• Nenhum resultado encontrado

Nyström e Öhrling (2003) descreveram as experiências de parentalidade de mães e pais durante o primeiro ano de seus filhos através de uma extensa revisão da literatura especializada no assunto. Os autores revisaram o período de 1992-2000 em banco de dados indexadores, tais como, Medline, Cinahl, PsycLit e Academic Search Databases. Os termos empregados na busca foram parentalidade, primeiro ano, infância e experiência. Foram selecionados 33 artigos relatando pesquisas quantitativas e qualitativas. Os dados foram analisados através de Análise de Conteúdo. Nos resultados, o tema unificador das vivências sobre a parentalidade entre mães e pais foi “viver num mundo novo e devastador”. Isto significa que mães e pais experienciaram mudanças devastadoras em suas vidas durante o primeiro ano da criança.

Descobertas considerando padrões de mudança na Satisfação Conjugal têm estimulado a exploração das causas disso ao longo do tempo. Por exemplo, nos anos 80, pesquisadores focalizaram-se sobre as transições da família para explicar por que Satisfação Conjugal declina com o tempo. A transição para a parentalidade foi central nestas pesquisas (Belsky, Lang & Huston, 1986; Cowan, Cowan, Heming, Garret,

Coysh, Curtis-Boles & Boles, 1985; Ruble, Fleming, Hackel & Stangor, 1988). Após o nascimento do primeiro filho, os pais relataram declínio na Satisfação Conjugal, nas interações positivas e no amor romântico, enquanto também relataram crescimento dos conflitos conjugais e dos problemas de relacionamento. Em suma, quase tudo de positivo no relacionamento dos parceiros é esperado diminuir após o nascimento do primeiro filho, por outro lado, quase tudo de negativo é esperado aumentar.

Relvas (1996) comentou que o nascimento do primeiro filho do casal pode trazer um decréscimo na intimidade, Ajustamento e Satisfação Conjugal. A parentalidade, também, pode significar um tempo de alegria e de enriquecimento individual e familiar, necessário para a realização do ser humano.

Sem dúvida que os livros e artigos escritos para pais grávidos alertam para as mudanças esperadas em seus casamentos. Estas mudanças podem resultar num ambiente positivo, mas principalmente estes trabalhos buscam ajudar na educação dos futuros pais sobre as dificuldades que o nascimento de uma criança traz, com freqüência, nos seus relacionamentos (Clements, Cordova, Markman & Laurenceau, 1997).

No entanto, mais de 90% dos casais americanos têm, no mínimo, uma criança. Se crianças causam problemas no casamento, por que os casais continuam repetindo esse erro? A resposta, talvez, resida no fato que tão comum quanto à idéia da criança como destroçador de casamento, é a idéia da criança como pacote de alegria ou evento divino. Infelizmente, ter uma criança “para salvar o casamento” é uma estratégia amplamente aceita por alguns casais infelizes e imprudentes, observam Clements e colegas (1997).

Recentemente, Salomone (2005) produziu uma reportagem para a Revista Veja abordando o tema da chegada do primeiro filho e da possibilidade disso se tornar catastrófico para o relacionamento do casal. A jornalista (p.107) registrou o depoimento de um casal que é um exemplo bastante ilustrativo das dificuldades de enfrentamento da transição para a parentalidade. Interessante observar o que comentou o homem de 29 anos:

Depois que I. nasceu não conseguimos segurar a onda mesmo. Éramos muito novos e acho que não estávamos preparados para as responsabilidades que chegaram junto com a nossa filha. Não tínhamos estrutura emocional para suportar tantas mudanças em nossa vida. Também fiquei muito incomodado ao ver a C. dividindo com o bebê a atenção que antes era só para mim. Quando ela teve depressão pós-parto, tudo ficou ainda mais complicado porque tive de me virar sozinho para cuidar da I. Não agüentei tanta pressão de uma vez só e

resolvi me separar. O nascimento da nossa filha foi como um tsunami. Foi devastador para o nosso casamento.

Em seguida, a mulher, ex-parceira, de 28 anos deu a sua versão dos fatos (Salomone, 2005, p. 107).

