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62 Debrucemo-nos agora sobre o quadro esquemático do modelo em espiral do

desenvolvimento na ótica de Neuenschwander (2002). São quatro, as fases de estatuto de identidade nele definidas:

1.ª fase – “Estatuto integrado de identidade relativamente não diferenciado” – Presença das identificações com os pais. Surgimento do potencial das operações formais e das possibilidades de escolha e de caminho. Necessidade de diferenciação;

2.ª fase – “Estatuto de desorganização relativa da identidade” – Surgimento dos pares e de novos grupos de relações sociais. Novas tarefas de desenvolvimento apresentam-se ao indivíduo, novos objetivos pessoais surgem. Com o desenvolvimento cognitivo no estado das operações formais, o confronto crítico com as identificações torna-se visível. O desequilíbrio devido às novas experiências de vida conduz o indivíduo à necessidade de superação do estado em que se encontra;

3.ª fase – “Estatuto de identidade de nova construção parcial” – Superação do desequilíbrio cognitivo provocado pelas experiências de vida importantes e adaptação às condições ecológicas (meio);

4.ª fase – “Estatuto de identidade, relativamente diferenciado e integrado” – Os adolescentes alcançam a identidade pelo equilíbrio e pela adaptação pessoal e social.

O equilíbrio encontrado e a respetiva calma perante novos acontecimentos manifestam-se insuficientes, e uma nova espiral de desenvolvimento surge. O desenvolvimento da identidade é o caminho de um estado de stresse para um estado de equilíbrio com o bem-estar. Essa progressão da superação de crises é realizada também com uma auto imagem coesa e um sentido de independência resoluto (Neuenschwander, 2002). O bem-estar obtido e elevado é a manifestação de uma identidade integrada e de relações sociais positivas, num equilíbrio psicossocial significativo. Este modelo de desenvolvimento pode ser generalizado a toda a vida.

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2.6. Desenvolvimento Cognitivo e Afetivo no Raiar da Novidade

O desenvolvimento cognitivo, a formação da identidade, o desenvolvimento moral, afetivo e físico, ocorrem num processo holístico em ordem ao todo, que é o sujeito na sua integridade e equilíbrio. Assim, é possível e recomendável a perceção da simultaneidade construtiva do desenvolvimento nas várias áreas do sujeito. Piaget foi um dos teóricos do desenvolvimento cognitivo a propor relações entre o desenvolvimento psicológico do adolescente e o desenvolvimento cognitivo (Neuenschwander, 2002). Nesta relação dual penetra o desenvolvimento do indivíduo na forma como encara a sua realização no futuro. A teoria de Piaget, que analisamos seguidamente, no que concerne ao desenvolvimento cognitivo, é o desenvolvimento de uma capacidade que o sujeito adquire e lhe permite avaliar e discorrer sobre o mundo físico e lógico-matemático de forma estruturada (Lourenço, 2007).

O desenvolvimento cognitivo é, para Piaget, uma “construção contínua” (Piaget, 1990a, 12). Neste processo vão-se encadeando, naturalmente, os diversos estádios de desenvolvimento equivalentes à obtenção de variadas estruturas operatórias, associados à adaptação gradual dos indivíduos nos desafios e dificuldades próprias do ambiente (Almeida, Guisande & Ferreira, 2009). O modelo proposto por Piaget é construtivista e interaccionista: baseia-se no conceito de adaptação como processo interativo da relação sujeito/meio. O desenvolvimento cognitivo faz-se por mudanças de estruturas através de invariantes funcionais gerais, i.e., de mecanismos de adaptação: assimilação e acomodação (Tavares & Alarcão, 1990). Como já referimos, no item relacionado com o desenvolvimento, corroboramos neste âmbito do desenvolvimento cognitivo que o fator fundamental do desenvolvimento é a equilibração, processo de regulação entre assimilação e acomodação (sujeito, organismo/meio). O equilíbrio depende da história individual de cada indivíduo, e o tempo é doseado por cada um à sua maneira. Vejamos de seguida os respetivos estádios e fatores presentes no desenvolvimento cognitivo.

