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Capítulo 3 – MÉTODO

3.2. Desenho do Estudo

3.5.3. Decorrer dos encontros

Realizámos onze encontros com os diferentes membros do sistema familiar: oito para fazer a recolha de dados e três, no fim do processo, para revelar os resultados da investigação aos participantes. Depois de observar cada sessão com a família, escrevíamos os aspetos mais significativos nas notas de campo, que podemos encontrar sinteticamente recolhidas no Apêndice N. Passamos, agora, a relatar sucintamente o desenvolvimento dos onze encontros.

No primeiro encontro com a Marta, realizado em outubro de 2011 no Lar de Crianças e Jovens, implementámos a primeira entrevista semiestruturada. Nas quatro entrevistas da investigação, seguimos os guiões, mas também acrescentámos no momento algumas segundas

perguntas (Kvale, 2008/2011) que considerámos adequadas. As quatro foram gravadas em

áudio e transcritas posteriormente.

Quando chegámos, ela já estava à nossa espera, parecia expectante mas bastante calma e à vontade. Foi importante ter criado, desde o primeiro momento, uma relação de empatia, mantendo uma postura calma e acolhedora, fazendo uso de certo humor e de perguntas iniciais informais. Reconhecer as nossas limitações linguísticas mostrou-se uma ferramenta útil para romper com certas barreiras e colocar a outra pessoa mais à vontade. No final do encontro, sentimos que foi positivo para ela ter desabafado connosco, especialmente o ter falado das suas origens diversas e do seu irmão adotado.

O segundo encontro com a Marta foi realizado no mês de novembro. O trabalho centrou-se na realização do genograma e no diálogo, a partir da informação que ela oferecia. Foi um bocado confuso apresentar toda a folha de instruções de uma vez, teria sido melhor começar pelos símbolos mais básicos. Apareceram, nesta sessão, narrações e reflexões relacionadas com as suas origens e com as ausências e conflitos familiares que experimenta. O genograma revelou-se um instrumento muito apropriado para trabalhar com este tipo de famílias, já que todos os instrumentos que se apoiem no suporte gráfico tornam a comunicação mais indireta e fácil de aceitar. A própria Marta reconheceu no fim do encontro que “foi bom para perceber as pessoas que gostam de mim e de quem eu gosto”.

No terceiro encontro, realizado no início do mês de dezembro, fizemos a entrevista semiestruturada com o casal. O encontro aconteceu no lar familiar e, apesar de terem aceitado participar na investigação, os primeiros momentos foram um pouco tensos. Estavam bastante na defensiva e não queriam abrir-se nas respostas, o que foi mudando progressivamente. Pensámos que o humor e a simplicidade ajudaram. O Luís parecia querer fugir, dando a entender que queria que aquilo acabasse o quanto antes. A Cristina estava vestida com um fato de treino e o Luís com um casaco de couro, parecendo que tinham acabado de acordar. Na entrada da casa, tinham um aparador onde estavam duas fotos das filhas: Sílvia e Marta. A casa estava fria e na sala havia uma certa desarrumação. Pensámos que o facto de estarem os dois juntos ajudou a perceber melhor a relação entre ambos, que parece fria e distante, mas também condicionou a participação mais ativa da Cristina.

O quarto encontro foi realizado no fim do mesmo mês, de novo com o casal em sua casa. Contudo, desta vez, realizou-se o genograma. Sentiram-se mais à vontade connosco, mas a tarefa resultou difícil para eles e tivemos que ser nós a realizar o genograma de forma dialogada. Os dois tinham realmente dificuldades em explicar quem eram os membros da sua família e falavam deles quase como desconhecidos.

O quinto encontro foi realizado no Lar de Crianças e Jovens com os quatro filhos, também no mês de dezembro. Quando chegámos à instituição, o Luís ficou com receio de estar connosco, começou a chorar e, só depois de ver as suas irmãs mais velhas, é que se sentiu mais à vontade. A Ana só apareceu no meio da sessão, porque estava noutra atividade. O encontro foi dividido em duas partes: uma primeira, de interação livre com as crianças, em que se usaram dois instrumentos, o desenho da árvore (Masuello, 1998) e o Sceno-Test (Von Staabs, 1991); a segunda parte consistiu na realização da Dupla Lua com a Marta e a Sílvia, na presença dos outros dois irmãos, o que não se revelou muito positivo, já que teria sido mais produtiva uma aplicação individualizada. O trabalho com bonecos e material lúdico mostrou-

se apropriado para interagir com crianças e levantar, de forma projetiva, dimensões inconscientes. Sentimos que esta família precisa de narrar a sua própria história, de falar de temas tabus e tentar dar sentido aos problemas que têm acontecido nas suas vidas.

