seria o “repasse de verbas e fundos públicos no âmbito do Estado para instâncias

privadas, (...) verdadeira transferência de recursos públicos para setores privados não ocorre sem uma clara utilidade política governamental.” (MONTAÑO: 2005: 146).

Os autores que analisam o Terceiro Setor, segundo Montaño (2005), o caracterizam como:

a) organizações não-lucrativas e não-governamentais - ONG´s, movimentos sociais, organizações e associações comunitárias; b) instituições de caridade, religiosas; c) atividades filantrópicas - fundações empresariais, filantropia empresarial, empresa cidadã, que teriam descoberto a importância da atividade social; d) ações solidárias – consciência solidária, de ajuda mútua e de ajuda ao próximo; e) ações voluntárias; e f) atividades pontuais e informais (MONTAÑO, 2005: 182).

A conceituação mais encontrada seria: organizações e/ou ações da “sociedade civil”, não-estatais e não-mercantis (Idem).

Com a finalidade de definir o termo de forma mais profunda, Montaño (2005) destaca algumas características comuns ao fenômeno presente nos textos sobre Terceiro Setor: “1. atividades públicas desenvolvidas por particulares; (...) 2. função social de resposta às necessidades sociais; (...) 3. valores de solidariedade local, auto-ajuda e ajuda mútua” (MONTAÑO, 2005: 183-184)

Partindo dessas características o autor, define o termo:

na verdade, no lugar deste termo, o fenômeno deve ser interpretado como ações que expressam funções a partir de valores. Ou seja, as ações desenvolvidas por organizações da sociedade civil, que assumem as funções de resposta às demandas sociais (antes de responsabilidade fundamentalmente do Estado), a partir de valores de solidariedade local, auto-ajuda e ajuda mútua (substituindo os valores de solidariedade social e universalidade e direito dos serviços) (MONTAÑO, 2005:184)

Com isso o termo Terceiro Setor, serve para fazer referência a uma função social das organizações da sociedade civil, não apenas a organizações em determinado setor, mas o que deve ser considerado nesse conceito são as modalidades, fundamentos e responsabilidades inerentes à intervenção e respostas para a “questão social”.

Contudo, mesmo com a falta de consenso quanto ao termo e a sua origem, pois o debate sobre Terceiro Setor possui uma ampla gama de autores de diversas correntes ideológicas e partidárias, “cada um partindo de análises sociais diferentes, valendo-se de um marco referencial teórico distinto e procurando objetivos diversos, concordam em aspectos substantivos nas suas considerações sobre o chamado ‘Terceiro Setor’”. (Idem: 59)

Em linhas gerais o autor divide essa diversidade entre duas tendências: “regressiva e outra (suposta) intenção progressiva”, e escolhe clássicos porque não há novidade nesse debate, “à sua fundamentação, explícita ou não, nos clássicos do liberalismo conservador (Tocqueville) e do neoliberalismo (Hayek) e nos críticos da sociedade do trabalho (Habermas);”. Mas também usa outro autor não clássico - Rosanvallon – pois o mesmo é muito presente no debate dos teóricos sobre o Terceiro Setor.” (Idem: 59).

Considerando a dificuldade de definição conceitual do que venha a ser Terceiro Setor, baseada no autor supracitado, a presente pesquisa adotou como definição do termo: ações, partindo de valores de solidariedade local, auto-ajuda e ajuda mútua, desenvolvidas por organizações da sociedade civil com função de substituição das responsabilidades do Estado no trato – especificamente nesse estudo – a políticas, a programas e/ou projetos educacionais.

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