Os estádios de desenvolvimento em Piaget implicam a sequência de sucessão das aquisições – ser constante; caráter integrador; correspondência de cada estádio com uma estrutura de conjunto. Os quatro estádios sobre o desenvolvimento cognitivo revelam “modos epistémicos de pensar e organizar a realidade” (Lourenço, 2007, 75). Antes da apresentação sucinta dos estádios, importa esclarecer que as idades são apenas um indicador e não um critério de desenvolvimento. Desde o nível sensório-motor (0-2 anos), pré-operatório (2-7 anos), operações concretas (7-11/12 anos), ao último estádio das operações formais [segundo Lourenço (1994), Piaget alterou a sua posição relativamente às idades em que ocorre o

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pensamento formal, ou seja, dos 11/12 – 14/15 anos para os 15-20 anos], por constatar que o sujeito se liberta do passado para novas atividades futuras, desde que integre, em cada nova estrutura mental, as que precederam a sua realidade presente (Piaget & Inhelder, 1973). Cada nível do desenvolvimento produz algo radicalmente novo; assim, o desenvolvimento é caracterizado pelo aparecimento de estruturas novas (Piaget & Inhelder, 1973), reputando o que para Piaget é relevante e fundamental, ou seja, que a essência da inteligência é a formação progressiva das estruturas operatórias e pré-operatórias (Piaget, 1990a). O desenvolvimento dá-se de forma contínua no prolongamento de três grandes etapas progressivas interligadas, pelo que é reconstruído e ultrapassado sucessivamente (Piaget & Inhelder, 1973).

Deste modo, considerando que existe uma síntese como sucessão no desenvolvimento e que os diversos estádios não são interrompidos ou suspensos no respetivo desenvolvimento, subsistem velocidades diferentes entre as crianças pelas mais diversas razões, não existindo saltos no desenvolvimento do conhecimento (Piaget & Inhelder, 1973). A velocidade do desenvolvimento pode, na realidade, variar de um indivíduo para outro e também de um meio social para outro; no entanto, todos os indivíduos passam por qualquer um dos estádios de desenvolvimento. Em suma: não existe uma fórmula pré-estabelecida no processo de desenvolvimento da criança, a não ser uma construção progressiva, que lhe permite passar de um exercício de atribuições para outro (Piaget & Inhelder, 1973).

Para Piaget, existem três fatores de desenvolvimento: o primeiro diz respeito à hereditariedade e ao crescimento orgânico, com destaque para a transformação nos sistemas nervoso e endócrino, e cujo desenvolvimento natural, de cada um dos seus órgãos, se inicia na adolescência. O indivíduo está continuamente num processo de maturação das suas capacidades de conhecimento, acedendo a novas possibilidades de procedimento, sem, contudo, lhe serem fornecidas condições suficientes (Piaget, 1964; Piaget & Inhelder, 1973; Piaget, 1990a). Deste modo, concluímos que a maturação orgânica, por si só, não é suficiente para o desenvolvimento, na medida em que o indivíduo o vai adquirindo através da presença de diversas tarefas, que surgem no âmbito da influência do meio físico e social (Piaget, 1990a). O segundo fator fundamental é a importância da ação sobre os objetos obtida pela experiência e pelo desempenho (Piaget, 1964). Piaget considera dois tipos de experiência: a experiência física (ação sobre os objetos para deles tirar propriedades) e a experiência lógico-matemática (ação sobre os objetos para conhecer o resultado das coordenações das ações). O terceiro fator é o das interações e transmissões sociais (Piaget & Inhelder, 1973). A linguagem ocupa um lugar de destaque, embora seja o desenvolvimento operatório a preceder a mesma. Para Piaget, existe uma profunda interação entre os agentes biológicos e sociais. As trocas sociais e a socialização estão presentes em todo o processo operatório; por

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