O sexto encontro deu-se em janeiro com o casal, de novo em sua casa, para realizar a

Dupla Lua e fazer algumas perguntas a partir dumas fotos que tinham das filhas. Quando

chegámos, eles estavam à porta a esperar. Ela pareceu-nos, como sempre, um pouco descuidada. A casa estava fria e desarrumada, como das outras vezes, e, quando perguntámos pelas fotos, quase que não sabiam onde estavam. Eles contaram que os filhos foram no Natal, mas que saíam muito de casa e que os pequenos desorganizaram tudo. Na aplicação da Dupla

Lua, conseguimos que cada um realizasse o seu desenho, apesar das dificuldades que

manifestavam. Foi muito interessante e útil para perceber a estrutura relacional da família. O sétimo encontro consistiu na entrevista realizada no mês de janeiro com a psicóloga Florinda, que é também a diretora do Lar de Crianças e Jovens onde moram os filhos. Quando chegámos, ela já estava à nossa espera na sala. A impressão geral que tivemos foi que ela conhecia bastantes pormenores da vida deles, até alguns elementos do caráter e dificuldades dos meninos e dos pais, mas sentimos que havia algum desconhecimento das expectativas e recursos que a família tinha. Ao longo da investigação, disponibilizou-nos os recursos da instituição, facilitou o nosso trabalho, deu-nos o número de telefone da família e deixou-nos fazer, nesse mesmo dia, a consulta de documentos. O único documento que consultámos foi um dos dossiês do Lar, tendo sido analisado, concretamente, o processo individual da filha mais pequena, Ana Luísa Pereira. A consulta deste documento serviu-nos para verificar algumas das informações que já tínhamos sobre a família, especialmente algumas datas, idades e nomes que tinham ficado confusos no preenchimento do questionário sociodemográfico. Também nos facultou informação detalhada sobre o desenvolvimento e os problemas de aprendizagem da Ana, devido a um défice auditivo na primeira infância, o que leva a que, na escola, lhe sejam aplicadas medidas de educação especial e tenha apoio suplementar da terapia da fala.

No oitavo encontro, entrevistamos o avô materno, Filipe, em casa do casal, com a presença permanente da sua filha Cristina e com o aparecimento esporádico do genro Luís. O encontro foi realizado também no mês de janeiro e teve duas partes diferenciadas, já que aproveitámos para implementar na mesma sessão a entrevista semiestruturada e o genograma. Quando chegámos, já estava o avô com o pai à porta de casa à nossa espera. O Filipe pareceu- nos alguém com mais capacidades cognitivas que os pais e numa fase da vida em que começa a valorizar mais as relações familiares. Parece que a visita dos netos no Natal mexeu muito

com ele, quase começou a chorar quando falámos desse tema. Na realização do genograma, podemos destacar que foram os dois a falar e complementaram-se nas perguntas. Chamou-nos a atenção as dúvidas que eles têm dos nomes e, especialmente, das idades dos filhos. Este, que seria o último encontro com a família, deixou-nos com a impressão de que não poderíamos terminar assim. Sentimos a necessidade de, depois de terminada a dissertação, devolvermos os resultados e ter um pequeno gesto de agradecimento e de encerramento.

O nono encontro foi realizado no mês de julho, com os quatro filhos, na instituição onde vivem. Por coincidência, era o aniversário da Ana e levámos uns bombons para oferecer, na despedida. Durante quinze minutos, reunimo-nos com as duas filhas mais velhas para lhes falar dos resultados da investigação, tentando sempre ajudá-las e abrindo espaços de esperança. Depois, estivemos a brincar no jardim e aproveitámos para fotografar os quatro filhos, para entregar posteriormente a fotografia aos pais. Os dois mais pequenos abraçaram- se a nós quando entrámos pela porta e ficámos emocionados e com muitas questões sobre o tipo de relação que tínhamos criado e os limites das investigações qualitativas com observação participante.

O décimo encontro foi realizado na casa da família, com o Luís, também no mês de julho. A sua mulher não podia estar presente porque estava a fazer um curso profissional. Ele ficou muito contente quando nos viu e explicou que tinha estado a trabalhar em vários lugares, mas ainda não encontrara nada estável. Também comentou que tinha que ir aos correios para receber uma carta que, possivelmente, era do tribunal. Entregámos a foto com os quatro filhos, já que não tinham nenhuma e achámos que poderia ser um elemento simbólico de presença e união. Agradecemos a sua participação e comentámos, de forma muito simples, alguns dos aspetos salientes da investigação. Ficámos surpreendidos quando, no mesmo dia, nos ligou para o telemóvel para nos informar de que a carta era para autorizar que os filhos fossem uns dias a casa em agosto. Estava feliz e agradecia, como se nós fôssemos a causa da mudança.

O décimo primeiro encontro foi realizado com a psicóloga da instituição para devolver-lhe os dados e, assim, fazer o processo de validação por respondente, como nos dois casos anteriores. Todavia, desta vez, com muita mais calma e pormenor na apresentação dos resultados obtidos na nossa investigação.