A gravidez de I. não foi planejada, mas em nenhum momento pensei que a chegada dela pudesse acabar com um relacionamento de tanto tempo. Logo que descobri que estava grávida, eu e o pai dela fomos morar juntos. Namorávamos havia seis anos, mas, à medida que a minha barriga ia crescendo, ele ia mudando radicalmente comigo. Deixou de ser carinhoso, atencioso e ficou extremamente impaciente com tudo. Quando nossa filha nasceu, vivemos um período de muita felicidade, mas que só durou dois meses. Um dia, ele disse que não me amava mais e que ia embora. Fiquei arrasada e comecei a fazer terapia. Hoje, superei o trauma, me casei de novo há dois anos, mas não penso em ter outro filho logo. Morro de medo quando penso que essa história pode se repetir.

No estudo de Belsky, Spanier e Rovine (1983), com o intuito de avaliar a mudança conjugal em função do nascimento do primeiro filho e/ou dos subseqüentes, 72 casais voluntários participaram de uma pesquisa longitudinal do último trimestre da gravidez até o nono mês do pós-parto. Os casais foram entrevistados juntos; os questionários foram respondidos individualmente; e, foram observados os comportamentos, nas residências. Análises dos escores médios revelaram pequena, mas nítida mudança no Ajustamento Conjugal (avaliado pela DAS), no funcionamento conjugal (atividades de lazer conjunto, na percepção do relacionamento como romântico, amigável e companheiro) e na interação conjugal observada. Os resultados indicaram que a transição para a parentalidade levou a uma modesta, porém significativa mudança no relacionamento conjugal. Provavelmente o mais representativo dos dados foi o declínio linear no Ajustamento Conjugal geral do último trimestre de gravidez para os três meses e, após, para os nove meses pós-parto, conforme revelado pela média dos escores totais da DAS em cada uma das três mensurações. Consideração de específicas subescalas da DAS revelam as prováveis causas deste declínio geral auto-relatado de qualidade conjugal. Com respeito a subescala Expressão de Afeto, um declínio significativo apareceu entre as duas primeiras mensurações, e apenas um leve declínio na terceira mensuração. Este padrão de resultados indicou que, em geral, o nascimento do bebê exerce um impacto maior nos momentos iniciais da experiência do casal com o novo filho.

Por outro lado, Miller e Sollie (1980) relataram que a mudança mais marcante foi do primeiro para o oitavo mês do pós-parto e não do sexto mês de gravidez para o primeiro mês do pós-parto. Estes autores interpretaram seus dados em termos de um período inicial de “lua de mel” com o bebê, no qual um eventual efeito estressante é amortecido pela reação inicial positiva da chegada da criança. Belsky e colegas (1983) entenderam que os dados de ambas as pesquisas são complementares. A interpretação integradora é que as interações positivas relacionadas com o bebê e o envolvimento conjugal geral entre os esposos declinaram significativamente do primeiro para o terceiro mês do pós-parto.

No caso específico da subescala Coesão Diádica, Belsky e colegas (1983) relataram que uma mudança significativa apareceu do último trimestre de gravidez para o terceiro mês do pós-parto, apenas para as mulheres. Enquanto os maridos consideraram seus relacionamentos conjugais como menos coesivos do que suas esposas durante o ultimo trimestre de gravidez, aos três meses tais diferenças não existiram. Tudo isso devido ao declínio dramático na avaliação das esposas dos seus casamentos e da estabilidade da avaliação dos maridos. Esses dados claramente sugerem que, em alguns aspectos, o Ajustamento Conjugal das esposas foi mais sensível aos efeitos da chegada de um bebê à família do que foi o Ajustamento Conjugal dos maridos, pelo menos no que tange às avaliações da Coesão Diádica. Considerando que peso maior foi sempre colocado sobre as mães no ajuste de suas vidas ao nascimento do bebê, esse achado não surpreende. Além de tudo, maridos não alteraram sua contribuição para a divisão de trabalho doméstico que tem sido tradicional responsabilidade das esposas (isto é, cozinhar, lavar, etc). Assim, são as esposas que principalmente aumentaram seus “fardos” domésticos por tornarem-se responsáveis pelo cuidado do bebê. Esposas relataram significativamente mais Ajustamento Conjugal geral do que maridos e em todas subescalas de Ajustamento Conjugal, exceto Consenso Diádico.

Ramos e colegas (2005) relataram, em estudo realizado com 61 homens na transição para a paternidade, que os níveis de Satisfação Conjugal declinaram significativamente do momento imediato do pós-parto (medida 1) para os 6 meses de idade do bebê (medida 2). Isso confirma a maioria das investigações sobre o assunto, no entanto, os autores registraram, que todos aqueles homens que anteriormente avaliaram de forma mais positiva a relação conjugal, apresentaram significativa melhor adaptação à transição.

Twenge, Campbell e Foster (2003) realizaram uma meta-análise e encontraram pais com Satisfação Conjugal mais baixa na comparação com casais sem filhos. Houve uma correlação negativa significativa entre Satisfação Conjugal e número de filhos. A diferença em Satisfação Conjugal é mais pronunciada entre mães de crianças (38% das mães de crianças tem Satisfação Conjugal mais elevada comparadas com 62% de mulheres sem filhos). Para homens, o efeito permanece similar ao longo das idades das crianças. O efeito da parentalidade sobre a Satisfação Conjugal é mais negativo entre grupos sócio-econômicos altos, mais jovens e em anos mais recentes. Os dados sugerem que a Satisfação Conjugal declina após o nascimento de uma criança devido ao papel do conflito e à restrição da liberdade. Os autores buscaram por artigos usando três fontes: (a) o PsycLIT no período de 1974-2000 e Sociofile (1974-2000) usando as palavras chave: crianças e Satisfação Conjugal; (b) secções de referência de todos os periódicos e (c) resumos de dissertações e teses. Assim, a amostra de dados incluiu periódicos, teses e dissertações. As medidas padronizadas (The Locke-Wallace, The Global Distress Scale e a Dyadic Adjustment Scale) mostraram tamanho de efeito significativamente maior quando comparadas com medidas de item único e medidas não padronizadas.

Dessen e Braz (2005b) incluíram o medo do marido de perder o afeto da esposa, por ciúme do bebê, e o medo da esposa em função da alteração em sua aparência física, como fatores importantes que concorrem para o declínio da Satisfação Conjugal na transição para a parentalidade.

O delineamento de muitas pesquisas da transição para a parentalidade assume que os fatores determinantes da Satisfação Conjugal têm o mesmo efeito antes e após o nascimento do primeiro filho para novos pais e para casais sem filhos. Guttmann (2004) testou a hipótese que pais pela primeira vez atribuiriam pesos diferentes a vários determinantes da Satisfação Conjugal dos pesos atribuídos por casais sem filhos. Se esses pesos relativos fossem levados em conta, algumas diferenças de Satisfação Conjugal relatadas entre os dois grupos seriam reduzidas. O autor examinou 60 novos pais e 60 casais sem filhos que responderam sobre o grau de suas satisfações com diversos aspectos de seus casamentos e avaliaram em que grau cada aspecto afetou suas Satisfações Conjugais. Estas duas medidas foram transformadas em uma única medida ponderada de Satisfação Conjugal. Os resultados mostraram uma diferença geral nos pesos atribuídos a vários fatores da Satisfação Conjugal. Também apareceu que novos pais estavam mais satisfeitos com seus casamentos do que o grupo dos casais sem filhos, nas medidas padrão e ponderada.

O estudo de Ahlborg, Dahlöf e Hallberg (2005) buscou descrever a qualidade do relacionamento íntimo entre pais seis meses após o nascimento de seu primeiro filho. A DAS modificada foi usada em 820 novos pais, dos quais 768 eram casados. Os resultados revelaram que a maioria dos pais era feliz em seu relacionamento, mas pais e mães estavam descontentes com seus relacionamentos sexuais. “Estar cansado(a) para relação sexual” foi um problema, especialmente para mães, e a freqüência mais comum de relação sexual por mês foi de uma ou duas vezes. Os resultados não apoiaram a assunção de que os casais compensariam a lacuna da sexualidade com sensualidade. Boa comunicação dentro do casal foi associada com níveis mais elevados de diversas dimensões do relacionamento íntimo, especialmente Consenso e Satisfação Diádicas. Assim, uma maneira de estabilizar e fortalecer um relacionamento quando a atividade sexual está baixa seria enfatizar a comunicação diádica e a atividade sensual. Os autores entenderam atividade sensual, neste estudo, como abraçar, beijar e acariciar e atividade sexual, o toque genital.